EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA DAS TURMAS RECURSAIS 11/2020
Estadual
Judiciário
15/12/2020
16/12/2020
DJERJ, ADM, n. 71, p. 41.
Ementário de Jurisprudência das Turmas Recursais do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA TURMAS RECURSAIS Nº 11/2020
COMISSÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Presidente: DESEMBARGADOR MARCO ANTONIO IBRAHIM
Organização: Serviço de Publicações Jurisprudenciais da Divisão de Organização de Acervos de Conhecimento - dicac@tjrj.jus.br
Rua Dom Manoel, 29, 2º andar, sala 215, Praça XV
Ementa número 1
PANDEMIA DE COVID-19
HOSPITAL PARTICULAR
CUSTEIO DE TRATAMENTO DE SAÚDE
MANUTENÇÃO DA VIDA
MULTA HORÁRIA
TRANSFERÊNCIA
SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE - S.U.S.
Agravo de Instrumento n.º 0001197-53.2020.8.19.9000 Agravante: Estado do Rio de Janeiro Agravado: Quiteria Feitosa Vicente R E L A T Ó R I O Trata-se de Agravo de Instrumento interposto alvejando decisão interlocutória proferida pelo Juízo de Direito do Juizado Especial Fazendário da Comarca da Capital que, nos autos de ação ajuizada pela agravada deferiu o pedido de antecipação dos efeitos da tutela, determinando que os entes estatais réus promovam a transferência do Agravado para uma unidade de saúde da rede pública de saúde para tratamento de Covid-19, e que os 1º e 2º Réus custeiem, até a efetiva transferência da Autora, a sua internação no Hospital Particular (3º Réu), arcando, inclusive, com todos os medicamentos e exames necessários ao tratamento de sua saúde, sob pena de multa horária de R$ 1.000,00 (mil reais). É o Relatório, passo ao V O T O: EMENTA: AGRAVO INTERPOSTO CONTRA DECISÃO DE PRIMEIRO GRAU QUE DEFERE O PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. CABIMENTO. ART. 3º C/C ART. 4º, AMBOS DA LEI Nº 12.153/2009. DECISÃO QUE NÃO SE MOSTRA TERATOLÓGICA, CONTRÁRIA À LEI OU A PROVA DOS AUTOS. SÚMULA N° 59 DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. DESPROVIMENTO DO RECURSO. Pela análise dos autos vê-se que o Agravante não está discutindo acerca da necessidade do procedimento objeto da demanda, sendo este essencial à manutenção da vida da parte autora, ora agravada. Na verdade, pretende o Agravante, no presente recurso, ver afastada sua responsabilidade quanto ao cumprimento da decisão alvejada. A questão constitucional em debate diz respeito ao dever do Estado de prestar tratamento médico adequado aos que dele necessitem e da responsabilidade solidária dos entes federados perante essa obrigação, cuja repercussão geral reconhecida gerando o Tema nº 793 do Supremo Tribunal Federal (RE nº 855.178/SE), no qual foi fixada a seguinte tese: "O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, sendo responsabilidade solidária dos entes federados, podendo figurar no polo passivo qualquer um deles em conjunto ou isoladamente." Assim, presentes o risco de dano de difícil reparação, assim como a verossimilhança das alegações, sendo certo, ainda, que a decisão agravada foi proferida com base em um juízo de cognição sumária, podendo ser reconsiderada ao fim da instrução processual, não se mostra a mesma teratológica ou ilegal, pelo que deve ser a mesma mantida. Vale ressaltar a orientação contida na Súmula 59 deste Tribunal de Justiça nos termos seguintes: "Somente se reforma a decisão concessiva ou não da antecipação de tutela, se teratológica, contrária à lei ou à evidente prova dos autos". Por tais motivos, VOTO pelo CONHECIMENTO e DESPROVIMENTO AO RECURSO. Dê-se baixa e arquivem-se, encaminhando as cópias das decisões e votos pertinentes para o Juízo de origem, fazendo menção no ofício ao número do processo principal. Rio de Janeiro, 07 de outubro de 2020. ALBERTO REPUBLICANO DE MACEDO JR. Juiz de Direito Relator Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Primeira Turma Recursal Fazendária
AGRAVO DE INSTRUMENTO 0001197-53.2020.8.19.9000
CAPITAL 1 TURMA RECURSAL DOS JUI ESP FAZENDA PUB.
Juiz(a) ALBERTO REPUBLICANO DE MACEDO JUNIOR - Julg: 07/10/2020
Ementa número 2
PLANO DE SAÚDE
EXAME SOROLÓGICO PARA COVID-19
NEGATIVA
COBERTURA OBRIGATÓRIA
CONSELHO RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS RECURSO: 0017475-60.2020.8.19.0002 RECORRENTE: Sueli da Costa ADVOGADO: Ana Paula Da Costa Ribeiro (RJ100817) RECORRIDO: UNIMED LESTE FLUMINENSE ADVOGADOS: Juliana Maria De Andrade Bhering Cabral Palhares (RJ120077) e Livia Nogueira Linhares Pereira Pinto Quintella (RJ125421) VOTO Negativa de cobertura para realização de exame de detecção do Covid 19 - Narra a parte autora que é beneficiária do plano de saúde junto a parte ré conforme fls.12 e que em 01/06/2020, ao apresentar sintomas do novo coronavírus, procurou atendimento médico. Aduz que, foi solicitada a realização do exame sorológico para a confirmação do COVID-19 conforme fls.15, porém, a parte autora recebeu a negativa da parte ré sob a alegação de ausência de cobertura. Ocorre que, ao tentar solucionar a questão administrativamente, não obteve sucesso. Pleito de tutela de urgência para que a parte ré autorize a realização do teste para COVID 19 e análise de cadeias leves livres kappa e lambda no sangue imediatamente e indenização à título de danos morais. Tutela deferida às fls.34. Contestação às fls.50 aduzindo preliminarmente o cumprimento da decisão de fls.34 tendo em vista o envio de um telegrama informando a autorização dos exames, a falta de interesse de agir diante da ausência de falha na prestação do serviço e no mérito aduz a ausência de solicitação de autorização para realização do exame perante a parte ré, a ausência de cobertura do exame Sars-Cov-2 (Coronavírus Covid-19), Sorologia Iga. Igm e Igg diante deste não constar no rol de coberturas da ANS no momento da solicitação médica, a taxatividade do rol da ANS, a não comprovação da negativa de atendimento, inexistência de falha na prestação de serviços, ilegitimidade passiva, ausência de provas dos fatos constitutivos do direito e a inexistência de dano moral. AIJ dispensada em razão do despacho de fls.568 que determinou o julgamento antecipado dos processos que possuem apresentação de defesa e que seja desnecessária a produção de novas provas, em razão da pandemia do coronavírus. Projeto de Sentença homologado no II JEC da Comarca de Niterói pelo juiz Jeronimo da Silveira Kalife às fls.586 que revogou a tutela de fls.34 e julgou improcedentes os pedidos. Recurso da parte autora às fls.598, com gratuidade deferida, aduzindo a falha na prestação de serviços, a tentativa de autorização para realização do exame, a não autorização do tratamento que a parte autora necessita, que o rol de cobertura obrigatória estipulado pela ANS é exemplificativo, o direito fundamental a saúde do paciente e por fim, reitera o pedido de indenização à título de danos morais diante da existência de dano. Provimento parcial do recurso da parte autora para reformar a sentença de fls.586 e restabelecer, confirmar e tornar definitivo os efeitos da tutela antecipada concedida às fls.34 tendo em vista que quando da solicitação do exame às fls.15 em 16/06/2015 a Resolução Normativa de nº 453 da ANS que regulamenta a cobertura obrigatória e a utilização de testes diagnósticos para infecção pelo Coronavírus, estava em vigor. Nesse sentido, em 14/08/2020 a ANS determinou a inclusão dos exames sorológicos para Covid-19 no rol de procedimentos com cobertura obrigatória pelos planos de saúde conforme informação do site: http://www.ans.gov.br/aans/noticias-ans/coronavirus-covid19/coronavirus-todas-as-noticias/5405-ans-i nclui-exame-para-deteccao-de-coronavirus-no-rol-de-procedimentos-obrigatorios. Contudo, não restou demonstrada lesão ao direito de personalidade da parte autora razão pela qual descabe indenização compensatória por danos morais. Sem honorários por se tratar de recurso com êxito. Pelo exposto, voto pelo provimento parcial do recurso da parte autora para reformar a sentença de fls.586 e restabelecer, confirmar e tornar definitivo os efeitos da tutela antecipada concedida às fls.34. Sem honorários por se tratar de recurso com êxito. Rio de Janeiro, 29 de outubro de 2020. Flávio Citro Vieira de Mello Juiz Relator
RECURSO INOMINADO 0017475-60.2020.8.19.0002
CAPITAL 1a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS
Juiz(a) FLÁVIO CITRO VIEIRA DE MELLO - Julg: 29/10/2020
Ementa número 3
OBRA PARTICULAR EM CONDOMÍNIO
PANDEMIA DE COVID-19
PROIBIÇÃO
PLANO DE RETOMADA DE OBRAS
DIREITO DE PROPRIEDADE
PERTURBAÇÃO DO SOSSEGO ALHEIO
LIMITAÇÃO DE HORÁRIO
2ª TURMA RECURSAL. RECURSO Nº 0124876-24.2020.8.19.0001. RECORRENTE: JOSÉ LOBO CARNEIRO MONTEIRO JUNIOR. RECORRIDA: SUELY DUARTE PEREIRA. VOTO: Narra a parte autora que é proprietária da unidade 201 de determinado condomínio e que o réu, vizinho do apartamento 101, mesmo ciente da proibição de realização de reformas durante a pandemia de COVID-19, retomou as obras em sua unidade no dia 02.06.2020, contrariando a legislação em vigor. Afirma que realizou registro de ocorrência na 19ª DP e que, na ocasião, o réu, ao receber a intimação policial, suspendeu a obra. Relata que, dias depois, a obra foi retomada, dando ensejo ao ajuizamento da presente demanda. Informa que é idosa, que continua em isolamento social e que não vem conseguindo cumprir suas tarefas diárias, inclusive o trabalho home office, sentindo-se extremamente incomodada com o constante e ensurdecedor barulho originado pela obra de reforma no apartamento do réu. Pugna, assim, pela concessão de tutela antecipada para cessação imediata da obra. No mérito, requer a confirmação da tutela e indenização por danos morais. Tutela antecipada deferida às fls.27, determinando a cessação da obra em 22.06.2020. O réu peticiona às fls. 35/42, juntando documentação e requerendo a reconsideração da decisão de deferimento da tutela antecipada. Aduz a parte ré que adquiriu o apartamento em novembro de 2019 e que a reforma teve início em fevereiro de 2020, sendo interrompida em 15.03.2020 em decorrência da pandemia de COVID-19. Afirma que a obra foi retomada em 02.06.2020, quando entrou em vigor o Decreto Municipal nº 47.488/20, que estabeleceu o Plano de Retomada, estando prevista na FASE 1 (art. 12 e Anexo II - Faseamento), autorização de funcionamento das atividades de construção de casas e prédios e reformas. Acrescenta que, em 08/06/2020, a 7ª Vara de Fazenda Pública, proferiu decisão liminar, suspendendo a vigência de diversos dispositivos do Decreto Municipal nº 47.488/20, razão pela qual a obra foi novamente interrompida. No entanto, em 09/06/2020, a Presidência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, suspendeu os efeitos da decisão proferida pelo Juízo da 7ª Vara de Fazenda Pública, nos autos do processo nº 0117233-15.2020.8.19.0001, passando a vigorar novamente as medidas estabelecidas na FASE 1 do Plano de Retomada do Município do Rio de Janeiro, inclusive a atividade de reforma de imóvel. Relata que, antes de retomar as atividades de reforma do apartamento, entrou em contato com o síndico e demais condôminos, apresentando um plano de retomada das obras, informando que todas as "Regras de Ouro" estabelecidas no Decreto Municipal nº 47.488/20 e as medidas de segurança estabelecidas no Decreto ERJ 47.112/20, seriam estritamente observadas, recebendo o "NADA A OPOR" de todos os condôminos, com exceção da autora. Afirma, por fim, que a obra sempre obedeceu às regras do condomínio e que o barulho e o nível de ruído por ela produzidos estão dentro dos parâmetros legais. A parte autora, em réplica de fls. 210/219, assevera que o réu desrespeitou o art. 4º, inciso XVII do Decreto do Estado do Rio de Janeiro nº 47.102, de 01 de junho de 2020, que determinava a suspensão, até o dia 05 de junho de 2020, das atividades de obras e reparos não emergenciais em imóveis residenciais e comerciais. Decisão de fls. 242, datada de 23.07.2020, autorizando a retomada das obras pelo réu. A sentença foi proferida às fls. 274/277 e julgou procedentes os pedidos, confirmando a tutela antecipada de fls.27, adaptando o horário de retomada da obra pelo réu, de segunda às sextas-feiras, das 8 às 14 horas, excluindo os feriados. Condenou a parte ré, ainda, ao pagamento da quantia de R$ 3.000,00 (três mil reais) à parte autora a título de danos morais. Recurso da parte ré, arguindo preliminar de cerceamento de defesa, eis que não teve oportunidade de apresentar contestação. No mérito, alega: a) que a obra no imóvel visa a habitação de sua família; b) que não houve reclamação de qualquer outro condômino; c) que o horário de 8 às 14 horas limita o recebimento de fornecedores; d) que sempre obedeceu às fases do plano de retomada; e) que a petição considerada como contestação não impugnava os danos morais; f) clara parcialidade na demanda; g) ausência de danos morais. Contrarrazões apresentadas pela parte autora às fls.333/349, pugnando pela manutenção integral da sentença. É o relatório. Passo ao voto. Em primeiro lugar, cumpre analisar a preliminar de cerceamento de defesa. Alega o réu que não lhe foi oportunizada chance de apresentar contestação e que, caso o Juízo entendesse desnecessária a produção da prova oral requerida, deveria ter determinado ao réu a apresentação de defesa (art. 30, da Lei 9.099/95), o que não foi feito, ferindo frontalmente o direito à ampla defesa e ao contraditório. Neste ponto, deve-se ressaltar que os despachos lançados no processo demonstram que a defesa, desde o início, ficou ciente de que, devido à pandemia, a regra seria o julgamento antecipado da lide, bem como que a pertinência da prova testemunhal seria valorada pelo Juízo antes de eventual designação de AIJ (fls.262). Observa-se que o réu teve oportunidade de contestar desde o despacho de fls.242, mas não o fez. Sendo assim, ao contrário do ventilado pelo réu, não caberia ao magistrado, por meio de decisão interlocutória, indeferir a prova testemunhal e determinar a juntada de contestação. Por outro lado, como muito bem consignado na sentença, o réu apresentou uma detalhada petição às fls.35/42, acompanhada de farta documentação (fls.43/190), sendo considerada como verdadeira defesa da lide e que foi levada em consideração pelo magistrado ao prolatar a sentença. Desta forma, não houve qualquer prejuízo à ampla defesa e ao contraditório, motivo pelo qual deve ser superada a preliminar de cerceamento de defesa. No mérito, o primeiro ponto a ser analisado é verificar qual a legislação aplicável ao presente caso. A autora invoca a aplicação do Decreto Estadual nº 47.102/2020, que no art,4º, inciso XVII determinava a suspensão. até o dia 05 de junho de 2020, das atividades de obras e reparos não emergenciais em imóveis residenciais e comerciais. Reforça que, por força do Decreto Estadual, não poderia o réu ter retomado as obras em seu imóvel no dia 02.06.2020. O réu, a seu turno, invoca a aplicação do Decreto Municipal nº 47.488/20, que estabeleceu o Plano de Retomada, estando prevista na FASE 1 (art. 12 e anexo II - Faseamento), autorização de funcionamento das atividades de construção de casas, prédios e reformas a partir de 02.06.2020. Ambas as normas entraram em vigor na mesma data, em 02/06/2020. Destarte, considerando que o réu retomou a obra em seu apartamento em 02.06.2020, conforme comprova o Registro de Ocorrência juntado aos autos, cumpre analisar se nesta data estava ou não ele autorizado a reiniciar a reforma em seu imóvel. E tal análise, como já mencionado, importa em definir qual a legislação aplicável ao presente caso, já que o Decreto Estadual nº 47.102/2020 e o Decreto Municipal nº 47.488/20 estabelecem datas diversas para a retomada das obras. A Constituição Federal dispõe que os Municípios são competentes para legislar sobre os assuntos de interesse preponderantemente local, ou seja, sobre as matérias que não podem ou não devem receber um tratamento uniforme em todo o Estado ou em todo o país, dentre elas a fixação de regras relativas a edificações, construções e reformas de imóveis realizadas em seu território. No direito brasileiro seguiu-se a tradição de se fixarem normas genéricas na legislação nacional, deixando-se ao cuidado das autoridades municipais o estabelecimento das normas específicas, que é justamente a hipótese dos autos. É fato notório que, durante o mês de junho deste ano, cada Município do Estado do Rio de Janeiro encontrava-se em diferente grau de isolamento social, o que reforçava a necessidade de se estabelecer normas específicas em relação a cada um dos Municípios, normas estas que abrangem, dentre outros pontos, a disciplina de retomada das atividades de obras e reparos em imóveis residenciais e comerciais. Sendo assim, diante da repartição de competências estabelecidas pela Constituição Federal, tenho que a norma a ser aplicada ao presente caso é o Decreto Municipal (Plano de Retomada de obras), no qual se baseou o réu. Estabelecida tal premissa, de que o réu estava autorizado a retomar a obra em seu imóvel em 02.06.2020, cumpre analisar a limitação ao direto de propriedade do réu, imposta pela sentença, que definiu um horário diferenciado para realização da obra em função da pandemia. E, num segundo momento, analisar a fixação do dano moral fundamentada na turbação da posse do imóvel pelo barulho causado pela obra do réu. No que tange à limitação do horário de realização da obra, entendo que a sentença não merece qualquer reparo. É certo que a pandemia causada pelo coronavírus mudou de forma intensa a vida de todos, fazendo com que as pessoas permanecessem mais tempo em casa, inclusive trabalhando em home office. Disto resulta que a propriedade não pode mais ser utilizada nos mesmos moldes de antes da pandemia, devendo se adequar aos novos tempos, obviamente dentro dos limites da razoabilidade e respeitados os demais diretos envolvidos. Antes da pandemia, as pessoas passavam praticamente o dia inteiro fora de suas residências, sendo razoável que a obra fosse realizada das 8h às 17h. No entanto, diante da necessidade atual de permanecerem a maior parte do tempo em casa, faz-se necessário adequar o horário de realização de obra à nova realidade. É cediço que nenhum direito é absoluto, incluindo, por óbvio, o direito de propriedade; e essa ponderação entre os diretos envolvidos (direito de propriedade, direito à saúde, direto ao sossego e direto de vizinhança) foi muito bem analisada na sentença, motivo pelo qual entendo que, neste ponto, a sentença não merece qualquer retoque. Em relação à fixação do dano moral fundamentada no barulho excessivo causado pela obra do réu, entendo que a sentença merece reparo. É fato que toda obra gera ruído; não há obra silenciosa. O que deve ser analisado, no entanto, é se o nível de ruído produzido pela obra do réu estava ou não dentro dos limites permitidos pela legislação. E esta análise é importante, pois ainda que o réu estivesse autorizado a retomar a obra (como, de fato, estava), deveria fazê-lo dentro dos limites máximos de intensidade estabelecidos em lei. A autora afirma na inicial que o ruído era ensurdecedor, excessivo, no entanto, não trouxe aos autos prova hábil a comprovar que a obra do réu excedeu, em algum momento, o nível máximo de ruído permitido pela legislação. Poderia a autora ter juntado aos autos prova da medição de decibéis, comprovando que a obra produzia ruído em nível superior ao permitido por lei ou, ainda, prova de que os equipamentos utilizados pelo réu seriam de grande porte, por exemplo, mas não o fez. Ressalta-se que o Registro de Ocorrência anexado ao feito nada esclarece a respeito do nível de ruído produzido pela obra. Poderia a autora, de igual forma, ter ajuizado sua ação na Vara Cível e requerido a produção de prova pericial (que não é cabível em sede de Juizado Especial) para comprovar que o nível de ruído da obra excedia aos limites legais, inclusive com produção antecipada de prova, para demonstrar que naquele período inicial e mais crítico da obra (de remoção de piso e troca de tubulações) o barulho estaria acima do permitido. Na forma do art. 373, I do CPC, o ônus da prova de comprovar o excesso de barulho é de quem alega, sendo ônus da parte autora a comprovação do fato constitutivo de seu direito, o que não ocorreu no presente caso. Sendo assim, considerando que não houve prova do excesso quanto ao ruído produzido pela obra do réu, ônus esse que incumbia à parte autora, deve ser afastada a condenação do réu ao pagamento de indenização por danos morais. Ante o exposto, VOTO no sentido de conhecer e DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO para JULGAR IMPROCEDENTE o pedido de danos morais. Mantida, no mais, a sentença tal como lançada. Sem ônus sucumbenciais. Rio de Janeiro, 03 de novembro de 2020. JULIANA ANDRADE BARICHELLO. JUÍZA RELATORA.
RECURSO INOMINADO 0124876-24.2020.8.19.0001
CAPITAL 2a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS
Juiz(a) JULIANA ANDRADE BARICHELLO - Julg: 16/11/2020
Ementa número 4
CUSTEIO DE TRATAMENTO DE SAÚDE
SEQUESTRO NOS COFRES PÚBLICOS
PANDEMIA DE COVID-19
REDUÇÃO DO VALOR
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO CONSELHO RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS II TURMA RECURSAL DE FAZENDA PÚBLICA AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0000590-40.2020.8.19.9000 Agravante: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO Agravada: ISIS RAMOS PEREZ VOTO Trata-se de Agravo de Instrumento interposto pelo Ministério Público, pretendendo a modificação da decisão que determinou o sequestro nos cofres do Município de Niterói da quantia de R$4.732,44, com o fim de custear o tratamento médico da parte autora durante o período de 01(um) ano. Requer o agravante a concessão do efeito suspensivo e consequente reforma da decisão agravada, a fim de determinar o sequestro suficiente para o período de 06 (seis) meses. Decisão de fl. 14/16, que recebeu o agravo, e deferiu o efeito suspensivo, determinando, ainda, a intimação dos agravados. Intimado para se manifestar, o agravado quedou-se inerte. É O RELATÓRIO. DECIDO. O Ministério Público, ora agravante, insurge-se contra decisão que deferiu a tutela e determinou o sequestro das verbas públicas suficientes para o período de 01 (um) ano de tratamento médico da autora, ora agravada. Com efeito, importa observar que, não obstante o tratamento médico requerido na inicial seja de incontestável necessidade à manutenção da saúde da parte autora, e, ainda, que a quantia determinada na decisão não é de grande monta, não se pode olvidar do cenário político/econômico atual, por conta da pandemia COVID-19. A realidade é que os Governos, nas esferas federal, estadual e municipal, são diariamente acionados, para fornecer medicamentos ou custear o tratamento médico aos cidadãos que não possuem meios econômicos para fazê-lo pelas vias próprias, em observância ao pilar constitucional da dignidade humana, que tem como consectário lógico e expresso na Magna Carta, o direito à saúde, sendo dever do Estado a sua garantia. Contudo, o panorama fático da saúde pública, que ordinariamente, já era precário, teve seu quadro intensificado drasticamente com a pandemia de COVID-19, instaurada pelo novo Coronavírus, porquanto o aumento dos gastos emergenciais e a estagnação da economia mundial aumentam cada vez mais a dívida pública. Desse modo, no intuito de ponderar os dois interesses envolvidos, o particular, da parte autora, que necessita do medicamento, mas também o interesse da coletividade nesse momento totalmente atípico, faz-se necessária uma análise com maior rigor de tais pedidos que envolvam penhora/sequestro/arresto de verbas públicas, devendo ser priorizado os casos comprovadamente emergenciais e com risco de irreversibilidade No caso, portanto, embora necessário o tratamento, o sequestro da verba para arcar com os gastos do tratamento pelo período de 01 (um) ano não mostra-se razoável, diante do cenário atual, sendo certo que a redução para o período de 06 meses em nada prejudicará a parte autora, não se revelando como medida irreparável para esta, que, posteriormente, poderá pleitear nova medida constritiva. Ao contrário, tal medida, se mantida, poderá onerar desnecessariamente os cofres públicos, sendo, assim, irreversível, diante da situação tão grave que atinge a todos nós. Diante do exposto, CONHEÇO o recurso interposto, eis que presentes seus requisitos de admissibilidade extrínseca e intrínseca, e VOTO por seu PROVIMENTO para modificar a decisão agravada e DETERMINAR o sequestro de verba, no valor de R$ 2.366,22 , suficiente para 06 meses de tratamento à parte autora. . Rio de Janeiro, na data da assinatura digital MABEL CHRISTINA CASTRIOTO MEIRA DE VASCONCELLOS JUÍZA RELATORA
AGRAVO DE INSTRUMENTO 0000590-40.2020.8.19.9000
Segunda Turma Recursal Fazendária
Juiz(a) MABEL CHRISTINA CASTRIOTO MEIRA DE VASCONCELLOS - Julg: 12/10/2020
Ementa número 5
FOLHA DE ANTECEDENTES CRIMINAIS
RETIRADA DA ANOTAÇÃO
PANDEMIA DE COVID-19
IMPOSSIBILIDADE
HABEAS CORPUS
VIA INADEQUADA
PRIMEIRA TURMA RECURSAL CRIMINAL Proc. Nº 0001001-83.2020.8.19.9000 HABEAS CORPUS IMPETRANTE: MAURO TORTURA LOPES PACIENTE: LUIZ CARLOS RODRIGUES DIAS Trata-se de HABEAS CORPUS, com pedido de liminar, impetrado em favor de LUIZ CARLOS RODRIGUES DIAS, apontando como autoridade coatora o Juízo do XX Juizado Especial Criminal da Ilha do Governador (que segundo ele não mais existe). Narra o Impetrante que consta na certidão criminal do paciente, a prática da contravenção penal prevista no art. 65 da LCP, efetivada, em tese em 1901, quando o paciente sequer era nascido, e que tal anotação está atrapalhando na contratação de um emprego. Acrescenta que não requereu a retirada da anotação ao juízo de origem porque o Fórum da Ilha do Governador estava fechado em razão da pandemia do COVID-19. Aduz que jamais soube deste procedimento e que a suposta contravenção já estaria prescrita. Que ainda que fosse o caso, não poderia constar na certidão essa anotação, sem data de sentença de extinção de punibilidade e sem data de trânsito em julgado. Assim, requer liminarmente, o reconhecimento da extinção da punibilidade em razão da ocorrência da prescrição e o cancelamento da anotação. A inicial veio instruída com os documentos de fls. 06/11. Foi indeferida a liminar requerida. O ilustre Promotor de Justiça em atuação junto à Turma Recursal, apresentou parecer às fls. 18, pela denegação da ordem. Voto Pretende o Impetrante pela via do Habeas Corpus a retirada de uma anotação de sua folha de antecedentes criminais. Inicialmente, importante esclarecer que a certidão apresentada com a inicial, consta que o suposto fato ocorrera em 1901, sendo provavelmente um erro de digitação, eis que o procedimento constante na certidão é de 1999. Mas, de qualquer forma efetivamente já se efetivou a prescrição. No entanto, entendo que não seja caso de Habeas Corpus, senão vejamos: O art. 647 do CPP, determina que será concedido o Habeas Corpus "sempre que alguém sofra ou se encontre na iminência de sofrer violência ou coação ilegal em sua liberdade de ir e vir, salvo nos casos de punição disciplinar ". É importante sublinhar que a jurisprudência é no sentido de que não terá seguimento o Habeas Corpus quando a coação ilegal não afetar diretamente a liberdade deambulatória. Na presente hipótese é bem claro que a liberdade do paciente não está de maneira nenhuma ameaçada em razão do fato alegado. Acrescente-se ainda, quando o presente foi distribuído junto ao Tribunal de Justiça, estava em vigor o Ato Normativo nº 14/2020, em que instituiu o plantão extraordinário para apreciar exclusivamente as medidas de urgência nos processos físicos, não assistindo razão a alegação de que o Fórum da Ilha do Governador estivesse fechado. Com efeito, o art. 93 do CP determina que a reabilitação alcança quaisquer penas aplicadas em sentença definitiva, assegurando ao condenado o sigilo dos registros sobre o seu processo e condenação. Ora, se o Réu condenado pode requerer a retirada de seu nome das anotações criminais após determinado período, com maior razão pode requerer o indiciado que teve inquérito arquivado. Aplicando-se igualmente o art. 202 da LEP, devendo tal pedido ser oferecido ao juízo de origem. Outra questão ainda há de ser levantada, é que o Impetrante narrou na inicial que o Juízo da XX do Juizado Especial Criminal não existe mais. No entanto, não esclareceu quem teria recebido seu acervo, não apontando assim a autoridade coatora. Diante do exposto, voto pela denegação da ordem. MARIA DO CARMO ALVIM PADILHA GERK JUÍZA RELATORA
HABEAS CORPUS - CRIMINAL 0001001-83.2020.8.19.9000
CAPITAL 1a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CRIMINAIS
Juiz(a) MARIA DO CARMO ALVIM PADILHA GERK - Julg: 28/09/2020
Ementa número 6
AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO
SUSPENSÃO
PANDEMIA DE COVID-19
SENTENÇA PROLATADA
INDEVIDAMENTE
RETORNO DOS AUTOS AO PRIMEIRO GRAU
Acordam os Juízes que integram a Quarta Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis em CONHECER DO RECURSO E DAR-LHE PROVIMENTO PARA ANULAR A SENTENÇA de fls. 33/34, determinando o retorno dos autos ao juizado de origem para que o juiz profira decisão designando AIJ, ou a dispensando de forma fundamentada, intimando a parte Ré, em ambos os casos, do prazo para apresentação de sua defesa. Todas as questões aduzidas no recurso apreciadas, sendo dispensada a transcrição das conclusões em homenagem aos princípios informativos previstos no artigo 2º da Lei 9099/95, e na forma do artigo 46, segunda parte, da mesma Lei, frisando-se que a nulidade da sentença se mostra flagrante e insuperável. A Ré-recorrente foi citada e intimada para apresentar sua defesa na AIJ designada para o dia 20/03/2020. Acontece que a referida audiência não ocorreu, eis que o Ato Normativo Conjunto nº 04/2020, de 12/03/2020, em seu artigo 20, suspendeu a realização das audiências pelo prazo de 60 (sessenta) dias ("Art. 20. Ficam suspensas as audiências e Sessões de Julgamento de primeiro e segundo graus de jurisdição, inclusive os administrativos pelo período de 60 (sessenta) dias"), isto em decorrência da pandemia do COVID-19, tendo, inclusive, sido expedida intimação eletrônica para a Ré dando ciência da referida suspensão (fls. 25, 27 e 40); Ora, a audiência designada não se realizou por determinação deste Tribunal e não houve nenhuma decisão judicial posterior nestes autos dispensando a nova designação de AIJ, o que se mostrava possível desde que fundamentada, muito menos houve determinação de intimação da Ré para que apresentasse sua defesa no prazo do art. 231, inc. V do CPC/2015. Tal quadro denota que a prolação da sentença de fls. 33/34 foi completamente indevida, impondo o retorno dos autos ao juizado de origem para que seja proferida nova decisão, quer designando AIJ, quer a dispensando de forma fundamentada, intimando a parte Ré, em ambos os casos, do prazo para apresentação de sua defesa. Acresça-se que a motivação concisa atende à exigência do artigo 93 da Constituição Federal, e está em conformidade com o disposto no artigo 26 do Regimento Interno das Turmas Recursais (Resolução do Conselho da Magistratura do TJ/RJ nº 14/2012). Sem condenação em custas e honorários por não estar presente a hipótese do art. 55, caput, da lei nº 9.099/95, valendo esta súmula como acórdão, conforme o disposto no art. 46 da Lei 9099/95.
RECURSO INOMINADO 0000404-93.2020.8.19.0083
CAPITAL 4a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS
Juiz(a) PAULO ROBERTO CAMPOS FRAGOSO - Julg: 04/11/2020
Ementa número 7
ENSINO SUPERIOR
REDUÇÃO DAS MENSALIDADES
PANDEMIA DE COVID-19
DILAÇÃO PROBATÓRIA
INCOMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL
VOTO Trata-se de recursos interpostos por ambas as partes contra a sentença 270/272, que condenou a parte ré a implementar redução de 50% no valor da mensalidade, em razão da suspensão das aulas presenciais e implementação do ensino pela internet, por força das medidas relativas à pandemia da COVID 19. Em sede recursal, pretende a parte autora que a redução implementada pela sentença vigore a partir de 23/03/2020, data de suspensão das aulas presenciais. A ré, por sua vez, pretende a extinção do feito por incompetência do Juízo, diante da complexidade da causa, bem como, subsidiariamente, a improcedência do pedido. Diante da atual situação de pandemia mundial decorrente do vírus SARS-CoV-2 (coronavirus), causador da COVID-19, todos os seguimentos da sociedade foram gravemente afetados, o que exigiu, inclusive, a adoção de medidas governamentais para a mitigação dos efeitos sanitários e econômicos. Neste contexto de excepcionalidade, exige-se prudência e cautela, inclusive, do Poder Judiciário, para que as decisões judiciais não tenham o efeito indesejado de agravar a já combalida situação sócio econômica das partes. Na hipótese dos autos, vislumbro necessidade de dilação probatória a fim de que as partes tenham a oportunidade de produzir elementos de prova relevantes à análise de todas as circunstâncias e efeitos da eventual revisão contratual pleiteada. Notadamente, é imprescindível o adequado substrato probatório contábil, a fim de que, em caso de acolhimento do pedido, a redução seja fixada em patamar que não coloque em risco o razoável equilíbrio econômico-financeiro do contrato celebrado entre as partes. Dessa forma, a demanda deve ser extinta sem análise do mérito, pela ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo, diante da evidente necessidade de dilação probatória, incabível em sede de Juizados Especiais Cíveis. Pelo exposto, voto no sentido de conhecer de ambos os recursos e dar provimento apenas ao recurso do réu para, acolhendo a preliminar de incompetência dos Juizados Especiais Cíveis, julgar extinto o feito sem resolução do mérito, na forma do art. 51, II, Lei 9.099/95. Sem custas e honorários advocatícios por não estar presente a hipótese do art. 55, caput, da lei nº 9.099/95.?
RECURSO INOMINADO 0096065-54.2020.8.19.0001
CAPITAL 4a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS
Juiz(a) RENATA PALHEIRO MENDES DE ALMEIDA - Julg: 05/11/2020
Ementa número 8
CAMBISTA
PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE
NÃO APLICAÇÃO
PANDEMIA DE COVID-19
PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE
Apelação nº 0039669-96.2016.8.19.0001 Juízo de Origem: Juizado Esp. do Torcedor e dos Grandes Eventos Apelante: Laercio Cesar dos Santos Apelado: Ministério Público do RJ Relatora: Juíza Rosana Navega Chagas Ementa: Artigo 2º, inciso IX da Lei 1521/51. Cambismo. Oferta de ingressos por preço superior ao estabelecido. Recurso da defesa, indicando equívoco evidente na sentença, quanto a fixação da pena. Procedência das alegações defensivas. Na sua sentença (fls.85) o juiz a quo declara estar fixando a pena base "em seu mínimo legal". Contudo, equivocou-se, eis que a penalidade mínima, na hipótese, é de 6 meses, e não 1 ano. Reconhecimento da reincidência, face anotações da FAC, de forma correta. Contudo, o aumento desta deve ser coerente com a nova pena base retificada. Assim, ao invés do aumento dobrado da pena base equivocada, deverá incidir o aumento da pena retificada, sugerindo 5 meses. Pena final de 11 meses, substituída por prestação de serviços à comunidade, em igual prazo, tal como opina o Ministério Público desta Turma recursal. Prevalência do artigo 62 da Lei 9.099/95, ao impor o afastamento das penas privativas de liberdade, "sempre que possível". Incidência do Princípio Constitucional da Razoabilidade, também a impor uma pena alternativa à prisão, eis que hoje, com a pandemia do coronavírus, a não substituição equivale a uma provável pena de morte, face a aglomeração de presos no sistema carcerário superlotado. RELATÓRIO Trata-se de apelação interposta pela defesa técnica do apelante retro indicado, denunciado na forma do artigo 2º, IX da Lei 1521/51, porque estaria ofertando ingressos em valor superior ao real. A sentença de fls. 81/87 o condenou, na pena final de 2 anos de reclusão e 10 dias multa. O recurso foi exclusivo da defesa; contudo, o próprio Ministério Público opina pela redução da pena e por sua substituição por pena restritiva de direitos, conforme fls. 105 e 111. A defesa técnica, exercida pela Defensoria Pública, ressalta nas suas razões de fls. 99/101 o evidente equívoco na fixação da pena base - e os demais equívocos gerados por este inicial erro - e tudo porque o juiz considerou, literalmente, que estaria fixando a pena no seu mínimo legal - mas não foi o que fez, pois equivocou-se, tal como veremos. Ocorre que, ao invés de fixar 6 meses, fixou 1 ano: o dobro da pena mínima, e como se um ano fosse a pena mínima estabelecida para o delito em tela. O Ministério Público do 2º grau concorda com a defesa técnica, inclusive também opinando para a substituição por pena restritiva de direitos, frise-se mais uma vez. É o relatório. Passo a proferir o voto. Com razão a defesa, cuja peça de fls. 99/101, bem como a promoção ministerial de fls. 104/111, que adoto como fundamentação, tendo pouco a acrescentar ou ressaltar. Na forma do artigo 2º, inciso IX da Lei 1521/51, a pena mínima para o delito em tela é de 6 meses. Na sentença, o juiz a quo declara que estaria fixando a pena base no seu mínimo legal, conforme seus termos vistos às fls. 85, verbis: "as circunstâncias não lhes são desfavoráveis, razão pela qual fixo a pena base no seu mínimo legal." (Grifos nossos, não vistos no texto original) Contudo, ao invés de fixar 6 meses, fixou o dobro, 1 ano, incidindo em claro e inequívoco erro material, após, dobrou a pena base, por reconhecer a reincidência ou maus antecedentes. Constatado evidente equívoco, a pena base e a pena final deve ser retificada. Por outro lado, a reincidência não impede a substituição da pena. Ademais, por literal imposição do artigo 62 da Lei 9.099/95, os processos nos Juizados Especiais Criminais objetivam, "sempre que possível", ...a aplicação de pena não privativa de liberdade." Embora esta Turma Recursal seja composta, substancialmente, por Juízes de Varas Criminais, onde a imposição da pena de prisão é rotina - em razão dos graves delitos nelas apreciados - nos Juizados Criminais a visão deve ser diferenciada, pois para nós, dos JECRIMS, acordos de pacificação, ou mesmo o perdão, são soluções que mais traduzem o sucesso do nosso trabalho. Afirmo isto, com a "autoridade" de ser uma Juíza dos Juizados Especiais Criminais há mais de 17 anos ininterruptos. Ressalte-se também, que a pena de prisão não me parece razoável, frisando-se o trágico momento atual do país, com a pandemia instalada do coronavírus, e onde o ingresso no sistema carcerário equivale a uma pena de morte muito provável, na prática, uma vez que os presos estão aglomerados em cárceres muito lotados. E em sendo assim, a não substituição da pena de prisão fere de morte o Princípio Constitucional da Razoabilidade, e neste voto já sendo iniciado o pré-questionamento deste fundamental princípio inserido na Carta Magna do país. We3 VOTO Por tudo, voto pelo recebimento do recurso, presentes seus requisitos, e pela retificação da pena base para 6 meses, também votando para a redução do acréscimo da reincidência, finalizando a pela em 11 meses de detenção, no regime aberto, e 5 dias multa. Na forma do artigo 44, § 3º do CP, é possível a substituição da pena de prisão, no que voto pela fixação da prestação de serviços à comunidade, em igual prazo. A condenação nas custas, deve ser afastada, pois o apelante é beneficiário da Justiça Gratuita e se encontra assistido pela Defensoria Pública. Rio de Janeiro, 25 de maio de 2020. ROSANA NAVEGA CHAGAS Juíza Relatora ESTADO DO RIO DE JANEIRO PODE JUDICIÁRIO SEGUNDA TURMA RECURSAL CRIMINAL
APELAÇÃO CRIMINAL 0039669-96.2016.8.19.0001
CAPITAL 2a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CRIMINAIS
Juiz(a) ROSANA NAVEGA CHAGAS - Julg: 03/06/2020
Ementa número 9
VIAGEM AO EXTERIOR
NÃO REALIZAÇÃO
PANDEMIA DE COVID-19
FORÇA MAIOR
ESTORNO
APLICAÇÃO DE JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA
VOTO: Não se trata de ilegitimidade passiva - suscitada unicamente no recurso inominado - eis que a ré (EXPEDIA ou HOTEIS.COM), como agência de turismo que é, ao vender reservas de hospedagem em Hotel em Playa del Carmen recebeu valores os quais não alegou, nem muito menos comprovou, ter realmente transferido ao Hotel destinatário. Logo, sua responsabilidade decorre de ter recebido valor e não reembolsado diante da impossibilidade da viagem em decorrência da pandemia do COVID-19. Neste ponto, inequivocamente inserido no mérito da causa, a resistência da ré, deduzida em Contestação, reside na forma de reembolso que realmente deve ocorrer na forma da Lei 14.046/20 (originariamente MP 948/20). Segundo a norma de regência, o estorno de valores despendidos com viagens que não puderam ser realizadas em virtude da pandemia do COVID-19 (o que efetivamente ficou comprovado nos autos) pode se dar em até doze parcelas contadas da data da realização da hospedagem, in casu. Afinal, o final da pandemia consiste em evento futuro e incerto, condição está à qual não pode ficar subordinada a condenação. Releva salientar que a pandemia do Covid-19 importou em força maior que atingiu ambos os contratantes. De modo que, ausente mínima culpa dos envolvidos, não há que se falar em incidência de penalidades, mas sim de restituição dos mesmos ao status quo ante. Logo, o reembolso do valor pago deverá ocorrer em até 12 parcelas com início na data em que a primeira hospedagem deveria ter ocorrido, com correção monetária e juros de mora legais contados da citação. No mais, ainda em razão da
força maior pronunciada, não há que se falar em configuração de danos morais, condenação esta que fica excluída. Recurso provido em sua maior parte. Sem custas.
RECURSO INOMINADO 0025954-03.2020.8.19.0209
CAPITAL 1a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS
Juiz(a) SIMONE GASTESI CHEVRAND - Julg: 12/11/2020
Ementa número 10
TRATAMENTO MÉDICO
GRUPO DE RISCO
PANDEMIA DE COVID-19
DESLOCAMENTO
EXTENSÃO DO TRATAMENTO
Agravo de Instrumento n.º 0000868-41.2020.8.19.9000 Agravante: MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO Agravado: SANDRO MÁRCIO DA SILVA CRUZ EMENTA: AGRAVO INTERPOSTO CONTRA DECISÃO DE PRIMEIRO GRAU QUE DEFERE O PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. CABIMENTO. ART. 3º C/C ART. 4º, AMBOS DA LEI Nº 12.153/2009. TRANSPORTE VEÍCULAR TRATAMENTO HEMODIÁLISE. EXTENSÃO DO PRÓPRIO TRATAMENTO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ENTES ESTATAIS. DECISÃO QUE NÃO SE MOSTRA TERATOLÓGICA, CONTRÁRIA À LEI OU A PROVA DOS AUTOS. SÚMULA N° 59 DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. DESPROVIMENTO DO RECURSO. Trata-se de Agravo de Instrumento interposto alvejando decisão interlocutória proferida pelo Juízo de Direito do Juizado Especial Fazendário da Comarca da Capital que, nos autos de ação ajuizada pelo agravado deferiu o pedido de antecipação dos efeitos da tutela, determinando que o Município réu e Estado do Rio de Janeiro sejam compelidos ao fornecimento de transporte para a parte autora e seu acompanhante de sua residência para realização do tratamento de hemodiálise na clínica Grupo de Assistência Médica Nefrológica - Unidade Engenho de Dentro, nos dias e horários definidos, assim como seu retorno da clínica para sua residência. Argumenta o Ente Público Municipal que o direito a saúde não se confunde com o direito ao transporte público gratuito. Ademais, aponta a ilegitimidade do Município para a prestação em voga, posto que os procedimentos atinentes a HEMODIÁLISE (Ambulatorial e Internação), serão de responsabilidade da Secretaria Estadual de Saúde, conforme a listagem elaborada pelo Sistema Único de Saúde, presente no TERMO DE COOPERAÇÃO DE NATUREZA CONVENCIONAL Nº 001/2016, de modo que o responsável pela obrigação principal também o será pela acessória. É o Relatório, passo ao V O T O: Pela análise dos autos vê-se que o parecer da Câmara de Resolução de Litígios em Saúde assim como a declaração médica acostados aos autos principais, atestam que a parte autora, ora agravada, é portadora de insuficiência renal, necessitando de transporte de modo a viabilizar o tratamento de hemodiálise já iniciado. O laudo médico juntado ao processo principal, doc. index 23/24 dos autos eletrônicos 0104394-55.2020.8.19.0001, demonstra a veracidade dos fatos narrados na inicial, comprovando, portanto, a doença e a necessidade do tratamento, bem como, de que o transporte deve ser feito de forma individual, diante da debilidade do estado de saúde do paciente. Ora, conforme laudo médico, o quadro da parte autora é potencialmente grave, e caso não realize o tratamento de hemodiálise nos dias necessários há óbvio risco a sua vida. Tal risco continua se o mesmo não for feito na forma descrita no laudo juntado, diante da debilidade do estado de saúde da paciente e de sua hipossuficiência financeira. Ademais, relatada a inviabilidade para a utilização do transporte público em razão das patologias secundárias à disfunção renal, mormente a síndrome de fadiga pós diálise. Imperioso observar que se encontra em curso uma pandemia de saúde (Covid-19) que afeta gravemente os pacientes denominados imunodreprimidos, como os doentes renais crônicos, que por esta razão estão no grupo de risco e não podem utilizar transportes públicos, dado o risco de contaminação pelo Coronavírus e agravamento do quadro clínico. Nesta esteira, o transporte para a parte se submeter ao tratamento de saúde necessário, quando não for possível seu deslocamento em transporte público por condições de saúde do paciente hipossuficiente, é verdadeira extensão ao direito constitucional às políticas públicas de saúde, uma vez que o deslocamento é etapa necessária para o acesso às máquinas de hemodiálise. Ademais, a questão constitucional em debate diz respeito ao dever do Estado de prestar tratamento médico adequado aos que dele necessitem e da responsabilidade solidária dos entes federados perante essa obrigação, cuja repercussão geral reconhecida gerando o Tema nº 793 do Supremo Tribunal Federal (RE nº 855.178/SE), no qual foi fixada a seguinte tese: "O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, sendo responsabilidade solidária dos entes federados, podendo figurar no polo passivo qualquer um deles em conjunto ou isoladamente." A alegação do MRJ de que o tratamento em questão seria atribuição do ERJ por força do Termo de Cooperação de Natureza Convenial nº 001/2016 não tem como ser acolhida. Inicialmente, porque a relação de procedimentos constantes de seu Anexo IV não constituiu uma lista oficial emanada do SUS, sendo certo que qualquer outro ato infralegal de divisão de atribuições constitucionais não é oponível àqueles que buscam a prestação de saúde pelo poder público. Neste passo, qualquer acerto entre os entes federativos deve ser avaliado em seara própria no âmbito de seus poderes executivos. Para o Poder Judiciário prevalecerão os ditames constitucionais, ressalvada apenas a divisão de atribuições feita pelo SUS na forma da Lei 8.080/90, sendo incabível, repita-se, a oposição de qualquer outro ato infralegal. Finalizando, a medida sequer constitui-se irreversível - salvo para a parte autora, ora agravada, dado o risco da interrupção de seu tratamento, decorrente de eventual demora. Assim, presentes o risco de dano de difícil reparação, assim como a verossimilhança das alegações, sendo certo, ainda, que a decisão agravada foi proferida com base em um juízo de cognição sumária, podendo ser reconsiderada ao fim da instrução processual, não se mostra a mesma teratológica ou ilegal, pelo que deve ser a mesma mantida. Vale ressaltar a orientação contida na Súmula 59 deste Tribunal de Justiça nos termos seguintes: "Somente se reforma a decisão concessiva ou não da antecipação de tutela, se teratológica, contrária à lei ou à evidente prova dos autos". Por tais motivos, VOTO pelo CONHECIMENTO e DESPROVIMENTO AO RECURSO. Dê-se baixa e arquivem-se, encaminhando as cópias das decisões e votos pertinentes para o Juízo de origem, fazendo menção no ofício ao número do processo principal. Rio de Janeiro, 29 de julho de 2020. SIMONE LOPES DA COSTA Juíza de Direito Relatora Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Primeira Turma Recursal Fazendária 2
AGRAVO DE INSTRUMENTO 0000868-41.2020.8.19.9000
CAPITAL 1 TURMA RECURSAL DOS JUI ESP FAZENDA PUB.
Juiz(a) SIMONE LOPES DA COSTA - Julg: 08/10/2020
Este texto não substitui o publicado no Diário Oficial.