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ATO NORMATIVO CONJUNTO 7/2024

Estadual

Judiciário

26/07/2024

DJERJ, ADM, n. 215, p. 3.

Dispõe sobre os procedimentos e fluxos de atendimento nos serviços de atenção e cuidados à saúde, públicos ou privados, da assistência social, encaminhados ao Poder Judiciário e sua intervenção, quando gestantes ou parturientes manifestarem interesse em entregar seu filho.

ATO NORMATIVO CONJUNTO TJ/CGJ nº 7/2024 Dispõe sobre os procedimentos e fluxos de atendimento nos serviços de atenção e cuidados à saúde, públicos ou privados, da assistência social, encaminhados ao Poder Judiciário e sua intervenção, quando gestantes ou parturientes manifestarem interesse em... Ver mais
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ATO NORMATIVO CONJUNTO TJ/CGJ nº 7/2024

 

 

Dispõe sobre os procedimentos e fluxos de atendimento nos serviços de atenção e cuidados à saúde, públicos ou privados, da assistência social, encaminhados ao Poder Judiciário e sua intervenção, quando gestantes ou parturientes manifestarem interesse em entregar seu filho.

 

 

O PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, Desembargador Ricardo Rodrigues Cardoso, e o CORREGEDOR-GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, Desembargador Marcus Henrique Pinto Basílio, no uso de suas atribuições legais;

 

CONSIDERANDO que a Constituição Federal consagra a proteção integral à criança e ao adolescente como prioridade absoluta;

 

CONSIDERANDO que o Congresso Nacional aprovou o Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças;

 

CONSIDERANDO que incumbe ao poder público, dentre outros, proporcionar a proteção a gestantes e puérperas que, no período pré e pós-natal, manifeste interesse em entregar espontaneamente seu filho recém-nascido em adoção, na forma dos artigos 7º, 8º e 13 da Lei nº 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente);

 

CONSIDERANDO a Lei Estadual nº 8.594/2019 que criou, no âmbito do Estado do Rio de Janeiro, o "Programa de Orientação à entrega de bebês à adoção";

 

CONSIDERANDO a Resolução n. 485, de 18 de janeiro de 2023, do Conselho Nacional de Justiça, que dispôs sobre o adequado atendimento de gestante ou parturiente que manifeste desejo de entregar o filho para adoção e a proteção integral da criança;

 

CONSIDERANDO que as políticas de atendimento aos direitos da mulher e aos direitos da criança e do adolescente devem ser feitas por meio de um conjunto articulado de ações governamentais e não governamentais;

 

CONSIDERANDO a necessidade de evitar qualquer tipo de intermediação informal, ainda que não revestida de dolo, no sentido de encaminhamento direcionado de crianças para adoção, em detrimento da indicação realizada em Juízo em matéria de Infância, de pessoas previamente habilitada para adoção;

 

CONSIDERANDO a Campanha Entregar de Forma Legal é Proteger e a necessidade de regulamentar procedimentos e fluxos de atendimento para encaminhamento à Justiça da Infância e da Juventude das gestantes, parturientes e genitores que manifestem interesse em entregar seus filhos em adoção;

 

RESOVEM:

 

DA ENTREGA VOLUNTÁRIA E LEGAL PARA ADOÇÃO

 

CAPÍTULO I

DAS DISPOSIÇÕE PRELIMINARES

 

Art. 1º. É direito da gestante ou parturiente entregar, de forma legal, o filho para adoção e de ser orientada e atendida pela Justiça com competência em matéria da Infância e da Juventude.

 

§ 1º. A entrega de filho para adoção é voluntária, mesmo durante a gravidez, sendo direito previsto no Artigo 13, §1º do Estatuto da Criança e do Adolescente, sem constrangimentos.

 

§ 2º. O direito a que se refere o caput engloba, dentre outros:

 

I - de ser atendida por equipe interdisciplinar das Varas com competência em matéria da Infância e da Juventude;

 

II - à retratação e arrependimento durante o processo de entregar o(a) seu filho(a) para adoção;

 

III - ao atendimento qualificado, à privacidade e ao sigilo, independentemente do motivo que a levou à decisão de entregar o(a) filho(a) para adoção;

 

IV - de não ser coagida a entregar a criança ou a ficar com ela;

 

V - de deixar informações e/ou registros sobre o histórico familiar, da gestação e de sua decisão acerca da entrega, que favoreçam a preservação da identidade e origem da criança;

 

VI - de receber assistência jurídica por um defensor público nomeado ou advogado dativo, que será designado pelo juiz para intervir no feito;

 

VII - de sem o consentimento da gestante ou da puérpera não serão consultados o suposto pai e nem os membros da família extensa.

 

 

Art. 2º. A gestante ou parturiente que, antes ou logo após o nascimento, perante Hospitais, maternidades, Unidades de Saúde, Conselhos Tutelares, Centros de Referência de Assistência Social (CRAS), Centros de Referência Especializada de Assistência Social (CREAS), Instituições de Ensino ou demais Órgãos do Sistema de Garantia de Direitos, manifeste interesse em entregar seu filho à adoção, antes ou logo após o nascimento, será encaminhada, sem constrangimento, à Vara da Infância e Juventude, a fim de que seja formalizado o procedimento judicial e seja designado atendimento pela equipe interprofissional.

 

 

CAPÍTULO II

DO ACOMPANHAMENTO À GESTANTE NO JUDICIÁRIO

 

Art. 3º. A autoridade judiciária deverá instaurar, imediatamente, de ofício ou a requerimento do Ministério Público ou de um dos interessados, o procedimento de acompanhamento.

 

Parágrafo único. Serão autuadas e registradas na classe processual "Entrega Voluntária" (15140) as informações instrumentalizadas e respectivos documentos colhidos, assim como relatório técnico, quando possível a realização imediata do atendimento interprofissional, remetendo-se em seguida ao representante do Ministério Público.

 

Art. 4º. Por determinação judicial, a equipe interdisciplinar das Varas com competência em matéria da Infância e da Juventude deverá prosseguir ao atendimento da mulher, observando os seguintes procedimentos:

 

I - entrevistar a genitora, a fim de lhe propiciar acolhimento, orientações e a livre manifestação de vontade por ela declarada, atendendo a nas demandas apresentadas;

 

II - escutar e analisar as motivações relacionadas à intenção de entrega do futuro filho, respeitado o devido sigilo das informações;

 

III - prestar os esclarecimentos sobre questões jurídicas do procedimento da entrega voluntária e todos os aspectos que envolvem a adoção;

 

IV - respeitar o sigilo sobre a entrega voluntária e, somente com a anuência da genitora ou puérpera, indagar sobre a identidade do suposto genitor ou família extensa que tenha interesse e condições de assumir a guarda; somente com a anuência da genitora ou puérpera, respeitando o seu desejo de manter sigilo sobre a entrega voluntária.

 

V - investir na promoção da autonomia da mulher e no respeito à sua decisão, orientando sobre seus direitos e sobre os direitos da criança;

 

VI - respeitar o desejo da mulher de manter sigilo sobre a sua gestação e a entrega voluntária da criança;

 

VII - orientar sobre os procedimentos que serão realizados, após o nascimento da criança, caso a mulher decida efetivamente pela sua entrega;

 

VIII - sugerir os devidos encaminhamentos ao Sistema de Garantia de Direitos que entender adequados, especialmente atendimento psicológico e/ou socioassistencial na rede de serviços do seu território, antes e após a entrega da criança;

 

IX - apresentar relatório à autoridade judiciária, considerando inclusive os eventuais efeitos do estado gestacional e puerperal;

 

X - emitir Termo de Acompanhamento expedido pela Vara com competência em matéria da Infância e da Juventude que promoveu o atendimento da gestante, em que conste a vontade da entrega voluntária da criança para adoção;

 

XI - comunicar previamente às maternidades locais e outras instituições de saúde o acompanhamento da gestante.

 

 

CAPÍTULO IV

DO ACOMPANHAMENTO À PARTURIENTE NO JUDICIÁRIO

 

Art. 5º. O profissional da maternidade ou dos demais serviços da rede de atenção e cuidados à saúde que realizar o atendimento previsto no caput do art. 2º deve comunicar imediatamente à Vara com competência em matéria da Infância e da Juventude, por meio de relatório informativo com os dados obtidos, acompanhados da via amarela da Declaração de Nascido Vivo (DNV) ou Certidão de Nascimento da Criança, se a mesma já tiver sido registrada, nos casos em que persistir a intenção da mãe de entregar a criança em adoção.

 

§ 1º. O relatório informativo deve ser encaminhado no início do expediente do próximo dia útil, caso o nascimento da criança ocorra fora do expediente forense.

 

§ 2º. Deve ser respeitada a integridade física e psicológica da parturiente e a sua decisão de não amamentar ou manter contato com a criança, providenciando-se acomodação em separado para ambas, evitando-se qualquer tipo de constrangimento e discriminação.

 

Art. 6º. A autoridade judiciária determinará, de ofício, a autuação do relatório informativo recebido da maternidade ou dos demais serviços da rede de atenção e cuidados à saúde, caso ainda não tenha sido instaurado o procedimento de acompanhamento, na forma do art. 4º, parágrafo único.

 

Art. 7º. Após o nascimento da criança, se persistir o interesse da mãe na entrega do recém-nascido para adoção, a equipe multidisciplinar do juízo articulará a confecção do registro de nascimento e o devido encaminhamento da puérpera para audiência de que trata o § 1º do art. 166 do ECA, inclusive o transporte, se for o caso, para ratificação do respectivo consentimento sobre a adoção.

 

Art. 8º. É garantida a lavratura do registro de nascimento e emissão da respectiva certidão, inclusive com a atribuição de nome e incluindo todos os dados constantes na declaração de nascido vivo.

 

§ 1º. Não tendo a genitora atribuído nome à criança, o registro será feito com o prenome de algum de seus avós ou de outro familiar seu, conforme dados constantes do relatório da equipe técnica.

 

§ 2º. Inexistindo outros dados, o juiz atribuirá prenome e sobrenome, bem como o nome da mãe, escolhendo-os entre os da onomástica comum e mais usual brasileira.

 

§ 3º. É garantida a lavratura do registro de nascimento e emissão da respectiva certidão, inclusive com a atribuição de nome e incluindo todos os dados constantes na declaração de nascido vivo.

 

 

CAPÍTULO V

DO ACOMPANHAMENTO EM JUÍZO

 

Art. 9. A autoridade judiciária, mediante o caso concreto, decidirá o encaminhamento de acordo com o superior interesse da criança.

 

Art. 10. A autoridade judiciária ouvirá a genitora em audiência, com a presença do Ministério Público e da Defensoria Pública ou Advogado, mesmo que tenha sido ouvida durante a gravidez.

 

§ 1º. A audiência deverá, sempre que possível, ser realizada no mesmo dia da apresentação da puérpera ao Juízo da Infância e Juventude ou em até 10 (dez) dias.

 

§ 2º. Após a oitiva judicial dos pais, na entrega voluntária de seus filhos para colocação em família adotiva, o juiz homologará a entrega e declarará a extinção do poder familiar (art. 166, § 1º, II do ECA) e decidirá sobre o acolhimento familiar ou institucional da criança, preferencialmente em audiência, na forma do artigo 166 do ECA.

 

§ 3º. Após o decurso do prazo para arrependimento a que faz alusão o art. 166 do ECA, o juízo determinará a inclusão imediata da criança no Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento, para adoção por pessoas habilitadas, e instaurará novo processo para acompanhamento das medidas protetivas aplicadas ao infante, do tipo "colocação em família substituta", no qual será realizada a determinação de que a criança está apta para a adoção, a fim de preservar o sigilo dos dados dos adotantes.

 

§ 4º. O juiz deverá oficiar ao Cartório de Registro Civil para dispensa da deflagração de procedimento oficioso de averiguação de paternidade, a que faz menção o art. 2º da Lei nº 8.560/1992, principalmente para a gestante ou parturiente exercer o direito de sigilo da entrega.

 

Art. 11. Na hipótese de desistência pela genitora/pelos genitores até a audiência e não havendo fatores de risco para a criança, esta será mantida com eles, devendo prosseguir o acompanhamento familiar como medida de proteção pelo prazo de 180 dias.

 

Art. 12. Caberá à Coordenadoria Judiciária de Articulação das Varas da Infância e da Juventude e do Idoso do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (CEVIJ) estruturar a capacitação das equipes técnicas das Varas com competência na área da Infância e Juventude sobre a temática em tela.

 

Art. 13. Este Ato Normativo entrará em vigor na data da sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

 

 

Rio de Janeiro, na data da assinatura.

 

 

Desembargador RICARDO RODRIGUES CARDOSO

Presidente do Tribunal de Justiça

 

 

Desembargador MARCUS HENRIQUE PINTO BASÍLIO

Corregedor-Geral da Justiça

 

 

Este texto não substitui o publicado no Diário Oficial.