Terminal de consulta web

EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA CRIMINAL 3/2023

Estadual

Judiciário

28/03/2023

DJERJ, ADM, n. 133, p. 50.

Ementário de Jurisprudência Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA CRIMINAL Nº 3/2023 COMISSÃO DE JURISPRUDÊNCIA Presidente: DESEMBARGADOR CHERUBIN HELCIAS SCHWARTZ JÚNIOR Organização: Serviço de Pesquisa, Análise e Publicação da Jurisprudência da Divisão de Organização de Acervos de... Ver mais
Texto integral

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA CRIMINAL Nº 3/2023

COMISSÃO DE JURISPRUDÊNCIA

Presidente: DESEMBARGADOR CHERUBIN HELCIAS SCHWARTZ JÚNIOR

Organização: Serviço de Pesquisa, Análise e Publicação da Jurisprudência da Divisão de Organização de Acervos de Conhecimento - dicac@tjrj.jus.br

Rua Dom Manoel, 29, 2º andar, sala 207

 

Ementa número 1

FEMINICÍDIO

CARÁTER OBJETIVO

MOTIVO TORPE

CARÁTER SUBJETIVO

INOCORRÊNCIA DE BIS IN IDEM

RECONHECIMENTO DAS QUALIFICADORAS

APELAÇÃO CRIMINAL. JÚRI. ART. 121, § 2°, I, IV E VI, C/C § 2º   A, I, DO CÓDIGO PENAL. CONDENAÇÃO. RECURSO DA DEFESA TÉCNICA ALEGANDO QUE A DECISÃO DOS JURADOS QUANTO ÀS QUALIFICADORAS É CONTRÁRIA A PROVA DOS AUTOS. INCOMPATIBILIDADE ENTRE AS QUALIFICADORAS DO MOTIVO TORPE E FEMINICÍDIO. PLEITO DE REVOGAÇÃO DE PRISÃO PREVENTIVA.     1. Apelante condenado pela prática do crime previsto no art. 121, §2°, I, IV e VI c/c §2º A, I, do Código Penal, à pena de 18 anos e 08 (oito) meses de reclusão, em Regime Fechado (index 339 e 363).    2. Recurso de Apelação da Defesa Técnica que, em suas Razões Recursais, sustentando em síntese: o Réu teve uma pena desproporcional ao crime  praticado; a circunstância judicial relacionada à culpabilidade foi indevidamente reconhecida; as qualificadoras devem ser afastadas por serem contrárias à prova dos autos; a qualificadora do feminicídio é incompatível com a do  motivo torpe no caso em apreço, estando amparadas na mesma situação fática; a prisão preventiva deve ser revogada, eis que a custódia provisória não se faz necessária. Requer, pois, a reforma da Sentença, adequando se a dosimetria, bem como a revogação da prisão preventiva. Formula, outrossim, prequestionamento com vistas ao eventual manejo de recursos aos Tribunais Superiores (index 396).    3. Cumpre destacar que não cabe a esta Instância Revisora analisar a prova produzida de maneira aprofundada e, sim, aferir se a decisão dos Jurados está ou não amparada na prova produzida nos autos. Isto porque, ao Corpo de Jurados, diante de duas teses existentes nos autos, é permitido optar por uma delas, tendo em vista o princípio da íntima convicção, o que se encontra no âmbito de sua prerrogativa constitucional (alínea 'c' do inciso XXXVIII do art. 5° da CF), dispensando o de fundamentar sua decisão, bastando que a tese escolhida conte com o devido respaldo probatório. Desta forma, é vedada a este Tribunal a valoração da escolha feita pelo Corpo de Julgadores   se justa ou não a opção pela tese acusatória ou defensiva   no exercício da sua soberania de sede constitucional. In casu, o Corpo de Jurados optou pela tese sustentada pelo Ministério Público de que o homicídio foi praticado por motivo torpe, mediante recurso que impossibilitou a defesa da vítima e em razão da condição de sexo feminino (feminicídio), havendo elementos nos autos, como visto, a amparar tal conclusão. Especificamente no que toca as qualificadoras relativas à torpeza e o feminicídio, é de se registrar que a primeira diz respeito ao motivo desprezível, repugnante, que causa repulsa, a vingança abjeta. No caso dos autos, elementos colhidos dão conta de que o crime se deu após discussão havida entre Réu e vítima  horas antes do crime, pelo fato de o Recorrente ter entregue a traficantes da região uma televisão pertencente à vítima como pagamento de uma dívida, do que ela reclamara. A contrário do que pretende a combativa Defesa, o legislador não especificou que o motivo torpe estaria adstrito à paga ou promessa de recompensa, mas apenas exemplificou duas situações, nas quais tal circunstância qualificadora estaria configurada, tanto que alude "a outro motivo torpe" para deixar ao encargo do intérprete a inclusão de circunstâncias não expressamente previstas, mas consideradas igualmente ignóbeis. Torpe "é o motivo repugnante, abjeto, vil, que causa repulsa excessiva à sociedade". ("Código Penal Comentado", Guilherme de Souza Nucci, 22ª ed. revista atualizada e ampliada, pág. 658). No que concerne ao feminicídio, qualificadora de natureza objetiva, não há qualquer incompatibilidade dela com o motivo torpe, não se cogitando sequer de hipótese de bis in idem. Aliás, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça apontou que "as qualificadoras do motivo torpe e do feminicídio não possuem a mesma natureza, sendo certo que a primeira tem caráter subjetivo, ao passo que a segunda é objetiva, não havendo, assim, qualquer óbice à sua imputação simultânea". Tal entendimento foi firmado no julgamento do AREsp 1.166.764, sob relatoria do ministro Antônio Saldanha Palheiro. Relativamente à impossibilidade de defesa da vítima, como bem destacado pela Juíza Presidente, tal qualificadora encontra arrimo no  laudo   pericial, que não registra  qualquer   lesão   nas   mãos   e   ou   braços   da   vítima,  revelando que Alice foi  surpreendida pelo Réu (index   22).    4. No que se refere à exasperação da pena base, melhor sorte não assiste à Defesa. A Juíza a quo utilizou uma das qualificadoras   feminicídio   para qualificar o delito e as remanescentes foram observadas na 2ª fase da fixação da pena. Outrossim, fixou a pena base acima do mínimo legal em 1/6, estabelecendo a em 14 (quatorze) anos de reclusão, argumentando que a culpabilidade do Réu é exacerbada, eis que a vítima sofreu diversos golpes no seu rosto, sendo cinco deles direcionados ao seu couro cabeludo na porção glabra da região frontal, dois na região periorbitária  direta  e  labial  e  uma no pescoço que atingiu a região carotidiana esquerda. Ressalta, ainda, que a face da vítima foi desfigurada com oito golpes provocados por ação perfurocortante direcionados  em  região  de  alta  letalidade,  evidenciando  acentuada  perversidade  do  réu, a justificar o incremento de sua sanção inicial. Não há o que ajustar in casu, eis que, de fato, como detalhado pela sentenciante, a culpabilidade do Réu extrapolou à normalidade prevista na figura típica, argumentos que acolho in totum. Quanto à fração de aumento utilizada, penso que até se mostrou módica. Na segunda fase, a Magistrada de 1º grau não vislumbrou quaisquer circunstâncias atenuantes. Por outro lado, tendo em vista o motivo torpe e a dificuldade de defesa da vítima, elevou a resposta penal em mais 1/3, fixando a em 18 (dezoito) anos e 08(oito) meses de reclusão. Já se apreciou detalhadamente quanto às mencionadas qualificadoras. No que tange à fração de aumento, entendo deva ser reduzida para 1/5, em se tratando de duas agravantes. Assim, reduzo a pena a 16 (dezesseis) anos, 09 (nove) meses e 18 (dezoito) dias de reclusão, que se torna definitiva. Não há o que retocar quanto ao Regime Fechado estabelecido, nem n que se refere à manutenção da prisão cautelar.  Isto porque a Defesa não demonstra ter havido inovação fática desde a decisão que decretou a prisão do Recorrente, capaz de apontar para a desnecessidade da segregação provisória. No caso vertente, com a devida vênia, a gravidade concreta do delito e a periculosidade do Réu são incontestes. Ele atuou com violência extremada, cumprindo ressaltar, ainda, que a testemunha C. em Juízo relatou sentir medo do Réu, informando que um amigo do Recorrente contou à declarante que ele teria dito que, quando fosse solto, "não sobraria um". Outrossim, os autos noticiam que o  réu  já era violento com a esposa, havendo relatos, inclusive, de agressão cometida com barra de ferro contra a sua companheira anterior. Desta forma, conclui se que, em liberdade, o Réu representa fundado risco não só em relação às testemunhas que prestaram depoimento, como, também, a outras mulheres que porventura venham a com ele se relacionar. Por fim, o argumento de que o réu estaria ressocializado após três anos na prisão não encontra sustentação nos autos, sendo certo o órgão jurisdicional competente para apurar eventual ressocialização do Apelante é o Juízo da Execução.    5. No que tange ao prequestionamento para fins de eventual interposição de recursos extraordinário e/ou especial, não se vislumbra violação a dispositivos constitucionais ou infraconstitucionais    6. DADO PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO para reduzir a pena a 16 (dezesseis) anos, 09 (nove) meses e 18 (dezoito) dias de reclusão, mantidos os demais termos da sentença.

APELAÇÃO 0136841-33.2019.8.19.0001

OITAVA CÂMARA CRIMINAL

Des(a). ADRIANA LOPES MOUTINHO DAUDT D' OLIVEIRA - Julg: 01/03/2023

 

Ementa número 2

TRÁFICO ILÍCITO  DE ENTORPECENTES

ATO INFRACIONAL ANÁLOGO

CRIME DE AÇÃO MÚLTIPLA

DOLO GENÉRICO

DEPOIMENTO DE POLICIAL

VALIDADE

APELAÇÃO. LEI Nº 8.069/1990 (E.C.A.) ATO INFRACIONAL ANÁLOGO AO DELITO CAPITULADO NO ARTIGO 33, CAPUT,  DA LEI Nº 11.343/2006. RECURSO DEFENSIVO, NO QUAL SE  PLEITEIA: 1) O RECEBIMENTO DA APELAÇÃO, TAMBÉM, NO EFEITO SUSPENSIVO. NO MÉRITO, SE REQUER: 2) A  IMPROCEDÊNCIA DA REPRESENTAÇÃO, POR SUPOSTA INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA EM RELAÇÃO  À AUTORIA DO ATO INFRACIONAL, ARGUMENTANDO TER O DECISUM REPROBATÓRIO SE  FUNDADO  NAS PALAVRAS DOS  POLICIAIS MILITARES. CONJUNTO PROBATÓRIO QUE CONFIRMA A PROCEDÊNCIA DA REPRESENTAÇÃO. MANUTENÇÃO DA MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE QUE, ALÉM DE FUNDAMENTADA PELO MAGISTRADO MENORISTA, MOSTRA SE NECESSÁRIA  E ADEQUADA  AO CASO CONCRETO E EM CONSONÂNCIA AOS ESCOPOS DE PROTEÇÃO E ASSISTÊNCIA AO MENOR. RECURSO CONHECIDO, E, NO MÉRITO DESPROVIDO.  De proêmio, no tocante ao pleito de concessão de efeito suspensivo ao recurso de apelação, inviável o deferimento do mesmo, eis que inobstante a Lei nº 12.010/2009 ter revogado o inciso VI do art. 198 do estatuto menorista, o art. 215,  prevê que tal efeito só pode ser concedido, para evitar dano irreparável à parte, ou seja, em casos extremos, o que inocorre,  na espécie.  Registre se ademais que, no caso dos autos, não se valeu a Defesa, tempestivamente, do disposto no parágrafo 3º, incisos I e II do artigo 1.012 do novel Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015), para requerer o efeito suspensivo pretendido, ocorrendo à preclusão temporal, razão pela qual se indefere o pedido.  No mérito, vê se que, a materialidade do ato infracional imputado aos adolescentes, V. A. R. R.,   V. S. da F. e M. D. F. M. C.,  está devidamente demonstrada, pelas peças que compõem o caderno processual.  A autoria, também, se mostra incontroversa ante as provas coligidas, principalmente pelos depoimentos em sede distrital dos policiais militares, sendo, portanto, o conjunto probatório hábil, no sentido de prestigiar a versão ministerial.  Com efeito, as declarações prestadas em sede policial  e reiteradas  em juízo,  apresentaram se firmes, minudentes   e  incisivas, de molde a embasar a sentença monocrática, ao descreverem com clareza, a ocorrência dos fatos, delineando, em detalhes, toda a dinâmica do evento sub examine.   Neste contexto, ao contrário do expendido nas razões recursais, há de se  enfatizar a validade de   depoimentos de  policiais, os quais, a priori,   gozam  de presunção de legitimidade,   salientando se  não se vislumbrar qualquer motivação idônea, incidente à hipótese, a fim de se invalidar ou questionar as declarações,  uma vez que respaldadas pelas demais provas, pelo que há de se tomá las como verdadeiras. Incidência do  verbete sumular nº 70 deste Egrégio Tribunal de Justiça. Precedentes jurisprudenciais.   Cumpre destacar, em relação ao fato de os policiais não terem presenciado a prática de qualquer ato de mercancia pelos menores representados, que  tal circunstância, não afasta a subsunção do ato infracional similar ao  delito  de tráfico de drogas, eis que, como crime de ação múltipla, o tipo penal previsto no caput do artigo 33,  da Lei nº 11.343/2006,  apresenta vários núcleos verbais, "importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, ...". ". Precedente desta Colenda Câmara.  Importa salientar, ainda que, o fato antissocial equiparado ao crime de tráfico ilícito de entorpecentes se contenta com o chamado dolo genérico, de tal modo que sua comprovação se perfaz, segundo a análise do painel circunstancial, ao lado de outros dados convergentes, tais como  os depoimentos dos agentes da lei alhures mencionados.  No caso em apreço, a quantidade, a natureza e a forma de acondicionamento da substância  ilícita  arrecadada (cocaína), conforme descrito no Laudo de Exame de Entorpecente acostado aos autos,  somados a outros dados convergentes,   tais como as circunstâncias e a dinâmica do evento  que envolveu a apreensão dos representados, ocorrida após denúncia de prática de tráfico de drogas na localidade onde os fatos se passaram, chefiado por um traficante integrante de uma beligerante facção criminosa, além da arrecadação de R$ 145, 00 (cento e quarenta e cinco reais) em espécie, traduzem a principal circunstância factual destinada a subsidiar o conceito de ato antissocial análogo ao delito de mercancia ilegal de drogas, reputando se cumprido o ônus probatório, que  recaiu sobre o órgão ministerial, relativamente à prova dos elementos constitutivos, da atribuição representativa.   Na espécie dos autos, além da completa inverossimilhança da tese defensiva e sua impertinência frente às circunstâncias deduzidas, não há qualquer elemento probatório mínimo, com produção a cargo da Defesa (C.P.P., art. 156). Ao contrário, dessume se da prova coligida que, o órgão do Ministério Público logrou comprovar, com exatidão, a materialidade do ato infracional,  conforme descrito na representação oferecida, repisando se que não foi  produzida, pela Defesa, qualquer prova idônea a supedanear o arguido. Precedentes.  Desta forma, não merece prosperar a pretensão defensiva de ver reformado o decisum objurgado, porquanto,  os autos apontam, sobremodo, em direção ao reconhecimento da procedência da representação oferecida em face dos menores recorrentes,   eis que  inconteste a prática pelos mesmos do ato infracional similar   ao  crime tipificado no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006.  Diante dos fatos deduzidos, e das circunstâncias em análise do caso concreto, considera se bem aplicada a medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade, uma vez que em consonância  com os termos do disposto no art. 112,  III, c/c  §  1º, da Lei nº  8.069/1990,  ressaltando se que as  medidas de caráter sociopedagógicos impostas aos menores infratores terão sempre, por finalidade precípua, a reeducação de seus destinatários.  CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO.

APELAÇÃO 0003166-86.2020.8.19.0017

OITAVA CÂMARA CRIMINAL

Des(a). ELIZABETE ALVES DE AGUIAR - Julg: 01/02/2023

 

Ementa número 3

FALSIDADE IDEOLÓGICA

USO DE DOCUMENTO FALSO

PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO

INAPLICABILIDADE

CONDUTAS AUTONÔMAS

APELAÇÃO CRIMINAL. FALSIDADE IDEOLÓGICA. "No processo penal, o Réu defende se dos fatos e não da qualificação jurídica que lhes é atribuída. No caso em comento, as circunstâncias fáticas foram bem delineadas na inicial acusatória (...)" (AgRg no RHC nº 131.422/MS, Relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 17/5/2022, DJe de 23/5/2022). Falsidade ideológica evidenciada, eis que o Réu, por três vezes, inseriu declaração falsa em documentos particulares com o fim de prejudicar direito, criar obrigação e alterar a verdade sobre sua real identidade. Uso de documento falso. Segundo Nucci, "fazer uso (empregar, utilizar ou aplicar) de qualquer dos papéis falsificados ou alterados, a que se referem os arts. 297 a 302 (...). Exige se que a utilização seja feita como se o documento fosse autêntico. (...) Trata se de tipo remetido, aquele que indica outros tipos para ser integralmente compreendido. Portanto, a amplitude do conceito de "papel falsificado ou alterado" depende da verificação do conteúdo dos arts. 297 a 302" (Nucci, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal: Parte Geral/Parte Especial. 07ª Ed. São Paulo. RT. 2011, p. 1.000). RECURSO DEFENSIVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

APELAÇÃO 0007665 85.2016.8.19.0007

SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL

Des(a). FLAVIO MARCELO DE AZEVEDO HORTA FERNANDES   Julg: 14/02/2023

 

 

Ementa número 4

EXECUÇÃO DA PENA

ERRO NO MARCO INICIAL

PROGRESSÃO DE REGIME E SAÍDA TEMPORÁRIA

REVOGAÇÃO

COISA JULGADA

AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO

CLÁUSULA REBUS SIC STANTIBUS

RECURSO DE AGRAVO  LEP   DECISÃO QUE, AO VERIFICAR ERRO NO MARCO INICIAL DA EXECUÇÃO DA PENA, REVOGOU AS DECISÕES QUE CONCEDERAM AO APENADO A PROGRESSÃO AO REGIME SEMIABERTO E A SAÍDA TEMPORÁRIA PARA VISITA AO LAR. Insurge se a defesa contra tal decisão. Alega, em síntese, que a decisão ofende garantias constitucionais e legais. Requer o restabelecimento das decisões revogadas. SEM RAZÃO O AGRAVANTE. Trata se de apenado condenado à pena de 08 (oito) anos e 09 (nove) meses de reclusão, em regime fechado, pela prática do crime de tráfico de drogas. Conforme dados do relatório da situação processual executória (fls. 09), o término de pena está previsto para ocorrer em 03/06/2029, sendo que alcançará o lapso temporal para progressão para o regime semiaberto somente em 03/03/2024. Depreende se dos autos que ocorreu um erro no marco inicial da execução da pena; tal fato gerou decisão de concessão de progressão de regime e decisão de concessão de saída temporária, ambas equivocadas, uma vez foram fundamentadas em cálculos errôneos. Assim, acertadamente, a magistrada a quo determinou a retificação do marco inicial da execução penal e revogou as decisões concessivas de progressão de regime e de saída temporária. Precedente do Superior Tribunal de Justiça reconhecendo que a coisa julgada em sede de execução penal submete se à cláusula rebus sic stantibus, de forma que modificado o substrato fático jurídico que apoiou a decisão, sua alteração é imprescindível, sem que isso ocasione ilegalidade ou ofensa a tal instituto. Com efeito, as decisões concessivas de progressão de regime e de saída temporária se mostraram equivocadas devido ao erro no marco inicial da execução da pena, tanto que, retificados os cálculos da pena, suas revisões constituíram medidas impositivas que ensejaram suas revogações. Frise-se que não há que se falar em afronta a coisa julgada, uma vez que os pressupostos fáticos e jurídicos, que serviram de suporte para as referidas decisões, não existem. Registre se que, no curso da execução da pena, as decisões que concedem ou denegam benefícios perduram o tempo em que subsistir o quadro fático que ensejou a sua prolação. A situação em tela, por óbvio, não se coaduna com a progressão de regime, nem saída temporária. Portanto, não há como restabelecer as decisões almejadas pela defesa, uma vez que os pressupostos fáticos e jurídicos que lhes apoiavam não mais subsistem. Desta forma, a decisão que indeferiu o pleito encontra se bem fundamentada. No tocante ao prequestionamento, não basta a simples alusão a dispositivos legais ou constitucionais, devendo a irresignação ser motivada, a fim de possibilitar a discussão sobre as questões impugnadas. Assim, diante do não cumprimento do requisito da impugnação específica, rejeita se o prequestionamento formulado pela Defesa. Manutenção da decisão vergastada. DESPROVIMENTO DO RECURSO DEFENSIVO.

AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL 5012267-97.2022.8.19.0500

QUARTA CÂMARA CRIMINAL

Des(a). GIZELDA LEITÃO TEIXEIRA - Julg: 14/03/2023

 

 

Ementa número 5

QUEBRA DE SIGILO DE DADOS TELEMÁTICOS

USUÁRIOS INDETERMINADOS DO GOOGLE

DELIMITAÇÃO GEOGRÁFICA E TEMPORAL

INVESTIGAÇÃO DE GRAVE CRIME

EXISTÊNCIA DE INTERESSE PÚBLICO RELEVANTE

DEFERIMENTO DO PEDIDO

MANDADO DE SEGURANÇA. QUEBRA DO SIGILO DE DADOS TELEMÁTICOS COLETIVA E EXPLORATÓRIA DE USUÁRIOS INDETERMINADOS DOS SERVIÇOS DA EMPRESA GOOGLE BRASIL E GOOGLE LLC. INQUÉRITO POLICIAL EM CURSO. REPRESENTAÇÃO DA AUTORIDADE POLICIAL PEDIDO ENDOSSADO PELO MP. CAUTELAR DEFERIDA. RECONSIDERAÇÃO NÃO REQUERIDA PELA ACIONANTE. MEDIDA COERCITIVA NÃO FIXADA PARA O CASO DE DESCUMPRIMENTO. LEGITIMIDADE E INTERESSE DE AGIR. TEORIA DA ASSERÇÃO. SOLUÇÃO QUE DESAFIA INGRESSO NO MÉRITO DA CAUSA. SERVIÇO DE GEOLOCALIZAÇÃO. POSSIBILIDADE.  ADEQUAÇÃO, NECESSIDADE E PROPORCIONALIDADE. DECISÃO NÃO FUNDAMENTADA ESPECIFICAMENTE E DE CONTORNOS ESPECIALMENTE PROPORCIONAIS. VIOLAÇÃO AO REGIME CONSTITUCIONAL E LEGAL DE PRIVACIDADE E PROTEÇÃO DE DADOS PESSOAIS DE USUÁRIOS DE INTERNET. ALEGAÇÕES NÃO COMPROVADAS.  Inicialmente, cabe ressaltar que a empresa impetrante vem pleitear em nome próprio direito alheio e difuso de usuários de seus sistemas. Como deixou bem assentado em sua sustentação oral, alega a empresa que o usuário tem direito ao sigilo dos dados inseridos em sua plataforma.  Ora, o legitimado para buscar a proteção judicial desse sigilo é o usuário e não a empresa. Na verdade, o que a empresa busca é, em última análise, a proteção do serviço que supostamente venda   um espaço onde toda e qualquer manifestação ficará inexpugnável, livre do controle do Estado, vendendo a falsa ideia que se pode ter um mundo virtual onde tudo é permitidos.  Desde os recentes episódios de 08 de janeiro passado próximo ficou claro que não se pode erigir em dogma a inexpugnabilidade da internet e que a pretexto da liberdade plena, qualquer atividade humana deixe de ser perscrutável pelo Estado.  A própria Suprema Corte Norteamericana   fincada na sede do liberalismo   está à debater a responsabilidade do provedor pelos conteúdos depositados e replicados na rede.  Fica claro, nessa toada, que a impetrante não pode defender o sigilo de consumidores indeterminados   direito alheio   mas sim que busca pela via transversa a credibilidade do negócio que quer vender.  Assim, primo icto oculi , delineia se a ilegitimidade da parte, matéria que se supera em privilégio do exame meritório.  Direitos e garantias fundamentais, em razão do conteúdo principiológico, que não possuem natureza absoluta. Ponderação de valores envolvidos que deve ser feita caso a caso. Quebra do sigilo de dados (geolocalização). Direito à privacidade e proteção de dados pessoais de usuários de internet. Violações de índole constitucional e legal não caracterizadas. Princípios da proporcionalidade, devido processo legal não violados. Decisão fundamentada. Medida deferida que de mostra adequada, necessária e proporcional à hipótese investigativa em curso, sem excesso. Roubo circunstanciado.  Medida restringida a certas áreas e horário especifico, local dos crimes. Observância dos critérios da razoabilidade e proporcionalidade. narrativa à mingua de ilegalidade ou ofensa a preceito constitucional sugerida.   SEGURANÇA DENEGADA.

MANDADO DE SEGURANÇA 0001862-98.2023.8.19.0000

SÉTIMA CÂMARA CRIMINAL

Des(a). JOAQUIM DOMINGOS DE ALMEIDA NETO - Julg: 28/02/2023

 

 

Ementa número 6

CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO

RELAÇÃO HOMOAFETIVA ENTRE MULHERES

LEI MARIA DA PENHA

INAPLICABILIDADE NO CASO CONCRETO

COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL

PENAL E PROCESSO PENAL. CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO SUSCITADO PELO JUÍZO DE DIREITO DO I JUIZADO DO ESPECIAL CRIMINAL DA COMARCA DE SÃO GONÇALO, POR ENTENDER QUE A COMPETÊNCIA PARA PROCESSAR E JULGAR O CRIME DESSES AUTOS (ART. 147 A DO CP - RELAÇÃO HOMOAFETIVA ENVOLVENDO MULHERES) É DA COMPETÊNCIA DO JUÍZO DE DIREITO DO JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DA COMARCA DE SÃO GONÇALO. NÃO ACOLHIMENTO DO INCONFORMISMO. A APLICAÇÃO DA CHAMADA LEI MARIA DA PENHA NAS RELAÇÕES HOMOAFETIVAS ENTRE MULHERES PARECE ENCONTRAR RESPALDO MADURO E FUNDAMENTADO NA JURISPRUDÊNCIA E DOUTRINA BRASILEIRAS.  SÃO EXEMPLOS AS DECISÕES DO TJRS (CJ 70036742047, REL. DES. IVAN LEOMAR BRUXEL, TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL); TJMG (RSE 1.0024.15.134061 9/001, REL. DES. EDISON FEITAL LEITE, PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL, JULGADO EM 26/07/2016); TJDFT (CJ 0702769-02.2022.8.07.0000, REL. DES. CESAR LOYOLA, CÂMARA CRIMINAL, JULGADO EM 23/03/2022) E DESTE TJERJ (CONFLITO DE JURISDIÇÃO 0070301 98.2022.8.19.0000; DES. JOSÉ ACIR LESSA GIORDANI; SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL; JULGAMENTO EM 18/10/2022; CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO 0036137 10.2022.8.19.0000, DES. JOÃO ZIRALDO MAIA, JULGAMENTO EM 26/07/2022, QUARTA CÂMARA CRIMINAL; CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO 0027238 23.2022.8.19.0000; DES. KÁTIA MARIA AMARAL JANGUTTA; SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL; JULGAMENTO EM 14/06/2022). O QUE MAIS IMPORTA POR DIZER RESPEITO AO TRIBUNAL COM COMPETÊNCIA PARA INTERPRETAR A LEGISLAÇÃO FEDERAL É A ORIENTAÇÃO DO COLENDO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, CONFORME AS DECISÕES MONOCRÁTICAS: (ARESP 1053365, MIN. ANTÔNIO SALDANHA PALHEIRO, PUBLICADA EM 07/06/2017 E ARESP 1913658, MIN. HUMBERTO MARTINS, PUBLICADA EM 04/08/2021). DE SER DESTACADO QUE NA DECISÃO PROFERIDA PELO MIN. ANTÔNIO SALDANHA PALHEIRO CONSTA, EXPRESSAMENTE, O QUE SE SEGUE: "O Superior Tribunal de Justiça firmou orientação de que "a incidência da Lei n. 11.340/2006 reclama situação de violência praticada contra a mulher, em contexto caracterizado por relação de poder e submissão, praticada por homem ou mulher sobre mulher em situação de vulnerabilidade" (HC 175.816/RS, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em 20/06/2013, DJe 28/06/2013). Outrossim, ficou assentado o entendimento de que para se verificar a aplicabilidade da Lei Maria da Penha devem ser examinadas as peculiaridades do caso, sendo desnecessária a existência de coabitação". NESSE CONTEXTO, HÁ QUE SE EXTRAIR A NECESSIDADE DE EXAME DO CASO CONCRETO PARA QUE SE POSSA ATINGIR O PERFEITO CONCEITO DE GÊNERO COM O FIM DE APLICAR AS NORMAS DA LEI 11340/06. EM HOMENAGEM AO PRÓPRIO JUIZ QUE SUSCITOU O CONFLITO, PROFESSOR E DOUTRINADOR DE ESCOL, ANDRÉ LUIZ NICOLITT, PERMITE SE ESTE RELATOR TRANSCREVER O RACIOCÍNIO DO EMINENTE MAGISTRADO: "O parágrafo único determina que as relações pessoais enunciadas no art.5º, para caracterização da violência doméstica e familiar contra a mulher, independem de orientação sexual, ou seja, abrangem relações homoafetivas que envolvam lésbicas, travestis, transexuais, transgêneros e gays, estando todos estes ao abrigo da lei, desde que um dos sujeitos assuma a representação social de mulher (gênero feminino). Trata se de importante previsão legal, pois traduz a intenção do legislador de dar à união homoafetiva reconhecimento jurídico, até mesmo como entidade familiar. Vale destacar, inclusive, que o dispositivo serviu de fundamentação para decisão de reconhecimento de união estável de relação homoafetiva pelo STJ, cuja ementa consta que a LMP atribuiu às uniões homoafetivas o caráter de entidade familiar, ao prever, no seu artigo 5º, parágrafo único, que as relações pessoais mencionadas naquele dispositivo independem de orientação sexual. Na relação homoafetiva entre duas mulheres já é possível vislumbrar a compatibilidade da lei com a reserva legal e a isonomia. Isto porque, uma mulher homossexual atende à elementar "mulher" prevista no art. 5º. Embora, aparentemente, seja possível cogitar violação à isonomia em razão de uma relação homossexual entre duas mulheres   pois haveria situação de igualdade de sexo   o fato é que pode ser que, no caso concreto, uma das conviventes assuma o papel social de homem, impondo uma diferença de gênero que justificaria a proteção diferenciada. Assim, em tal hipótese, apesar da igualdade de sexo, se caracterizada a condição de opressão e subjugação fundada no gênero, será cabível a incidência da LMP." DESTARTE, NO CASO CONCRETO APENAS SE TEM A VERSÃO DA VÍTIMA E DA ACUSADA, ENTÃO INDICIADA, E A ÚNICA COISA QUE SE PODE CONCLUIR É QUE AMBAS ASSUMEM A RELAÇÃO AMOROSA QUE SE FEZ FINDADA. DA MESMA FORMA EM QUE NUMA RELAÇÃO HETEROSSEXUAL O FIM DO RELACIONAMENTO PODE SE DAR POR INICIATIVA DO HOMEM, HAVENDO REAÇÃO BRUTAL DA MULHER, INCLUSIVE PRATICANDO ATOS CRIMINOSOS PARA IMPEDIR O FIM DA RELAÇÃO, O MESMO SE PODE DIZER NA RELAÇÃO HOMOAFETIVA NA QUAL AQUELA QUE ASSUME A POSIÇÃO SOCIAL DE MULHER É QUEM SE OPÕE À RUPTURA DO RELACIONAMENTO. NA HIPÓTESE DOS AUTOS NÃO SE SABE QUAL DELAS, OU ATÉ SE UMA DELAS   VÍTIMA E ACUSADA   ASSUMIU ESSA OU AQUELA POSIÇÃO SOCIAL, NÃO SENDO SUFICIENTE SE PRESUMIR QUE A ACUSADA TERIA ASSUMIDO A CONDIÇÃO SOCIAL DE HOMEM NA RELAÇÃO POR TER, DE CERTA FEITA, OFERECIDO FLORES À VÍTIMA, SALVO SE FOR ENTENDIDO QUE UMA MULHER NUMA RELAÇÃO HETEROSSEXUAL NÃO POSSA OFERECER FLORES AO SEU PARCEIRO. (AS REFERÊNCIAS DECORREM DE CONSULTA DA RELATORIA AO INQUÉRITO POLICIAL QUE INSTRUIU A DEFLAGRAÇÃO DA AÇÃO PENAL). SENDO ASSIM, A PRÓPRIA DÚVIDA, NÃO ESCLARECIDA DEVIDAMENTE NA FASE INVESTIGATÓRIA, IMPÕE QUE SE RECONHEÇA A COMPETÊNCIA DO JUÍZO ESPECIAL CRIMINAL, UMA VEZ NÃO SENDO O CASO DE APLICAÇÃO DA LEI MARIA DA PENHA. COMPETÊNCIA QUE SE DETERMINA DO JUÍZO SUSCITANTE.    

CONFLITO DE JURISDIÇÃO 0020610-18.2022.8.19.0000

SEXTA CÂMARA CRIMINAL

Des(a). JOSÉ MUIÑOS PIÑEIRO FILHO - Julg: 24/01/2023

 

Ementa número 7

FURTO QUALIFICADO

DESCLASSIFICAÇÃO

APROPRIAÇÃO INDÉBITA

IMPOSSIBILIDADE

ABUSO DE CONFIANÇA

RECONHECIMENTO DA QUALIFICADORA

APELAÇÃO. Artigo 155, §4º, II e IV, c/c 14, II, ambos do Código Penal. Condenação. RECURSOS DEFENSIVOS. Primeiro Apelante (E.). Absolvição por insuficiência de provas. Desclassificação para o crime de Apropriação Indébita. Redução das penas base. Abrandamento do regime prisional. Segundo Apelante (M.). Absolvição por insuficiência de provas. Revisão das penas base. Aplicação da fração de 2/3 em função da tentativa. Correção da Multa.  1. A ausência de dúvidas acerca da materialidade e da autoria do crime pelo qual os ora Apelantes foram condenados, inviabiliza a absolvição. Aplicação da Súmula 70, desse Tribunal.   2. Impossibilidade de desclassificação para o delito de apropriação indébita. O diferencial entre as condutas consiste na existência ou não de posse prévia do bem. A conduta perpetrada pelos acusados foi a de subtrair bens pertencentes à Souza Cruz e não de estar na posse ou guarda de um bem pertencente à empresa e, quando solicitada sua devolução, negar-lhe a entrega.  3. A qualificadora do abuso de confiança resta suficientemente caracterizada, não merecendo exclusão da Sentença. Ambos os Apelantes exerciam função na empresa ré, alvo do desiderato criminoso, sendo neles depositada a confiança de que o labor seria em prol do correto funcionamento do transporte da carga.  4. Inviável o pedido de redução das penas base. A Sentença fixou as acima do mínimo legal para ambos os Apelantes, em razão da presença de duas qualificadoras, quais sejam, abuso de confiança e concurso de pessoas, sendo que para o primeiro Apelante foi aplicada um aumento maior, de forma correta e proporcional, já que ostenta maus antecedentes.  5. Impossibilidade de aplicação da causa de diminuição de pena da tentativa na fração máxima. Na terceira fase da dosimetria, correta e adequada a redução da pena pela tentativa na fração de 1/3, diante do iter criminis percorrido pelos agentes, uma vez que, o crime chegou próximo à sua consumação, o que só não ocorreu, em razão da efetiva intervenção policial.  6. Merecem reparo as penas de multa aplicadas para ambos os acusados. Se no furto simples a pena mínima é de 1 ano e 10 dias multa, razoável e proporcional dizer que, no furto qualificado a pena mínima é de 2 anos e 20 dias multa. Então se as penas base do segundo Apelante foram afastadas do mínimo em 2 anos, de forma equivalente deve ser o afastamento da pena de multa, para 40 dias multa. Da mesma forma, para o primeiro Apelante, já que sua pena base foi afastada do mínimo em 2 anos e meio, pelo que a pena de multa deve ser fixada em 45 dias multa.  7. Inviável o abrandamento de regime prisional. Conforme o artigo 33, §3º, do Código Penal, a fixação do regime de pena deverá ser norteada pelas circunstâncias judiciais previstas no artigo 59, do Código Penal. No caso do primeiro Apelante, na primeira fase, as penas base foram fixadas acima do mínimo legal, o que autoriza a fixação do regime de pena mais gravoso.  RECURSOS PARCIALMENTE PROVIDOS.

APELAÇÃO 0000844-61.2013.8.19.0204

SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL

Des(a). KÁTIA MARIA AMARAL JANGUTTA - Julg: 07/02/2023

 

Ementa número 8

CRIME DE TORTURA

COBRANÇA DE DÍVIDA DE DROGA

PROVA DA MATERIALIDADE DO DELITO

INDÍCIOS DE AUTORIA

RECEBIMENTO DA DENÚNCIA

Ementa. Recurso em Sentido Estrito. Artigo artigos 1º, I, "b", da Lei nº 9.455/97 e do artigo 24-B da Lei 8.069/90, na forma do artigo 69 do Código Penal. Tortura praticada na cobrança de dívida de droga. O reconhecimento da ocorrência, ou não, de justa causa na persecução penal deve se dar de forma superficial, a ser constatado de plano. E se existir fundada suspeita de crime, elementos idôneos de informação que autorizem a investigação penal do episódio delituoso é legítima a instauração do processo penal, impondo ao Poder Público a adoção de providências necessárias ao esclarecimento da verdade processual. A inicial observou as exigências do artigo 41, do Código de Processo Penal, estão individualizadas as condutas imputadas, com as circunstâncias objetivas e subjetivas do caso e instruída com as peças do Inquérito Policial, como RO, termo de declarações da vítima, representação pela prisão preventiva, auto de reconhecimento de pessoa. Para a consumação do delito do artigo 1º, da Lei nº 9.455/97 é necessária a constatação do sofrimento físico ou moral a que foi submetida a vítima. É irrelevante que o constrangimento mediante intenso sofrimento físico ou mental seja destinado à prática de ação ou omissão criminosa. É indevida a rejeição da denúncia diante da prova da materialidade e indícios de autoria, há justa causa para deflagração da ação penal. Denúncia recebida. Recurso provido.

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO 0002051-24.2022.8.19.0061

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL

Des(a). KATYA MARIA DE PAULA MENEZES MONNERAT - Julg: 07/03/2023

 

Ementa número 9

MAUS TRATOS A ANIMAL DOMÉSTICO

TUTOR DE CACHORRO

AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS

MANUTENÇÃO DA PENA DE MULTA

APELAÇÃO CRIMINAL. MAUS TRATOS A ANIMAL DOMÉSTICO (ARTIGO 32, § 1.º A, DA LEI N.º 9.605/98). APELANTE QUE, AGINDO DE FORMA LIVRE E CONSCIENTE, NA QUALIDADE DE PROPRIETÁRIO DE UM CACHORRO DA RAÇA BULLDOG CAMPEIRO, DE NOME PADANG, PRATICOU ATOS DE MAUS TRATOS AO REFERIDO CÃO, NA MEDIDA EM QUE DEIXOU DE CUIDAR DO ANIMAL, ABANDONANDO E DEIXANDO DE ALIMENTÁ LO, PARA ALÉM DE TER SE OMITIDO COM RELAÇÃO AOS CUIDADOS BÁSICOS COM A SAÚDE DO REFERIDO CACHORRO. PRETENSÃO DEFENSIVA NO SEGUINTE SENTIDO: (1) NULIDADE DO PROCESSO, POR AUSÊNCIA DE EXAME DE CORPO DE DELITO/PROVA PERICIAL; (2) ABSOLVIÇÃO POR FALTA OU INSUFICIÊNCIA DE PROVAS, (3) RESTABELECIMENTO DA GUARDA DO ANIMAL E (4) FIXAÇÃO DA PENA PECUNIÁRIA EM 01 SALÁRIO MÍNIMO. MANUTENÇÃO INTEGRAL DA SENTENÇA. INOCORRÊNCIA DE NULIDADE DO PROCESSO POR FALTA DE EXAME DE CORPO DE DELITO. EM QUE PESE SEJA UM DELITO QUE DEIXA VESTÍGIOS, DESNECESSÁRIO O LAUDO PERICIAL, HAJA VISTA QUE A MATERIALIDADE DELITIVA RESTOU POSITIVADA POR OUTRAS PROVAS CONSTANTES DOS AUTOS, ESPECIALMENTE DOCUMENTAL E TESTEMUNHAL. RELATÓRIO DE VISITA ELABORADO POR MÉDICO VETERINÁRIO E FOTOS DO ANIMAL QUE DEMONSTRAM À SACIEDADE OS MAUS TRATOS E O SOFRIMENTO A QUE ESTAVA SENDO SUBMETIDO O CÃO. PRECEDENTES DESTE TRIBUNAL. ABSOLVIÇÃO QUE SE NEGA. AUTORIA E MATERIALIDADE DEVIDAMENTE CORROBORADAS PELO REGISTRO DE OCORRÊNCIA ADITADO (ID. 09), RELATÓRIO DE VISITA (ID. 12), FOTOS DO ANIMAL (IDS. 13/16, 18/21 E 39/73), TERMO CIRCUNSTANCIADO (ID. 27), EXAMES REALIZADOS (IDS. 178, 182, 184, 186 E 190), ALÉM DA PROVA ORAL PRODUZIDA, ESPECIALMENTE OS DEPOIMENTOS DOS VETERINÁRIOS I. E T.. RELATÓRIO DE VISITA ESCLARECEDOR AO NARRAR QUE O ANIMAL SE ENCONTRAVA COM PROTUSÃO DA GLÂNDULA LACRIMAL, INFESTADO DE CARRAPATOS, COM UMA FERIDA AO LADO DO ÂNUS COM LARVAS DE MOSCA (MIÍASE), ALÉM DE ANDAR COM DIFICULDADE. DIANTE DA FARTA PROVA COLHIDA, RESTA EVIDENTE QUE O CÃO FOI VÍTIMA DE MAUS TRATOS PRATICADOS POR SEU TUTOR QUE, MESMO SABENDO DE TODOS OS PROBLEMAS DE SAÚDE DO ANIMAL, NÃO PROVIDENCIOU OS NECESSÁRIOS CUIDADOS MÉDICOS. FOTOGRAFIAS QUE COMPROVAM CABALMENTE O ESTADO DE ABANDONO E MAUS TRATOS EM QUE SE ENCONTRAVA O ANIMAL. OBSERVA SE QUE O CACHORRO ESTAVA ABAIXO DO PESO, COM A DOENÇA DO CARRAPATO, FILARIOSE, DIVERSAS FERIDAS, INCLUSIVE COM A PRESENÇA DE MIÍASE; CIRCUNSTÂNCIAS QUE CAUSARAM DOR E SOFRIMENTO AO ANIMAL, CONFORME RELATADO PELO VETERINÁRIO IZANAGI. PREJUDICADO O RESTABELECIMENTO DA GUARDA DO CÃO, FALECIDO EM 27/01/2022, CONFORME DOCUMENTO ACOSTADO AOS AUTOS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO (ID. 581). CAUSA ESPÉCIE O DESCONHECIMENTO PELO TUTOR, ORA APELANTE, DA SITUAÇÃO DO ANIMAL, EMBORA NÃO ESTIVESSE IMPEDIDO DE VISITÁ LO. FIXAÇÃO DA PENA PECUNIÁRIA EM 01 SALÁRIO MÍNIMO QUE NÃO SE ACOLHE. RÉU EMPRESÁRIO, PROPRIETÁRIO DO RENOMADO ESTABELECIMENTO "C. DO S.", NO BAIRRO NOBRE DE ITAÚNA, EM SAQUAREMA, LOCALIDADE INTERNACIONALMENTE CONHECIDA E PROCURADA PARA A PRÁTICA DE SURF.  DEFESA QUE NÃO LOGROU COMPROVAR A INCAPACIDADE DO RECORRENTE PARA CUMPRIR A PENA DE MULTA IMPOSTA. REJEIÇÃO DA PRELIMINAR E DESPROVIMENTO DO RECURSO.

APELAÇÃO 0005114-03.2021.8.19.0058

QUARTA CÂMARA CRIMINAL

Des(a).  LUIZ MARCIO VICTOR ALVES PEREIRA - Julg: 02/03/2023

 

Ementa número 10

RECEPTAÇÃO

INCERTEZA COM RELAÇÃO À  AUTORIA

PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO

ABSOLVIÇÃO DO RÉU

APELAÇÃO CRIMINAL. DELITO DE RECEPTAÇÃO. DECRETO CONDENATÓRIO. IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA QUE BUSCA A ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS.   Pleito absolutório que merece prosperar. A materialidade delitiva restou devidamente positivada pelos elementos de prova colhidos na fase de inquisa. Noutro giro, após a oitiva da mídia com os depoimentos, tem se que a autoria não se comprovou satisfatoriamente. Isso porque, em que pese os agentes da lei terem declarado que viram o acusado no interior do veículo cortando fios e que o carro já estava bastante desmontado, não foi possível extrair, com certeza, se o carro estava em poder do acusado ou se estava abandonado na rua, tendo o réu se aproveitado da circunstância para furtar os fios. Observa se que o policial T. se recordou que o acusado, informalmente, no momento da abordagem, afirmou que o carro não era seu e que estava extraindo os fios para vender, versão esta em perfeita harmonia com as declarações feitas pelo militares na delegacia. Importa acrescentar que o endereço residencial declarado pelo acusado não coincide com o local dos fatos e, conforme narrativas, o veículo já estava bastante "depenado". Os indícios inquisitoriais não são suficientes e não servem à certeza exigida para o embasamento de uma condenação criminal. Como de sabença geral, em um Estado de Direito não se admite uma condenação fundada em ilações, mas apenas e tão somente em prova segura e hábil a afastar a presunção de inocência insculpida no artigo 5º, LVII, da Constituição da República.  Portanto, não havendo provas suficientes nos autos acerca da autoria, a absolvição é medida que se impõe à luz do princípio do in dubio pro reo.   RECURSO PROVIDO.

APELAÇÃO 0002126-62.2017.8.19.0021

SÉTIMA CÂMARA CRIMINAL

Des(a). MARIA ANGÉLICA GUIMARÃES GUERRA GUEDES - Julg: 02/02/2023

 

Ementa número 11

PROMOTORES DO GAECO

PRINCÍPIO DO PROMOTOR NATURAL

AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO

INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA

DECISÃO DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA

APELAÇÃO.  M.  A.  F.  CONDENADO PELA  PRÁTICA  DOS  CRIMES PREVISTOS NO ARTIGO 35, CAPUT, C/C. 40, INCISOS III, IV E V, AMBOS  DA  LEI  N°.  11.343/06  (ITEM  II  DA  DENÚNCIA);  ARTIGO 33,  CAPUT,  C/C  40,  INCISOS  IV  E  V,  AMBOS  DA  LEI  N°. 11.343/06,  NA  FORMA  DO  ARTIGO  29  DO  CÓDIGO  PENAL  (ITEM III.2 DA DENÚNCIA); ARTIGO 33, CAPUT, DA LEI N°. 11.343/06; NA  FORMA  DO  ARTIGO  29  DO  CÓDIGO  PENAL  (ITEM  III.3  DA DENÚNCIA); ARTIGO 33, CAPUT, DA LEI N". 11.343/06, NA FORMA DO  ARTIGO  29  DO  CÓDIGO  PENAL  (ITEM  III.4  DA  DENÚNCIA),  E ARTIGO 33, CAPUT, DA LEI N°. 11.343/06, NA FORMA DO ARTIGO 29 DO CÓDIGO PENAL (ITEM III.5 DA DENÚNCIA), OS CRIMES DE TRÁFICO NA FORMA DO ARTIGO 71, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL, TUDO NOS MOLDES DO ARTIGO 69 DO CÓDIGO PENAL, À PENA DEFINITIVA DE  17  ANOS,  5  MESES  E  7  DIAS  DE  RECLUSÃO,  EM  REGIME FECHADO E AO PAGAMENTO DE 4.390 DIAS MULTA; JÉSSICA  DOS  SANTOS CONDENADA PELA  PRÁTICA  DO  CRIME  PREVISTO  NO ARTIGO  35,  CAPUT,  C/C  40,  INCISOS  IV  E  V,  AMBOS  DA  LEI  DE DROGAS (ITEM II DA DENÚNCIA), À PENA DEFINITIVA DE 5 ANOS, 1 MÊS E 6 DIAS DE RECLUSÃO, EM REGIME FECHADO, BEM ASSIM AO PAGAMENTO DE 1.180 DIAS MULTA; C. E. G. DE O. CONDENADO PELA PRÁTICA DO CRIME PREVISTO  NO  ARTIGO  35,  CAPUT,  C/C  40,  INCISOS  III,  IV  E  V, AMBOS  DA  LEI  DE  DROGAS  (ITEM  II  DA  DENÚNCIA),  À  PENA DEFINITIVA  DE  5  ANOS,  3  MESES  E  22  DIAS  DE  RECLUSÃO,  EM REGIME FECHADO, E 1.230 DIAS MULTA; R. A. DOS S. A. CONDENADO PELA PRÁTICA DOS CRIMES PREVISTOS NO ARTIGO 35, CAPUT, C/C 40, INCISOS IV E V, AMBOS DA LEI N°. 11.343/06 (ITEM II DA DENÚNCIA); ARTIGO 33, CAPUT, C/C 40, INCISOS IV E V, AMBOS DA LEI N°. 11.343/06, NA FORMA DO ARTIGO 29 DO CÓDIGO PENAL (ITEM III.2 DA DENÚNCIA), NOS MOLDES DO ARTIGO 69 DO CÓDIGO PENAL, À PENA DEFINITIVA DE 11 ANOS E 04 MESES DE RECLUSÃO,  EM REGIME FECHADO, E 1.670 DIAS MULTA; R.  F.  CONDENADO PELA  PRÁTICA  DOS  CRIMES  PREVISTOS  NO ARTIGO 35, CAPUT, C/C 40, INCISO V, AMBOS DA LEI DE DROGAS (ITEM II DA DENÚNCIA), À PENA DEFINITIVA DE 4 ANOS, 11 MESES E  15  DIAS  DE  RECLUSÃO,  EM  REGIME  FECHADO,  E  1.150  DIAS MULTA; M. F. M. CONDENADO PELA PRÁTICA DO CRIME PREVISTO NO  ARTIGO  35,  CAPUT,  C/C  40,  INCISOS  IV  E  V,  AMBOS  DA  LEI  DE DROGAS (ITEM II DA DENÚNCIA), À PENA DEFINITIVA DE 5 ANOS, 1 MÊS E 6 DIAS DE RECLUSÃO, EM REGIME FECHADO, E 1.180 DIAS MULTA; D. DOS S. F. CONDENADA PELA PRÁTICA DO CRIME PREVISTO NO  ARTIGO  35,  CAPUT,  C/C  40,  INCISO  V,  AMBOS  DA  LEI  DE DROGAS (ITEM II DA DENÚNCIA), À PENA DEFINITIVA DE 4 ANOS; 11 MESES E 15 DIAS DE RECLUSÃO, EM REGIME FECHADO, E 1.150 DIAS MULTA. 1  Não procede a alegação de nulidade por violação do princípio do promotor natural, eis que o exercício dos promotores do GAECO não se deu de forma arbitrária, mas com base em prévia resolução da instituição que dispõe que "[a] atuação do GAECO será realizada, prioritariamente na fase de investigação e de oferecimento de denúncia, cumprindo o Promotor Natural oficiar na ação penal", o que ocorreu no caso concreto. 2  A decisão que decretou a interceptação telefônica foi devidamente fundamentada. Houve investigação prévia segundo relatório sobre investigação. Os elementos de investigação obtidos na primeira operação objetivando reprimir o tráfico de drogas, crime punido com reclusão, valeram para fundamentar a deflagração da segunda investigação, de modo que existia indícios de autoria. O meio de obtenção de prova, qual seja a interceptação telefônica, foi devidamente empregado no caso concreto, porquanto é da natureza da conduta prática por membros de associação criminosa para tráfico de drogas a necessidade do emprego de tal meio de obtenção de prova, não havendo meio menos oneroso (invasiva) capaz de desvendar a atuação dos seus inúmeros  integrantes com o detalhamento e a segurança jurídica trazida pela interceptação telefônica, sendo certo ainda que é ônus da defesa demonstrar a violação do disposto no artigo 2°, II, da Lei 9296/1996, o que não ocorreu nos autos. Registre se que as interceptações foram prorrogadas de forma fundamentada por prazo razoável em razão da necessidade de investigar a criminalidade complexa diante de dezenas de integrantes. Vale ressaltar que na operação "Vou de Táxi   Fase I, pela qual o Ministério Público denunciou 92 indivíduos. É cediço também que não há a exigência de degravação dos diálogos objeto de interceptação telefônica em sua integralidade, conforme entendimento do STF, sendo certo que a defesa teve acesso ao conteúdo integral dos diálogos monitorados, podendo impugnar qualquer diálogo trazido como prova pelo MP, além de acrescentar o que lhe parecer relevante. É desnecessária a realização de perícia de voz para identificação de vozes captadas em interceptação telefônica ante a falta de previsão para tal perícia na Lei 9.296/1996.  No caso concreto a Defesa não colocou em dúvida a identificação dos acusados pelas vozes, não havendo requerimento de perícia, de modo que a presente pretensão não comporta acolhimento. 3   Quanto ao mérito convém ressaltar que o Juiz analisou pormenorizadamente todas as provas dos autos, não havendo espaço para prosperar as irresignações defensivas, porquanto os policiais, responsáveis pelas investigações e degravações das interceptações telefônicas, apontam a participação dos Apelantes na associação criminosa. As condenações dos Apelantes foram fundamentadas nos depoimentos prestados pelos os policiais, corroborados pelas comunicações interceptadas, com diálogos em manifesto contexto de traficância organizada com hierarquia e divisões de tarefas. 4   Os crimes de tráfico de drogas apontados foram provados, havendo apreensão dos entorpecentes quando da prisão em flagrante de C. . G., C., R. A. e J., de modo que as materialidades delitivas restaram comprovadas e as autorias também confirme interceptação telefônica e depoimentos dos policiais investigadores. 5   Não é possível aplicar o privilégio do tráfico quando há condenação pelo crime de associação ao tráfico de drogas em razão da dedicação ao tráfico comprovada. 6   As causas de aumento de pena estão provadas nos autos. 7   A dosimetria da pena não merece reforma. As penas formam elevadas de forma proporcional em razão da quantidade e da natureza das substâncias arrependidas, bem como pela reprovabilidade da associação criminosa com inúmeros integrantes. Quanto à agravante da reincidência é importante ressaltar que o STF já declarou a constitucionalidade do instituto por importar em observância da individualização da pena. A substituição de pena pretendida encontra óbice no art. 44 do CP em razão do quantum da pena. Os regimes de cumprimento da pena bem observaram o quantum de pena aplicado a cada um dos acusados, bem como as circunstâncias judiciais negativas. A detração pretendida deve ser realizada pela VEP, não sendo o caso de aplicar o 387, §2º, do CPP porque os regimes de cumprimento de pena foram estabelecidos com fundamento nas circunstâncias judiciais negativas.  Pedido de isenção de custas deve ser direcionado à VEP. CONHEÇO E NEGO PROVIMENTO AO RECURSO.

APELAÇÃO 0014621-32.2018.8.19.0045

TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL

Des(a). PAULO SÉRGIO RANGEL DO NASCIMENTO - Julg: 28/02/2023

 

Ementa número 12

TRÁFICO ILÍCITO  DE ENTORPECENTES

CAMINHÃO DE TRANSPORTE RODOVIÁRIO

DECRETAÇÃO DE PERDIMENTO DO BEM

TERCEIRO DE BOA FÉ

VIOLAÇÃO DO DIREITO DE PROPRIEDADE

RESTITUIÇÃO

ORDEM CONCEDIDA

MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSUAL PENAL. APREENSÃO DE VEÍCULO. PENA DE PERDIMENTO. CAMINHÃO DE TRANSPORTE RODOVIÁRIO. MOTORISTA CONTRATADO PARA SERVIÇO DE FRETE LÍCITO QUE SE UTILIZOU DO CAMINHÃO, PARA GANHO EXTRA, PARA TRANSPORTE DE CARGA SEM NOTA FISCAL, A QUAL SE MOSTROU POSTERIORMENTE SEREM DROGAS. CONDENAÇÃO DO MOTORISTA POR TRÁFICO DE DROGAS, RECONHECIDO O DOLO EVENTUAL. PROPRIETÁRIO TERCEIRO DE BOA FÉ. PLEITO DE RESTITUIÇÃO DO BEM NÃO ANALISADO INICIALMENTE PELO MAGISTRADO A QUO. APESAR DE PEDIDO EXPRESSO DE ABERTURA DE INCIDENTE DE RESTITUIÇÃO DE COISA APREENDIDA, NA FORMA DO ART. 120 DO CPP, ESTE NÃO FORA PROCESSADO PELO MAGISTRADO. SENTENÇA QUE DECRETOU O PERDIMENTO DO BEM APREENDIDO EM FAVOR DA UNIÃO, SEM ANÁLISE DA PROPRIEDADE DO BEM OU DA BOA FÉ DO TERCEIRO. APELAÇÃO INTERPOSTA NÃO RECEBIDA PELO MAGISTRADO SOB ALEGAÇÃO DE ILEGITIMIDADE DO TERCEIRO. INTERPOSIÇÃO DE RECURSO EM SENTIDO ESTRITO QUE ATÉ O MOMENTO NÃO FOI REMETIDO A ESTE TRIBUNAL. IMPETRAÇÃO DO MANDAMUS NO CENTÉSIMO DÉCIMO NONO DIA, DIANTE DA MOROSIDADE DO PROCESSAMENTO DO RESE. SÚMULA 267 DO STF. AFASTAMENTO. EXCEPCIONALIDADE. APESAR DE, EM REGRA, SER INCABÍVEL MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA ATO JUDICIAL PASSÍVEL DE SER COMBATIDO POR RECURSO, ESTE SERÁ CABÍVEL EM SITUAÇÕES TERATOLÓGICAS, ABUSIVAS, OU QUE POSSAM GERAR LESÃO GRAVE OU DE DIFÍCIL REPARAÇÃO. IN CASU, O IMPETRANTE TENTA HÁ MAIS DE 02 ANOS A RESTITUIÇÃO DO SEU BEM, OCORRENDO SUCESSÃO DE ERROS PROCESSUAIS NA CONDUÇÃO DO PEDIDO. É PATENTE O DIREITO LÍQUIDO E CERTO DO IMPETRANTE. O MAGISTRADO FUNDAMENTOU A PERDA DO BEM SOB OS SEGUINTES ARGUMENTOS:  RESTOU PROVADO QUE O CAMINHÃO ERA UTILIZADO, ROTINEIRAMENTE, PARA TRANSPORTE DE CARGAS ILEGAIS, NÃO APENAS DROGAS, MOTIVO PELO QUAL ENTENDO QUE SE TRATA DE INSTRUMENTO DO CRIME (ARTIGO 91, II, "A" DO CP). ASSIM, DECRETO O PERDIMENTO DOS BENS APREENDIDOS EM FAVOR DA UNIÃO . O REGRAMENTO PARA A DECRETAÇÃO DE PERDA DE BENS DIVERGE ENTRE O CÓDIGO PENAL E A LEI DE DROGAS; ENQUANTO ESTA ABARCA TODO E QUALQUER BEM DE VALOR ECONÔMICO APREENDIDO EM DECORRÊNCIA DO TRÁFICO DE DROGAS (ART. 243, PARÁGRAFO ÚNICO, DA CRFB E ART. 61 DA LEI 11.343/06) AQUELE EXIGE A PERDA DOS INSTRUMENTOS DO CRIME, DESDE QUE CONSISTAM EM COISAS CUJO FABRICO, ALIENAÇÃO, USO, PORTE OU DETENÇÃO CONSTITUA FATO ILÍCITO (ART. 91, II,  A , CP). ASSIM, É ABSOLUTAMENTE EQUIVOCADA A UTILIZAÇÃO DE EVENTUAL HABITUALIDADE CRIMINOSA  PARA TRANSPORTE DE CARGAS ILEGAIS  PARA A DECRETAÇÃO DO PERDIMENTO DO BEM, POIS O BEM APREENDIDO   CAMINHÃO   NÃO CONSISTE EM COISA CUJO USO CONSTITUA FATO ILÍCITO. ADEMAIS, CONFORME TEMA 647 EM REPERCUSSÃO GERAL JULGADO PELO EXCELSO STF:  É POSSÍVEL O CONFISCO DE TODO E QUALQUER BEM DE VALOR ECONÔMICO APREENDIDO EM DECORRÊNCIA DO TRÁFICO DE DROGAS, SEM A NECESSIDADE DE SE PERQUIRIR A HABITUALIDADE, REITERAÇÃO DO USO DO BEM PARA TAL FINALIDADE, A SUA MODIFICAÇÃO PARA DIFICULTAR A DESCOBERTA DO LOCAL DO ACONDICIONAMENTO DA DROGA OU QUALQUER OUTRO REQUISITO ALÉM DAQUELES PREVISTOS EXPRESSAMENTE NO ARTIGO 243, PARÁGRAFO ÚNICO, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL . NO CASO CONCRETO, FOI PROVADO QUE A CAMINHONETE FORA UTILIZADA PARA TRANSPORTE DE DROGAS POR PAULO HENRIQUE DOS SANTOS SOUZA, NÃO IMPORTANDO SABER SE TAL TRANSPORTE ERA HABITUAL OU ROTINEIRO. O QUE É NECESSÁRIO ANALISAR, E QUE NÃO FORA DEVIDAMENTE FEITO PELO CULTO MAGISTRADO A QUO, SE REFERE À PROPRIEDADE DO BEM E A EXISTÊNCIA DE BOA FÉ DO TERCEIRO PROPRIETÁRIO, CONFORME DETERMINAM OS ARTIGOS 60, §6º E 63-B, DA LEI 11.343/06.  AS PROVAS PRÉ CONSTITUÍDAS COMPROVARAM A PROPRIEDADE DO VEÍCULO EM NOME DO IMPETRANTE, O SEU REGISTRO COMO TRANSPORTADOR RODOVIÁRIO DE CARGAS PELA ANTT, A SUA CONTRATAÇÃO PARA O TRANSPORTE DA CARGA LÍCITA   APREENDIDA COM AS DROGAS, MAS LOGO DEPOIS LIBERADA PELO MAGISTRADO. CONFORME SE OBSERVA DA SENTENÇA EM QUE SE DECRETOU A PERDA DO BEM APREENDIDO, O MAGISTRADO A QUO CONSIGNOU QUE P. H. CONFESSOU QUE TRABALHAVA DE CARTEIRA ASSINADA PARA O IMPETRANTE HÁ 04 ANOS FAZENDO TRANSPORTES NA CAMINHONETE APREENDIDA E TER UTILIZADO UM APLICATIVO  FRETEBRAS  PARA PEGAR MAIS CARGAS PARA TRANSPORTE, GERALMENTE SEM NOTA FISCAL, PARA  CONSEGUIR UM DINHEIRO EXTRA , SEM O CONHECIMENTO DE SEU CHEFE. NÃO HÁ QUALQUER INDÍCIO QUE O IMPETRANTE, PROPRIETÁRIO DO VEÍCULO TIVESSE QUALQUER CONSCIÊNCIA DAS AÇÕES DE P., AO CONTRÁRIO, TODAS AS PROVAS PRODUZIDAS NO PROCESSO INDICAM QUE O P. SE APROVEITOU DA CONFIANÇA DE SEU CHEFE E FEZ O TRANSPORTE DAS DROGAS SEM SEU CONHECIMENTO. PROVADA A PROPRIEDADE DO VEÍCULO E A CONDIÇÃO DE TERCEIRO DE BOA FÉ DO PROPRIETÁRIO, DEVE SER ESTE RESTITUÍDO AO SEU DONO, EM RESPEITO AO DIREITO DE PROPRIEDADE GARANTIDO PELA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, EM SEU ART. 5º, INCISO XXII, E CONFORME ARTIGO 119 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL.  MANDADO DE SEGURANÇA PROCEDENTE. ORDEM CONCEDIDA

MANDADO DE SEGURANÇA 0093758-62.2022.8.19.0000

SÉTIMA CÂMARA CRIMINAL

Des(a). SIDNEY ROSA DA SILVA - Julg: 02/03/2023

 

 

Este texto não substitui o publicado no Diário Oficial.