ATO SN20/2017
Estadual
Judiciário
04/09/2017
11/09/2017
DJERJ, ADM, n. 5, p. 16.
Ferreira, Marcius da Costa - Processo Administrativo: 124690; Ano: 2017
Dispõe sobre esclarecimentos sobre os documentos a serem encaminhados a esta Corregedoria Geral da Justiça no que diz respeito ao regime de contratação de prestador de serviços sem vínculo empregatício para realização de atividade-fim - Decisão.
Processo: 2017-124690
Assunto: CONSULTA - MATÉRIA EXTRAJUDICIAL
SÃO JOÃO DA BARRA OFÍCIO ÚNICO
DECISÃO
Trata-se de consulta formulada em caráter genérico pela Delegatária do Serviço do Ofício Único do Município de São João da Barra da Comarca de São João da Barra em que solicita esclarecimentos sobre os documentos a serem encaminhados a esta Corregedoria Geral da Justiça no que diz respeito ao regime de contratação regido pela Lei nº 6.019/74, considerando que o artigo 4º A da referida lei passou a permitir a contratação de prestador de serviços sem vínculo empregatício para realização de atividade-fim.
Parecer do SELEX às fls. 18/21 no sentido de que os Delegatários poderão utilizar o regime da Lei nº 6.019/74 para a execução de serviços não relacionados às atividades típicas delegadas pelo Estado, não havendo nesse caso necessidade de encaminhamento de documentação a esta Corregedoria Geral da Justiça, desde que fiquem arquivadas no serviço, possibilitando eventual fiscalização.
A Constituição da República Federativa de 1988 em seu artigo 236 delimita juridicamente a atividade notarial e registral ao dispor que:
Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público.
§ 1º Lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, e definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário.
§ 2º Lei federal estabelecerá normas gerais para fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro.
§ 3º O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção, por mais de seis meses.
Estamos diante, portanto, de um sistema misto no serviço de notas e de registro, uma vez que se trata de função típica da Administração Pública, a qual, por sua vez, é entregue ao particular que vai gerenciá la sob a fiscalização do Poder Judiciário. Nas palavras de Walter Ceneviva: "A atividade notarial e registrária, embora exercida em caráter privado, tem característicos típicos de serviço público".
Assim, o seu exercício privado por delegação do Poder Público não lhes retira o caráter público e, para atingir suas finalidades, são delegados a profissionais de direito dotados de fé pública, consoante dispõe o artigo 3º da Lei nº 8.935/94, sendo que os atos praticados pelos Delegatários são dotados de presunção relativa de veracidade, atributo dos atos praticados pelo Poder Público.
Importante ressaltar que justamente por não exercer seu ofício no seio da organização funcional da Administração, com funções específicas e remuneração fixada em lei, o Delegatário da atividade extrajudicial não é ocupante de cargo público, de forma que seu exercício profissional deve ser considerado função pública por conta das inúmeras tarefas que são autorizadas a praticar, as quais seriam, na sua essência, da competência originária da Administração Pública.
Neste sentido, o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça já decidiram que, apesar de os Notários e Registradores exercerem atividade estatal, não detém titularidade de cargo público efetivo, de forma que não se submetem ao regime jurídico dos servidores públicos, nem gozam das mesmas prerrogativas.
A atividade notarial, portanto, deve ser considerada como função pública exercida pelos notários e registradores, e na falta destes pelos seus prepostos, sendo estes operadores delegatários do Poder Público. Neste sentido, grande parte dos doutrinadores assegura sobre a possibilidade de aplicação dos princípios específicos da Administração Pública para a atividade notarial, principalmente por serem estes muito mais exigentes e imperativos do que as normas constantes no diploma civilista.
Por sua vez, o artigo 28 da Lei nº 8.935/94 (Lei dos Notários e Registradores) dispõe que esses gozam de independência no exercício de suas atribuições, têm direito à percepção dos emolumentos integrais pelos atos praticados na serventia e só perderão a delegação nas hipóteses previstas em lei. Neste sentido, a corroborar esta independência na administração do trabalho, dispõe que o gerenciamento administrativo e financeiro dos serviços notariais e de registro é da responsabilidade exclusiva do respectivo titular, inclusive no que diz respeito às despesas de custeio, investimento e pessoal, cabendo-lhe estabelecer normas, condições e obrigações relativas à atribuição de funções e de remuneração de seus prepostos de modo a obter a melhor qualidade na prestação dos serviços. Assim caberá a este, como particular que desempenha função pública, assumir os riscos da atividade.
No caso em análise, no que se refere à contratação de escreventes e auxiliares, conforme o artigo 20 da lei dos Notários e Registradores, os notários e os oficiais de registro poderão realizar a contratação daqueles para desempenho de suas funções, com remuneração livremente ajustada e sob o regime da contratação do trabalho. Por sua vez, assim dispõe o §4º do artigo 34 da Consolidação Normativa da Corregedoria Geral da Justiça - parte extrajudicial:
§ 4º. A contratação de empregados, no âmbito dos serviços extrajudiciais privatizados/não oficializados pelos Titulares/Delegatários, deverá ser realizada em seu nome, com o respectivo número do Cadastro de Empregador Individual (CEI), observadas as obrigações trabalhistas e previdenciárias decorrentes da relação de trabalho.
Desta forma, caberá aos Delegatários o exercício das atividades típicas do Estado com o auxílio dos serviços de prepostos, diretamente a eles vinculados sob o regime da legislação trabalhista. No entanto, em que pese esta autonomia gerencial no exercício de suas atribuições, ficam os Delegatários sujeitos, por força do §1º do artigo 236 da Constituição da República, à fiscalização pelo Poder Judiciário, uma vez que exercem atividades eminentemente públicas.
À vista do exposto, considerando a relevante função pública exercida pelos Delegatários, estes somente poderão utilizar o regime da Lei nº 6.019/74 para a execução de serviços não relacionados às atividades típicas delegadas pelo Estado, não havendo nesse caso necessidade de encaminhamento de documentação a esta Corregedoria Geral da Justiça, sendo, contudo, necessário o arquivamento no Serviço para eventual fiscalização.
Oficie-se à consulente, encaminhando cópia da presente.
Publique-se.
Após, arquivem-se.
São Sebastião do Rio de Janeiro, 04 de setembro de 2017.
MARCIUS DA COSTA FERREIRA
Juiz Auxiliar da Corregedoria Geral da Justiça
Este texto não substitui o publicado no Diário Oficial.