EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA DAS TURMAS RECURSAIS 9/2020
Estadual
Judiciário
20/10/2020
21/10/2020
DJERJ, ADM, n. 35, p. 11.
Ementário de Jurisprudência das Turmas Recursais do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA TURMAS RECURSAIS Nº 9/2020
COMISSÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Presidente: Desembargador MARCO ANTONIO IBRAHIM
Organização: Serviço de Publicações Jurisprudenciais da Divisão de Organização de Acervos de Conhecimento - dicac@tjrj.jus.br
Rua Dom Manoel, 29, 2º andar, sala 215, Praça XV
Ementa número 1
ESTADO DO RIO DE JANEIRO
INCLUSÃO NO POLO PASSIVO
DOMICÍLIO DO AUTOR
COMARCA DIFERENTE DA CAPITAL
CABIMENTO
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO SEGUNDA TURMA RECURSAL DE FAZENDA PÚBLICA PROCESSO N°: 0080896-27.2020.8.19.0001 RECORRENTE: DANIEL DA SILVA LOPES RECORRIDOS: ESTADO DO RIO DE JANEIRO EMENTA: NOVA INTERPRETAÇÃO ACERCA DA FIXAÇÃO DA COMPETÊNCIA TERRITORIAL DOS JUIZADOS FAZENDÁRIOS NA HIPÓTESE DO AUTOR RESIDIR EM COMARCA FORA DAS REGIÕES JUDICIÁRIAS ABRANGIDAS PELO MICROSISTEMA. APLICAÇÃO DO ARTIGO 52, CAPUT E § ÚNICO DO CPC. CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO RECURSO. RELATÓRIO: Trata-se de ação pelo rito especial da Lei 12.153/09, proposta em face do Estado do Rio de Janeiro, através da qual o autor, servidor público estadual, alega que vem sendo descontado compulsoriamente um valor a título de Fundo de Saúde da Polícia Militar - FUSPOM, mensalmente em seu contracheque. Diante da arguição de inconstitucionalidade da Lei nº 3.465/2000, chancelada no processo nº 2007.017.00025, foi decidido que tal contribuição compulsória afronta o artigo 149, §1º, da CRFB. Desse modo, pretende o ressarcimento dos valores indevidamente descontados. A inicial veio acompanhada com os documentos de fls. 09/75. O Ministério Público às fls. 83/85 manifestou desinteresse no feito. Sentença de fls. 92/93 julgou extinto o processo, apreciação de mérito, nos termos do artigo 485, inciso IV, do Código de Processo Civil, com base no seguinte fundamento: "Na presente hipótese, a parte autora é domiciliada em Município diverso da Capital. Portanto, o JEFP da Capital não têm jurisdição, sendo assim incompetente para processar e julgar o feito." Recurso Inominado do autor às fls. 97 e seguintes, no qual requer que seja reformada integralmente a respeitável sentença, tornando o I Juizado de Fazenda Pública da Comarca da Capital competente para o julgamento da causa. Após a distribuição do recurso, os autos vieram conclusos. RELATEI DE FORMA BREVE. PASSO AO VOTO. Presentes os requisitos de admissibilidade intrínsecos e extrínsecos, os recursos devem ser conhecidos. O Juízo a quo, decidiu pela incompetência dos Juizados Especiais Fazendários para conhecer de ação ajuizada por parte residente em Município diverso do Rio de Janeiro, com fundamento nos arts. 19, I c/c art. 20 da Lei nº5781/10, in verbis: Art. 19: A jurisdição dos Juizados Especiais da Fazenda Pública se estenderá pelas áreas das Regiões Administrativas Fazendárias Especiais a eles vinculados nesta lei, abrangendo as seguintes Comarcas: * 1ª Região administrativa Fazendária Especial: Comarca da Capital; Art. 20: A jurisdição dos Juizados da Fazenda Pública será a da respectiva Região Administrativa Fazendária especial, conforme o disposto no artigo anterior. O art. 2º da Lei 12.153/09 dispõe sobre a competência absoluta destes Juizados no foro onde estiverem instalados, verbis: Art. 2º. É de competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública processar, conciliar e julgar causas cíveis de interesse dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, até o valor de 60 (sessenta) salários mínimos. §4º No foro onde estiver instalado o Juizado Especial da Fazenda Pública, a sua competência é absoluta. Ressalte-se que em matéria processual era também o entendimento das Turmas Recursais Fazendárias, conforme Enunciado nº10 do Aviso Conjunto TJ/COJES nº12/17, assim consolidado: 10. Os Juizados Especiais da Fazenda Pública da Comarca da Capital não possuem competência territorial funcional para processar e julgar demandas de partes domiciliadas em municípios diversos do Rio de Janeiro, a teor do que dispõem os artigos 19, I e 20 da Lei n. 5781/10 c/c artigo 2º, §4º da Lei n. 12153/09. A competência para processar e julgar essas demandas pertence ao juízo fazendário comum, enquanto não instalados os Juizados Fazendários regionais. (Precedente: RI - processo nº 0261506-29.2016.8.19.0001). Entretanto, considerando as ponderações nos últimos encontros desta Turma Recursal e na reunião do COJES, passou-se a considerar a competência dos Juizados Fazendários da Capital para as ações propostas em face do Estado, nos termos do art. 52, parágrafo único do CPC/15, in verbis: Art. 52. É competente o foro de domicílio do réu para as causas em que seja autor Estado ou o Distrito Federal. Parágrafo único. Se Estado ou o Distrito Federal for o demandado, a ação poderá ser proposta no foro de domicílio do autor, no de ocorrência do ato ou fato que originou a demanda, no de situação da coisa ou na capital do respectivo ente federado. Neste passo, demonstra-se que, embora o referido diploma legal tenha concedido a possibilidade do autor propor a ação em seu domicílio, faculta-lhe a escolha da Comarca da Capital para ajuizamento de ações em que o Estado for o demandado. Não se pode olvidar que a mens legis era de evitar o deslocamento do autor e/ou seu patrono para outra Comarca, fora de seu domicílio. No entanto, com o advento do processo eletrônico houve grande evolução neste quesito, pois, exceto em caso de audiências, essa necessidade de deslocamento deixou de existir. Além disso, sendo o autor, nestes casos, a parte mais vulnerável na relação jurídica, não se pode privá-lo da maior celeridade proporcionada pelos Juizados Especiais Fazendários, que atuam em causas de menor complexidade e consequentemente maior celeridade processual. Assim, entende-se, com fulcro no já mencionado art. 52 do CPC/15, que o Juizado Especial Fazendário é competente para o conhecimento e julgamento de demandas em que o Estado do Rio de Janeiro figure no polo passivo, ainda que a parte autora resida em Comarca diversa da Capital, devendo a sentença ora vergastada ser anulada, resolvendo-se o mérito da demanda. Diante do exposto, voto pelo CONHECIMENTO e PROVIMENTO do recurso inominado do autor de fls. 97 e seguintes para anular a r. sentença de fls. 92/93 e determinar o retorno dos autos ao juízo a quo, para prosseguimento do feito. Sem custas e sem honorários, diante do provimento do recurso. Rio de Janeiro, 20 de agosto de 2020. DANIELA BANDEIRA DE FREITAS Juíza Relatora
RECURSO INOMINADO 0080896-27.2020.8.19.0001
Segunda Turma Recursal Fazendária
Juiz(a) DANIELA BANDEIRA DE FREITAS - Julg: 31/08/2020
Ementa número 2
INSTITUIÇÃO FINANCEIRA
CONTRATO DE SEGURO
CÂNCER
PREEXISTÊNCIA
NÃO CONFIGURAÇÃO
PAGAMENTO
INOCORRÊNCIA DE DANO MORAL
Processo: 0002561-77.2019.8.19.0017 Recorrente/Réu: BANCO DO BRASIL Recorrido/Autor: RENATA GOMES DE SOUSA VOTO A parte autora alega que em outubro/2017 contratou " BB Seguro Vida Mulher Mais". Ocorre, que em novembro/2017, fora diagnosticada com câncer de mama, sendo informada em fevereiro/2018, pela própria gerente que teria direito ao seguro contratado. Todavia, ao solicitar o seguro, teve seu pedido indeferido em 14/05/2018, sob a alegação de que o diagnóstico da doença neoplásica foi confirmado em data anterior ao início da cobertura para a garantia reclamada, que tem um prazo de carência estabelecido nas condições gerais, após o início da vigência do seguro. Entretanto, frisa que o direito da autora se iniciou em 18/10/2017, onde consta a vigência do contrato até o ano de 2022. Requer o pagamento das indenizações previstas no seguro e indenização por danos morais. Em contestação, a ré apresenta preliminar da falta de interesse de agir. No mérito, destaca que o contrato firmado entre as partes, juntado pela autora às fls. 22 à 26, é claro ao fixar carência de 90 dias da data de início da vigência para a cobertura de diagnóstico de câncer de mama. Assim, sustenta que o diagnóstico da parte autora ocorrera antes do prazo de carência convencionado entre as partes, que se findaria em 18/01/2018. Requer o acolhimento da preliminar ou a improcedência dos pedidos. A sentença julgou procedentes os pedidos para, condenar a parte ré à restituição da quantia de R$ 30.000,00 e ao pagamento da quantia de R$3.000,00, a título de compensação pelos danos morais. Recurso do réu: apresenta preliminar de ilegitimidade passiva e da incompetência do juizado especial. Ademais, aponta que não há falar em condenação do Banco recorrente em restituir a quantia de R$30.000,00, porquanto o mesmo não atua no ramo de seguros, limitando-se a agir como agente intermediário, de modo que, se houver dever de indenizar, deve responder apenas a CIA DE SEGUROS ALIANÇA BRASIL. Requer a improcedência dos pedidos. É o relatório, decido. Preliminar de ilegitimidade passiva que se rejeita, pois o documento de fls. 22/25 evidencia claramente a contratação do serviço perante o réu. De fato, conforme corretamente constou na fundamentação da sentença:"Em defesa, a ré sustenta que negou cobertura pois constatou que a doença da parte autora era pré existente. Quanto à contratação do seguro, vejo que se tornou incontroversa, o que dispensa maiores fundamentações. É cediço que nos contratos de seguro, os contratantes têm a obrigação de agir com boa-fé e transparência em relação às declarações ou circunstâncias que possam influir na celebração do negócio (art. 765 do Código Civil). Cabe à seguradora, ora ré, averiguar o real estado de saúde do segurado antes da celebração do contrato, não podendo vir depois tentar se eximir do pagamento da indenização, após receber as devidas contraprestações, sob o fundamento de preexistência da moléstia. (...) Portanto, nada adianta a prestadora de serviços alegar a preexistência da doença e a má-fé do consumidor, se não realizou exames prévios à contratação. Em nenhum momento restou demonstrado que o segurado, no momento da contratação tinha plena consciência da preexistência da doença. Além disso, não há nos autos qualquer prova de que a doença fosse de fato preexistente, já que a empresa ré não se desincumbiu do ônus que lhe cabia. Sendo assim, o pedido de pagamento do valor previsto na apólice de seguro em relação ao diagnóstico de câncer (R$30.000,00 - fl. 22) deve ser julgado procedente". Entretanto, constata-se que a circunstância vivenciada pelo consumidor constitui mero dissabor, mormente porque para que se possa falar em dano extrapatrimonial, necessário que a pessoa seja atingida em sua honra, reputação ou personalidade, passe por dor, humilhação, constrangimentos, tenha os próprios sentimentos violados, o que não ocorreu no caso em apreço. A questão posta em discussão possui natureza estritamente material, inexistindo a comprovação de qualquer negativação indevida, sendo certo que a ausência de cobertura do sinistro, por si só e como regra, não gera dano moral indenizável, podendo justificar eventualmente a resolução contratual e, conforme o caso, a respectiva reparação dos danos materiais. Isto posto, VOTO no sentido de conhecer do recurso no mérito, dou-lhe provimento parcial para julgar improcedente o pedido de danos morais, mantida no mais a sentença. Sem ônus da sucumbência face ao êxito parcial. . Rio de janeiro, 28 de setembro de 2020. ÉRICA DE PAULA RODRIGUES DA CUNHA JUÍZA RELATORA
RECURSO INOMINADO 0002561-77.2019.8.19.0017
CAPITAL 1a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS
Juiz(a) ERICA DE PAULA RODRIGUES DA CUNHA - Julg: 30/09/2020
Ementa número 3
INTERRUPÇÃO DO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA
RESTABELECIMENTO
DEMORA EXCESSIVA
DANO MORAL
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO CONSELHO RECURSAL - 2ª TURMA RECURSAL Processo nº: 0030249-14.2020.8.19.0038 RECORRENTE: CHRISTIANY MARCIA RAMOS GIFFONI RECORRIDO: LIGHT SERVICOS DE ELETRICIDADE S A VOTO Afirma a autora ter havido demora desproporcional da ré no restabelecimento do serviço de energia elétrica, após temporal ocorrido em 28/04/2019. Aduz ter ficado seis dias sem energia elétrica em sua residência. Pleiteia indenização por danos morais. Sentença que JULGOU IMPROCEDENTES OS PEDIDOS. Recurso da parte autora. É o breve relatório. Passo a decidir. Sentença que merece reparo. A relação jurídica que ora se examina é de consumo, pois o autor é destinatário final da energia elétrica fornecida pela ré, daí a necessidade de se resolver a lide dentro da norma consumerista prevista no Código de Proteção e Defesa do Consumidor. Da leitura do artigo 14 do CPDC, verifica-se que a responsabilidade do consumidor é objetiva e somente não responderá pela reparação dos danos causados se provas que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste ou o fato é exclusivo do consumidor ou de terceiro. Caberia à concessionária ré demonstrar que não são verdadeiros os fatos narrados. Em que pese tenha impugnado especificamente os números de protocolos de atendimento constantes da Petição Inicial, a demanda reconhece que houve interrupção do serviço, limitando-se a argumentar que foi por período inferior a 09 (nove) horas. Porém, não há nos autos qualquer prova de tal alegação, tendo a ré apresentado somente tela produzida unilateralmente à fl. 76. Cumpre ressaltar que o dano moral, na hipótese, não advém da interrupção inicial do serviço, que se deu por força de temporal, mas, sim, da demora excessiva e injustificada em seu restabelecimento. Isto posto, VOTO no sentido de julgar parcialmente procedente o pedido autoral, condenando a ré ao pagamento de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), acrescido de juros a partir da citação e correção monetária a partir da presente data, quantia que se mostra mais adequada face ao princípio da razoabilidade, ao caráter punitivo-pedagógico da condenação. Sem ônus sucumbenciais. Rio de Janeiro, 30/09/20. FABIANO REIS DOS SANTOS JUIZ DE DIREITO
RECURSO INOMINADO 0030249-14.2020.8.19.0038
CAPITAL 2a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS
Juiz(a) FABIANO REIS DOS SANTOS - Julg: 30/09/2020
Ementa número 4
DESACATO
AUSÊNCIA DE DOLO
DESABAFO
ATIPICIDADE
Processo nº 0001034-79.2018.8.19.0032 Apelante: MINISTÉRIO PÚBLICO Apelado: CLAUDIO AFONSO DA SILVA RELATÓRIO Trata-se de apelação interposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, objetivando a reforma da r. sentença de fls. 88/89, que julgou improcedente o pedido formulado na denúncia, com fundamento na atipicidade (art. 331 do CP). Sustenta o Parquet, em síntese, que o réu agiu sob o dolo de ofender, humilhar e menosprezar a fiscal sanitária do Município, que estava no exercício de suas funções. Aduz, ainda, que os termos utilizados pelo réu, em tom de ameaça, de que o agente público "fez vista grossa", além do alerta para que os fiscais "não mexessem" com ele, caracterizam o crime de desacato. Requer, ao final, a condenação do apelado pela prática do delito previsto no artigo 331, caput, do Código Penal (fls. 96/99). A Defensoria Pública, em contrarrazões, manifesta-se no sentido de que a sentença seja mantida, negando-se, por conseguinte, provimento ao recurso interposto, sustentando, em síntese, a não comprovação que o apelado teria praticado o delito de desacato (fls. 116/120). A Defensoria da Turma Recursal ratificou as contrarrazões defensivas, bem como formulou pedido de aditamento, consistente na não recepção do artigo 331 do CP, por incompatibilidade com os incisos IV e IX, do art. 5º c/c 37, caput, ambos da CRFB (fls. 122/125). O Ministério Público que atua junto à Turma Recursal manifestou-se pela manutenção da sentença recorrida, ressaltando sua posição acerca do descabimento da tese de "inconvencionalidade" do crime de desacato, de modo que pugna pelo desprovimento do recurso ministerial (fls. 126/129). Rio de Janeiro, 24 de junho de 2020. Gisele Guida de Faria - Relatora Processo nº 0001034-79.2018.8.19.0032 Apelante: MINISTÉRIO PÚBLICO Apelado: CLAUDIO AFONSO DA SILVA VOTO Conheço do recurso, pois presentes seus pressupostos. Trata-se de Recurso de Apelação interposto pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro contra a sentença de fls. 88/89, que julgou improcedente o pedido formulado na denúncia, por entender que o fato narrado na denúncia seria atípico (art. 331 do CP). Em que pese os argumentos trazidos pelo Ministério Público, meu voto será pelo desprovimento do recurso. I. Da atipicidade: O crime de desacato, previsto no artigo 331 do Código Penal, se caracteriza pela ação de "Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela". É sabido que cometerá o crime de desacato aquele que ofender, vexar, humilhar, menosprezar, ou agredir o funcionário público, atingindo-lhe a dignidade ou o decoro da função, podendo constituir-se em palavras ou atos, bem como em violência que importe contravenção de vias de fato, ou crime de lesões corporais. Nesse contexto, exige-se o dolo do desacato, ou seja, a vontade consciente de praticar a ação, ou proferir a palavra injuriosa com o propósito de ofender, ou desrespeitar o funcionário público a quem se dirige, não configurando o crime, mera expressão produto de desabafo ou revolta momentânea. Dessa forma, para sua caracterização, deve o autor do fato saber que está se dirigindo a um funcionário público e que a ofensa é irrogada em razão desta, sendo correto afirmar que a ignorância ou erro sobre essas circunstâncias, exclui o dolo do desacato, como, também, o estado emotivo, ou colérico do agente. No caso em exame, restou comprovado que os fatos narrados na denúncia não se subsumem ao delito de desacato. Isso porque, pelos depoimentos dos funcionários Laura e Jean da vigilância sanitária da secretaria Municipal de Saúde de Mendes/RJ, verifica-se que a conduta praticada pelo apelado não se adequa ao delito de desacato. Registre-se que o réu deixou de trazer sua versão aos autos, pois foi decretada sua revelia. Com efeito, os fiscais de vigilância sanitária, Laura (fls. 90) e Jean (fls. 91) declararam que compareceram, por três vezes, na residência do pai do acusado para averiguação de uma denúncia relativa à criação de animais em área urbana e, notificaram o réu sobre a proibição do criadouro, tendo o mesmo continuado com a criação dos animais (galinhas), apenas diminuindo a quantidade (três a quatro). Em momento posterior, a servidora Laura recebeu do apelado a mensagem mencionada na denúncia, através do aplicativo Facebook (messenger) com o seguinte teor: "Sacanagem sua. Tu é parente do meu filho e vem aqui na minha casa me multar"; "Se vier aqui de novo vai ter que consertar aquelas cadeiras do comércio da praça"; "tem também o moreno do fim do ponto que vocês fizeram vista grossa" e "não mexa comigo que eu não mexo com vocês". Note-se que as declarações do acusado denotam irresignação genérica e desprovida do dolo de causar mal futuro e grave. Na verdade, o réu apenas demonstrou discordância com a atuação dos fiscais, que não verificavam que havia cadeiras quebradas na praça pública e, questionava também, o motivo pelo qual era o único interpelado em relação aos demais comerciantes locais. Assim, tais frases não tiveram o dolo de ofender, menosprezar, diminuir ou desprestigiar a fiscal sanitária Municipal, como bem pontuado pelo Ministério Público da Turma Recursal. Por todo exposto, verifica-se que a sentença de improcedência deve ser mantida, por seus próprios fundamentos, no que tange ao reconhecimento da atipicidade delitiva, porquanto, como bem fundamentado pela Juíza sentenciante, os fatos caracterizam opinião pessoal do apelado que não configuram o crime de desacato, sendo certo que o termo "sacanagem sua, tu é parente do meu filho", não guarda correlação com a função pública, nem a intenção de menosprezo, mas sim, se refere ao fato de haver relação de parentesco entre eles, por ser o réu pai do filho da prima da fiscal, Laura, apontada como vítima. II. Da inconstitucionalidade e inconvencionalidade do delito de desacato: Não merece prosperar a tese de atipicidade da conduta, haja vista que o crime de desacato se encontra recepcionado pela ordem constitucional vigente, não havendo, ainda, incompatibilidade com a Convenção Americana de Direitos Humanos, até porque o direito à liberdade de expressão não é absoluto. Ademais, o escopo do referido tratado é preservar o direito a livre manifestação de opiniões, particularmente aquelas que possam ser considerados inconvenientes a um regime político, por se referirem a atos praticados por agentes públicos específicos, conservando, desta maneira, a possibilidade de controle por parte da população dos atos do Estado. Tal garantia é, sem sombra de dúvida, elementar para a subsistência de um Estado democrático de direito. Todavia, a ofensa gratuita e injuriosa praticada contra o funcionário público não está amparada pelo referido tratado, tampouco pela garantia constitucional da liberdade de expressão. Assim decidiu a 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, em 24/05/17, sendo relator o Ministro Antônio Saldanha Pinheiro. Nesta decisão, sustenta o Eminente Magistrado que o tipo penal do desacato não inibe a liberdade de expressão, apenas restringe a averbação ao funcionário nos limites da civilidade e educação: "HABEAS CORPUS. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. VIOLAÇÃO DO ART. 306 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO E DOS ARTS. 330 E 331 DO CÓDIGO PENAL. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. MANUTENÇÃO DA TIPIFICAÇÃO DO CRIME DE DESACATO NO ORDENAMENTO JURÍDICO. DIREITOS HUMANOS. PACTO DE SÃO JOSÉ DA COSTA RICA (PSJCR). DIREITO À LIBERDADE DE EXPRESSÃO QUE NÃO SE REVELA ABSOLUTO. CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE. INEXISTÊNCIA DE DECISÃO PROFERIDA PELA CORTE (IDH). ATOS EXPEDIDOS PELA COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS (CIDH). AUSÊNCIA DE FORÇA VINCULANTE. TESTE TRIPARTITE. VETORES DE HERMENÊUTICA DOS DIREITOS TUTELADOS NA CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. POSSIBILIDADE DE RESTRIÇÃO. PREENCHIMENTO DAS CONDIÇÕES ANTEVISTAS NO ART. 13.2. DO PSJCR. SOBERANIA DO ESTADO. TEORIA DA MARGEM DE APRECIAÇÃO NACIONAL (MARGIN OF APPRECIATION). INCOLUMIDADE DO CRIME DE DESACATO PELO ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO, NOS TERMOS EM QUE ENTALHADO NO ART. 331 DO CÓDIGO PENAL. INAPLICABILIDADE, IN CASU, DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO TÃO LOGO QUANDO DO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. WRIT NÃO CONHECIDO. [...] 7. Embora a Comissão Interamericana de Direitos Humanos já tenha se pronunciado sobre o tema "leis de desacato", não há precedente da Corte relacionada ao crime de desacato atrelado ao Brasil. 8. Ademais, a Corte Interamericana de Direitos Humanos se posicionou acerca da liberdade de expressão, rechaçando tratar-se de direito absoluto, como demonstrado no Marco Jurídico Interamericano sobre o Direito à Liberdade de Expressão. 9. Teste tripartite. Exige-se o preenchimento cumulativo de específicas condições emanadas do art. 13.2. da CADH, para que se admita eventual restrição do direito à liberdade de expressão. Em se tratando de limitação oriunda da norma penal, soma-se a este rol a estrita observância do princípio da legalidade. [...] 13. Controle de convencionalidade, que, na espécie, revela-se difuso, tendo por finalidade, de acordo com a doutrina, "compatibilizar verticalmente as normas domésticas (as espécies de leis, lato sensu, vigentes no país) com os tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo Estado e em vigor no território nacional." 14. Para que a produção normativa doméstica possa ter validade e, por conseguinte, eficácia, exige-se uma dupla compatibilidade vertical material. 15. Ainda que existisse decisão da Corte (IDH) sobre a preservação dos direitos humanos, essa circunstância, por si só, não seria suficiente a elidir a deliberação do Brasil acerca da aplicação de eventual julgado no seu âmbito doméstico, tudo isso por força da soberania que é inerente ao Estado. Aplicação da Teoria da Margem de Apreciação Nacional (margin of appreciation). 16. O desacato é especial forma de injúria, caracterizado como uma ofensa à honra e ao prestígio dos órgãos que integram a Administração Pública. Apontamentos da doutrina alienígena. 17. O processo de circunspeção evolutiva da norma penal teve por fim seu efetivo e concreto ajuste à proteção da condição de funcionário público e, por via reflexa, em seu maior espectro, a honra lato sensu da Administração Pública. 18. Preenchimento das condições antevistas no art. 13.2. do Pacto de São José da Costa Rica, de modo a acolher, de forma patente e em sua plenitude, a incolumidade do crime de desacato pelo ordenamento jurídico pátrio, nos termos em que entalhado no art. 331 do Código Penal. 19. Voltando-se às nuances que deram ensejo à impetração, Documento: 73399234 - EMENTA / ACORDÃO - Site certificado - DJe: 30/06/2017 Página 3 de 4 Superior Tribunal de Justiça deve ser mantido o acórdão vergastado em sua integralidade, visto que inaplicável o princípio da consunção tão logo quando do recebimento da denúncia, considerando que os delitos apontados foram, primo ictu oculi, violadores de tipos penais distintos e originários de condutas autônomas. 20. Habeas Corpus não conhecido. (HC Nº 379.269/MG, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, 3ª Seção, julgado em 24/05/2017). Assim como todos os demais princípios constitucionais, a liberdade de expressão deve ser lida em consonância com os outros princípios, como o da legalidade. Dessa forma, deve haver ponderação no sentido de não sobrepor a liberdade absoluta, em detrimento da honra e dignidade do funcionário público. Assim, não há que se falar em descriminalização do delito do artigo 331 do Código Penal junto às normas constitucionais. Por tais razões, entendo que a sentença de fls. 88/89, deve ser confirmada por seus próprios fundamentos, aos quais me reporto, em consonância com recente decisão do Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal que reconheceu a repercussão geral do tema contido no RE 635729, reafirmando a jurisprudência da referida Corte no seguinte sentido: EMENTA Juizado especial. Parágrafo 5º do art. 82 da Lei nº 9.099/95. Ausência de fundamentação. Artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal. Não ocorrência. Possibilidade de o colégio recursal fazer remissão aos fundamentos adotados na sentença. Jurisprudência pacificada na Corte. Matéria com repercussão geral. Reafirmação da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. (RE 635729 RG / SP - SÃO PAULO, REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO, Relator Min. Dias Toffoli, Julgamento: 30/06/2011). Pelo fio do exposto, voto no sentido de CONHECER do recurso e, no mérito, NEGAR-LHE PROVIMENTO. Rio de Janeiro, 30 de setembro de 2016. ALBERTO SALOMÃO JUNIOR JUIZ DE DIREITO RELATOR Processo nº. 0005128-21.2014.8.19.0029 Primeira Turma Recursal Criminal Sendo assim, voto pelo conhecimento e não provimento do recurso. Rio de Janeiro, 24 de junho de 2020. Gisele Guida de Faria - Relatora Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro II Turma Recursal Criminal 1 Processo nº 0001034-79.2018.8.19.0032 II Turma Recursal Criminal
APELAÇÃO CRIMINAL 0001034-79.2018.8.19.0032
CAPITAL 2a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CRIMINAIS
Juiz(a) GISELE GUIDA DE FARIA - Julg: 30/06/2020
Ementa número 5
ESTATUTO DO IDOSO
GRATUIDADE DE JUSTIÇA
EXCLUSÃO DO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS
Agravo de Instrumento nº 0000827-74.2020.8.19.9000 Proc. Origem: 0070505-13.2020.8.19.0001 Agravante: Wantoir Gonçalves Ferreira Agravado: Estado do Rio de Janeiro V O T O Trata-se de agravo de instrumento interposto em face de decisão que indeferiu o pedido de gratuidade de justiça requerido pelo autor, ora agravante. Sustenta que o Juízo a quo teria ignorado o fato de se tratar de idoso, pelo que alega fazer jus à isenção prevista no artigo 17, inciso X, da Lei Estadual nº 3.350/99, ainda que perceba rendimento líquido de R$ 7.375,32. Deferida a antecipação parcial dos efeitos da tutela recursal. Não foram apresentadas contrarrazões. É O BREVE RELATÓRIO. DECIDO. Conforme dispõe o artigo 17, inciso X, da Lei Estadual nº 3.350/99, Art. 17 - São isentos do pagamento de custas: (...) X - os maiores de 65 anos que recebam até 10 salários mínimos. Note-se que embora o agravante não faça jus à gratuidade de justiça ante o valor de seus rendimentos, eis que percebe valor bruto superior a R$ 14.000,00, como se vê pelo contra cheque de fls. 135 dos autos principais, se enquadra na regra de isenção legal acima transcrita, porquanto possui 66 anos de idade, como dá conta a carteira de identidade cuja cópia restou acostada às fls. 08 dos autos principais. Assim, sem olvidar que a referida regra legal apenas diz respeito às custas processuais - mas não em relação à taxa judiciária - considerando que somente teria que recolher em razão da interposição de recurso inominado valores a título de custas, entendo presentes os requisitos para a concessão a antecipação dos efeitos da tutela recursal. Isto posto, VOTO pelo PROVIMENTO PARCIAL do agravo interposto, nos termos da fundamentação supra. Transitada em julgado, dê-se baixa, remetendo-se cópia do presente acórdão ao Juízo de origem. Rio de Janeiro, 14 de setembro de 2020. JOÃO FELIPE NUNES FERREIRA MOURÃO Juiz de Direito Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Primeira Turma Recursal Fazendária
AGRAVO DE INSTRUMENTO 0000827-74.2020.8.19.9000
CAPITAL 1 TURMA RECURSAL DOS JUI ESP FAZENDA PUB.
Juiz(a) JOÃO FELIPE NUNES FERREIRA MOURÃO - Julg: 23/09/2020
Ementa número 6
AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO DE CUSTAS
INTIMAÇÃO
INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL
CANCELAMENTO DA DISTRIBUIÇÃO DO PROCESSO
PROCESSO Nº: 0002876-25.2019.8.19.9000. IMPETRANTE: ROMILDO DE SÁ ALENCAR. IMPETRADO: IV JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DA CAPITAL. VOTO Mandado de segurança impetrado contra decisão de indeferimento da gratuidade de justiça, proferida nos autos do processo nº 0205128-48.2019.8.19.0001, com pedido de liminar para determinar o processamento de recurso inominado. O impetrante requer a concessão de gratuidade de justiça também neste mandamus. A inicial veio acompanhada dos documentos de fls. 17/74. Decisão de fls. 77, concedendo prazo de cinco dias para juntada dos três últimos extratos da conta corrente, da conta poupança e das faturas do cartão de credito do impetrante, bem como declaração de imposto de renda dos últimos três anos ou certidão de isento, a fim de ser apreciado o pedido de gratuidade de justiça. O impetrante juntou os documentos de fls. 73/112. Decisão de fls. 113, indeferindo a gratuidade de justiça e determinando o recolhimento das custas, sob pena de cancelamento da distribuição. Certidão cartorária de fls. 115, informando a ausência de manifestação do impetrante. É o breve relatório. Passo ao voto. Conforme certificado pela Secretaria das Turmas Recursais (certidão de fls. 115), o impetrante não efetuou o recolhimento das custas neste mandamus, apesar de intimado. O artigo 290 do Código de Processo Civil estabelece que a distribuição do processo será cancelada quando a parte, intimada na pessoa de seu advogado, não realizar o pagamento das custas. Desta forma, não havendo recolhimento das custas, deve a inicial ser indeferida, com o consequente cancelamento da distribuição. Ante o exposto, VOTO no sentido de indeferir a petição inicial e determinar o cancelamento da distribuição, na forma do artigo 10 da Lei 12.016/09 c/c art. 290 do CPC. Nos termos da Resolução CM nº 14/2012, independe de inclusão em pauta a análise do indeferimento da inicial (artigo 13, inciso VI). Custas pela impetrante. Sem honorários advocatícios, na forma da Súmula nº 512, do STF e da Súmula 105, do STJ. Intimem-se os interessados. Após, dê-se baixa e arquivem-se. Rio de Janeiro, 03 de setembro de 2020. JULIANA ANDRADE BARICHELLO Juíza Relatora.
MANDADO DE SEGURANÇA - CPC 0002876-25.2019.8.19.9000
CAPITAL 2a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS
Juiz(a) JULIANA ANDRADE BARICHELLO - Julg: 03/09/2020
Ementa número 7
PROGRAMA SOCIO TORCEDOR
PANDEMIA DE COVID-19
NÃO REALIZAÇÃO DOS JOGOS
COBRANÇA DO PLANO
CANCELAMENTO
NULIDADE DA MULTA
ESTADO DO RIO DE JANEIRO PODER JUDICIÁRIO Segunda Turma Recursal Cível Autos n°: 0119832-24.2020.8.19.0001 Recorrente: GUILHERME DE CARVALHO MANTOVANO Recorrido: CLUBE DE REGATAS DO FLAMENGO VOTO Fatos: Alega a parte autora que é participante do clube de sócio torcedor do réu, através do plano +Paixão e, apesar da não realização de jogos durante a pandemia do Covid-19, bem como a orientação para evitar aglomerações, como em jogos em estádios, o réu continua efetuando as cobranças do plano regularmente todos os meses. Além do pacote normal, o autor adquiriu dois pacotes, no valor total de R$ 2.730,00, que lhe davam direito a dois jogos sempre que o clube réu jogasse "em casa", os quais no cenário atual se tornaram inócuos. O autor, então, enviou um email ao réu questionando a inexistência de possibilidade de suspensão do plano ou algo semelhante, tendo recebido como resposta que nada poderia ser feito e que não havia tal possibilidade. Ainda, o autor foi informado que se efetuasse o cancelamento do plano, teria que arcar com 50% de multa. Ao verificar que outras pessoas estavam com o mesmo problema e recorrendo ao PROCON, o autor efetuou a sua própria reclamação junto ao órgão para tentar uma solução sem sucesso. Pedido: - Requer o cumprimento da tutela antecipada para suspender o pagamento das parcelas subsequentes do contrato de Sócio Torcedor Flamengo; - Requer o restituição dos valores pagos nos dois pacotes contratados no valor de R$ 2.730,00, ou devolução proporcional ao tempo em que fora utilizado; - O Cancelamento e devolução das prestações do PLANO +PAIXÃO já pagos a partir do evento Pandemia, ou seja, a partir de março de 2020; - Se não for possível o cancelamento do pagamento, que seja rescindindo o contrato sem que se pague multa no valor de 50% das prestações subsequentes; - Condenação ao pagamento por danos morais em valores a serem arbitrados. Prova: Fls.: 28- cartão; 29/30- faturas; 31/32- e-mails. TUTELA ANTECIPADA INDEFERIDA Fls.: 36 Contestação: Fls.: 62/77 e 207/222- Alega a parte ré preliminarmente incompetência do juízo e ilegitimidade passiva. No mérito, alega que mesmo sem a compra de ingressos para partidas do Flamengo, o autor permaneceu tendo acesso aos benefícios que foram contratados por ele. Afirma que a cobrança de multa rescisória de 50% do valor restante a ser pago no contrato segue estritamente os ditames constantes nos termos de uso do programa. Aduz que no ato de contratação o sócio já adquire os benefícios por todo o tempo contratado, o parcelamento é apenas uma forma de facilitar que os torcedores consigam arcar com os custos do plano, sendo possível o pagamento integral. ACIJ NÃO REALIZADA Sentença: Fls.: 363/365- Homologado pelo(a) Dr(a).: Flavio Citro Vieira de Mello "Em face de todo o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO, conforme o art. 487, I do CPC, para; (I) condenar o réu a cancelar o programa de sócio torcedor, em nome do autor, no prazo de 05 dias, devendo o réu comprovar em juízo o cancelamento, sob pena de multa diária de R$50,00 (cinquenta reais); (II) condenar a ré ao pagamento de R$ 2.730,00 (dois mil setecentos e trinta reais), a título de danos materiais, devidamente corrigido a partir do ajuizamento da demanda e acrescido de juros de mora na taxa de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação. Advirto a Parte Ré, desde já, que a quantia acima referida deverá ser depositada em até 15 (quinze) dias a contar do trânsito em julgado desta, sob pena de multa de 10% do valor da indenização na forma do art. 523 do CPC e do Enunciado Jurídico n° 08 oriundo do VIII Encontro de Juizados Especiais Cíveis e Turmas Recursais" Fundamentação: "Rejeito a preliminar de incompetência do juízo, tendo em vista que o caso narrado nos autos é claramente uma reclamação acerca de relação de consumo, não tendo relação com a matéria cabível ao Juizado Especial do Torcedor. Não se fala em qualquer questão acerca de estádios e jogos e sim da relação de consumo travada entre o autor e o réu, para qual o presente juízo é competente. Rejeito a preliminar de ilegitimidade passiva, porque a presença das condições para o exercício regular do direito de ação deve ser aferida, à luz da consagrada Teoria da Asserção, de acordo com as afirmações feitas pelo autor na inicial, sendo a procedência das mesmas questão afeta ao mérito, devendo com ele ser apreciada. No que tange ao caso em apreço, o Autor trouxe em fls. 28 carteirinha de sócio do autor, em fls. 29/30 cobrança dos pacotes extras, em fls. 31/32 contato com o réu e resposta do mesmo. Compulsando-se os autos, verifica-se que o autor reclama que mesmo não havendo a ocorrência de jogos ou pela orientação da OMS de não participar de aglomerações, o réu continua a efetuar cobranças regulares acerca do programa sócio torcedor. Além disso, o autor pagou por dois pacotes para obter ingressos específicos, que não pode usar em razão da não ocorrência dos jogos. O réu, em contestação, afirma que o programa concede outros benefícios que não as facilidades para aquisição de ingressos, bem como se trata de valor anual parcelado, e não valores mensais. De acordo com os documentos apresentados aos autos, verifica-se que apesar das alegações que constam da defesa do réu, o mesmo em nada se manifestou acerca dos pacotes extras adquiridos pelo autor referentes a ingressos de jogos "em casa". Em relação a tal serviço, não há que se discutir que o mesmo não está tendo resultado uma vez que os jogos somente foram retomados recentemente e sem presença de público, sem que se possa vislumbrar o momento em que os torcedores poderão novamente comparecer aos estádios. Dessa forma, com relação aos pacotes extras, o valor deverá ser ressarcido. Acerca do plano de sócio torcedor, em que pese o réu ter informado a existência de outros benefícios que não a prioridade na aquisição de ingressos, não conseguiu demonstrar quais seriam esses, nem como poderiam ser aplicados ao autor, por exemplo. Ressalto, inclusive, que a maior parte dos "termos e condições" anexado pelo réu trata sobre a compra e venda de ingressos para participantes do programa, deixando apenas uma pequena parte a outras facilidades, a qual ali também não são explicadas. Sendo assim, considerando a inviabilidade de comparecimento a jogos no cenário atual e o desejo da parte autora, deverá o réu cancelar o seu plano de sócio torcedor. Contudo, ressalto que deverá ser aplicada a multa prevista contratualmente, tendo em vista que a ausência de prestação dos serviços em questão não decorre de discricionariedade do réu. Com relação ao pleito de restituição dos valores pagos a partir de março, entendo não ser possível seu acolhimento porque não há qualquer comprovação dos valores quitados, nem tampouco restou liquidado o pedido. Não pode este juízo emitir sentença condenatória ilíquida, pelo que tal pedido não pode ser acolhido. Acerca do pedido de danos morais, também entendo pelo não acolhimento, uma vez que em que pese o autor tenha razão em relação a não prestação dos serviços, tal fato decorreu de caso fortuito que foi a pandemia criada pelo Covid-19, fato este que está fora dos riscos assumidos pelo réu quando lançou o seu programa de sócio torcedor, pelo que não há como ser responsabilizado pelas medidas tomadas pelas organizações de saúde e pelos chefes do Poder Executivo." Embargos de declaração: (X) sim () não Fls.: 378/380 e 389/395- AMBOS REJEITADOS Recurso: (X) autor () réu Fls.: 412/417- requer a reforma da sentença conforme termos da inicial, salientando que embora o dispositivo passe a ideia de que haverá o cancelamento sem incidência de multa de fidelização, por sua vez, em sua fundamentação, o cancelamento da multa não se deu, tendo ficado confuso. Aduz que a multa para cancelamento do contrato num valor de 50% é abusiva por si só, independente se haverá ou não jogos e que deve receber a restituição dos valores pagos pelo Plano após o mês de março de 2020. Deferimento da JG Fls.: 424/425 Contrarrazões: (X) sim () não Fls.: 434/443- Impugna as alegações do recorrente, prestigiando a manutenção da sentença. Salienta que as cobranças são regulares e devidas, não cabendo restituição. É o relatório, passo a votar: Trata-se de recurso autoral contra sentença que julgou parcialmente procedente seus pedidos. Insurge-se sobre a multa de 50% cobrada sobre as parcelas vincendas em havendo cancelamento do contrato de plano sócio torcedor. Nota-se que devido a pandemia que assola a população mundial o contrato não fora cumprido concernente a uma imposição das autoridades públicas a fim de se evitar a propagação do vírus covid-19. Neste sentido, embora a ausência da prestação de serviço não decorra da discricionaridade do réu, o autor, ora contratante, também não poderá arcar com uma multa sobre cancelamento de um serviço que não está usufruindo, não tendo, por conseguinte responsabilidade na quebra contratual. Neste sentido, evidente a nulidade da cláusula objeto da lide, eis que coloca o recorrente em desvantagem exagerada. No mais, mantenho a sentença como lançada, haja vista ausência de comprovação de pagamento das mensalidades referente a março em diante, totalizando R$1.948,00. Ressalto que tal comprovação é de fácil acesso ao autor consoante informação de cobrança através de cartão de crédito. Isto posto, VOTO no sentido de conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento para declarar nula a cobrança da multa rescisória de 50% objeto da lide. No mais mantenho a sentença como lançada. Sem sucumbência, ante o recurso exitoso. PAULO LUCIANO DE SOUZA TEIXEIRA Juiz Relator RECURSO INOMINADO 0119832-24.2020.8.19.0001
CAPITAL 2a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS
Juiz(a) PAULO LUCIANO DE SOUZA TEIXEIRA - Julg: 01/10/2020
Ementa número 8
GRATUIDADE DE JUSTIÇA
DESERÇÃO DO RECURSO
AVISO-PRÉVIO
MANDADO DE SEGURANÇA CONCEDIDO
Mandado de Segurança 0000417-16.2020.8.19.9000 Impetrante: Lygia Soares Mendonça Machado Impetrado: XI Juizado Especial Cível Regional da Leopoldina VOTO Trata-se de Mandado de Segurança contra decisão que indeferiu o pedido de gratuidade de justiça feito pela impetrante, no Processo nº 0024489-87.2019.8.19.0210. A impetrante juntou, às fls. 25/33, prova de Aviso Prévio de seu marido, bem como diversas despesas que possui. As provas dos autos não são suficientes para demonstrar que a autora possui condições de arcar com as custas processuais sem prejuízo de seu próprio sustento e de sua família. Há, portanto direito líquido e certo a ser amparado. Face ao exposto, VOTO no sentido de conceder a segurança a fim de ser deferida a gratuidade de justiça à impetrante, devendo ser recebido e processado o recurso interposto, superada a questão da deserção. Sem honorários. P.I. Rio de Janeiro, 03 de setembro de 2020 RICARDO DE ANDRADE OLIVEIRA JUIZ RELATOR
MANDADO DE SEGURANÇA - CPC 0000417-16.2020.8.19.9000
CAPITAL 2a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS
Juiz(a) RICARDO DE ANDRADE OLIVEIRA - Julg: 10/09/2020
Ementa número 9
INSTITUIÇÃO BANCÁRIA
GOLPE DO "MOTOBOY"
CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA
EXCLUSÃO DA OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR
VOTO No caso em comento, trata-se do conhecido "golpe do motoboy", amplamente divulgado nos canais de comunicação e frequentemente debatido por este E. TJRJ. Entendo estar configurada a culpa exclusiva da vítima, já que não há qualquer comprovação da ingerência do banco em todo o trâmite do golpe - o que também representa verdadeiro fortuito externo. O que se vê é que o autor da demanda voluntariamente forneceu os dados necessários à consumação da fraude, além de entregar seu cartão à motoboy que não integra os quadros da sociedade empresária - por ter feito interpretação errada da situação vivenciada. Diante de tal cenário (e da monstruosa quantia que lhe foi inicialmente debitada), o autor deveria ter entrado em contato com sua gerente pessoal ou ter ido à agência física do Banco, na tentativa de solucionar o problema. Mas jamais ter entregue seus cartões à pessoa física trajada de motoboy. Configura-se, pois, a excludente de responsabilidade que enseja o dever de indenizar. RECURSO PROVIDO.
RECURSO INOMINADO 0030809-67.2020.8.19.0001
CAPITAL 1a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS
Juiz(a) SIMONE GASTESI CHEVRAND - Julg: 30/09/2020
Ementa número 10
ATO OBSCENO
REPERCUSSÃO GERAL
SOBRESTAMENTO
INOCORRÊNCIA
PENA DE MULTA
Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Conselho Recursal dos Juizados Especiais Primeira Turma Recursal Criminal Apelação nº 0033.442-98.2018.8.19.0202 Apelante: FERNANDO ANTONIO CORREIA RODRIGUES Apelado: MINISTÉRIO PÚBLICO R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso interposto pela Defesa do réu FERNANDO ANTONIO CORREIA RODRIGUES, condenado pela prática da infração penal prevista no artigo 233 do Código Penal. Pretende a Defesa em preliminar, que seja reconhecida a violação ao disposto no artigo 1.035, parágrafo 5º, do Código de Processo Civil, porque o STF reconheceu a repercussão geral sobre o tema, sendo determinada a suspensão dos processos. Assim, requer seja declarada a nulidade da r. sentença e determinada a suspensão do processo. No mérito, que não há prova suficiente para condenação, pleiteando a absolvição do réu na forma do artigo 397, inciso III do Código de Processo Penal; subsidiariamente, requer a mantença da pena no patamar lançado na sentença. Denúncia a fl. 02/A-02v. Narra a denúncia, em síntese que o réu, com consciência e vontade, praticou ato obsceno ao abaixar as calças e exibir seu pênis dentro de sua casa, mas com a porta aberta; que assim agiu para que a vítima visse tal cena, por não gostar do filho dela. Termo circunstanciado e demais peças oriundas da Delegacia Policial a fl. 02/14. Audiência preliminar a fl. 30. Requerimentos do MP a fl. 15 e do réu a fl. 16. Termos de declaração de testemunhas a fl. 19/21 e 24/27. Proposta de transação penal a fl. 31, sendo rejeitada a fl. 37/38. Resposta à acusação a fl. 51/58, com documentos a fl. 59/70. Ata de Audiência de Instrução e Julgamento a fl. 78/81, na qual foi recebida a denúncia e colhida a prova oral. Alegações finais a fl. 82/83, 86/95 (com peças a fl. 96/132) e 134/135. Petição do réu a fl. 140/145v, com peças a fl. 146/161. Sentença a fl. 162/170, condenando o réu à pena de multa, no mínimo legal. Razões recursais da Defesa a fl. 181/195. Contrarrazões a fl. 201/203 e 205/206. Parecer recursal a fl. 207v. Rio de Janeiro, 24 de agosto de 2020. TELMIRA DE BARROS MONDEGO JUÍZA RELATORA Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Conselho Recursal dos Juizados Especiais Primeira Turma Recursal Criminal Apelação nº 0033.442-98.2018.8.19.0202 Apelante: FERNANDO ANTONIO CORREIA RODRIGUES Apelado: MINISTÉRIO PÚBLICO V O T O Artigo 233 do Código Penal - Repercussão reconhecida pelo E. STF - Ausência de determinação superior, para suspensão das ações penais em curso - Preliminar que se rejeita - Réu que abaixa as calças e exibe sua genitália - Ato obsceno configurado - Prova produzida em observância a princípios constitucionais e legais - Depoimentos colhidos em Juízo, apontando para a autoria imputada ao réu - Dolo de praticar ato obsceno - Eventuais conflitos de vizinhança não podem justificar o crime praticado - Pena de multa corretamente fixada, no mínimo legal - Sentença condenatória que se mantém, integralmente. Trata-se de recurso interposto pela Defesa do réu FERNANDO ANTONIO CORREIA RODRIGUES, condenado pela prática da infração penal prevista no artigo 233 do Código Penal. Pretende a Defesa em preliminar, que seja reconhecida a violação ao disposto no artigo 1.035, parágrafo 5º, do Código de Processo Civil, porque o STF reconheceu a repercussão geral sobre o tema, sendo determinada a suspensão dos processos. Assim, requer seja declarada a nulidade da r. sentença e determinada a suspensão do processo. No mérito, que não há prova suficiente para condenação, pleiteando a absolvição do réu na forma do artigo 397, inciso III do Código de Processo Penal; subsidiariamente, requer a mantença da pena no patamar lançado na sentença. Estão presentes os requisitos de admissibilidade recursal, razão pela qual deve ser conhecido. Em preliminar, pretende a Defesa que seja declarada a nulidade do processo e suspensão de seu curso, por ter sida reconhecida a repercussão geral acerca da constitucionalidade do artigo 233 do Código Penal. Apesar da Defesa ter instruído suas razões com cópias de r. decisões proferidas pelo E. Supremo Tribunal Federal, não lhe assiste razão. Com efeito, o Supremo Tribunal Federal, nos autos do RE 1093553 RG/RS, que trata exatamente da constitucionalidade do artigo 233 do Código Penal, manifestou-se pela existência de questão constitucional e repercussão geral da matéria. Todavia, não determinou a suspensão das ações penais em curso e, por tal razão, não cabe à Justiça da Primeira Instância fazê-lo. É que, nos autos do RE 966.177 (que trata sobre a constitucionalidade do artigo 50 do Decreto-Lei no 3.688/41), onde também foi reconhecida a repercussão geral do tema, instado a se manifestar sobre a suspensão, S. Exa. o Ministro Relator Luiz Fux, assim o fez: "No paradigmático julgamento da questão de ordem suscitada por este Relator no presente recurso extraordinário, foram estabelecidas pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, dentre outras, as seguintes premissas: a) o §5º do art. 1035 do CPC é passível de aplicação, em tese, aos processos penais, uma vez que o recurso extraordinário, independentemente da natureza do processo originário, possui índole essencialmente constitucional, sendo esta, em consequência, a natureza do instituto da repercussão geral àquele aplicável; b) de qualquer modo, a suspensão de processamento prevista no supracitado dispositivo não é consequência automática e necessária do reconhecimento da repercussão geral, sendo da discricionariedade do relator do recurso extraordinário paradigma determiná-la ou modulá-la; c) por outro lado, se a suspensão de processamento vir a ser determinada a partir da sobredita avaliação discricionária do Relator, isto implicará a sustação curso da prescrição da pretensão punitiva dos crimes objeto dos processos suspensos (tão-somente ações penais, uma vez que a medida não abrange procedimentos de investigação), o que perduraria até o julgamento definitivo do recurso extraordinário paradigma pelo Supremo Tribunal Federal. (...) Ocorre que, em nenhum momento posteriormente a esse julgamento, procedeu este Relator à determinação de sobrestamento de que trata o art. 1035, §5º, do CPC, sendo certo, nesse contexto, que, até eventual manifestação em contrário, deve prevalecer a presunção de constitucionalidade do ato normativo questionado, até porque, repita-se, na linha do que esclareceu o Plenário ao julgar a questão de ordem, a referida hipótese de suspensão de processamento não é consequência necessária e automática do reconhecimento da repercussão geral." - grifei. Portanto, não tendo havido qualquer determinação para a suspensão de ações e/ou procedimentos criminais que se refiram ao tipo penal em comento, rejeito a preliminar sustentada pela i. Defesa. Passo ao exame do mérito. A instrução criminal seguiu em estrita observância aos princípios constitucionais do devido processo legal, contraditório e ampla defesa, sendo oportunizada aos litigantes a possiblidade de produção de todo o gênero de prova em Direito admitida. Foram observados, ainda, os princípios da informalidade, celeridade e economia processuais, tendo o Ministério Público pugnado pela juntada de mídia, sendo admitida como meio de prova. A referida mídia permaneceu acautelada em Cartório, entendendo esta Magistrada ser desnecessária sua juntada e análise, eis que seu conteúdo é incontroverso. Nesse passo, em Audiência foram colhidos os depoimentos da vítima direta, de uma informante e do réu. Digo vítima direta pois, não obstante o sujeito passivo do crime do artigo 233 do Código Penal ser a sociedade, pode o particular, diretamente envolvido no fato, sentir-se igualmente e até mais lesionado do que a própria coletividade. Assim, a vítima direta no evento, qual seja, a vizinha do réu, prestou depoimento idôneo, claro e conclusivo, apontando sem dúvida para a autoria delitiva que a ele foi imputada. O réu, por seu turno, admitiu a prática delitiva em comento, qual seja, que abaixou suas calças e exibiu seu órgão genital, sabedor que sua porta estava aberta - local de visualização de sua vizinha/vítima. Não lhe aproveita a alegação de que a vítima direta não estava presente no local, nem visualizado o ato obsceno, diante do idôneo depoimento prestado em Juízo. Em suas palavras: "todos na casa da vítima viram (...), que pode afirmar que todas as pessoas em sua casa viram o fato" (fl. 79). Mesmo se ela não tivesse visto, o mesmo atuar reprovável seria ofensivo à moral e bons costumes, e uma vez que chegado o fato ao conhecimento da vítima, estaria ela justificada a procurar a Autoridade Policial, para lavratura do termo circunstanciado - como efetivamente o fez. Como já dito, desimportante para a análise recursal a juntada da mídia. Isto porque é incontroverso seu conteúdo, qual seja, a exibição, pelo réu, de seu órgão genital, visto que claramente reconhecido por ele e por sua i. Defesa - fl. 185, no 12. Portanto, a autoria é inconteste e o crime foi consumado. Na lição de Rogerio Greco, "a consumação ocorre no momento em que o agente pratica o ato obsceno em lugar público, ou aberto, ou exposto ao público", que o caracterizou como crime "formal (bastando a prática do comportamento considerado valorativamente como obsceno)" - Código Penal Comentado - 6ª Edição - pág. 744 - Ed. Impetus. Resta a análise do elemento subjetivo, qual seja, o dolo de praticar o ato obsceno, ofendendo o sentimento médio de pudor. Ora, abaixar as calças e exibir a genitália escapa de qualquer normalidade, violando regras mínimas de respeito que devem vigorar em sociedade. Ao assim agir, no mínimo o réu assumiu o risco de ser visto por terceiros, o que caracterizaria seu dolo eventual. Todavia, reconheço o dolo direto. Tanto a vítima, quanto o réu e sua companheira, afirmaram que o réu abaixou as calças e exibiu o órgão genital, estando patente a esta Magistrada que o fez para que fosse visto e com cunho ofensivo. Embora o réu tenha praticado a conduta dentro de seu apartamento, certo é que agiu de porta aberta, de modo que local era facilmente visualizado pela vizinhança. A própria companheira do réu, muito embora tenha tentado afastar - em vão - a responsabilidade dele, declarou que "tendo o mesmo praticado o ato obsceno deste processo (...) que não sabe dizer quanto tempo seu companheiro ficou com a calça abaixada balançando o pênis; que enquanto seu companheiro balançava o pênis, a depoente permaneceu no banheiro (...); que foi o autor do fato quem abriu a porta; (...) que ao ser avisado que estava sendo filmado, viu o autor do fato estava na porta da cozinha praticando os gestos narrados na denúncia". A referida informante, em momento algum, referiu-se ao ato obsceno praticado pelo réu como retorsão à injusta provocação feita por terceiro. O réu, em seu interrogatório, admite ter praticado o crime, sustentando, em seu favor, que assim agiu por retribuição a idêntica postura de terceira pessoa. Entretanto, tal tese está dissociada do conjunto probatório produzido, à saciedade, nos autos. Aliás, eventual discussão pretérita ou mesmo dissabores entre os vizinhos não têm o condão de servir como justificativa para o atuar reprovável do réu. Violação de direitos de vizinhança deve ser objeto de ação própria e perante o Juízo competente, não podendo dar azo à prática de infrações penais de nenhuma natureza. A conduta praticada pelo réu é típica e antijurídica, não tendo a i. Defesa logrado comprovar qualquer causa que afaste sua responsabilidade penal. Ainda que haja alguma discussão, na Superior Instância, acerca do crime em análise, não se pode considerar seu significado relativo, nem alterar sua relevância ao tentar impor mudança de acordo com o decorrer do tempo e valores culturais. Nas palavras de Rogerio Greco, "Ato obsceno é um conceito eminentemente normativo, que depende, obrigatoriamente, de um juízo de valor para que possa ser compreendido. O princípio da adequação social poderá auxiliar o intérprete, servindo como termômetro que identifica o pudor médio" (ob. cit. P. 743). A conduta praticada sempre foi e ainda hoje é considerada avessa à moral, jamais podendo ser tida como razoável ou socialmente tolerável. O réu, ainda, é plenamente imputável, seja porque seu atuar é moralmente reprovável pelo homem médio, seja porque facilmente comprovado pelos depoimentos de sua companheira e em seu próprio interrogatório, que praticou a conduta de forma livre e consciente. Deste modo, a condenação resultou não de análise superficial e precipitada, mas sim de considerações detalhadas sobre os elementos colhidos nos autos, em especial aos depoimentos colhidos em Audiência diante da sensatez do digno e culto Juiz Natural. De igual modo, foi fixada a pena de multa e em seu mínimo legal, por atender o critério pedagógico-repressivo-punitivo da sanção penal. Nenhum retoque há de ser feito. Portanto, VOTO no sentido de que CONHECIDO e NEGADO PROVIMENTO ao recurso interposto, mantendo-se a r. sentença por seus irretocáveis fundamentos. Rio de Janeiro, 24 de agosto de 2020. TELMIRA DE BARROS MONDEGO JUÍZA RELATORA 2
APELAÇÃO CRIMINAL 0033442-98.2018.8.19.0202
CAPITAL 1a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CRIMINAIS
Juiz(a) TELMIRA DE BARROS MONDEGO - Julg: 03/09/2020
Este texto não substitui o publicado no Diário Oficial.