EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA DAS TURMAS RECURSAIS 3/2021
Estadual
Judiciário
20/04/2021
21/04/2021
DJERJ, ADM, n. 147, p. 22.
Ementário de Jurisprudência das Turmas Recursais do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA TURMAS RECURSAIS Nº 3/2021
COMISSÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Presidente: DESEMBARGADOR MARCO ANTONIO IBRAHIM
Organização: Serviço de Publicações Jurisprudenciais da Divisão de Organização de Acervos de Conhecimento - dicac@tjrj.jus.br
Rua Dom Manoel, 29, 2º andar, sala 215, Praça XV
Ementa número 1
TRATAMENTO MÉDICO
VALE SOCIAL
IMPOSSIBILIDADE
QUADRO CLÍNICO
TRANSPORTE VEICULAR
PRESTAÇÃO ACESSÓRIA AO TRATAMENTO
SOLIDARIEDADE ENTRE ESTADO E MUNICÍPIO
Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro GAB. DRA. CARLA FARIA BOUZO Segunda Turma Recursal Fazendária Processo nº 0099222-69.2019.8.19.0001 Recorrente: Estado do Rio de Janeiro Recorrente: Município do Rio de Janeiro Recorrido: MARTINHO DO NASCIMENTO FERREIRA Relatora: Carla Faria Bouzo RECURSO INOMINADO. JUIZADO ESPECIAL DE FAZENDA PÚBLICA. TRANSPORTE VEICULAR. TRATAMENTO DE HEMODIÁLISE. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. RECURSO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO E DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO. EXISTÊNCIA DE SOLIDARIEDADE ENTRE OS ENTES FEDERATIVOS. TEMA 793 DO E. STF. DESPROVIMENTO DOS RECURSOS. RELATÓRIO Trata-se de ação pelo rito especial da Lei n. 12.153/09 proposta por MARTINHO DO NASCIMENTO FERREIRA, em face do ERJ e MRJ, alegando que é portador de Insuficiência Renal Crônica estágio 5 SECUNDÁRIO A NEFROPATIA HIPERTENSIVA (CID 10 N18.0) e realiza tratamento de hemodiálise. Afirma que não tem condições de custear o tratamento necessário para a manutenção de sua vida. Requer fornecimento de TRANSPORTE VEICULAR DA SUA RESIDÊNCIA ATÉ A CLÍNICA, com acompanhante, bem como o seu retorno para casa a fim de possibilitar a realização do procedimento de hemodiálise nos dias e horários devidos, enquanto durar o tratamento. A petição inicial foi instruída com os documentos de fls 11/24. Decisão de deferimento parcial da tutela de urgência às fls. 32/33: ¿...Diante das razões expostas, defiro parcialmente a antecipação de tutela, para determinar que os réus providenciem o transporte para a parte autora nos dias e horas pleiteados na inicial, restringindo-se, todavia, o transporte de modo que seja adequado, mas não necessariamente exclusivo, a fim de que a parte autora possa se submeter ao tratamento do qual necessita, seja por meio da gratuidade do transporte público adaptado, ou por meio de outro veículo, exclusivo ou não, no prazo de cinco dias a contar da intimação desta decisão, sob pena de arcarem com os custos de transporte particular. I-se os réus para que deem cumprimento à decisão. ¿ Contestação do ERJ ás fls. 46/57. Contestação do Município do Rio de Janeiro às fls. 72/101 com juntada do Termo de cooperação de fls. 102/136. Decisão de desprovimento do agravo de instrumento interposto pelo MRJ às fls. 238/243. Parecer do Ministério Público às fls. 228 opinando pela improcedência do pedido. Sentença de procedência do pedido às fls. 263/265. Recurso inominado interposto pelo Estado do Rio de Janeiro às fls. 297/306. Sustenta a impossibilidade de condenação do estado no fornecimento de transporte especial, destacando a existência de vale social para portadores de doenças crônicas, com base na Lei estadual n° 4510/2005. Pondera que é dever da família amparar os seus enfermos e que o fornecimento de transporte só se justificaria na hipótese de absoluto desamparo da parte, entendendo se tratar de extensão exagerada do direito á saúde. O Município do Rio de Janeiro interpôs Recurso inominado às fls. 312/343, reiterando os argumentos de sua contestação. Impugna o valor da causa. Alega que não há prova da impossibilidade utilização do transporte público com acompanhante, inclusive com o uso de passe livre com gratuidade também para eventual acompanhante. Pondera que a prestação assistencial é voltada aos desamparados. Sustenta a competência do ERJ e inexistência de responsabilidade do MRJ para tratamento de hemodiálise, conforme TERMO DE COOPERAÇÃO Nº 01/2016. Pondera que o direito à saúde não engloba o direito ao transporte gratuito Contrarrazões do autor às fs 400/403 Parecer do MP pelo conhecimento e provimento dos Recursos ás fls. 143. VOTO Conheço dos recursos, eis que presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade. No mérito, a sentença deve ser mantida por seus próprios fundamentos. Trata-se de pedido de obtenção de TRANSPORTE VEICULAR DA RESIDÊNCIA ATÉ A CLÍNICA, para a realização do tratamento de hemodiálise. Pois bem. Observe-se que na Sessão de Julgamento realizada no dia 23/05/2019, o E. Supremo Tribunal Federal, por maioria, ao apreciar o RE n.º 855.178, fixou a seguinte tese de repercussão geral (Tema 793): " Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro.¿ Nos termos do art. 196 da Constituição Federal, o acesso à saúde é direito fundamental e as políticas públicas destinadas a implementá-lo, embora vinculem o Estado e os cidadãos, devem gerar proteção suficiente ao direito garantido, afigurando-se suscetíveis de revisão judicial, sem que daí se possa vislumbrar ofensa aos princípios da divisão de poderes, da reserva do possível ou da isonomia e impessoalidade. Por outro lado, as normas internas de organização, funcionamento e gestão do Sistema Único de Saúde, de natureza administrativa, não afastam a legitimidade solidária dos entes federativos para responder às demandas de fornecimento de medicamentos, insumos, exames ou procedimentos deduzidos pelos desprovidos de recursos financeiros indispensáveis ao seu custeio. Destaca-se que eventual deliberação a respeito da repartição de responsabilidades compete unicamente aos entes federativos, a ser realizada em momento oportuno, dado que o particular que buscou a via judicial para ver atendido o seu direito não pode sofrer limitação decorrente de assuntos de ordem meramente administrativa. Muito embora o autor faça jus ao transporte público gratuito, nos termos da Lei Estadual 4.510/2005, é certo que, diante de seu quadro clínico comprovado através do laudo médico de fls. 19/21, a disponibilização do Vale-Social não lhe atenderia, devendo os réus proverem o transporte da parte autora pelos serviços de que dispunham, de forma adequada e não necessariamente individual. De acordo com o documento médico acostado aos autos às fls.19/21, o autor é idoso, portador de insuficiência renal crônica estágio 5, secundário a Nefropatia hipertensiva e submetido a hemodiálise. O laudo médico demonstra, ainda, que o autor apresenta ¿patologias secundárias à disfunção renal, como anemia crônica e osteodistrofia renal, para os quais faz uso de medicações regularmente. Em razão do quadro de oligoanúria, próprio da disfunção renal crónica, paciente apresenta ganho hídrico interdiálitico elevado, o que determina taxa de ultrafiltrarão (UF) elevada durante as sessões de hemodiálise. Por sua vez, esses episódios de taxa de UF elevada leva a um quadro de atordoamento miocárdico, que pode determinar hipotensão lipotimia e até mesmo síncope após sessão de hemodiálise. Paciente tem histórico de AVC isquêmico com sequela motora, apresentando hemiparesia em dimidio esquerdo...¿ situação que impossibilita o uso do transporte público. O autor comprovou a hipossuficiência econômica e se encontra em situação de pobreza e necessidade da obtenção da tutela pretendida. Ademais, note-se que o transporte para o local do tratamento é uma prestação acessória ao tratamento, portanto, uma vertente do direito à saúde. No caso destes autos, constata-se que o transporte especializado do autor até a clínica apontada na inicial, nos dias e horários estabelecidos se revela imprescindível. Não há, portanto, qualquer reparo a ser feito na sentença, pois a autora comprovou preencher todos os requisitos para obtenção do medicamento pleiteado. Diante do exposto, VOTO PELO CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DE AMBOS OS RECURSOS, mantendo a sentença pelos seus fundamentos e os acima lançados. Fixo os honorários em R$ 500,00 para cada um dos recorrentes, nos termos do art. 85, §3º e § 8º, do CPC. Rio de Janeiro, 24 de março de 2021. Carla Faria Bouzo Juíza Relatora
RECURSO INOMINADO 0099222-69.2019.8.19.0001
Segunda Turma Recursal Fazendária
Juiz(a) CARLA FARIA BOUZO - Julg: 05/04/2021
Ementa número 2
ENERGIA ELÉTRICA
COBRANÇA DE ALÍQUOTAS DO I.C.M.S.
AUMENTO ABUSIVO
PRINCÍPIO DA SELETIVIDADE
Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro SEGUNDA TURMA RECURSAL DA FAZENDA PÚBLICA Processo nº 0172185-75.2019.8.19.0001 Recorrente: ESTADO DO RIO DE JANEIRO Recorrido: LEONARDO SEVERO LOPES COELHO VOTO ICMS. ENERGIA ELÉTRICA. ALÍQUOTA DE 18%. PRINCÍPIO DA SELETIVIDADE. QUESTÃO JÁ DECIDIDA PELO ÓRGÃO ESPECIAL EM CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE DE LEGISLAÇÃO ESTADUAL. DESPROVIMENTO DO RECURSO. RELATÓRIO Trata-se de ação proposta por LEONARDO SEVERO LOPES COELHO em face do ESTADO DO RIO DE JANEIRO postulando, o autor, em resumo: (1) condenar o réu a realizar a redução das alíquotas acima do percentual de 18% de ICMS incidente sobre os serviços de energia elétrica, e (2) a devolução dos valores indevidamente pagos no total de R$ 2.867,47. Parecer de não intervenção do MP em fls. 63. Contestação do ESTADO DO RIO DE JANEIRO em fls. 655. Sentença de procedência do pedido em fls. 780. Recurso do réu em fls. 10007 sustentando a constitucionalidade da cobrança. Contrarrazões às fls. 13745 pugnando pela manutenção da sentença. VOTO Após detida análise dos autos, entendo que a sentença deve ser MANTIDA. O autor, ora recorrido, postula a declaração incidental de inconstitucionalidade do art. 14, VI, "b" e "c" da Lei Estadual nº 2.657/1996, que dispõe sobre as alíquotas progressivas de ICMS em relação ao serviço de energia elétrica. Contudo, esta matéria já foi enfrentada pelo Órgão Especial, a quem compete exercer o controle concentrado de inconstitucionalidade das legislações estaduais, estando pacificada a questão. O Órgão Especial deste Tribunal, nas arguições de Inconstitucionalidade n.º 27/2005 e nº 21/2008, declarou a inconstitucionalidade dos artigos 14, VI, item 2 e VIII, item 7 do Decreto Estadual nº 27.427/2000, e 14, VI, b, da Lei Estadual nº 2.657/96, que se referem à cobrança do ICMS pela alíquota de 25%. Reputou-se estar configurada violação ao Princípio da Seletividade, entendendo que deveria ser aplicada a alíquota genérica de 18%, acrescida de 5% referente ao Fundo Mundial de Combate à Pobreza. Vale aqui transcrever acórdão recente do E. TJRJ: 0355338-97.2008.8.19.0001 - APELACAO / REMESSA NECESSARIA 1ª Ementa Des(a). LUIZ ROLDAO DE FREITAS GOMES FILHO - Julgamento: 06/02/2019 - SEGUNDA CÂMARA CÍVEL APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO. IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS. ENERGIA ELÉTRICA. INCIDÊNCIA DA ALÍQUOTA DE 25% (VINTE E CINCO POR CENTO). ABUSIVIDADE. SENTENÇA QUE REJEITOU A PREFACIAL DE ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM E JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO, REDUZINDO A ALÍQUOTA DO ICMS SOBRE CONSUMO DE ENERGIA ELÉTRICA PARA 18% (DEZOITO POR CENTO), ACRESCIDA DO ADICIONAL DO FUNDO DE COMBATE À POBREZA E, AINDA, CONDENOU O ESTADO DO RIO DE JANEIRO A RESTITUIR OS VALORES INDEVIDAMENTE COBRADOS NO QUINQUENIO ANTERIOR À PROPOSITURA DA DEMANDA E AQUELES VENCIDOS ATÉ A DATA DO EFETIVO PAGAMENTO. INSURGÊNCIA DE AMBAS AS PARTES. ÓRGÃO ESPECIAL DESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA QUE RECONHECEU, NO INCIDENTE DE ARGUIÇÃO Nº 2005.017.00027, A INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 14, VI, ITEM 2, E VIII, ITEM 7 DO DECRETO Nº 27.427/2000 DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, QUANTO À FIXAÇÃO DE TARIFA MÁXIMA SOBRE OS SERVIÇOS DE ENERGIA ELÉTRICA E DE TELECOMUNICAÇÕES, POR LESÃO AOS PRINCÍPIOS DA SELETIVIDADE E DA ESSENCIALIDADE, PREVISTOS NO ARTIGO 155, §2º, DA CRFB. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA, TENDO EM VISTA QUE OS PEDIDOS DO AUTOR NÃO FORAM INTEGRALMENTE ACOLHIDOS. CUSTAS PROCESSUAIS RATEADAS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS COMPENSADOS, DE ACORDO COM O ARTIGO 21 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973, VIGENTE À ÉPOCA DA PROPOSITURA DA AÇÃO. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO A AMBAS AS APELAÇÕES. INTEIRO TEOR Íntegra do Acórdão - Data de Julgamento: 06/02/2019 (*) No mesmo sentido, manifesta-se a jurisprudência da Turma Recursal: 0037924-10.2018.8.19.0002 - RECURSO INOMINADO 1ª Ementa Juiz(a) RAQUEL DE OLIVEIRA - Julgamento: 19/12/2018 - TURMA RECURSAL FAZENDARIA EXTRAORDINARIA PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO TURMA RECURSAL EXTRAORDINÁRIA DE FAZENDA PÚBLICA PROCESSO N°: 0037924-10.2018.8.19.0002 RECORRENTE: ESTADO DO RIO DE JANEIRO RECORRIDO: REGINALDO ABRÃO BORGES EMENTA: TRIBUTÁRIO - ICMS - ALÍQUOTA INCIDENTE SOBRE O CONSUMO DE ENERGIA ELÉTRICA - MAJORAÇÃO INTRODUZIDA POR LEI DECLARADA INCONSTITUCIONAL POR VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA SELETIVIDADE TRIBUTÁRIA - JULGAMENTO PELO ÓRGÃO ESPECIAL DE OBSERVÂNCIA OBRIGATÓRIA POR FORÇA DO DISPOSTO NO ARTIGO 103 DO REGIMENTO INTERNO - EXCLUSÃO DE OFÍCIO DA COMINAÇÃO DE MULTA ANTE O DISPOSTO NO ARTIGO 12 DA LEI 12.153/2009 - MANUTENÇÃO DA SENTENÇA - DESPROVIMENTO DO RECURSO RELATÓRIO Trata-se de ação pelo rito especial da Lei 12.153/09, proposta em face do Estado do Rio de Janeiro, por meio da qual a parte autora (EIRELI) afirmou que vem sendo cobrada alíquota superior à devida pelo ICMS incidente sobre o consumo de energia elétrica, o que violaria o princípio da seletividade. Requer a adequação da alíquota a 18%, e repetição de indébito. Indeferimento de tutela de evidência, fls. 62/64. O Ministério Público manifestou seu desinteresse pelo feito, fl. 80. Contestação, fls. 105/124, alega que as decisões apresentadas estabelecem que o ICMS incide sobre o preço final da operação de consumo de energia elétrica, logo, infirmam a tese sustentada pelo autor. No mais, afirma que "a Tarifa de Fornecimento paga pelo consumidor à distribuidora engloba tanto os valores referentes à Tarifa de Energia quanto os valores relativos à Tarifa de Uso dos Sistemas de Distribuição. Mas, independentemente dos rótulos escolhidos pelo agente regulador, o que importa para fins tributários é que tudo isso são apenas componentes do PREÇO pago pelo consumidor para receber a energia elétrica. O preço é a própria Tarifa de Fornecimento, e não uma específica parcela que se queira dela destacar, de forma mais ou menos aleatória ou arbitrária. " Pela sentença de fls. 129/131, o pedido foi julgado procedente para condenar o réu a aplicar a alíquota genérica de 18% prevista na lei e no ICMS, em relação aos serviços de energia elétrica até que sobrevenha legislação que fixe novo percentual, nos termos do artigo 199, § 12º, da Constituição deste Estado, no prazo de 30 dias a contar da intimação presente, sob pena de multa equivalente ao triplo do que vier a ser cobrado em desconformidade com a presente decisão, além da condenação ao pagamento da quantia de R$ 2.897,35 a título de devolução dos valores pagos a maior pelas alíquotas de ICMS, no período de agosto de 2013 a julho de 2018, acrescidos de correção monetária pelo IPCA-E a contar de cada desconto e juros de mora, na forma do art. 1º-F da Lei 9.494/97 a contar da citação, conforme decisão adotada pelo STF no RE 870.947 em regime de Repercussão Geral c/c Enunciado 36 do Aviso Conjunto TJ/COJES 15/2017. Recurso Inominado do ERJ, fls. 147/158, pelo qual pretende a reforma da sentença, alegando que a majoração da alíquota da lei estadual é constitucional, que a seletividade é apenas uma possibilidade, conforme o artigo 155, II, §2º, III, da CR, que a sentença implicou em evidente violação ao princípio da separação dos poderes, que deve ser observada a Suspensão de Segurança 4302/RJ e que a repercussão geral da matéria foi reconhecida pelo STF no julgamento do RE 714.139/SC . Contrarrazões, fls. 167/177. VOTO Cuida-se de recurso interposto contra a sentença pela qual foi reconhecida a inconstitucionalidade da cobrança de alíquota do ICMS incidente sobre a energia elétrica em percentual superior a 18%, além de condenar o ERJ à devolução da diferença recolhida a maior pelo contribuinte. Quanto ao tema da majoração de alíquota, note-se que o Órgão Especial já se manifestou a este respeito em sede de controle difuso nas Arguições de Inconstitucionalidade 0021368-90.2005.8.19.0000 e 0029716-92.2008.8.19.0000, no sentido de afastar a majoração da alíquota incidente sobre o consumo de energia elétrica introduzida pelo artigo 14, VI, alínea "b", da Lei Estadual 2.657/96. Por ocasião do julgamento da Arguição nº 0029716-92.2008.8.19.0000, restou assim estabelecido: Arguição de Inconstitucionalidade, em sede de mandado de segurança. Art. 14, vi, "b", da Lei nº 2.657/96, do Estado do Rio de Janeiro, com a nova redação dada pela Lei 4.683/2005, que fixa em 25% (vinte e cinco por cento) a alíquota máxima de ICMS sobre operações com energia elétrica. Anterior declaração de inconstitucionalidade do art. 14, VI, item 2 e VIII, item 7, do Decreto estadual nº 27.427/2000, regulamentador daquela lei, na Arguição nº 27/2005 julgada pelo Órgão Especial deste eg. Tribunal de Justiça. Lei impugnada que adota idênticos fundamentos do decreto, violando os princípios da seletividade e da essencialidade assegurados no art. 155, § 2º, da Carta Magna de 1988. Procedência da arguição de inconstitucionalidade do art. 14, vi, "b", da Lei 2.657/96, do Estado do Rio de Janeiro. Decisão unânime. (Arguição de Inconstitucionalidade 0029716-92.2008.8.19.0000 - Des. JOSÉ MOTA FILHO - Julgamento: 20/10/2008 - ÓRGÃO ESPECIAL) Isto porque a majoração introduzida pelo comando legal em questão violou o princípio constitucional da seletividade tributária, segundo o qual a alíquota de determinados tributos será inversamente proporcional à essencialidade do bem tributado. Em que pese o argumento de que a CR estabeleceu que a seletividade no ICMS seria apenas uma possibilidade, não uma obrigatoriedade como no caso do IPI, é certo que a norma em questão é desprovida de coerência quando opta por majorar o encargo tributário exatamente sobre energia elétrica, bem evidentemente essencial. Neste sentido: APELAÇÃO CÍVEL. TRIBUTÁRIO E CONSTITUCIONAL. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO. ALÍQUOTA DE ICMS SOBRE SERVIÇO DE ENERGIA ELÉTRICA, NO PERCENTUAL DE 30%. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA SELETIVIDADE E DA ESSENCIALIDADE. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA, DETERMINANDO A APLICAÇÃO DA ALÍQUOTA GENÉRICA DE 18%. IRRESIGNAÇÃO DO ESTADO. 1- Sabe-se que a questão já é conhecida desta Corte, eis que o Órgão Especial, por ocasião do julgamento da Arguição de Inconstitucionalidade nº 27/2005, em acórdão unânime da lavra do eminente Desembargador Roberto Wider, declarou a inconstitucionalidade do art. 14, inciso VI, item 2, e inciso VIII, item 7, do Decreto nº 27.427/2000, ao fixar alíquota de 25% (hoje 30%) sobre os serviços de energia elétrica e telecomunicações, por inobservância dos princípios da seletividade e da essencialidade, previstos no art. 155, § 2º, inciso III, da Constituição Federal, ¿mormente quando estipula alíquotas menores a produtos supérfluos, como bebidas alcoólicas.¿ Por conseguinte, ante o evidente desrespeito à gradação prevista no art. 155, § 2º, III, da CRFB/88, conclui-se irremediavelmente eivado de inconstitucionalidade o artigo 14, VI, item 2, e VIII, item 7, do Decreto nº 27.427, do ano de 2000, do Estado do Rio de Janeiro. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. (Apelação Cível 0287510-84.2008.8.19.0001 - Des. MÁRCIA FERREIRA ALVARENGA - Julgamento: 18/10/2017 - DÉCIMA SÉTIMA CÂMARA CÍVEL) APELAÇÃO. AÇÃO DECLARATÓRIA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO TRIBUTÁRIO. ALÍQUOTA DE ICMS SOBRE FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA E SERVIÇOS DE TELECOMUNICAÇÕES. Alíquota de 25%, prevista no art. 14, VI, b, da Lei estadual n° 2.657/96, e art. 14, VI, 2, e VIII, 7, do Decreto nº. 27.427/2000, incompatível com a norma do art. 155, § 2º, III, da Constituição Federal. No mérito, a questão foi objeto da Arguição de Inconstitucionalidade nº. 2005.017.00027, julgada aos 27.03.2006, tendo o Órgão Especial deste Tribunal de Justiça declarado a inconstitucionalidade dos artigos 14, VI, item 2, e 14, VIII, item 7, do Decreto nº. 27.427/2000, por ofensa aos princípios da seletividade e da essencialidade. Incumbência constitucional do Judiciário, sem ofensa ao princípio da separação dos Poderes (art. 2º da CR/88), de apontar a alíquota aplicável mediante processo de interpretação da lei, tarefa inerente à atividade jurisdicional. Encontra-se no próprio Regulamento do ICMS a alíquota que deve incidir na hipótese, até que o legislador corrija os vícios de inconstitucionalidade apontados pelo Órgão Especial. Aplicação da alíquota genérica de 18% (art. 14, I, Decreto nº. 27.427/2000) e cobrança da alíquota de 5% (cinco por cento) referente ao Fundo de Combate à Pobreza, que se mostram corretas. Precedentes. Prazo prescricional quinquenal. Revisão dos ônus sucumbenciais, dado que a autora resultou vencida em mínima parte. Primeiro apelo a que se nega provimento. Segundo apelo provido. (Apelação Cível 0087453-79.2010.8.19.0001 - Des. JESSÉ TORRES PEREIRA JUNIOR - Julgamento: 18/07/2018 - SEGUNDA CÂMARA CÍVEL) No mais, deve ser assinalado que o julgamento de ambas as arguições de inconstitucionalidade, por força do disposto no artigo 103 do Regimento Interno deste TJERJ, é de observância obrigatória pelos órgãos fracionários desta Corte: APELAÇÃO CÍVEL. REPETIÇÃO DE INDÉBITO TRIBUTÁRIO. ESTADO DO RIO DE JANEIRO. Ação declaratória c/c repetição de indébito, em que persegue a autora a restituição, em dobro, dos valores que excedam a alíquota de 18%, cobrados a título de ICMS, incidente sobre serviços de telefonia, acrescidos de 5% do Adicional relativo ao Fundo de Combate à Pobreza. Sentença de parcial procedência. Inconstitucionalidade da norma que fixou a alíquota de 25% do ICMS incidente sobre os serviços de energia elétrica e telecomunicações (art. 14, VI, item 2 e inciso VIII, item 7 do Decreto Estadual nº 27.427/2000), de há muito reconhecida na Arguição de Inconstitucionalidade nº 27/2005, por inobservância dos princípios da seletividade e da essencialidade, previstos no art. 155, §2º, III, da Constituição Federal. No mesmo sentido, as Arguições de Inconstitucionalidade nos 0029716-92.2008.8.19.0000 (antigo nº 2008.017.00021) e 0046584-48.2008.8.19.0000, as quais também reconheceram a inconstitucionalidade da alíquota máxima de 25% (vinte e cinco por cento) de ICMS sobre operações com energia elétrica. Decisão impositiva para todos os órgãos fracionários deste E. Tribunal de Justiça, a teor do disposto no art. 103 do Regimento Interno e do artigo 927, V, do CPC/2015, a ensejar a aplicação da alíquota genérica de 18% (dezoito por cento), prevista no inciso I, do art. 14, da Lei Estadual nº 2.657/96, e no inciso I, do art. 14, do Decreto Estadual nº 27.427/00, em virtude da ausência de norma específica. Precedentes desta E. Corte e Câmara. Sentença mantida. Desprovimento do recurso. (Apelação Cível 0049214-40.2009.8.19.0001 - Des. MARIA INÊS DA PENHA GASPAR - Julgamento: 06/06/2018 - VIGÉSIMA CÂMARA CÍVEL) Quanto ao Recurso Extraordinário 714.139/SC, referido nas razões recursais às fls. 139/140, vale ressaltar que a suspensão teve alcance estrito, conforme esclarecimento prestado pelo próprio Ministro Relator ao indeferir o pedido do ERJ, naqueles autos, em 17/08/2016. Contudo, a sentença merece pequena retificação de ofício no que tange à fixação da multa cominatória, que deve ser excluída da condenação ante o disposto no artigo 12 da Lei 12.153/2009. Assim, VOTO PELO CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO, mantida a sentença por seus fundamentos e os acima lançados, com uma retificação de ofício apenas para excluir a multa cominatória, ante o disposto no art.12, da Lei 12.153/2009. Sem custas pela isenção legal. Honorários pelo recorrente fixados em R$ 500,00 (quinhentos reais), nos termos do art.85, §3º, do CPC. Quanto à repetição do indébito, os juros e correção serão apurados com base no Enunciado 37 do COJES. Desta forma, VOTO pelo CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO INOMINADO. Sem custas, tendo em vista a isenção legal. Condeno o recorrente ao pagamento de honorários advocatícios, ora fixados em 10% do valor da condenação. Rio de janeiro, 25 de março de 2021. Cristiana Aparecida de Souza Santos Juíza Relatora
RECURSO INOMINADO 0172185-75.2019.8.19.0001
Segunda Turma Recursal Fazendária
Juiz(a) CRISTIANA APARECIDA DE SOUZA SANTOS - Julg: 26/03/2021
Ementa número 3
SALVO-CONDUTO
PLANTIO DE CANNABIS SATIVA
DOMICÍLIO
DIREITO À VIDA E À SAÚDE
CONDIÇÕES IMPOSTAS
CONCESSÃO
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO nº 0026013-88.2020.8.19.0209 Recorrente: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO Recorrida: XXXX Relatora: Juíza de Direito DANIELA BARBOSA ASSUMPÇÃO DE SOUZA Habeas corpus preventivo - salvo conduto - ordem concedida para impedir ameaça de prisão em flagrante em virtude de plantio de cannabis sativa para extração de óleo de canabidiol para fins terapêuticos. Imputação prévia da conduta prevista no art. 28, §1º, da Lei 11343/2006 enseja a concessão da ordem preventiva. Hipótese adstrita ao subjetivismo da autoridade persecutória. Ameaça contra a liberdade de locomoção evidenciada, além de eventual apreensão das plantas de cannabis sativa, circunstância que interrompe o tratamento dos filhos menores da paciente. Competência da Justiça Estadual e do Juizado Especial Criminal. Ausência de nulidade. Prevalência dos direitos fundamentais à vida e à saúde. Possibilidade de pessoa física cultivar cannabis para extração de óleo com finalidade terapêutica sem que se configure crime previsto na Lei 11.343/2006. Silêncio eloquente suprido. Sentença mantida e acrescida apenas de condições para a validade do salvo-conduto. Recurso em sentido estrito que devolve toda a matéria a reexame. Necessidade de controle quanto à produção e qualidade do óleo extraído da planta de cannabis, por laboratório especializado da UFRJ. Proteção à própria paciente e a seus filhos menores. Ausência de prejuízo à paciente. Recurso desprovido. A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso em Sentido Estrito nº 0026013-88.2020.8.19.0209, contra a sentença de fls. 83, oriunda do IV Juizado Especial Criminal da Barra da Tijuca, em que é recorrente o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO e recorrida, XXXX. A C O R D A M os Juízes de Direito da Segunda Turma Recursal Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, em votação unânime, NEGAR PROVIMENTO ao recurso, adequando, no entanto, a sentença de fls. 83, nos termos do voto da Relatora. R E L A T Ó R I O Recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público em atuação junto ao IV Juizado Especial Criminal da Barra da Tijuca, na forma do art. 581, X, do CPP c/c art. 92, da Lei 9099/95, às fls. 102. Requer, preliminarmente, o reconhecimento da ausência do interesse de agir, uma vez que o habeas corpus tem suas hipóteses de incidência circunscritas aos casos de lesão ou perigo de lesão à liberdade ambulatorial, ao contrário do crime previsto no artigo 28 da Lei nº 11.343/06, isso porque o preceito secundário do tipo incriminador não prevê pena de prisão, inexistindo a possibilidade de constrição da liberdade do indivíduo. No mérito, pugna pela reforma da sentença de fls. 83, aduzindo a proibição da conduta típica, que proíbe o consumo pessoal, independentemente de sua finalidade terapêutica ou recreativa; da impossibilidade de superação da norma proibitiva ante o alegado direito à saúde; e, por fim, aduz que não se trata de mora da União ou da ANVISA, mas sim, de "silêncio eloquente", ou seja, ao legislar sobre a matéria deixou-se deliberadamente de fora a possibilidade de pessoas físicas serem produtoras de cannabis. O dispositivo da decisão impugnada está assim consignado: "Diante do exposto, defiro o pedido e CONCEDO SALVO-CONDUTO em favor de XXXXX a fim de que as autoridades coatoras sejam impedidas de proceder à prisão em flagrante da paciente pela produção artesanal de 30 plantas da Cannabis Sativa, por cada quadrimestre do ano, para fins estritamente medicinais, bem como fiquem impedidas de apreenderem as mudas das plantas utilizadas para o tratamento de seus três filhos menores." (grifei). Em contrarrazões, conforme fls. 124, a impetrante pugna pela manutenção da sentença e desprovimento do recurso em sentido estrito, aduzindo que a conduta é atípica, pois não visa ao consumo pessoal, mas sim preservar a saúde, bem juridicamente tutelado, dos seus três filhos autistas, cuja interrupção do tratamento pode conduzir à morte. Além disso, afirma que é estudante de Farmácia, tem conhecimento sobre o método de produção do óleo, que é fabricado em ambiente próprio, a um custo infinitamente menor do que o mesmo produto quando importado. O Ministério Público em atuação perante esta Turma Recursal suscita, preliminarmente, a nulidade absoluta do processo em razão da incompetência da Justiça Estadual e do Juizado Especial Criminal para o julgamento da matéria, uma vez que a conduta da impetrante se amoldaria, em tese, ao crime de maior potencial ofensivo encartado no art. 33, §1º, II, da Lei 11.343/06. Alternativamente, pugna pelo conhecimento do recurso e, no mérito, oficia pela manutenção da decisão, aperfeiçoada com determinadas condições que permitam o controle da produção e consumo do óleo de canabidiol, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. V O T O 1. Juízo de admissibilidade do recurso Inicialmente, verifica-se que estão presentes os pressupostos recursais objetivos e subjetivos do recurso, uma vez que o mencionado meio processual de impugnação tem previsão legal (art. art. 581, inciso X, do CPP); observou as formalidades legais (art. 578 do CPP); é tempestivo (art. 586, do CPP); o recorrente é parte legítima e também está presente o interesse recursal (art. 577 do CPP). Além disso, não há causas impeditivas ou extintivas do direito de recorrer. Posto isso, CONHECE-SE do recurso e, como consequência, passa-se à análise do seu mérito. 2. Do exame da Preliminares Recurso em sentido estrito de decisão de mérito que concedeu ordem de Habeas Corpus, interposto na forma do art. 581, X, do CPP. Vale consignar, primeiramente, que, muito embora a juíza que recebeu o recurso, fls. 120, não tenha realizado o juízo de retratação, como determina o art. 589, do Diploma Processual, a questão deve ser superada, sem o reconhecimento de prejuízo ao recorrente que, inclusive, não arguiu a ausência do juízo de retratação pelo órgão a quo. Conforme a mais recente jurisprudência do STJ, a omissão apontada não passa de mera irregularidade: Ao interpretar o artigo 589 do Código de Processo Penal, esta Corte Superior de Justiça firmou o entendimento de que a inexistência de pronunciamento do magistrado quanto à manutenção ou não da decisão impugnada por meio de recurso em sentido estrito configura mera irregularidade. Precedentes. 2. Na espécie, conquanto os autos tenham ascendido ao Tribunal de origem sem que o togado tenha realizado o juízo de retratação da decisão de pronúncia, não há dúvidas de que a inobservância de tal formalidade não acarretou quaisquer prejuízos à defesa, uma vez que o recurso em sentido estrito já foi julgado, tendo os indícios de autoria e a materialidade do delito imputado ao paciente sido novamente examinados, não havendo motivos para que o processo seja anulado a fim de que haja novo pronunciamento judicial sobre tais questões, que foram alvo de análise fundamentada na provisional e no aresto objurgado" (HC 369.297/RS, j. 29/10/2016). (grifei). Em relação às preliminares arguidas pelo Ministério Público, tanto perante o Juízo de origem, quanto perante esta Turma Recursal, o exame destas não aponta para a nulidade deste processo. Assim vejamos. De acordo com a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a competência para julgar pedido de habeas corpus preventivo em favor de quem planta, transporta ou usa maconha (Cannabis sativa L) para fins terapêuticos, dependerá das autoridades apontadas como coatoras que, in casu, é a Autoridade Policial Estadual, definindo-se, assim, a competência da Justiça Estadual para julgamento do habeas corpus. Assim: CONFLITO DE COMPETÊNCIA. HABEAS CORPUS PREVENTIVO. PEDIDO DE SALVO CONDUTO PARA CULTIVO, USO, PORTE E PRODUÇÃO ARTESANAL DA CANNABIS (MACONHA) PARA FINS MEDICINAIS. ALEGAÇÃO DE JUSTO RECEIO DE SOFRER RESTRIÇÃO NO DIREITO DE IR E VIR. NARRATIVA QUE APONTA A POSSIBILIDADE DE AUTORIDADES POLICIAIS DO ESTADO DE SÃO PAULO PRATICAREM COAÇÃO CONTRA A LIBERDADE DEAMBULATORIAL DOS PACIENTES. AUSÊNCIA DE PEDIDO DE SALVO CONDUTO PARA IMPORTAÇÃO DA PLANTA OU DE QUALQUER OUTRA CONDUTA TRANSNACIONAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. 1. O presente conflito de competência deve ser conhecido, por se tratar de incidente instaurado entre juízos vinculados a Tribunais distintos, nos termos do art. 105, inciso I, alínea d, da Constituição Federal - CF. 2. O núcleo da controvérsia consiste em definir a competência para prestar jurisdição na hipótese habeas corpus preventivo para viabilizar o plantio de maconha para fins medicinais. Os impetrantes objetivam ordem de salvo conduto para que os pacientes possam cultivar artesanalmente a planta Canabis Sativa L, bem como usá-la e portá-la dentro do território nacional para fins terapêuticos 3. Da leitura da inicial do habeas corpus impetrado em favor dos pacientes extrai-se que autoridades estaduais foram apontadas como coatoras, quais sejam: o Delegado Geral da Polícia Civil de São Paulo e o Comandante Geral da Polícia Militar de São Paulo. Destarte, as autoridades estaduais apontadas como coatoras, por si só, já definem a competência do primeiro grau da Justiça Estadual. 4. Ademais, o salvo conduto pleiteado pelo impetrante diz respeito ao cultivo, uso, porte e produção artesanal da Cannabis, bem como porte ainda que em outra unidade da federação. Nesse contexto, o argumento do Juízo de Direito Suscitado de que os pacientes teriam inexoravelmente que importar a Cannabis permanece no campo das ilações e conjecturas. Em outras palavras, não cabe ao magistrado corrigir ou fazer acréscimos ao pedido dos impetrantes, mas tão somente prestar jurisdição quando os pedidos formulados estão abarcados na sua competência. Em resumo, não há pedido de importação a justificar a competência da Justiça Federal, consequentemente, não há motivo para supor que o Juízo Estadual teria que se pronunciar acerca de autorização para a importação da planta invadindo competência da Justiça Federal. Ademais, a existência de uso medicinal da Cannabis no território pátrio de forma legal, em razão de salvos condutos concedidos pelo Poder Judiciário, demonstra a possibilidade de aquisição da planta dentro do território nacional, sem necessidade de recorrer à importação. 5. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça - STJ é firme quanto à necessidade de demonstração de internacionalidade da conduta do agente para reconhecimento da competência da Justiça Federal, o que não se identifica no caso concreto. Frise-se ainda que o tráfico interestadual não tem o condão de deslocar a competência para a Justiça Federal Precedentes. 6. Conflito conhecido para declarar a competência da Justiça Estadual. O habeas corpus, portanto, foi impetrado perante a Justiça competente. O representante do Parquet em atuação perante o primeiro grau, aduziu que a conduta estaria amoldada ao delito previsto no art. 28, § 1º, da Lei 11343/2006, sendo incabível a impetração do habeas corpus, uma vez que não haveria ameaça à liberdade de locomoção da impetrante. O Ministério Público em atuação perante esta Turma Recursal, por sua vez, salientou, que os fatos narrados na inicial do writ envolvem a conduta típica descrita no art. 33, §1º, II, da Lei 11.343/06, e não, a do art. 28, §1º, desse diploma legal, já que a impetrante planta, cultiva e colhe cannabis sativa L. para consumo dos seus três filhos, na forma de óleo de cannabis e não para uso próprio. Portanto, tratando-se da possível prática de infração penal de maior potencial ofensivo, a competência para processar e julgar o HC em estudo seria de alguma das varas criminais do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Contudo, as preliminares arguidas pelos representantes do Ministério Público, nas duas instâncias, não devem prosperar. Isso porque, não se deve olvidar que se cuida de pedido de salvo conduto, ou seja, de caráter preventivo, não sendo possível, desde já, fixar a hipótese típica que dependerá, no caso concreto, da avaliação subjetiva da autoridade persecutória. Nessa toada, a depender da cognição da mencionada autoridade, poderia constituir hipótese de lavratura de termo circunstanciado (art. 28, §1º, da Lei 11343/2006) ou de flagrante delito (art. 33, §1º, II, da Lei 11343/2006), como, aliás, se deu no presente caso, em que a Autoridade Policial, e o Promotor de Justiça que oficia perante à primeira instância, entenderam pela configuração de crime de menor potencial ofensivo, ao passo que o Ministério Público em atuação nesta Turma Recursal se manifestou pela prática de crime de maior potencial ofensivo. Assim, o fato de o art. 28, §1º, da Lei de Drogas não prever pena de prisão não torna incabível a impetração do habeas corpus. O direito à liberdade de locomoção da paciente encontra-se ameaçado, uma vez que, como bem aduziu o Ministério Público em atuação perante esta Turma Recursal, a subjetividade da análise da autoridade persecutória, diante do caso concreto, poderá concluir pela suposta prática de crime mais gravoso, ensejando a prisão em flagrante da paciente. Além disso, mesmo no caso previsto no art. 28, §1º, da Lei 11343/2006, a paciente não estará livre de ser conduzida coercitivamente à delegacia de polícia para lavratura de termo circunstanciado e de ter as plantas apreendidas. Tal fato justifica a impetração do habeas corpus, como salvo conduto para evitar a ameaça de deslocamento coercitivo e de autuação pela prática de crime, ainda que não se trate de delito que enseje prisão. Por fim, forçoso concluir que a semeadura descrita no art. 33, §1º, II, da Lei de Drogas, está vinculada diretamente ao caput, do art. 33, que tipifica a conduta do tráfico ilícito de drogas, não se podendo, diante da situação posta, bem como da farta documentação acostada aos autos, verificando-se, em tese, não se tratar de salvo conduto para a prática do crime de tráfico ilícito de drogas, deslocar-se a competência. Dessa forma, superadas as preliminares suscitadas, passo ao exame do mérito. 2. Do mérito recursal Recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público estadual, inconformado com a sentença de fls. 83/87, que concedeu a ordem de salvo conduto pretendida por XXXXX, a fim de que as autoridades coatoras sejam impedidas de proceder à prisão em flagrante da paciente pela produção artesanal de 30 plantas da espécie Cannabis Sativa L., por cada quadrimestre do ano, objetivando a confecção artesanal de óleo de canabidiol (CBD), necessário ao tratamento medicinal de seus três filhos, XXX, XXX e XXX, todos portadores de transtorno do espectro autista. O salvo-conduto foi concedido com prazo de validade até 30/09/2022 e o plantio deveria ocorrer no apartamento da paciente, no espaço destinado para tal fim, conforme informado nos autos. A paciente é mãe de três filhos menores, XXX (10 anos), XXX(5 anos) e XXX (3 anos), todos portadores de autismo (transtorno de espectro autista), sendo certo que nenhum deles respondendo aos tratamentos convencionais ministrados, também não sendo candidatos à tratamento cirúrgico, conforme laudos médicos acostados aos autos. Os autos trazem farta documentação comprobatória do estado clínico das crianças, bem como laudos indicando que os menores iniciaram tratamento com farmacoterapêutico à base de CBD (com baixa concentração de tetra-hidrocanabinol - THC), tendo uma evolução significativa na qualidade de vida, redução das crises de autoagressividade e significativa melhora na fala e na interação social, por orientação de quatro médicos distintos, a saber, Dr. Eduardo de Sá Campello Faveret - neuropediatra e epileptologista, CRM-RJ 52.50944-6; Dr. Paulo Tomaz Fleury Teixeira - médico preventivo terapeuta canábico, CRM-MG 19.994; Dra. Lislie Abram - psiquiatra, CRM-RJ 52.98735-2; e Dr. José Mauro Gomes Ferreira, CRM-RJ 52.29799-5, conforme documentos contidos no index, 27 dos autos. Por sua contundência, reconhecida pelo Ministério Público em sua manifestação, vale também reproduzir trechos dos mencionados laudos médicos acostados aos autos eletrônicos, assim vejamos: XXX Já faz uso de óleo de cannabis há quatro anos, tendo "apresentado acentuada melhora comportamental e cognitiva, após o início do uso de óleo de cannabis (rico em canabidiol e baixa concentração de THC)". "O tratamento com canabinóides resultou em grande melhora sob o aspecto psico-comportamental, com eliminação dos casos de auto agressividade e significativo desenvolvimento da fala, cognição e interação social" "O tratamento resultou em grande melhora no comportamento, diminuindo agressividade e significativo desenvolvimento de fala, cognição e interação social". (index 27). XXX "Com o uso de cannabis, iniciado há 1 ano e 11 meses, houve melhora significativa em fala, (ilegível) e controle de crises/comportamentos autoagressivos". (index 27). XXX "Aos 12 meses iniciou uso de canabinóides devido a atraso no desenvolvimento da fala e surgimento de autoagressividade. Desde então, apresentou redução bastante significativa da hiperatividade, estereotipias e fim da autoagressividade. Houve também grande desenvolvimento da fala/autonomia do paciente." (index 47). (grifei) Diante da ineficácia do tratamento tradicional, a prescrição de óleo rico em canabidiol pelos profissionais médicos acima relacionados, foi a causa eficiente da excepcional melhora no quadro médico dos filhos da paciente, inclusive do desempenho escolar, o que resta indubitavelmente comprovado nos autos, (index 27). Em razão disso, inclusive, a ANVISA, que havia retirado o produto da lista das substâncias proibidas, conforme nota técnica 093/015, incluindo-o no rol das substâncias controladas, autorizou (documento index 27) a importação do óleo de canabidiol para as três crianças, tendo a paciente, inclusive, obtido o custeio do tratamento de um de seus filhos pelo Poder Público. Não obstante, a paciente continuava a encontrar graves dificuldades para obter o produto, em razão da demorada burocracia no desembaraço aduaneiro, sendo certo que a ANVISA veda a importação pela via postal, ante a elevada cotação do dólar, além dos impostos e taxas de envio. A própria ANVISA ressalta, na nota, a morosidade e burocracia no processo de importação do CBD, o que leva a atrasos no tratamento, gerando piora do prognóstico do paciente. Em razão de todas as dificuldades narradas e custos necessários, o tratamento dos três filhos, segundo a paciente, girava em torno de R$200.000,00 (duzentos mil reais), o que praticamente inviabilizava a importação para os seus outros dois filhos, (uma vez que um deles tinha o tratamento custeado pelo Erário) circunstâncias que comprometiam o prosseguimento do exitoso tratamento. Frise-se, ainda, que mencionada nota técnica prevê que o pedido para importação do CBD, um dos componentes não psicoativos da cannabis sativa, deve estar acompanhado da prescrição médica, sendo permitida somente para uso pessoal, por pessoa física previamente cadastrada além de laudo de profissional legalmente habilitado contendo a descrição do caso, código internacional de doenças (CID), justificativa para a utilização de produto não registrado no Brasil em comparação com as alternativas terapêuticas já existentes registradas pela ANVISA, bem como os tratamentos anteriores. Verifica-se que os órgãos responsáveis adotam todas as providências necessárias, para garantir que a importação da substância só possa ocorrer para fins medicinais e quando comprovadamente justificada a necessidade, inclusive, da não eficácia dos demais tratamentos autorizados. Há, portanto, evidente confronto entre o direito à saúde dos filhos da paciente e a omissão do Estado na elaboração de norma jurídica que regulamente a produção artesanal do óleo de cannabis por particulares, para fins medicinais, não suprindo a autorização da ANVISA, na prática, a necessidade de quem precisa fazer uso contínuo do óleo de canabidiol, em razão da demora excessiva no recebimento e do alto custo para importação do produto. A Constituição Federal, no artigo 196, prevê que o direito à saúde é obrigação do Estado, ao declarar que: "A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos e ao acesso universal, igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação". (grifei) Da mesma forma, no seu artigo 6º, a Constituição consolida o direito à saúde como obrigação do Estado, e no seu art. 197, dispõe que: "São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado." Nessa toada, não se deve olvidar que a efetivação do direito à saúde é imprescindível para a concretização do princípio da dignidade da pessoa humana positivado no artigo 1º, III, da CRFB. Assim, ao buscar o Judiciário, por meio do remédio constitucional do habeas corpus preventivo, a paciente pretende tão somente efetivar o direito à saúde de seus próprios filhos, garantindo aos mesmos a continuidade do tratamento que reduz os efeitos danosos do autismo, a permitir, assim, que possam ter uma melhor qualidade de vida e não corram riscos de danos mais graves à saúde em decorrência do transtorno que os acomete. Aliás, este é o direito inalienável de qualquer mãe, não sendo absurdo, muito ao contrário, o entendimento que autorizasse reconhecer que sua conduta, em face de uma eventual atuação estatal, estaria acobertada pela causa excludente da antijuridicidade do estado de necessidade justificante, prevista nos artigos, 23, I e 24, do Código Penal. Diversos estudos demonstram os efeitos positivos da utilização de canabinoides para o tratamento de doenças graves, como Parkinson, esquizofrenia, Alzheimer, esclerose múltipla, artrite reumatoide e epilepsia, muito embora ainda não exista no Brasil regulamentação sobre o cultivo da planta exclusivamente para uso medicinal. No Brasil, o Conselho Federal de Medicina, através da Resolução CFM 2.113/14, publicada no Diário Oficial da União de 16 de dezembro de 2014, seção I, p. 183, aprovou o uso compassivo do canabidiol para o tratamento de epilepsias em crianças e adolescentes resistentes aos tratamentos convencionais. A magistrada de primeiro grau, na sentença concessiva da ordem de habeas corpus, observou bem as garantias constitucionais à saúde, à vida e à dignidade da pessoa humana, reconhecendo como pressuposto ao pedido, a possibilidade de plantio da cannabis sativa para extração do CDB, unicamente com finalidade terapêutica. Nesse ponto, a própria Legislação em vigor, através do art. 2º, parágrafo único, da Lei 11.343/06, prevê a possibilidade de autorização pela União para a plantação, cultura e colheita de vegetais dos quais possam ser extraídas ou produzidas drogas, com finalidade exclusiva medicinal e científica. Não procede, assim, diante do exposto, o argumento recursal do silêncio eloquente. Ora, como ensina Renato Brasileiro de Lima, "o legislador não pode prever todas as situações que poderiam ocorrer na vida em sociedade e que seriam similares àquelas por ele já elencadas" (Código de processo penal comentado, Juspodivm, 2016, p. 32). Contudo, uma vez submetido o fato ao Poder Judiciário, não pode ser negada a jurisdição, cabendo ao juiz aplicar a Lei ao caso concreto, buscando sempre atender aos fins sociais e às exigências do bem comum, procedendo, para tanto, à integração das normas, na forma do artigo 140, no NCPC c/c artigo 3º do CPP c/c art. 4º, da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro. Vejamos: Art. 140 do NCPC - O juiz não se exime de decidir sob a alegação de lacuna ou obscuridade do ordenamento jurídico. Art. 3o do CPP - A lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de direito. O art. 4º da Lei de Introdução - Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito" (Decreto-lei n. 4.657/1942). Assim, segundo, ainda, os ensinamentos de Renato Brasileiro de Lima, o argumento ministerial não pode prosperar, uma vez que ao "juiz não é dado deixar de julgar determinada demanda sob o argumento de que não há norma expressa regulamentando-a, há de fazer uso dos métodos de integração, dentre eles a analogia, com o objetivo de suprir eventuais lacunas encontradas no ordenamento jurídico" (Código de processo penal comentado, Juspodivm, 2016, p. 31-32). Por fim, não deve haver óbice à possibilidade da paciente, pessoa física, produzir, artesanalmente, óleo de cannabis, garantindo, assim, o direito constitucional dos seus filhos, portadores de transtorno do espectro autista, à saúde, ao usarem medicamento ou produto farmacoterapêutico à base de canabidiol e THC, ainda mais porque prescrito pelos médicos que os assistem e atestam os resultados positivos de sua utilização, melhorando sobremaneira a qualidade de vida das crianças e, por conseguinte, de seus familiares, diretamente atingidos com os transtornos, dificuldades de aprendizagem e agressividade manifestados pelos filhos autistas, em razão da síndrome que os acomete e que pode ser tratada e amenizada na forma ora analisada. Nessa toada, a paciente obteve judicialmente ordem de salvo conduto a fim de que fosse vedada a sua prisão em flagrante em virtude da eventual apreensão de plantação da planta de cannabis sativa L. em sua residência, o que impediria a continuidade do tratamento médico de seus filhos, grave prejuízo aos mesmos e, por conseguinte, a violação dos dispositivos constitucionais acima mencionados. A ordem deve ser mantida por seus próprios fundamentos. No entanto, como bem acentuou o Ministério Público em atuação perante esta Turma, é preciso que o farmacoterapêutico objeto desta demanda, em virtude de suas peculiaridades, esteja sujeito ao controle das autoridades públicas brasileiras. Embora o promotor de justiça em atuação junto ao 1º grau não tenha efetivamente suscitado essa omissão no seu recurso, certo é que, ao impugnar a sentença como um todo, pugnando por sua reforma, trouxe a esta Turma Recursal o debate sobre o mérito do ato impugnado em sentido amplo, devolvendo a matéria integralmente para reexame. Dessa forma, considerando que o aperfeiçoamento da sentença não implica qualquer prejuízo à paciente, mas, ao contrário, lhe dá garantias, e a seus filhos, quanto à correta produção e utilização do óleo de canabidiol, entendo que as recomendações do i. representante do Parquet em atuação junto à 2ª instância podem ser incorporadas à decisão, não se configurando julgamento extra-petita. Nesse sentido, acolho a promoção do Ministério Público para aperfeiçoar a decisão de mérito em Habeas Corpus, proferida pela primeira instância, visando à segurança jurídica da paciente e da sociedade, a fim de que o plantio e extração do óleo de canabidiol seja submetido ao controle da Universidade Federal do Rio de Janeiro, por meio de seu Laboratório de Análises Tóxicas (LATOX) e do Projeto Farmacannabis, com a finalidade de monitorar a terapia com cannabis, com foco na avaliação de segurança e suporte farmacêutico aos três pacientes. Consigno que, ao analisar o presente caso, tive acesso ao Projeto Farmacannabis por meio do endereço virtual, http://www.farmacia.ufrj.br/latox/PDFs/ProtocAdesaoFarmacannabis.pdf, onde a paciente poderá obter informações sobre os requisitos para a sua adesão. Ante o exposto, a decisão de mérito prolatada em Habeas Corpus deverá ser acrescida das condições impostas pelo Ministério Público, cujo cumprimento será condição essencial para que o salvo conduto possa surtir os seus regulares efeitos. Assim, mantenho a guerreada decisão em seus demais termos, que deverá ser acrescida das seguintes condições: "... Sendo assim, defiro o pedido LIMINAR e CONCEDO SALVO-CONDUTO em favor de XXX a fim de que os agentes da Lei sejam impedidos de proceder à prisão em flagrante da paciente, pela produção artesanal de 30 plantas de Cannabis Sativa L., por quadrimestre, para fins estritamente medicinais, bem como de apreenderem as mudas das plantas, utilizadas exclusivamente para o tratamento dos filhos da paciente. Por outro lado, deverá a paciente, assim proceder: 1 - A paciente (ou por procurador com poderes especiais), deverá entregar os óleos de cannabis produzidos, artesanalmente, pessoalmente ao Laboratório de Análises Toxicológicas (LATOX) da Universidade Federal Fluminense, a fim de o projeto FarmaCannabis proceda à avaliação técnica do medicamento, sendo vedado o envio por outra forma, apresentando-se os laudos ao juízo de 1º grau durante o prazo de validade do salvo-conduto estipulado na decisão; 2 - O material vegetal e os produtos dele derivados devem ser empregados, exclusivamente, no tratamento individual dos menores XXX, XXX e XXX; 3 - Não pode haver distribuição das plantas de cannabis sativa L., tampouco dos óleos medicinais dela derivados, para terceiros, por qualquer meio, sejam pessoas físicas, associações sem fins lucrativos ou sociedades comerciais de
qualquer tipo; 4 - Fica impedida a publicização das atividades do laboratório sem autorização prévia, por escrito, da docente responsável; 5 - O plantio, cultivo e colheita de cannabis sativa L. em quantidade superior à ora estabelecida, trinta plantas de cannabis sativa L. por cada quadrimestre do ano, implicará em descumprimento deste Salvo-Conduto e responsabilidade penal da impetrante, sem prejuízo de responsabilização em outras esferas. Expeça-se o salvo-conduto. ...". Assim sendo, VOTO no sentido de CONHECER do recurso, e, no mérito, NEGAR-LHE PROVIMENTO, ficando mantida a decisão de mérito recorrida em seus demais termos, acrescida das condições acima elencadas. Oficie-se à Universidade Federal do Rio de Janeiro, por meio de seu Laboratório de Análises Tóxicas (LATOX) e do Projeto Farmacannabis sobre o teor da presente, com cópia integral. A paciente deverá comprovar a adesão ao Projeto Farmacannabis no prazo máximo de 15 dias, oficiando-se ao Juízo de primeiro grau. Rio de Janeiro, 12 de março de 2021. DANIELA BARBOSA ASSUMPÇÃO DE SOUZA Juíza Relatora ESTADO DO RIO DE JANEIRO-PODER JUDICIÁRIO CONSELHO RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS SEGUNDA TURMA RECURSAL CRIMINAL 20
APELAÇÃO CRIMINAL 0026013-88.2020.8.19.0209
CAPITAL 2a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CRIMINAIS
Juiz(a) DANIELA BARBOSA ASSUMPCAO DE SOUZA - Julg: 24/03/2021
Ementa número 4
PARTIDO POLITICO
DIFAMAÇÃO
QUEIXA-CRIME REJEITADA
ATIPICIDADE
Conselho Recursal 2ª. Turma Recursal Criminal Processo nº. 0030669-88.2020.8.19.0209 Apelante: PARTIDO SOCIALISMO E LIBERDADE - PSOL. Apelado: CARLOS NANTES BOLSONARO. Juiz Relator: JOÃO CARLOS DE SOUZA CORRÊA R E L A T Ó R I O Vistos etc... Trata-se de RECURSO DE APELAÇÃO interposto pelo apelante PARTIDO SOCIALISMO E LIBERDADE - PSOL, contra sentença de fls. 145/146, que rejeitou a queixa-crime, por entender atípica a conduta do apelado, com lastro no artigo 395, inciso II do Código de Processo Penal, eis que para a configuração do crime de difamação é necessário que seja imputado um fato certo e determinado, delimitado no tempo e no espaço. Em suas razões de apelação de fls. 169/183, o apelante requer a reforma da sentença e o prosseguimento da ação, aduzindo que a conduta do apelado é típica, visto que, ao contrário do fundamentado na sentença, é imputado ao apelante um fato específico, qual seja, o atentado à facada contra o então candidato à Presidência, Sr. Jair Bolsonaro, imputando assim ao apelante a participação neste episódio. Em suas contrarrazões de fls. 200/208, o apelado pugna pelo improvimento do recurso e a condenação do apelante em honorários sucumbenciais, nos termos do artigo 85, §§ 2º e 8º, do Código de Processo Civil. O Ministério Público em seu parecer de fls. 214/217 opinou pelo recebimento e não provimento do recurso, o que foi reiterado pelo Parquet em atuação nesta Turma Recursal. V O T O Conheço do recurso, eis que presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos para sua admissibilidade. O apelante ajuizou queixa-crime requerendo a condenação do apelado CARLOS NANTES BOLSONARO nas sanções previstas no artigo 139 do Código Penal, isto porque, em sua rede social do twitter, postou a seguinte mensagem: "CONFERE? Precisa desenhar ainda tudo que está acontecendo???? O desespero bate na bunda do piçou, a linha auxiliar do PT e 'adversário' conivente do PSDB. O problema é que no sentido real vão gostar ..." A sentença do Juiz a quo deve ser mantida, eis que na postagem não restou tipificado o crime de difamação, visto que nela não há fato certo e determinado, delimitado no tempo e no espaço, conforme entendimento pacífico da jurisprudência. "AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CRIMES CONTRA A HONRA. REJEIÇÃO DE QUEIXA-CRIME. ACUSAÇÃO GENÉRICA. AUSÊNCIA DE IMPUTAÇÃO DE FATO CERTO E DETERMINADO. REVOLVIMENTO DE MATÉRIA FÁTICA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7 DO STJ. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. Os crimes de calúnia e difamação exigem, para sua ocorrência, a imputação de fato certo e determinado, narrado especificamente em determinadas condições de tempo e lugar. 2. Para rever o entendimento das instâncias ordinárias, seria necessário o revolvimento do acervo fático-probatório, o que é vedado pelo óbice da Súmula n. 7 do STJ. 3. Ausentes fatos novos ou teses jurídicas diversas que permitam a análise do caso sob outro enfoque, deve ser mantida a decisão agravada. 3. Agravo regimental não provido. (grifamos) (STJ - AgRg no AREsp: 1422649 DF 2018/0347266-0, Relator: Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Data de Julgamento: 09/06/2020, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 18/06/2020) Por outro lado, não se pode, como quer o apelante, admitir-se a construção de ilações para se chegar a fato que não está escrito na postagem, quando deseja vincular a postagem do atentado ao então candidato à Presidência da República, Sr. Jair Bolsonaro. Sendo certo que imputações vagas, imprecisas ou indefinidas não possuem o condão de caracterizar o delito de difamação, devendo ser ressaltado que fatos ofensivos, mesmo que gravosos, não configuram o crime de difamação, quando não descrevem fato certo e determinado, podendo-se, contudo, eventualmente, restar caracterizado o crime de injúria. Neste giro, ocorre que como se trata de querelante pessoa jurídica, passível de violação somente a sua honra objetiva, resta também afastada a responsabilidade criminal pelo crime de injúria, podendo, entretanto, caso queira, buscar o apelante reparação a sua imagem ou reputação na seara cível. Desta forma, a rejeição da queixa-crime deve ser mantida ainda pelos fundamentos expostos na sentença, aos quais me reporto, em consonância com a decisão do Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal, que reconheceu a repercussão geral do tema contido no RE 635.729, reafirmando a Jurisprudência da referida Corte no sentido de que a invocação dos fundamentos da sentença do juízo a quo, como razões de decidir, não afronta o art. 93, inciso IX, da Constituição Federal, o que pode ser constatado pelo aresto que se segue, ipsis litteris: "Ementa Juizado Especial. Parágrafo 5º do art. 82 da Lei nº 9.099/95. Ausência de fundamento. Artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal. Não ocorrência. Possibilidade de o colégio recursal fazer remissão aos fundamentos adotados na sentença. Jurisprudência pacificada na Corte. Matéria com repercussão geral. Reafirmação da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal" (RE 635729 RG/SP - São Paulo, Repercussão Geral no Recurso Extraordinário, Relator Ministro Dias Toffoli, Julgamento: 30/06/2011). Condeno o apelante ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, estes no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), o que faço com amparo no artigo 85, §§ 2º e 8º, do Código de Processo Civil c/c art. 3º do Código de Processo Penal. ISTO POSTO, voto no sentido de CONHECER e NEGAR PROVIMENTO ao recurso de apelação interposto, condenando o apelante ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, estes no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais). Rio de Janeiro, 19 de março de 2021. JOÃO CARLOS DE SOUZA CORRÊA Juiz Relator Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Comarca da Capital
APELAÇÃO CRIMINAL 0030669-88.2020.8.19.0209
CAPITAL 2a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CRIMINAIS
Juiz(a) JOAO CARLOS DE SOUZA CORREA - Julg: 24/03/2021
Ementa número 5
INSTITUIÇÃO BANCÁRIA
PROGRAMA DE PONTOS
PASSAGEM AÉREA
CANCELAMENTO DE VOO
RESTITUIÇÃO DOS PONTOS
IMPOSSIBILIDADE
INOCORRÊNCIA DE DANO MORAL
ESTADO DO RIO DE JANEIRO PODER JUDICIÁRIO CONSELHO RECURSAL IV TURMA CÍVEL PROCESSO Nº: 0282588-77.2020.8.19.0001 RECORRENTE: Banco Santander RECORRIDO: Anderson Messias Palmeira VOTO Recurso interposto em face da sentença de fls. 131/135, que condenou o banco réu, ora recorrente, a reembolsar 15.900 pontos na conta do autor e a pagar-lhe a quantia de R$2.000,00 (dois mil reais) a título de indenização por danos morais. Autor que alega ter trocado seus pontos por uma passagem aérea para sua mãe e, em razão do cancelamento do voo em decorrência da pandemia, o autor solicitou a troca dos pontos por uma passagem para ele mesmo. SENTENÇA QUE MERECE REFORMA. Autor que, a partir da conversão dos pontos junto ao Banco por bilhete de passagem em nome de terceiro, não mais poderia alterar, sem a concordância da companhia aérea, a titularidade do bilhete, muito menos exigir que o Banco-réu o fizesse. Autor que, portanto, não poderia exigir, por tal recusa, a restituição dos pontos junto ao banco, especialmente em razão das regras da Lei nº 14.034/2020, que não lhe assegura o direito ao reembolso. Ausência de falha no serviço prestado que impede o reconhecimento de direito a danos morais. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO PARA JULGAR IMPROCEDENTE O PEDIDO. Sem ônus sucumbenciais porque não verificada a hipótese prevista no artigo 55, ¿caput¿, da Lei 9099/95.?? Rio de Janeiro, 19/03/2021. José Guilherme Vasi Werner Juiz Relator
RECURSO INOMINADO 0282588-77.2020.8.19.0001
CAPITAL 4a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS
Juiz(a) JOSE GUILHERME VASI WERNER - Julg: 19/03/2021
Ementa número 6
CEDAE
AUSÊNCIA DE CONTRATAÇÃO
RESIDÊNCIA
ENDEREÇO DIVERSO
CANCELAMENTO DE DÉBITO
ABSTENÇÃO DA NEGATIVAÇÃO DO NOME
TJRJ - 4ª TURMA RECURSAL CÍVEL Processo: 0002527-15.2020.8.19.0067 Recorrente: WANDER INACIO DE OLIVEIRA Recorrido: COMPANHIA ESTADUAL DE AGUAS E ESGOTOS CEDAE RECURSO INOMINADO. CONSUMIDOR. MATRÍCULA DESCONHECIDA. MUNICÍPIO DIVERSO DA RESIDÊNCIA DO AUTOR. AUSÊNCIA DE PROVA DA CONTRATAÇÃO. MISSIVAS SEM NEGATIVAÇÃO. SÚMULA 230 TJRJ. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. VOTO Recurso Inominado em face de sentença que julgou improcedentes os pedidos iniciais, reconhecendo a ausência de prova mínima do autor. Trata-se de demanda em que questiona o requerente a contratação e vinculação pela ré de seu nome a matrícula de imóvel desconhecido, pretendendo o cancelamento do débito da matrícula, abstenção da ré em negativar seu nome, e compensação por danos morais. A pretensão recursal é no sentido de que seja proferida nova sentença para julgamento do feito. O ônus da prova da contratação é da recorrida-ré, ou seja, de que o autor-recorrente contratou, nos termos do art. 373, II do CPC. À parte não cabe a prova de fato negativo, isto é, de que não contratou, sendo prova impossível de ser realizada pelo autor. Inclusive, há protocolo de atendimento datado de 2011 para solucionar o problema (fl. 12) e nada foi feito pela ré. Portanto, ausente a prova da contratação da matrícula pelo autor junto à ré, o ônus recai sobre esta, segundo a teoria do risco do empreendimento, nos termos do art. 14, caput e §1º do CDC, impondo-se o cancelamento deste e do débito a ela vinculados - matrícula nº 1693351-0 - em nome do autor, bem como a abstenção da ré em inscrevê-lo nos cadastros restritivos por tais débitos. Quanto aos danos morais, não há prova da efetiva negativação do nome do autor, consistindo em meras missivas, a ensejar a incidência da Súmula nº 230 do TJRJ ("Cobrança feita através de missivas, desacompanhada de inscrição em cadastro restritivo de crédito, não configura dano moral, nem rende ensejo à devolução em dobro.") Isso posto, VOTO no sentido de conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento, para reformar a sentença e JULGAR PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido para condenar o réu a: 1) cancelar a matrícula nº 1693351-0, bem como o débito a ela atrelado vinculado ao nome e CPF do autor, no prazo de 15 dias a contar da intimação desta, sob pena de multa a ser fixada em sede de execução; e 2) a abster-se de inserir o nome do autor nos cadastros restritivos de crédito, relativamente a débitos da matrícula nº 1693351-0, sob pena de multa a ser fixada em sede de execução. Rio de Janeiro, na data da sessão de julgamento. Keyla Blank De Cnop Juíza de Direito
RECURSO INOMINADO 0002527-15.2020.8.19.0067
CAPITAL 4a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS
Juiz(a) KEYLA BLANK DE CNOP - Julg: 22/03/2021
Ementa número 7
ESTABELECIMENTO COMERCIAL
FURTO DE AUTOMÓVEL
RESPONSABILIDADE OBJETIVA
SUMULA 130, DO S.T.J.
DANO MATERIAL E DANO MORAL CARACTERIZADOS
INDENIZAÇÃO
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO CONSELHO RECURSAL SEGUNDA TURMA RECURSAL CÍVEL RECURSO Nº: 0246746-36.2020.8.19.0001 Recorrente: HAVAN LOJAS DE DEPARTAMENTOS LTDA. Recorridos: GABRIEL OLIVEIRA CARVALHO e ROSANA ALICE ESSABBÁ SOARES DE SOUSA CARVALHO Origem: 2º Juizado Especial Cível - Castelo - Foro Central - RJ. Juiz Relator: Mauro Nicolau Junior V O T O Pretende a empresa ré a reforma da sentença que a condenou ao pagamento de indenização por danos morais e materiais resultantes de furto do veiculo dos autores ocorrido no interior do estacionamento de uma de suas lojas. Sustenta a inexistência de provas quanto aos bens que a parte autora afirma que se encontravam no interior do veículo e, ainda, ausência de sua responsabilidade indenizatória. No que diz respeito a responsabilidade indenizatória da empresa recorrente não merece prosperar sua tese de exclusão visto que responde ela objetivamente pelos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, portanto, não há se falar em culpa na ocorrência do fato. Os estacionamentos dos supermercados e estabelecimentos em geral destinam-se a propiciar aos consumidores maior comodidade e com isso atrair mais clientes. Dessa forma o furto de veículos de propriedade dos consumidores no interior do estacionamento oferecido por lojas, supermercados, shopping centers etc., caracteriza defeito na prestação do serviço, ensejando o dever de indenizar eventuais danos suportados. Nesse sentido vem entendendo o Egrégio Tribunal de Justiça deste Estado. "RESPONSABILIDADE CIVIL DO FORNECEDOR. Furto de Veículo em Área do Estacionamento do Supermercado. Acidente de Consumo. Fato do Serviço. Responsabilidade Objetiva. Prova dos Danos. Súmula 130 do Superior Tribunal de Justiça: "A empresa responde, perante o cliente, pela reparação do dano ou furto de veículo ocorrido em seu estabelecimento." Responde o fornecedor, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços, entendendo-se como tal, em face da abrangência do conceito legal, toda a atividade por ele realizada no propósito de tornar o seu negócio viável e atraente, aí incluídos o estacionamento, as instalações confortáveis e outras facilidades colocadas à disposição da sua clientela.O dano moral está ínsito na própria ofensa, de tal modo que, provado o fato danoso, ipso facto está demonstrado o dano moral à guisa de uma presunção natural, uma presunção hominis ou facti, que decorre das regras da experiência comum.Se a indenização pelo dano moral não pode ser fonte de lucro, também não pode servir de estímulo à violação de direitos personalíssimos de outrem.Sentença que bem mensurou os danos sofridos pela vítima, pelo que deve ser integralmente confirmada. Desprovimento dos recursos." APELACAO 2009.001.17665 - DES. SERGIO CAVALIERI FILHO - Julgamento: 13/05/2009 - DECIMA TERCEIRA CAMARA CIVEL "RESPONSABILIDADE CIVIL. FURTO DE VEÍCULO EM ESTACIONAMENTO DE SUPERMERCADO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. Teoria do Risco. O supermercado Réu responde pelos prejuízos acarretados por furto de veículo ocorrido no pátio de estacionamento instalado em sua dependências e gratuito para os clientes, em razão de falhas no seu sistema de segurança, independentemente de culpa, sendo desinfluente a circunstância de o local ser administrado por empresa 'terceirizada'. Inteligência do verbete 94 da súmula do TJRJ e o verbete 130 da súmula do Superior Tribunal de Justiça. Dano material comprovado nos autos, não havendo impugnação consistente ao valor pedido na inicial e fixado pelo Juízo na sentença. Danos morais arbitrados em valor módico. Correto os valores fixados a título de danos materiais e morais, restando atendidos os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, sendo adequados e suficientes à espécie.NEGADO SEGUIMENTO AO RECURSO". APELACAO 2009.001.17953 - DES. LEILA ALBUQUERQUE - Julgamento: 14/04/2009 - DECIMA OITAVA CAMARA CIVEL Dispõe o Enunciado 130 do Superior Tribunal de Justiça que "a empresa responde, perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de veículo ocorridos em seu estacionamento." No que tange aos danos morais, por toda a narrativa trazida aos autos, verifica-se que os fatos causaram aborrecimentos e transtornos que exorbitaram aos parâmetros da normalidade, mormente por estarem os autores retornando de viagem e, provavelmente, portando suas malas e bagagens, a sensação de impotência, frustração e perda, em não encontrarem o veiculo onde haviam deixado e com a segurança oferecida pela ré, devendo, contudo serem fixados de maneira a atender seu caráter punitivo e pedagógico, tendo por base os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, sob pena de vir a causar enriquecimento sem causa o que foi feito com maestria pela magistrada sentenciante. No que diz respeito ao pleito de indenização por danos materiais, da mesma forma, não merece retificação a sentença na medida em que a despeito de efetivamente não ter a parte autora demonstrado e comprovado que no interior do veiculo havia malas e bagagens cuja indenização pleiteiam, é de se notar a extrema dificuldade de trazerem aos autos essas provas até porque se efetivamente o furto ocorreu os itens de sua propriedade já não mais se encontravam no carro. A ré, por sua vez, dispunha de todo seu aparato de segurança, principalmente imagens do circuito de segurança que em momento algum se interessou em trazer aos autos a fim de comprovar o fato impeditivo do direito dos autores, tal como afirmado na peça de resistência. Se por um lado não se pode exigir que qualquer pessoa produza provas contra seus interesses, por outro não há como se ignorar que em tendo a ré condições de demonstrar a veracidade do quanto alegado mas se recusando (ou não se interessando em fazê-lo) deve arcar com as consequências de sua opção processual devendo, assim, ser mantida a condenação em indenização pelos danos materiais dos produtos que foram comprovadamente adquiridos pelos autores. Por esses motivos o VOTO é no sentido de ser conhecido o recurso e no mérito a ele SER NEGADO PROVIMENTO para manter a sentença tal como proferida condenando-se a recorrente ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios de 15% sobre o valor da condenação. Rio de Janeiro, 18 de março de 2021. MAURO NICOLAU JUNIOR Juiz de Direito RESULTADO DO JULGAMENTO. I - Os magistrados componentes da 2ª Turma Recursal deliberaram por conhecer do recurso e no mérito lhe NEGAR provimento nos termos do voto do juiz relator. II - Furto de veiculo ocorrido no interior de estacionamento de estabelecimento comercial. III - Responsabilidade objetiva da empresa pelos danos experimentados por seus clientes. IV - Dano moral caracterizado por conta da sensação de perda, impotência e frustração em encontrar seu veiculo invadido e sem os pertences nele deixados. V - Ainda que não deferida a inversão do ônus da prova, incumbe ao fornecedor a comprovação quanto a inexistência de falha em seus serviços o que, no caso, poderia ter sido feito perfeitamente com a juntada do circuito de imagens de seus instrumentos e câmeras de segurança, o que preferiu não fazer devendo, assim, arcar com as consequências de sua opção processual. VI - Danos morais e materiais configurados. Sentença mantida. Processo 0246746-36.2020.8.19.0001 Pág. 1
RECURSO INOMINADO 0246746-36.2020.8.19.0001
CAPITAL 2a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS
Juiz(a) MAURO NICOLAU JUNIOR - Julg: 19/03/2021
Ementa número 8
CANCELAMENTO DE VOO
PANDEMIA DE COVID-19
FORÇA MAIOR
INOCORRÊNCIA DE
DANO MORAL
DANO MATERIAL
PROCESSO Nº: 0027668-92.2020.8.19.0210 RECORRENTE: DECOLAR. COM LTDA RECORRIDO: JOSIVAN DE LIMA VALDIVINO, IRANILDA TORQUATO DA SILVA VALDIVINO E GOL LINHAS AEREAS S/A RELATORA: RAQUEL DE OLIVEIRA VOTO Demanda em que se discute falha na prestação dos serviços pela ré, consubstanciada no cancelamento de passagens aéreas de voo que seria realizado em 26/08/2020 devido à pandemia de Covid-19. Os autores formularam os seguintes pedidos: 1) devolução do valor pago de R$ 1.024,00 das passagens canceladas e R$ 1.013,44 pela diferença das novas passagens adquiridas; e 2) danos morais de R$ 15.000,00 para cada autor. A sentença acolheu a pretensão, para condenar as rés, solidariamente, a pagarem danos materiais de R$ 1.024,00, e danos morais de R$ 3.000,00 para cada autor. Em recurso, a 1ª ré requerer a reforma da sentença, reiterando os termos de sua defesa. A lide deve ser solucionada à luz das regras do Código de Defesa do Consumidor, porque, sendo a ré fornecedora de produtos e serviços, deve responder objetivamente pelos danos causados aos consumidores decorrentes da prestação defeituosa (art. 14 do CDC). O cancelamento do voo ocorreu após a OMS declarar estágio de Pandemia para a Covid-19. A 1ª ré, ora recorrente, não deu ao consumidor a assistência para solução administrativa do problema, não disponibilizando em seu site o pedido de reembolso na forma da Lei nº 14.034/2020. Realmente, a pandemia caracterizou motivo de força maior, não gerando responsabilidade quanto ao dano moral, no entanto, isso não se refere ao dano material. A condenação ao pagamento do valor das passagens, solidariamente entre as rés, se faz necessário, mormente porque não se afigura razoável que os autores aguardassem indefinidamente por uma solução por parte das rés, pois, até então, havia a 1ª ré se limitado a atribuir tal responsabilidade à companhia aérea. Portanto, merece reforma em parte a sentença para excluir a condenação por danos morais. Pelo exposto, VOTO PARA CONHECER E DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO para REFORMAR A SENTENÇA e excluir a condenação por danos morais. Sem custas judiciais e sem honorários advocatícios. Rio de Janeiro, data da assinatura digital. RAQUEL DE OLIVEIRA JUÍZA RELATORA PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 2ª TURMA RECURSAL CÍVEL
RECURSO INOMINADO 0027668-92.2020.8.19.0210
CAPITAL 2a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS
Juiz(a) RAQUEL DE OLIVEIRA - Julg: 29/03/2021
Ementa número 9
CARTÃO DE CRÉDITO
ANUIDADE
VALOR MÍNIMO EM COMPRAS
CLÁUSULA DE ISENÇÃO
RESTITUIÇÃO SIMPLES
DANO MORAL
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO CONSELHO RECURSAL - 1ª TURMA RECURSAL Processo nº: 0029341-08.2020.8.19.0021 RECORRENTE: ISRAEL SANTOS DO NASCIMENTO RECORRIDO: BANCO SANTANDER BRASIL S.A. VOTO Trata-se de relação de consumo que será analisada sob a ótica da Lei 8.078/90, uma vez que as partes se encontram enquadradas nos artigos 2° e 3° do referido diploma legal. A controvérsia no caso em vertente recai sobre a legalidade da cobrança de anuidade no cartão de crédito da Autora. Em que pese a legalidade da cobrança, ficou comprovado nas faturas de fls.21/30 que o autor alcançou o mínimo de R$100,00 em compras necessário para a isenção da tarifa de anuidade, considerada a existencia de compra parcelada. Indevida, portanto, a sua cobrança, devendo ocorrer a restituição simples, tendo em vista a ausência de má-fé por parte da demandada. Quanto ao dano moral, como de sabença, o mesmo promana dos atos lesivos aos bens integrantes da personalidade do Autor. No caso em tela, indubitável que a falha na prestação do serviço causou danos extrapatrimoniais a parte Autora. Dito isto para a fixação do quantum indenizatório, compete ao julgador orientar-se pela lógica do razoável e fixar o valor de acordo com o grau de reprovabilidade da conduta, a situação econômica do Réu e a condição do autor, de modo a produzir eficácia pedagógica a inibir condutas idênticas e reparando a integralidade do dano causado ao Autor sem implicar em enriquecimento indevido. Considerando isto, fixo os danos morais no valor de R$ 1.000,00. Pelo exposto, VOTO no sentido de conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento para reformar a sentença e julgar procedente o pedido para condenar a ré a pagar, à título de dano material, a quantia de R$ 124,68 (cento e vinte e quatro reais e sessenta e oito centavos), acrescidos de juros de 1% ao mês a partir da citação e correção monetária da data do desembolso e à título de dano moral, a quantia de R$1.000,00 (mil reais), acrescidos de juros a partir da citação e correção a partir da presente data. Sem ônus sucumbenciais, face ao êxito. Rio de Janeiro, 19 de março de 2021. Rodrigo Faria de Sousa, Juiz Relator
RECURSO INOMINADO 0029341-08.2020.8.19.0021
CAPITAL 1a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS
Juiz(a) RODRIGO FARIA DE SOUSA - Julg: 23/03/2021
Ementa número 10
CONTRATO DE TRABALHO TEMPORÁRIO
DESVIRTUAMENTO DA CONTRATAÇÃO
TEMA 551 DO S. T, F.
VERBAS TRABALHISTAS
REFORMA DA SENTENÇA
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO PRIMEIRA TURMA RECURSAL FAZENDÁRIA PROCESSO Nº 0001616-61.2019.8.19.0059 RECORRENTE: FABIENE DE MATOS AGUIAR RECORRIDO: MUNICÍPIO DE SILVA JARDIM RECURSO INOMINADO. FAZENDA PÚBLICA. MUNICÍPIO. CONTRATO TEMPORÁRIO. COBRANÇA DE FÉRIAS, DÉCIMO TERCEIRO SALÁRIO E SALDO DE SALÁRIO. PEDIDO DE INDENIZAÇÃO A TÍTULO DE DANO MORAL. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. INCONFORMISMO DA AUTORA. TEMA Nº 551 DO STF. TESE FIXADA QUE PREVÊ EXCEÇÃO QUANDO 'COMPROVADO DESVIRTUAMENTO DA CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, EM RAZÃO DE SUCESSIVAS E REITERADAS RENOVAÇÕES E/OU PRORROGAÇÕES'. LEI MUNICIPAL QUE PREVÊ CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA POR NO MÁXIMO SEIS MESES. CASO CONCRETO EM QUE A CONTRATAÇÃO SE ESTENDEU POR PERÍODO MAIOR QUE O PREVISTO NA LEI. VERBAS DEVIDAS. TEMA Nº 905 DO STJ. UTILIZAÇÃO DO IPCA-E A PARTIR DE JULHO/2009 COMO ÍNDICE DA CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS CONFORME ARTIGO 1º-F, DA LEI Nº 9.494/1997. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. REFORMA DA SENTENÇA QUE SE IMPÕE. PROCEDÊNCIA PARCIAL DOS PEDIDOS. CONHECIMENTO E PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO. Voto Trata-se de RECURSO INOMINADO interposto pela autora, FABIENE DE MATOS AGUIAR, em face da sentença anexada nos indexadores 80/81 e 83/84, que julgou IMPROCEDENTES os pedidos deduzidos na inicial. Nas razões recursais de indexadores 96/104, a parte autora pretende a reforma do julgado, afirmando que as verbas trabalhistas decorrentes da contratação temporária não foram pagas pelo Município réu, reprisando as alegações contidas nos autos. O Município réu não apresentou contrarrazões ao recurso, consoante indexador 138. Convertido o julgamento em diligência nos indexadores 142/143, o Município recorrido trouxe aos autos cópia integral do processo administrativo de cobrança das verbas trabalhistas, anexada nos indexadores 155/159. É o relatório. Passo ao voto. Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço do recurso. Trata-se de ação objetivando o pagamento de verbas trabalhistas a ex-funcionária temporária do Município. Assiste razão parcial à recorrente. A contratação é incontroversa e tem natureza de contrato administrativo. Como é cediço, a investidura em cargo ou emprego público está condicionada à prévia aprovação em concurso público, conforme exegese do art. 37, incisos II e IX, da Constituição da República. Entretanto, a mesma Constituição da República previu casos de contratações excepcionais, regidas por legislação própria e com submissão ao regime estatutário, para atender as necessidades temporárias e de interesse público da Administração, na forma do art. 37, IX da CRFB/88. Por certo, a contratação a título precário estabelece um vínculo laboral entre as partes submetido a regime especial, não sendo aplicáveis as regras relativas ao regime estatutário, tampouco ao regime celetista. Por outro lado, existem direitos constitucionais que beneficiam todos os trabalhadores que estão previstos na Carta maior, como férias e décimo terceiro salário - incisos XVII e VIII, respectivamente, do artigo 7º. Ocorre que recentemente o E. STF firmou entendimento, em tese fixada no Tema nº 551, no qual se discutia, à luz do caput e do inciso IX do artigo 37 da Constituição Federal, a possibilidade, ou não, de extensão de direitos dos servidores públicos efetivos aos servidores e empregados públicos contratados para atender necessidade temporária e excepcional do
setor público. O Supremo Tribunal Federal, por maioria, apreciando o aludido Tema nº 551 em sistema de repercussão geral, negou provimento ao Recurso Extraordinário nº 1.066.677 e fixou a seguinte tese: "Servidores temporários não fazem jus a décimo terceiro salário e férias remuneradas acrescidas do terço constitucional, salvo (I) expressa previsão legal e/ou contratual em sentido contrário, ou (II) comprovado desvirtuamento da contratação temporária pela Administração Pública, em razão de sucessivas e reiteradas renovações e/ou prorrogações". Vale ressaltar que o município recorrido dispõe de lei municipal que veda contratos temporários que ultrapassem o período de 6 (seis) meses. Vejamos: Lei Complementar Municipal nº 17, de 22 de janeiro de 1998, com as alterações que lhe foram introduzidas pela Lei Complementar Municipal nº 19, de 11 de dezembro de 1998: "Art. 220 - Consideram-se como de necessidade temporária de excepcional interesse público as contratações que visem a: I - combater surtos epidêmicos, 06 (seis) meses; II - fazer recenseamento, 12 (doze) meses; III - atender a situações de calamidade pública, 06 (seis) meses; IV - substituir professor ou admitir professor visitante, inclusive estrangeiro, 48 (quarenta e oito meses); V - permitir a execução de serviço por profissional de notória especialização, inclusive estrangeiro, nas áreas de pesquisa científica e tecnológica 48 (quarenta e oito meses); VI - atender a outras situações de urgência que vierem a ser definidas em lei, 06 (seis) meses; VII - a execução de Convênios firmados com a União Federal, Estado e outros Municípios, obedecidos os prazos de suas vigências. VIII - contratar profissionais da área de saúde, até que se promova Concurso Público, que deverá ocorrer no prazo máximo de 06 (seis) meses. [...] Art. 221 - É vedado o desvio de função de pessoa contratada na forma deste título, bem como sua recontratação, sob pena de nulidade do contrato e responsabilidade administrativa e civil da autoridade contratante." (grifos) Assim, considerando que a autora labutou por dois períodos junto à municipalidade de forma precária e temporária, consoante declaração do próprio município (indexador 157), tendo o primeiro vínculo perdurado de 17.04.2015 a 01.12.2016, o que corresponde a 1 (um) ano, 7 (sete) meses e 13 (treze) dias, e, em um segundo vínculo, entre 02.01.2017 a 02.10.2017, o que corresponde a 9 (nove) meses. Vê-se que ao todo a recorrente trabalhou por 2 (dois) anos, 4 (quatro) meses e 13 (treze) dias. Logo, evidente que a contratação perdeu sua natureza "temporária" quando se verifica que a prestação do serviço se deu por período em muito superior à legislação local. De igual modo, a excepcionalidade trazida pela tese adotada no Tema nº 551 se apresenta nestes autos. A contratação temporária restou desvirtuada, quando se verifica que a prestação do serviço se deu por dois períodos, de mais de dois anos. Desta forma, à luz do que foi decidido pelo E. STF quando do julgamento do Tema nº 551, a sentença merece ser retocada. Cabia à municipalidade ré, ora recorrida, quem detém todas as informações sobre as fichas financeiras de seus atuais e antigos servidores, as informações sobre os pagamentos efetuados ao longo dos anos, demonstrar que efetuou o pagamento das verbas, ônus do qual não se desincumbiu. No processo administrativo de cobrança resta declarado o valor devido à autora de R$ 6.779,73 (seis mil, setecentos e setenta e nove reais e setenta e três centavos): Importante observar, que no tocante à correção monetária e aos juros, deve-se aplicar o entendimento consolidado no Tema nº 905 do C. Superior Tribunal de Justiça, que assim dispõe: "PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. SUBMISSÃO À REGRA PREVISTA NO ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 02/STJ. DISCUSSÃO SOBRE A APLICAÇÃO DO ART. 1º-F DA LEI 9.494/97 (COM REDAÇÃO DADA PELA LEI 11.960/2009) ÀS CONDENAÇÕES IMPOSTAS À FAZENDA PÚBLICA. CASO CONCRETO QUE É RELATIVO A INDÉBITO TRIBUTÁRIO. TESES JURÍDICAS FIXADAS. (...) 3.1.1 Condenações judiciais referentes a servidores e empregados públicos. As condenações judiciais referentes a servidores e empregados públicos, sujeitam-se aos seguintes encargos: (a) até julho/2001: juros de mora: 1% ao mês (capitalização simples); correção monetária: índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com destaque para a incidência do IPCA-E a partir de janeiro/2001; (b) agosto/2001 a junho/2009: juros de mora: 0,5% ao mês; correção monetária: IPCA-E; (c) a partir de julho/2009: juros de mora: remuneração oficial da caderneta de poupança; correção monetária: IPCA-E.(...) 5. Em se tratando de dívida de natureza tributária, não é possível a incidência do art. 1º-F da Lei 9.494/97 (com redação dada pela Lei 11.960/2009) - nem para atualização monetária nem para compensação da mora -, razão pela qual não se justifica a reforma do acórdão recorrido. 6. Recurso especial não provido. Acórdão sujeito ao regime previsto no art. 1.036 e seguintes do CPC/2015, c/c o art. 256-N e seguintes do RISTJ." (REsp 1495146/MG, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/02/2018, DJe 02/03/2018) (grifos nossos) Por outro lado, no tocante ao pedido de reparação por danos morais, melhor sorte não assiste à recorrente. Incumbia à parte autora comprovar que o atuar do Município tenha afetado a sua esfera psíquica ou lesionado direitos inerentes à personalidade da autora. O inadimplemento apontado possui mera natureza patrimonial, inexistindo nos autos relatos de fatos hábeis a gerar a ocorrência do referido dano moral. Face ao exposto, VOTO para DAR PROVIMENTO AO RECURSO INOMINADO interposto pela autora, para reformar a sentença de primeiro grau e JULGAR PROCEDENTES EM PARTE os pedidos deduzidos na inicial, para condenar o Município de Silva Jardim ao pagamento de verbas trabalhistas no montante de R$ 6.779,73 (seis mil, setecentos e setenta e nove reais e setenta e três centavos), valor que deverá ser corrigido monetariamente pelo IPCA-E, desde a data em que o pagamento deveria ser efetuado, e acrescido de juros moratórios de acordo com a remuneração oficial da caderneta de poupança, desde a citação, em cumprimento estrito à orientação firmada no Tema nº 905 do STJ, e JULGAR IMPROCEDENTE o pedido de reparação a título de dano moral, valendo esta Súmula como acórdão. Sem custas e sem honorários, ante o provimento do recurso (artigo 55, in fine, da Lei nº 9.099/1995). Transitada em julgado, encaminhe-se o Processo Eletrônico ao juízo de origem. Rio de Janeiro, 24 de março de 2021. Simone Lopes da Costa JUÍZA RELATORA
RECURSO INOMINADO 0001616-61.2019.8.19.0059
CAPITAL 1 TURMA RECURSAL DOS JUI ESP FAZENDA PUB.
Juiz(a) SIMONE LOPES DA COSTA - Julg: 24/03/2021
Este texto não substitui o publicado no Diário Oficial.