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EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA CRIMINAL 10/2024

Estadual

Judiciário

29/10/2024

DJERJ, ADM, n. 42, p. 57.

Ementário de Jurisprudência Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA CRIMINAL Nº 10/2024 COMISSÃO DE GESTÃO DE CONHECIMENTO Presidente: DESEMBARGADOR CHERUBIN HELCIAS SCHWARTZ JÚNIOR Organização: Serviço de Pesquisa, Análise e Publicação da Jurisprudência da Divisão de Organização de... Ver mais
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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA CRIMINAL Nº 10/2024

COMISSÃO DE GESTÃO DE CONHECIMENTO

Presidente: DESEMBARGADOR CHERUBIN HELCIAS SCHWARTZ JÚNIOR

Organização: Serviço de Pesquisa, Análise e Publicação da Jurisprudência da Divisão de Organização de Acervos de Conhecimento - dicac@tjrj.jus.br

Rua Dom Manoel, 29, 2º andar, sala 207

 

Ementa número 1

LESÃO CORPORAL GRAVE

CONVERSÃO EM PRISÃO PREVENTIVA

GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA

CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL

ORDEM DENEGADA

HABEAS  CORPUS.  DELITO  PREVISTO  NO  ARTIGO  129,  PAR.  1º, INC. II, DUAS VEZES, E ARTIGO 129, PAR. 2º, INCISOS I, II, III E IV, TUDO  NA  FORMA  DO  ART.  69  DO  CÓDIGO  PENAL.  PRISÃO PREVENTIVA.  ALEGAÇÃO  DE  AUSÊNCIA  DOS  REQUISITOS  DA CUSTÓDIA.   1. Ação Mandamental impetrada em favor do Paciente pleiteando se a revogação da prisão preventiva.   2. Consultando os autos de origem, por meio do Ejud, vê se que o Paciente  foi  preso  em  flagrante  em  23/5/2024  (index  2)  e,  em 24/5/2024,  em  Audiência  de  Custódia,  a  prisão  em  flagrante  foi convertida  em  preventiva  (index  50).  O  Ministério  Público  ofereceu Denúncia em 03/6/2024 em face do Paciente, dando o como incurso nos delitos descritos no artigo 129, par. 1º, inc. II, duas vezes (vítimas C. e R.), e artigo 129, par. 2º, incisos I, II, III e IV (vítima D.),  tudo  na  forma  do  art.  69,  todos  do  Código  Penal  (index 62). No dia 05/6/2024, o Juiz da 2ª Vara Criminal de Resende recebeu a  Denúncia  e  determinou  a  citação  do  acusado  (index  72). Formulado  pedido  de  relaxamento  ou  revogação  da  prisão preventiva, foi indeferido em Decisão proferida em 23/7/2024. No dia 07/8/2024 consta apresentação de Resposta à acusação (index 128) e, na data de 09/8/2024, o Juiz a quo ratificou o recebimento da Denúncia e designou AIJ para o dia 23/9/2024. No que se refere à alegação de que  não  houve  situação  de  flagrância,  a  discussão  a  respeito tornou se  despicienda,  uma  vez  que  foi  decretada  a  prisão preventiva.     3.  A  Decisão  em  que  a  prisão  em  flagrante  foi  convertida  em preventiva  e  a  que  posteriormente  a  manteve  são  detalhadas  e fundamentadas,  destacando  a  gravidade  concreta  dos  fatos imputados  ao  Paciente,  concluindo  que  se  encontram  presentes  os requisitos estampados no art. 312 do CPP.  Veja se que,  conforme a Denúncia,  o  Paciente  teria  determinado  a  traficantes  que  agredissem as  vítimas.  Relata se  que  na  data  dos  fatos,  por  volta  das  20h, aproximadamente  cinco  traficantes,  trajados  de  roupas  camufladas, encapuzados a armados, levaram as vítimas, duas moças e um rapaz, para uma área de mata, submetendo as a intensas agressões físicas, incluindo  golpes  com  pedaços  de  madeira.  Consta que  os  traficantes acusaram a vítima C. de não ter devolvido a motocicleta que seria pertencente ao denunciado, com quem teria tido uma relação amorosa. Consta, também,  que  as  vítimas  R.  e  C.  foram agredidas  com um pedaço de madeira na cabeça, ficando inconscientes, enquanto a vítima D. foi atingida por um disparo de arma de fogo na perna, bem como que, em sede policial, o denunciado admitiu que emprestou a motocicleta  à  C.,  que  se  recusou  a  devolvê la,  razão  pela  qual contatou  um  colega,  quem  intermediou  contato  com  elementos  da facção  criminosa.  Os fatos noticiados  são  de  gravidade  concreta, produziram lesões graves nas vítimas R. e C., que chegaram a ficar inconscientes, e gravíssima na vítima D., que levou um tiro na perna, sofrendo deformidade permanente.     4.  Diante de todo o  exposto,  verifica se  que  estão  presentes  os requisitos  para  a  prisão  preventiva,  consubstanciados  na  necessidade de garantia da ordem pública e por conveniência da instrução criminal, eis que as vítimas ainda irão depor.    5.  Questões relativas ao mérito, como a alegação de que   Paciente não teria dado ordem para as agressões, não podem ser analisadas em sede de habeas corpus, que não comporta dilação probatória.   6. Inexiste, outrossim, afronta aos princípios da proporcionalidade e homogeneidade.  Repita se  que  o  Paciente  foi  denunciado  pela prática,  em  tese,  dos  crimes  previstos  no  artigo  129,  par.  1º,  inc.  II, duas vezes, e artigo 129, par. 2º, incisos I, II, III e IV, tudo na forma do art.  69,  todos  do  Código  Penal.  Diga se, ainda, que  o  regime prisional  não  está  atrelado,  unicamente,  ao  quantum  da  pena, cumprindo lembrar as peculiaridades do caso concreto e os termos dos art.  59 e  33,  §§2º  e  3º,  do  CP.  Outrossim, em se tratand de delitos violentos, não há falar se em substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos (art. 44, I, do CP).    7.  Quanto  às  condições  pessoais  favoráveis,  tais  como  primariedade, bons antecedentes, residência fixa e trabalho lícito, não têm o condão de,  por  si  sós,  garantirem  a  liberdade  dos  que  sofrem  a  persecução penal instaurada pelo Estado se restam evidenciados nos autos, como in casu, fundamentos que recomendam a prisão preventiva. Assim, não vislumbro constrangimento ilegal.   8. ORDEM DENEGADA.

HABEAS CORPUS 0063944-34.2024.8.19.0000

OITAVA CÂMARA CRIMINAL

Des(a). ADRIANA LOPES MOUTINHO DAUDT D' OLIVEIRA - Julg: 11/09/2024

 

Ementa número 2

CRIME DE TORTURA

MATERIALIDADE COMPROVADA

AUTORIA DEMONSTRADA

REINCIDÊNCIA

CONDENAÇÃO AO REGIME SEMIABERTO

APELAÇÃO CRIMINAL   RÉUS DENUNCIADOS COMO INCURSOS NAS PENAS DO ARTIGO 1º, II, DA LEI 9.455/97, DO ARTIGO 146, § 1º DO CÓDIGO PENAL E DO 157, CAPUT, PARTE FINAL, C.C §2º, II E §2º A, I DO CÓDIGO PENAL, TODOS NA FORMA DO ARTIGO 69 DO ESTATUTO PÁTRIO REPRESSIVO   SENTENÇA ABSOLUTÓRIA   RECURSO INTERPOSTO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO, REQUERENDO A CONDENAÇÃO NOS TERMOS DA DENÚNCIA   PARCIAL PROVIMENTO   A MATERIALIDADE DO CRIME DE TORTURA RESTOU COMPROVADA PELOS LAUDOS E FOTOS APRESENTADAS NOS AUTOS, QUE CONFIRMARAM AS AGRESSÕES, MERECENDO DESTAQUE QUE O LAUDO EM SEU 3º QUESITO INFORMA QUE A LESÃO FOI PRODUZIDA POR EMPREGO DE TORTURA OU POR OUTRO MEIO INSIDIOSO OU CRUEL, JÁ QUE RESPONDIDA POSITIVAMENTE PELO PERITO, ACRESCENTANDO QUE SE TRATAM DE LESÕES EXTENSAS EM MEMBROS SUPERIORES E INFERIORES.   A AUTORIA DO MESMO DELITO FOI DEMONSTRADA PELO DEPOIMENTO PRESTADO PELA VÍTIMA T. EM JUÍZO, QUE INCLUSIVE RECONHECEU OS RÉUS. PORÉM NÃO HÁ CERTEZA ACERCA DO CRIME DE ROUBO, EM ESPECIAL QUANTO AO DOLO DE SUBTRAIR O APARELHO CELULAR PELOS APELADOS. SENDO CERTO, QUE A VÍTIMA EM JUÍZO ADUZIU QUE OS RÉUS SOMENTE SUMIRAM COM SEU TELEFONE   QUANTO AO CRIME PREVISTO NO ARTIGO 146 § 1º DO CÓDIGO PENAL (CONSTRANGIMENTO ILEGAL) O MESMO RESTOU ABSORVIDO PELO CRIME DE TORTURA   RÉUS QUE EM JUÍZO NEGARAM OS FATOS. DIANTE DE TAIS CONSIDERAÇÕES, EM ESPECIAL NO FIRME E COESO DEPOIMENTO DA VÍTIMA, TORNA SE NECESSÁRIA A CONDENAÇÃO DOS RÉUS APELADOS, PELO CRIME PREVISTO NO ARTIGO 1º INCISO II DA LEI 9455/97, DEVENDO SER MANTIDA A ABSOLVIÇÃO PELOS CRIMES DE ROUBO MAJORADO E DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL.   DOSIMETRIA   A PENA BASE DEVE SER FIXADA EM SEU MÍNIMO LEGAL PARA AMBOS, QUAL SEJA, 02 ANOS DE RECLUSÃO, JÁ QUE AS CIRCUNSTÂNCIAS E CONSEQUÊNCIAS SÃO NORMAIS PARA O GRAVE TIPO PENAL. NA SEGUNDA FASE AMBOS OS RÉUS POSSUEM UMA CONDENAÇÃO ANTERIOR, COM TRANSITO EM JULGADO, QUE CARACTERIZA A REINCIDÊNCIA, RAZÃO PELA QUAL AUMENTA SE A PENA NA FRAÇÃO MÍNIMA DE 1/6, TORNANDO SE DEFINITIVA EM 02 ANOS E 04 MESES DE RECLUSÃO, EM REGIME SEMIABERTO, POIS REINCIDENTES, E AUSENTES CAUSAS DE AUMENTO E DE DIMINUIÇÃO DE PENA   PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO MINISTERIAL MANTER A ABSOLVIÇÃO PELOS CRIMES DE ROUBO MAJORADO E CONSTRANGIMENTO ILEGAL, CONDENANDO OS RÉUS PELO CRIME DE TORTURA, COM PENA FINAL DE 02 ANOS E 04 MESES DE RECLUSÃO EM REGIME SEMIABERTO, POIS REINCIDENTES.

APELAÇÃO 0802740-46.2023.8.19.0046

SEXTA CÂMARA CRIMINAL

Des(a). FERNANDO ANTONIO DE ALMEIDA - Julg: 20/08/2024

 

 

Ementa número 3

CRIME CONTRA  A ORDEM TRIBUTÁRIA

SONEGAÇÃO FISCAL

EQUIPAMENTO EMISSOR DE CUMPOM FISCAL SEM O DEVIDO REGISTRO

DANO CAUSADO À COLETIVIDADE

DESPROVIMENTO DO RECURSO

APELAÇÃO CRIMINAL   Art. 1º, II, da Lei nº 8.137/90, por 26 vezes, n/f do 71, do CP. Pena: 03 anos, 10 meses e 20 dias de reclusão, em regime aberto, e 18 dias multa, além da devolução à Fazenda Pública do valor sonegado de R$ 407.574,24. Substituída a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade e entrega de bens no valor de 03 salários mínimos em instituição a ser designada pela Secretaria Municipal de Administração do Município. Apelada que, entre os anos de 2014 e 2016, fraudou continuadamente o fisco estadual com a utilização de equipamento emissor de cupom fiscal sem o devido registro a autorização. SEM RAZÃO A DEFESA. Materialidade e autoria não foram alvo do presente recurso. Improsperável o pedido de revisão da pena base. Circunstâncias judiciais desfavoráveis que ensejam a exasperação da reprimenda básica. Consequências e circunstâncias do crime que extrapolam as normais do tipo penal em razão do grave dano causado à coletividade representado pela significativa quantia sonegada durante dois anos. Art. 59, do CP. Quantum de acréscimo da pena (1/6) devidamente fundamentado e aplicado de forma razoável e proporcional. Inviável a redução da fração para o aumento relativo à continuidade delitiva. O aumento foi aplicado corretamente na fração máxima (2/3), uma vez que foram cometidos 26 crimes em condições semelhantes, no mesmo local e do mesmo modo. Súmula 659 do STJ. Do prequestionamento. Ausência de violação a qualquer norma do texto da CF/88 e das leis ordinárias pertinentes ao caso concreto. Manutenção da Sentença. DESPROVIMENTO DO RECURSO DEFENSIVO.

APELAÇÃO 0002440-04.2018.8.19.0011

QUARTA CÂMARA CRIMINAL

Des(a). GIZELDA LEITÃO TEIXEIRA - Julg: 27/08/2024

 

Ementa número 4

CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO

APURAÇÃO DE CRIME DE ESTUPRO

DISCUSSÃO SOBRE VIOLÊNCIA DE GÊNERO

AMIGO DA FAMÍLIA

VÍNCULO AFETIVO

ACESSO AO ESPAÇO DE CONVIVÊNCIA FAMILIAR

COMPETÊNCIA DO JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA MULHER

CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO. Inquérito Policial para apuração de crime do artigo 213, do Código Penal. Delito, em tese, perpetrado por amigo íntimo e vizinho da família, contra adolescente de 14 anos. Juízo Suscitante que alega não se tratar de violência de gênero.  A teor do disposto no artigo 5º, caput, da Lei 11.340/06, configura violência doméstica e familiar contra a mulher, qualquer ação ou omissão, baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial. O conceito de violência doméstica e familiar contido na Lei 11.340/06, não se aplica apenas às esposas, companheiras ou amantes do autor do fato, mas, também, a qualquer outra pessoa do gênero feminino, bastando que haja um vínculo familiar ou afetivo, independentemente da natureza da violência por ele praticada. E, ainda, segundo disposto no artigo 23, parágrafo único, da Lei 13.341/17, até que haja a criação dos Juizados e Varas especializadas em crimes contra a criança e o adolescente previstos em seu caput, as ações deverão ser julgadas, preferencialmente, nos Juizados ou varas especializadas em violência doméstica e temas afins, sobretudo em razão da sua estrutura, eis que dispõem de uma equipe técnica multidisciplinar. Na hipótese, o apontado autor do fato é amigo íntimo e vizinho da família da Vítima, de apenas 14 anos de idade, com acesso ao espaço de convivência familiar e possibilidade de se aproveitar da vulnerabilidade da jovem, não havendo dúvidas de que, o Juizado de Violência Doméstica poderá oferecer um atendimento mais adequado às peculiaridades do caso, afastando, assim, a competência da Vara Criminal comum, que não dispõe de uma estrutura especializada.   CONFLITO IMPROCEDENTE.

CONFLITO DE JURISDIÇÃO 0060086-92.2024.8.19.0000

SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL

Des(a). KÁTIA MARIA AMARAL JANGUTTA - Julg: 17/09/2024

 

Ementa número 5

CRIME DE DIVULGAÇÃO DE CENAS DE SEXO E FOTOGRAFIAS ÍNTIMAS

FILMAGEM SEM CONSENTIMENTO

PUBLICAÇÃO NO INSTAGRAM E ENVIO PARA PESSOAS DE SEU RELACIONAMENTO

MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS

VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL

CONCESSÃO DE SURSIS

EMENTA: APELAÇÃO   CRIME DE DIVULGAÇÃO DE CENA DE SEXO E DE FOTOGRAFIAS ÍNTIMAS   ART. 218 C DO CP   SENTENÇA CONDENATÓRIA   PENA DE 01 ANO E 04 MESES DE RECLUSÃO EM REGIME ABERTO, SUSPENSA NA FORMA DO 77, DO CP PELO PERÍODO DE 02 ANOS, SOB AS SEGUINTES CONDIÇÕES: COMPARECIMENTO MENSAL EM JUÍZO PARA INFORMAR E JUSTIFICAR SUAS ATIVIDADES; PROIBIÇÃO DE MUDAR DE ENDEREÇO SEM PRÉVIO COMUNICADO AO JUÍZO, SOB PENA DE REVOGAÇÃO DO BENEFÍCIO; PARTICIPAÇÃO EM GRUPO REFLEXIVO POR NO MÍNIMO 20 HORAS E PAGAMENTO NO VALOR DE R$20.000,00 A TÍTULO DE DANOS CAUSADOS PELO CRIME   ABSOLVIÇÃO   INVIABILIDADE   CONJUNTO PROBATÓRIO COESO E HARMÔNICO   VIOLÊNCIA DOMÉSTICA   ESPECIAL RELEVÂNCIA DA PALAVRA DA VÍTIMA   MATERIALIDADE E AUTORIA SOBEJAMENTE DEMONSTRADAS   QUEBRA DE CADEIA DE CUSTÓDIA NÃO CONFIGURADA   ESPELHAMENTO DE DADOS   NÃO CABIMENTO   MATERIAL CAPTADO PELOS INTERLOCUTORES DAS MENSAGENS ENCAMINHADAS VIA DIRECT DO INSTAGRAM   DOSIMETRIA PENAL ESCORREITA   PENA FIXADA NO MÍNIMO LEGAL   MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.  1. Réu inconformado com término do relacionamento amoroso que manteve com a vítima por quatro anos, cadastrou um perfil falso no Instagram e publicou na rede social fotos e vídeos íntimos de sexo e nudez da vítima, enviando as mídias para pessoas de seu relacionamento, inclusive, seu atual namorado, para o irmão e o pai dele.  2. No caso vertente, não cabe falar em quebra da cadeia de custódia ou ausência de autenticidade do conteúdo da prova digital por falta de laudo pericial do material apresentado pela apelação. Com efeito, a própria vítima reconheceu a autenticidade do vídeo, se reconhecendo nele, bem como o acusado, chegando a afirmar que ele foi gravado em seu quarto, porém sem o seu consentimento. Outrossim, as mensagens e todo o material foram recebidos pelas testemunhas G. (atual namorado da vítima) e R. (amigo de G.) e por eles fornecidas em sede policial. G. chegou a afirmar que, em razão de toda esta situação, restringiu sua conta nas redes sociais, bloqueando o acesso do acusado, mas, no entanto, ele utilizava a conta da empresa dele, para continuar monitorando a sua vida. Ora, não se pode considerar ilícita a conduta do interlocutor que se limita a documentar o teor de suas próprias conversas, em seu celular, através de captura de tela.  3. Assim, as capturas de tela impugnadas pela defesa foram fornecidas pelas próprias testemunhas (G. e R.), interlocutoras da conversa mantida com o apelante, por meio do direct do Instagram, não se tratando o caso, portanto, de espelhamento de dados da conta do réu, tampouco de acesso, por terceiro, ao aplicativo instalado no aparelho desse.  4. Somado a isso, a jurisprudência do Eg. STJ é assente no sentido de que não evidenciados a existências de adulteração da prova, supressão de trechos ou alteração da ordem cronológica dos diálogos ou interferência de terceiros, como no caso em tela, não cabe falar em nulidade por quebra da cadeia de custódia.  5. Neste cenário probatório, impossível o acolhimento do pleito defensivo de absolvição do apelante. As declarações prestadas pela vítima e pelas testemunhas foram firmes e categóricas e se mostram suficientes para embasar o decreto condenatório contra o acusado, ora apelante. Resta evidente que o apelante divulgou fotos e vídeos íntimos da vítima, contendo cenas de sexo e de nudez, sem a sua autorização, comprovando a autoria e a materialidade do crime em questão. Destaque se que doutrina e jurisprudência entendem que a palavra da vítima, nos crimes praticados em contexto de violência doméstica, reveste se de especial credibilidade e pode dar lastro à condenação, desde que verossímil e não seja confrontada com outra prova que a desmereça.   6. Aplicação da pena que não comporta ajustes. Pena fixada no mínimo legal. Concessão do Sursis pelo período de dois anos.  7   Incabível a exclusão da verba indenizatória fixada na sentença por ausência de legitimidade ativa do Ministério Público. A título de indenização por danos morais, o Juízo fixou o valor indenizatório no patamar de R$20.000,00 (vinte e mil reais) em favor da vítima, com fulcro no art. 387, IV, do CPP. Tal questão já foi tratada pelo Egrégio STJ no Tema Repetitivo nº 983 e, havendo pedido expresso feito pela acusação na denúncia, mantenho a condenação.  8. O dano moral decorre da própria prática delituosa. Não há necessidade de a vítima comprovar que a conduta do acusado se deu de forma injusta e de má fé ou comprovar que do fato ela sofreu abalo psíquico, emocional ou moral para conseguir a reparação. O próprio fato já configura dano. Com efeito, o apelante enviou vídeo da vítima praticando sexo oral nele para o atual namorado dela (G.), ao pai de G. (atual sogro) e ao amigo de G. (R.), conforme aponta o laudo pericial acostado no Doc. 198  Fls. 02/05, sendo que tal filmagem sequer foi consentida pela vítima.  9. No mais, em relação aos critérios para a fixação do valor do dano moral, deverá o julgador se ater às balizas da razoabilidade e da proporcionalidade, para que a medida não represente enriquecimento ilícito, bem como para que seja capaz de coibir a prática reiterada da conduta lesiva pelo seu causador. Certo, entretanto, que do mesmo modo que o valor da indenização por dano moral não pode ser fonte de enriquecimento ilícito para quem o sofreu, também não pode ser irrisório a ponto de não reparar o dano. DESPROVIMENTO DO RECURSO.

APELAÇÃO 0184740-56.2021.8.19.0001

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL

Des(a). MARIA SANDRA ROCHA KAYAT DIREITO - Julg: 20/08/2024

 

Ementa número 6

REVOGAÇÃO DE MEDIDA CAUTELAR

SUSPENSÃO DE ATIVIDADES ECONÔMICAS E FINANCEIRAS DA EMPRESA

RECEPTAÇÃO

ATO ILÍCITO DE FUNCIONÁRIO DA EMPRESA

CONSTRANGIMENTO ILEGAL NA ORDEM DE INTERDIÇÃO

SEGURANÇA CONCEDIDA

Mandado de Segurança. Decisão que determinou a suspensão de atividade de natureza econômica da empresa impetrante, mediante a interdição do estabelecimento. Liminar concedida para cassar a medida cautelar imposta. Parecer da PGJ pela concessão da segurança.  Inquérito policial que apura a prática, em tese, de crime de receptação de cabos por funcionários da empresa. Perigo de dano de difícil reparação. A empresa X1 Fibras é regularmente inscrita na JUCERJA e possui autorização da ANATEL para operar com comunicação multimídia em geral, razão pela qual, à despeito do material suspeito encontrado na posse de funcionários, a empresa executa outros serviços que podem estar perfeitamente dentro da licitude de seu objeto social, de modo que há constrangimento ilegal na ordem de interdição. O cometimento de ato ilícito por funcionários não pode impedir a continuidade da atividade econômica da empresa, sendo suficiente o afastamento daquele que se investiga a autoria do ato criminoso. Denúncia ainda não oferecida. Sequer participam do processo criminal os sócios da empresa impetrante regularmente constituída. Ademais, há notícias nos autos originários que será oferecida ANPP, o denota, inclusive, a possibilidade de perda de objeto. Impõe se, assim, a cassação da medida cautelar imposta, a fim de resguardar a continuidade da atividade empresarial. Segurança concedida para consolidar a liminar anteriormente deferida.

MANDADO DE SEGURANÇA 0061263-91.2024.8.19.0000

TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL

Des(a). MÔNICA TOLLEDO DE OLIVEIRA - Julg: 10/09/2024

 

Ementa número 7

HOMICIDIO DOLOSO QUALIFICADO

POLICIAL MILITAR

MOTIVO FÚTIL

DESMOBILIZAÇÃO DE MANIFESTAÇÃO

ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO

DENEGAÇÃO DA ORDEM

HABEAS CORPUS. ART. 121, §2º, II, IV E VIII, DO CÓDIGO PENAL. IMPETRAÇÃO OBJETIVANDO A REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA DO PACIENTE, SUSTENTANDO A AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DA CUSTÓDIA CAUTELAR.  1. Paciente preso em flagrante no dia 08/02/2024, no Complexo da Maré, por suposta prática do crime de homicídio doloso (dolo eventual), constando da exordial que o denunciado, que é policial militar, assumiu o risco de matar ao golpear, com o dedo no gatilho no fuzil 7.62 que portava, a vítima J. de A. C., efetuando um disparo que a atingiu, causando a sua morte.   2. Consta da denúncia, ademais, que o crime foi praticado por motivo fútil para desmobilizar uma pequena manifestação de moradores que ocorria perto da passarela 09, na Maré; mediante recurso que impossibilitou a Defesa da vítima, eis que o disparo foi feito à queima roupa e mediante emprego de arma de fogo de uso restrito.  3. Em sede de audiência de custódia houve a conversão da prisão em preventiva, considerando a gravidade concreta do crime e periculosidade social, bem como a necessidade de se garantir a instrução criminal.   4. Posteriormente, o Ministério Público denunciou o paciente pela prática do crime previsto no art. 121, §2º, II, IV e VIII, do Código Penal, sendo a inicial recebida em 22/02/2024, quando a prisão preventiva restou mantida pela autoridade impetrada.  5. Audiência de instrução e julgamento designada para 24/06/2024.  6. Prisão processual que, embora tenha caráter excepcional e se revele a ultima ratio (§6º do art. 282 do Código de Processo Penal), se afigura, in casu, necessária e adequada, notadamente para garantia da ordem pública diante da gravidade concreta dos fatos imputados ao paciente, de grande repercussão na localidade em que a vítima morava e supostamente perpetrado por policial militar no exercício da função.  7. Além disso, em se tratando do acusado de um Policial Militar, a sua prisão é necessária para a garantia da ordem pública, a fim que as testemunhas, em especial as civis, tenham total liberdade e segurança para prestar declarações no curso do processo.  8. Nesse contexto, a manutenção da prisão preventiva é medida que se impõe, não se mostrando suficiente a aplicação de outras medidas cautelares alternativas, dentre aquelas elencadas no art. 319 do Código de Processo Penal.  CONHECIMENTO E DENEGAÇÃO DA ORDEM.

HABEAS CORPUS 0013642-98.2024.8.19.0000

QUINTA CÂMARA CRIMINAL

Des(a). PAULO BALDEZ - Julg: 23/05/2024

 

Ementa número 8

CRIME DE EXTORSÃO

VÍTIMA IDOSA

GRAVE AMEAÇA SUPORTADA

MATERIALIDADE E PARTICIPAÇÃO COMPROVADAS

MANUTENÇÃO DA SENTENÇA

Apelação criminal. Denúncia que imputou à acusada a prática da conduta tipificada no art. 158, caput, c/c o art. 29 e o art. 61, II, "h", todos do Código Penal. Pretensão acusatória julgada procedente. Condenação da acusada às penas de 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão e de 11 (onze) dias multa, à razão unitária mínima. Irresignação defensiva.  Materialidade e participação da acusada no delito de extorsão comprovadas pelas provas angariadas no feito. Comprovante de depósito bancário à fl. 13. Extrato da conta bancária da vítima à fl. 14 (id. 000019). Extrato da conta bancária da acusada às fls. 36/46 (id. 000046). Declarações prestadas em sede policial pela vítima (termo de declaração às fls. 06/07   id. 000011), ratificadas pela prova oral produzida em juízo.  Crimes patrimoniais. Extorsão. Palavra da vítima que tem especial valor probante. Clivagem das narrativas. Relatos do lesado J. M. prestados em sede policial que se coadunam com a prova oral produzida em juízo. Depoimentos coerentes e harmônicos entre si acerca de como se deram os fatos imputados na denúncia.  Alegação da acusada de que emprestou sua conta bancária para um antigo colega de escola, chamado "B.", receber quantia oriunda da venda de um veículo automotor. Versão meramente argumentativa, desprovida de coerência com as provas coligidas nos autos. Inexistência de contraprova capaz de desconstituir os elementos probatórios apresentados pela acusação.  Caso em apreço que se subsume ao crime de extorsão, e não ao delito de estelionato, pois o interlocutor, ainda não identificado, teria, por meio de ligação telefônica, simulado o sequestro da filha da vítima J. M., exigindo o depósito de determinada quantia sob o pretexto de matá la, tudo a revelar que o sujeito passivo do delito em momento algum agiu iludido, mas sim em razão da grave ameaça suportada. Inviáveis, portanto, as pretensões absolutória e desclassificatória sustentadas pela Defesa.  Manutenção da condenação pelo delito de extorsão. Medida que se impõe. Prejudicada a pretensão recursal defensiva da suspensão condicional do processo, já que a pena mínima cominada ao referido delito é superior a 1 (um) ano.  Sanção penal aplicada. Análise. Dosimetria realizada pelo Juízo de primeiro grau. Estrita observância do sistema trifásico.  1ª fase:  Pena base. Fixação desta no mínimo legal, ou seja, em 4 (quatro) anos de reclusão e 10 (dez) dias multa, à razão unitária mínima. Ausência de circunstâncias judiciais a serem valoradas negativamente.  2ª fase:  Reconhecimento da agravante prevista no art. 61, II, "h", do Código Penal. Agravante de natureza objetiva, sendo suficiente para a sua incidência o fato de a vítima ser pessoa maior de 60 (sessenta) anos de idade, independentemente do conhecimento dessa circunstância pela acusada. Jurisprudência do STJ. Incremento da pena em 1/6 (um sexto), alcançando a pena intermediária 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 11 (onze) dias multa, à razão unitária mínima.  3ª fase:  Ausência de causas de aumento ou de diminuição de pena.   Consolidação da pena definitiva em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 11 (onze) dias multa, à razão unitária mínima.  Manutenção da sanção penal aplicada na sentença. Prejudicadas as pretensões recursais defensivas da alteração do regime inicial de cumprimento de pena e da substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos, considerando se o quantum de pena aplicado.    Desprovimento do recurso. Manutenção da sentença penal condenatória em sua integralidade.

APELAÇÃO 0004308-38.2018.8.19.0004

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL

Des(a). PEDRO FREIRE RAGUENET - Julg: 13/08/2024

 

Ementa número 9

ESTUPRO DE VULNERÁVEL

VÍNCULO DE PARENTESCO

GRAVIDEZ DECORRENTE DE ESTUPRO

CRIME CONTINUADO

OMISSÃO MATERNA

ABANDONO INTELECTUAL

RECURSO DESPROVIDO

E M E N T A  APELAÇÃO CRIMINAL. CONDENAÇÃO DO PRIMEIRO APELANTE (L.) COMO INCURSO NO ARTIGO 217 A, C/C OS ARTIGOS 226, INCISO II, E 234 A, INCISO III, POR MAIS DE 06 (SEIS) VEZES, N/F DO ARTIGO 71, TODOS DO CÓDIGO PENAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL CONTRA SUA ENTEADA, RESULTANDO EM GRAVIDEZ, EM CONTINUIDADE DELITIVA. CONDENAÇÃO DA SEGUNDA APELANTE (C.) COMO INCURSA NOS ARTIGOS 217 A, ESTE C/C OS ARTIGOS 13, PARÁGRAFO 2º, ALÍNEA "A", E 234 A, INCISO III, POR MAIS DE 06 (SEIS) VEZES, N/F DO ARTIGO 71, E 246, N/F DO ARTIGO 69, TODOS DO CÓDIGO PENAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL POR OMISSÃO, CONTRA SUA FILHA, RESULTANDO EM GRAVIDEZ, EM CONTINUIDADE DELITIVA, E ABANDONO INTELECTUAL. RECURSOS DEFENSIVOS. PRIMEIRO APELANTE (L.). PEDIDOS: 1) ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS; 2) REDUÇÃO DA PENA BASE AO MÍNIMO LEGAL; 3) AFASTAMENTO DO BIS IN IDEM CONSISTENTE NA INCIDÊNCIA DA CIRCUNSTÂNCIA AGRAVANTE PREVISTA NO ARTIGO 61, INCISO II, ALÍNEA "F", E DA CAUSA ESPECIAL DE AUMENTO DE PENA PREVISTA NO ARTIGO 226, INCISO II, AMBOS DO CÓDIGO PENAL; 4) REDUÇÃO DA FRAÇÃO DE AUMENTO DE PENA DECORRENTE DA GRAVIDEZ DA OFENDIDA; 5) REDUÇÃO DA FRAÇÃO DE AUMENTO DE PENA REFERENTE À CONTINUIDADE DELITIVA. SEGUNDA APELANTE (C.). PEDIDOS: 1) ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS DA OMISSÃO COM RELAÇÃO AO CRIME DE ESTUPRO E POR AUSÊNCIA DE DOLO QUANTO AO CRIME DE ABANDONO INTELECTUAL; 2) REDUÇÃO DAS PENAS BASE AO MÍNIMO LEGAL, AFASTANDO SE A INCIDÊNCIA DA CAUSA ESPECIAL DE AUMENTO SOBRESSALENTE RECONHECIDA NA PRIMEIRA FASE DO CÁLCULO; 3) AFASTAMENTO DO BIS IN IDEM CONSISTENTE NA INCIDÊNCIA DA CIRCUNSTÂNCIA AGRAVANTE PREVISTA NO ARTIGO 61, INCISO II, ALÍNEA "F", E DA CAUSA ESPECIAL DE AUMENTO DE PENA PREVISTA NO ARTIGO 226, INCISO II, AMBOS DO CÓDIGO PENAL; 5) REDUÇÃO DO AUMENTO DE PENA REFERENTE AO CRIME CONTINUADO.   I. Pretensão absolutória que não merece prosperar. I.1. Crime de estupro de vulnerável. Materialidade do delito e respectiva autoria na pessoa dos apelantes positivadas pelas provas pericial e oral produzidas no curso da instrução criminal. Criança de apenas 11 (onze) anos de idade que precisou de atendimento médico logo após ter dado à luz, em casa, um recém nascido a termo, de aproximadamente 3kg. Exame pericial que detectou não só o óbvio desvirginamento e as lesões perineais decorrentes do parto natural, mas também o apagamento das pregas anais com alargamento de aproximadamente 4 cm do esfíncter anal. Lesão que, de acordo com a médica que atendeu a vítima no hospital, denota manipulação crônica, provavelmente com introdução reiterada de objetos no ânus da vítima. Circunstâncias que evidenciam a prática de não apenas um, mas diversos crimes de estupro, embora a vítima tenha relatado, em seu depoimento, apenas o coito vaginal perpetrado pelo primeiro apelante, o qual resultou em gravidez. Certeza da autoria na pessoa do acusado que advém não só do exame de DNA, que apontou 89% de probabilidade do primeiro apelante (L.) ser o pai do recém nascido, mas principalmente do relato da vítima, que afirmou ter sido estuprada pelo padrasto, não mencionando nenhum outro abusador. Primeiro apelante (L.) que optou por fazer uso do seu direito ao silêncio, deixando, com isso, de apresentar a sua versão dos fatos. Inverossimilhança da versão autodefensiva da segunda apelante (C.). Não é crível que uma mãe não percebesse no corpo de sua filha, de apenas 11 (onze) anos de idade, apontada pelas testemunhas como uma menina magra, os sinais de uma gestação de cerca de 37 (trinta e sete) semanas, que resultou no nascimento de um bebê de cerca de 03kg. Segunda apelante (C.) que preferiu se omitir, fechando os olhos à conduta criminosa do seu companheiro contra a sua filha criança, em total inobservância do seu dever de cuidado. Omissão que propiciou a repetição dos abusos sexuais. Tipicidade incontroversa e omissão penalmente relevante. Estupros deliberadamente mantidos em segredo pela mãe da vítima que, convenientemente, não matriculou a menina na escola ou mesmo a levou para acompanhamento médico regular, reduzindo, assim, as chances de detecção dos repetidos abusos. Vítima que já havia parido quando da chegada da equipe médica do SAMU, aparentemente convocada apenas porque a parturiente sofreu uma hemorragia em decorrência da laceração de seu períneo. Condenação que se mantém. I.2. Abandono intelectual. Vítima de apenas 11 (onze) anos de idade que, segundo a própria mãe, ora apelante, não estava matriculada em estabelecimento de ensino, não se podendo imputar à escola, na qual a menor sequer estudava, o dever de informar o Conselho Tutelar acerca de sua ausência. As alegações de que a segunda apelante (C.) era doente e tinha dificuldades de locomoção e visão não afastam o seu dever de prover educação para seus filhos, sendo certo que ela residia com o corréu e dois filhos mais velhos do que a vítima, que poderiam tê la auxiliado, caso ela tivesse solicitado, quer providenciando a matrícula da menina, quer auxiliando o deslocamento da mãe até a escola, que, como se constata dos autos, era próxima da residência da família. Condenação escorreita.  II. Dosimetria. II.1. Penas base. II.1.a. Crime de estupro de vulnerável. Afastamento do mínimo legal perfeitamente justificado com relação a ambos os apelantes. Circunstâncias do caso concreto que reforçam a necessidade de maior rigor na imposição da reprimenda, contraindicando a incidência pura e simples do parágrafo único do artigo 68 do Código Penal. O deslocamento da majorante sobressalente para outra fase da dosimetria não contraria o sistema trifásico. Ao contrário, privilegia o princípio da individualização da pena. Precedentes. Vítima que não só foi submetida a episódios de abuso sexual pelo padrasto, com a conivência da mãe, como também sofreu uma lesão certamente incômoda e dolorosa em seu esfíncter anal, que sofreu dilatação de cerca de 4cm. Crimes praticados dentro de residência na qual viviam, também, os irmãos da vítima, sendo um deles menor de idade. Dano psicológico sofrido pela vítima, que relatou não ter tido ânimo de sair de casa e conviver com outras crianças nos últimos meses em que residiu com a sua família, se vendo presa em um local que, ao contrário do que seria esperado, não era seguro. Vítima cuja saúde foi colocada em risco, não só por ter sido submetida a gerar uma criança em um corpo imaturo, de apenas 11 (onze) anos, mas também pela falta de acompanhamento pré natal e pelas desumanas condições do parto, feito em casa, na presença do agressor e de sua mãe omissa. Vítima que certamente sofreu modificações precoces no seu corpo de criança e, como se não bastasse, perdeu o convívio com seus irmãos e o acesso à própria residência, passando a viver em um abrigo. Atos de violência que atingiram não só a criança estuprada, mas também o recém nascido, cuja saúde foi colocada em risco diante da falta de assistência pré natal e nascimento em condições deploráveis, além de ter sido precocemente retirado do convívio com sua família biológica, privado do acesso ao leite materno e colocado para adoção. Acréscimo de novos fundamentos a embasar a manutenção da pena base. Possibilidade. Inexistência de reformatio in pejus. Precedente do Supremo Tribunal Federal. II.1.b. Pena base do crime de abandono intelectual justificadamente afastada do mínimo legal. Segunda apelante que deixou de matricular sua filha na escola e, com isso, a privou não só de sua formação acadêmica, mas também da socialização com outras crianças e do acompanhamento por outros adultos, que certamente teriam percebido a gestação e alertado as autoridades competentes, minorando, assim, os danos experimentados pela menor. II.2. Pena intermediária. Circunstância agravante prevista no artigo 61, inciso II, alínea "f", do Código Penal ("prevalecendo se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade") corretamente reconhecida. Existência inequívoca de um núcleo doméstico comum entre autor, vítima e sua genitora, com convivência permanente. Causa especial de aumento de pena prevista no artigo 226, inciso II, do Código Penal reconhecida em desfavor do primeiro apelante, padrasto da vítima, mas considerada como circunstância desfavorável na primeira fase do cálculo da pena, assim como a condição de mãe da vítima, utilizada em desfavor da segunda apelante também para afastar a pena base do mínimo legal. Compatibilidade entre o reconhecimento da condição de padrasto e de mãe e do abuso da relação doméstica, tratando se de situações inegavelmente distintas. Inocorrência de bis in idem. II.3. Pedido de redução da fração de aumento de pena pela gravidez. Rejeição. O crime de estupro, no caso em exame, não só resultou em gravidez, mas na gravidez de uma criança de apenas 11 (onze) anos de idade, que, além das lógicas modificações corporais decorrentes de uma gestação, sofreu laceração no períneo durante o parto, precisando de sutura. Criança que precisou ser medicada para interromper artificialmente a lactação, já que o bebê foi entregue para adoção. Circunstâncias que justificam a aplicação da fração máxima de aumento de pena pela incidência do disposto no artigo 234 A, inciso III, do Código Penal. II.4. Continuidade delitiva do estupro de vulnerável. Aplicação da fração máxima de aumento de pena plenamente justificada. Apesar da vítima ter descrito apenas um episódio de abuso, restou evidenciado que, além de ter sido submetida à conjunção carnal que resultou em gravidez, também foi submetida a manipulações anais frequentes, que resultaram em frouxidão considerável do seu esfíncter anal, o que certamente não se obtém com poucos episódios de violência sexual, mas sim por um atuar crônico do agressor.   Recursos desprovidos.

APELAÇÃO 0192030-88.2022.8.19.0001

SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL

Des(a). ROSA HELENA PENNA MACEDO GUITA - Julg: 27/08/2024

 

Ementa número 10

ROUBO MAJORADO

ALEGAÇÃO DE NULIDADE DO RECONHECIMENTO PESSOAL

INDUÇÃO NO DEPOIMENTO

POSSÍVEL INDUÇÃO NO RECONHECIMENTO PESSOAL

VIÉS DE CONFIRMAÇÃO

ABSOLVIÇÃO

DECISÃO REFORMADA

APELAÇÃO CRIMINAL. ROUBO MAJORADO. PRETENSÃO DEFENSIVA ABSOLUTÓRIA. ALEGAÇÃO DE NULIDADE DO RECONHECIMENTO PESSOAL, EM VIOLAÇÃO AO ARTIGO 226 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. PROVIMENTO. ASSISTE RAZÃO À DEFESA EM SEU PLEITO ABSOLUTÓRIO, POIS O PROCESSO ESTÁ MACULADO POR NULIDADES. A VÍTIMA É CLARA AO AFIRMAR, EM SEU DEPOIMENTO, QUE FORA PRESSIONADA PELO DELEGADO DE POLÍCIA PARA AFIRMAR QUE O ROUBO FORA PRATICADO COM O EMPREGO DE ARMA DE FOGO, MESMO ESTE NÃO SENDO O CASO. ALÉM DISSO, A PRIMEIRA DESCRIÇÃO DOS AUTORES DO FATO FORA DE QUE SE TRATAVA DE  DOIS ELEMENTOS NEGROS, JOVENS , ENQUANTO É POSSÍVEL AFERIR PELO INTERROGATÓRIO DOS RÉUS QUE C. É BRANCO E E. NEGRO. ALIADO A TUDO ISSO, OS RÉUS FORAM RECONHECIDOS APÓS SEREM PRESOS EM FLAGRANTE, DOIS DIAS APÓS O ROUBO, NA POSSE DA MOTOCICLETA ROUBADA E JÁ APRESENTADOS PELA AUTORIDADE POLICIAL À VÍTIMA COMO AUTORES DO ROUBO PARA O RECONHECIMENTO. POR FIM, A VÍTIMA AFIRMA QUE ENCONTROU COM OS RÉUS NO FÓRUM E CONVERSOU COM ELES, ISSO TUDO EM MOMENTO ANTERIOR AO RECONHECIMENTO PESSOAL FEITO EM JUÍZO. TODAS ESSAS CIRCUNSTÂNCIAS SOMADAS FAZEM NECESSÁRIO A CONSIDERAÇÃO DE POSSÍVEL INDUÇÃO NO RECONHECIMENTO, O QUE INCREMENTA UM RISCO DE FALSO RECONHECIMENTO. ASSIM, AINDA QUE A VÍTIMA AFIRME EM SEU DEPOIMENTO QUE RECONHECE SEM SOMBRA DE DÚVIDAS OS RÉUS, É POSSÍVEL A OCORRÊNCIA NO CASO DE UM VIÉS DE CONFIRMAÇÃO: FENÔMENO NO QUAL UMA VEZ QUE A TESTEMUNHA OU A VÍTIMA RECONHECE ALGUÉM COMO O AUTOR DO DELITO, HÁ TENDÊNCIA, POR UM VIÉS DE CONFIRMAÇÃO, A REPETIR A MESMA RESPOSTA EM RECONHECIMENTOS FUTUROS, POIS SUA MEMÓRIA ESTARÁ MAIS ATIVA E PREDISPOSTA A TANTO (STJ HC N. 712.781/RJ). ABSOLVIÇÃO DO RÉU QUE SE IMPÕE. ARTIGO 386, INCISO VII, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. EXTENSÃO DOS EFEITOS DA ABSOLVIÇÃO AO CORRÉU.  PROVIMENTO DO RECURSO DEFENSIVO. DECISÃO REFORMADA.

APELAÇÃO 0027940-55.2009.8.19.0054

SÉTIMA CÂMARA CRIMINAL

Des(a). SIDNEY ROSA DA SILVA - Julg: 08/08/2024

 

Este texto não substitui o publicado no Diário Oficial.