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EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA DAS TURMAS RECURSAIS 9/2021

EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA DAS TURMAS RECURSAIS 9/2021

Estadual

Judiciário

19/10/2021

DJERJ, ADM, n. 32, p. 19.

Ementário de Jurisprudência das Turmas Recursais do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA TURMAS RECURSAIS Nº 9/2021 COMISSÃO DE JURISPRUDÊNCIA Presidente: DESEMBARGADOR MARCO ANTONIO IBRAHIM Organização: Serviço de Publicações Jurisprudenciais da Divisão de Organização de Acervos de Conhecimento -... Ver mais
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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA TURMAS RECURSAIS Nº 9/2021

COMISSÃO DE JURISPRUDÊNCIA

Presidente: DESEMBARGADOR MARCO ANTONIO IBRAHIM

Organização: Serviço de Publicações Jurisprudenciais da Divisão de Organização de Acervos de Conhecimento - dicac@tjrj.jus.br

Rua Dom Manoel, 29, 2º andar, sala 215, Praça XV

 

 

Ementa número 1

MAUS TRATOS CONTRA IDOSOS

MEDIDAS DESPENALIZADORAS

DESCABIMENTO

ENTENDIMENTO DO S.T.F

DECISÃO DENEGATÓRIA DE HABEAS CORPUS

HABEAS CORPUS n.º 0000896-72.2021.8.19.9000        Impetrante: CARLOS AUGUSTO SILVA DOS SANTOS JUNIOR     Paciente:     SOLANGE NOGUEIRA DE CARVALHO       Relatora: Juíza de Direito ALINE ABREU PESSANHA    Habeas Corpus.  Aplicação da Lei nº 9.099/95 ao Estatuto do Idoso. Artigo 94 do Lei nº 10.741/2003. Plenário do Supremo Tribunal Federal que, no julgamento da ADI 3096/DF, atribuiu ao mencionado dispositivo interpretação conforme a Constituição da República de 1988 e extraiu a seguinte norma jurídica: aos delitos previstos no Estatuto, cujas penas privativas de liberdade máximas não ultrapassem 4 (quatro) anos, aplica se somente o procedimento sumaríssimo previsto na lei dos juizados especiais, não se aplicando, portanto, qualquer medida despenalizadora, nem qualquer interpretação benéfica ao autor do delito contra o idoso. Efeitos vinculante e erga omnes da decisão final da ADI. Aplicação dos artigos 102, §2º, da Constituição da República e 28, parágrafo único, da Lei nº 9.868/99. Impossibilidade de, in casu, o suposto autor do fato ser beneficiado com composição civil de danos, transação penal ou suspensão condicional do processo. Superior Tribunal de Justiça que segue essa orientação por meio de decisão monocrática, conforme autoriza o artigo do 255, §4º, inciso II, do seu Regimento Interno. Constrangimento ilegal não caracterizado. Prosseguimento da ação penal. Ordem de habeas corpus denegada.      A C Ó R D Ã O       Vistos, relatados e discutidos estes autos de Habeas Corpus nº 0000896-72.2021.8.19.9000, em que é impetrante CARLOS AUGUSTO SILVA DOS SANTOS JUNIOR, paciente SOLANGE NOGUEIRA DE CARVALHO, e impetrado o Juízo do IV Juizado Especial Criminal da comarca da Capital.                                 A C O R D A M , os Juízes de Direito da Segunda Turma Recursal Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, em votação unânime, DENEGAR A ORDEM DE HABEAS CORPUS.                .     R E L A T Ó R I O                            Habeas Corpus, com pedido liminar, impetrado para suspender Ação Penal nº 0073349-67.2019.8.19.0001 até o julgamento do writ e, no mérito, pelo trancamento do mencionado procedimento criminal.    2. O impetrante alega, em síntese, que o juízo do 4º Juizado Especial Criminal da comarca da Capital não concedeu "a possibilidade de composição civil, transação penal, bem como suspensão condicional do processo, por entender ser crime praticado contra idoso, sendo inviável com base na ADI nº 3096". Diz que tal decisão configura evidente constrangimento ilegal. Explica que o decisum do Supremo Tribunal Federal "não inviabilizou as medidas despenalizadoras de todos os crimes do estatuto do idoso (lei 10.741/03), e sim, [apenas d]aquela que a pena é maior do que 02 (anos) não excedendo a 04 (quatro) anos, o que dispõe o artigo 94 da lei 10.741/03". Relata que a paciente foi denunciada pela prática, em tese, do crime previsto no artigo 99 da Lei nº 10.741/2003, cujo preceito secundário traz pena máxima de 1 ano. Diz que, de acordo com a inicial acusatória, a paciente teria, consciente e voluntariamente, exposto a perigo a integridade e a saúde, física e psíquica, dos idosos Helio de Carvalho e Maridea Nogueira de Carvalho. Afirma que o Ministério Público ofereceu transação e suspensão condicional do processo. Reconhece que na AIJ o Parquet requereu a reconsideração das propostas, "com base na ADI nº 3096, fundamentando que os crimes contra idoso é incabível medidas despenalizadoras". Destaca que os benefícios da Lei nº 9.099 foram oferecidos após a mencionada decisão do STF. Insiste que a decisão atacada não aplicou corretamente a decisão da Corte Constitucional. Fixa que é possível a aplicação dos institutos despenalizadores previstos na Lei dos Juizados para os crimes cuja pena máxima não ultrapassem 2 anos.     3. Ao final, requer, liminarmente, a suspensão da ação penal até o julgamento do mérito do HC e, ato contínuo, seja decretada "a nulidade d[a] decisão que inviabilizou as medidas despenalizadoras, consequentemente, que seja realizada audiência preliminar para o oferecimento de tais medidas, como já foi ofertada uma proposta de transação penal, na fl. 66 nos autos do processo (...), uma vez que é imputado a paciente o crime do artigo 99 da lei 10.741/03 e a pena máxima é de 01 (um) ano".     4. Despacho no qual deixei de deferir a liminar, por não haver teratologia na decisão (v.g. STJ, REsp 1642596 AM), e requisitei informações à autoridade apontada como coatora (TJe 21).    5. Ofício encaminhado à autoridade apontada como coatora, solicitando informações (fls. 22).    6. Informações da autoridade apontada como coatora, em 28/06/2021, nas quais aponta a situação processual e o entendimento adotado por aquele juízo. Aduz, em síntese, que o Ministério Público, inicialmente, ofereceu proposta de transação penal, porém a acusada/paciente não foi encontrada e, sobre a proposta, não se manifestou. Em 13/10/2020, a paciente constituiu advogado, contudo, não compareceu a duas sessões de mediação designadas pelo CEJUSC. Conta que, na audiência ocorrida em 02/06/2021, "o Ministério Público reconsiderou a sua proposta de transação penal, tendo em vista a imputação de crime contra idoso, de acordo com o entendimento do STF, na ADI 3096. Diante de tal manifestação, este Juízo prosseguiu com a instrução, estando os autos ora conclusos para sentença". Sustenta que o melhor entendimento sobre a decisão da referida ADI é que não há que se distinguir os crimes cuja pena máxima não exceda 2 anos. Afirma que, ainda que fosse admitida a aplicação das medidas despenalizadoras, ela não faria jus ao benefício, por não atender às condições subjetivas previstas na Lei nº 9.099/95 (TJe 25/27).    7. Decisão na qual indeferi a liminar e determinei a remessa dos autos ao Ministério Público para manifestação (fls. 28/31).    8. Manifestação do Ministério Público que atua nesta Turma Recursal, opinando pelo conhecimento e, no mérito, desprovimento do writ, com fundamento no artigo 94 do Estatuto do Idoso (fls. 33).    9. Os autos vieram conclusos, sendo devolvidos com pedido de inclusão em pauta.    V O T O           10. Habeas corpus no qual o impetrante pretende seja decretada a nulidade da decisão proferida na Ação Penal nº 0000829-02.2021.8.19.0208, que recebeu a denúncia, bem como, seja designada audiência preliminar, sob o fundamento de serem cabíveis os institutos despenalizadores da Lei dos Juizados ao crime previsto no artigo 99 do Estatuto do Idoso, cuja pena máxima é de 1 (um) ano.    11. Contudo, a ordem deve ser denegada. Isso porque a decisão proferida pela autoridade apontada como coatora não é teratologia, ao contrário. Senão vejamos:    12. Na audiência de instrução e julgamento realizada em 02 de junho de 2021, o Ministério Público   titular da ação penal   reconsiderou suas manifestações anteriores, retirando as propostas de benefícios previstos na Lei nº 9.099, e requereu o recebimento da denúncia apresentada, com o seguinte fundamento:    "Incabível a composição civil, a transação penal, bem como a suspensão condicional do processo, tendo em vista o resultado da ADI nº 3096, que vetou a aplicação das medidas despenalizadoras quando a hipótese for de crime contra o idoso."    13. Em ato contínuo, a defesa técnica da paciente apresentou defesa preliminar, a denúncia foi recebida e foi realizada a fase de instrução.     14. Nesse contexto, "Não cabe ao juiz, que não é o titular da ação penal, substituir se ao órgão ministerial ou ao querelante para formular de ofício a proposta (...), sob pena de evidente violação ao art. 129, inciso I, da Constituição Federal" (in LIMA, Renato Brasileiro de Lima. Legislação criminal especial comentada: volume único   9. ed., rev., atual. e ampl.   Salvador: JusPODIVM, 2021, p. 620).    15. Apenas nas hipóteses de recusa injustificada do órgão do MP em oferecer os benefícios previstos na Lei do Juizado (S. 696, STF) ou de o juiz não concordar com o seu conteúdo, é que caberá a aplicação do artigo 28 do Código de Processo Penal, por analogia.    16. Entretanto, o caso dos autos não se enquadra nessas hipóteses. Isso porque o Supremo Tribunal Federal, por meio da ação direta de inconstitucionalidade (ADI 3096 5), ao analisar o  artigo 94 da Lei nº 10.741/03 (Estatuto do Idoso), decidiu que aos crimes  praticados contra os idosos se aplica, unicamente, o rito sumaríssimo disciplinado na Lei nº 9.099/95. No entanto, excluiu qualquer possibilidade de aplicação de medidas despenalizadoras ao suposto autor do fato (SAF).    17. Confira-se a ementa do mencionado julgado, que é esclarecedora:    "AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGOS 39 E 94 DA LEI 10.741/2003 (ESTATUTO DO IDOSO). RESTRIÇÃO À GRATUIDADE DO TRANSPORTE COLETIVO. SERVIÇOS DE TRANSPORTE SELETIVOS E ESPECIAIS. APLICABILIDADE DOS PROCEDIMENTOS PREVISTOS NA LEI 9.099/1995 AOS CRIMES COMETIDOS CONTRA IDOSOS. 1. No julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 3.768/DF, o Supremo Tribunal Federal julgou constitucional o art. 39 da Lei 10.741/2003. Não conhecimento da ação direta de inconstitucionalidade nessa parte. 2. Art. 94 da Lei n. 10.741/2003: interpretação conforme à Constituição do Brasil, com redução de texto, para suprimir a expressão "do Código Penal e". Aplicação apenas do procedimento sumaríssimo previsto na Lei n. 9.099/95: benefício do idoso com a celeridade processual. Impossibilidade de aplicação de quaisquer medidas despenalizadoras e de interpretação benéfica ao autor do crime. 3. Ação direta de inconstitucionalidade julgada parcialmente procedente para dar interpretação conforme à Constituição do Brasil, com redução de texto, ao art. 94 da Lei n. 10.741/2003." (ADI 3096, Relator(a): CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 16/06/2010, DJe 164 DIVULG 02 09 2010  PUBLIC 03 09 2010 EMENT VOL 02413 02  PP 00358 RTJ VOL 00216 01 PP 00204, grifei)"    18. Assim, diante dos efeitos vinculantes e erga omnes da decisão final na ADI (ut artigo 102, parágrafo 2º, da CRFB/88 e artigo 28, parágrafo único, da Lei nº 9.868/99), o suposto autor de crimes contra idosos não pode ser beneficiado com composição civil de danos, transação penal ou suspensão condicional do processo.     19. Por essa razão, aliás, o Superior Tribunal de Justiça vem decidindo monocraticamente no mesmo sentido. Confira se trecho da decisão proferida pelo Ministro RIBEIRO DANTAS, em 1º.08.2018, no julgamento do REsp 1.642.596 AM, transcrito aqui apenas no que importa aqui:    "(...) O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 3096/DF (Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe nº 164. Divulgação 02/09/2010, Publicação 03/09/2010), conferiu interpretação conforme ao artigo 94 da Lei n. 10.741/2003. O citado dispositivo assim dispõe:   'Aos crimes previstos nesta lei, cuja pena máxima privativa de liberdade não ultrapasse 4 (quatro) anos, aplica se o procedimento previsto na Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, e, subsidiariamente, no que couber, as disposições do Código Penal e do Código de Processo Penal.'     Pois bem, no julgamento da ADI 3096, o Supremo deu a este dispositivo interpretação conforme a Constituição para aplicá lo apenas no que diz respeito ao procedimento sumaríssimo previsto na Lei n. 9.099/95, a fim de garantir ao idoso o benefício da celeridade processual.     Avançando nesse raciocínio, o Pretório Excelso vedou a possibilidade de que fossem aplicadas quaisquer das medidas despenalizadoras previstas na referida lei, bem como que houvesse interpretação benéfica   quanto às disposições do artigo 94   ao autor do crime previsto no Estatuto do Idoso.     (...) Portanto, de acordo com o entendimento do Supremo Tribunal Federal, as medidas despenalizadoras previstas na Lei n. 9.099/1995 não são aplicáveis aos autores de crimes previstos no Estatuto do Idoso.  (...)" (STJ   REsp: 1642596 AM 2016/0320317 4, Relator: Ministro RIBEIRO DANTAS, Data de Publicação: DJ 08/08/2018, grifei)    20. Posto isso, voto no sentido de CONHECER do writ e, no mérito, DENEGAR A ORDEM do presente Habeas Corpus.      Rio de Janeiro, 17 de setembro de 2021.        Juíza de Direito ALINE ABREU PESSANHA  R E L A T O R A       Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro     SEGUNDA TURMA RECURSAL CRIMINAL          Habeas Corpus nº 0000896-72.2021.8.19.9000   fls. 1      

HABEAS CORPUS   CRIMINAL 0000896-72.2021.8.19.9000

CAPITAL 2a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CRIMINAIS

Juiz(a) ALINE ABREU PESSANHA - Julg: 23/09/2021

 

Ementa número 2

INJÚRIA

IMUNIDADE PROFISSIONAL

ADVOGADO

DECISÃO CASSADA

PROSSEGUIMENTO DO FEITO

Apelação  Processo nº 03257210-09.2019.8.19.0001  Apelante: MARIO FIGUEIREDO BARBOSA NETO  Apelado:  LUCELENA ABRANTES FERREIRA  Relatora: Dr.ª CLÁUDIA GARCIA COUTO MARI                     APELAÇÃO CRIMINAL. AÇÃO PENAL PRIVADA. REJEIÇÃO DA QUEIXA CRIME. INOCORRÊNCIA DE PERDÃO JUDICIAL POR PROVOCAÇÃO REPROVÁVEL. HIPÓTESE DE IMUNIDADE PROFISSIONAL.  PROVIMENTO DO RECURSO PARA CASSAR A DECISÃO  E DETERMINAR O PROSSEGUIMENTO DO FEITO.                 RELATÓRIO           Cuida se de recurso de apelação interposto pelo Querelante, ora apelante, em face da decisão proferida pela MMª Juíza de Direito do IV Juizado Especial Criminal do Leblon   Comarca da Capital, que rejeitou a queixa crime, entendendo que a hipótese é de perdão judicial, na forma do inciso I do paragrafo 1º do artigo 140 do CP, sob fundamento de que o ofendido de forma reprovável provocou diretamente a injúria (fls. 30/31).                Em suas razões de apelação, a fls. 36/49, objetiva a reforma da decisão com o prosseguimento do feito, aduzindo que em dois áudios agressivos foi chamado de "babaca", "canalha", "podre", "merda" e "covarde".                 Afirmou que um ato de advogado, protegido por imunidade profissional, inclusive reconhecido em sentença, não pode configurar uma provocação reprovável que isente a querelada de pena.                Sustentou que a extinção precoce do feito, sem aplicação da reprimenda jurídica, frustra o ideal de justiça e a busca da pacificação social, já que o perdão judicial foi concedido antes da instrução, o que é rechaçado pela jurisprudência e doutrina.                Em contrarrazões (fls. 84/91), a querelada sustentou que a mensagem do querelante teve a intenção de atingir sua honra, não estando coberta pela imunidade profissional, já que ocorreu fora dos autos, não tendo atuado o querelante como advogado quando a enviou, mas sim como marido de sua amiga.                Aduziu que a imunidade profissional não configura um vale tudo, devendo o causídico ser punido quando há excesso.                Afirmou que o querelante deu causa à resposta, pois se sentiu indignada e agredida em razão da mensagem enviada pelo mesmo para seu namorado/advogado.                Parecer Ministerial, a fls. 107/108, opinando pelo conhecimento e não provimento do recurso.                Parecer do Ministério Público, em atuação nesta Turma Recursal, às fls. 119, reiterando os fundamentos do Parecer de fls. 107/108.    V O T O        Conheço o recurso tendo em vista que presentes os requisitos de admissibilidade.                 Insurgiu se o Querelante, ora apelante, contra decisão que rejeitou a queixa crime, referente a conduta descrita no artigo 140 do CP (Injúria).                Constam da exordial dois áudios, com a seguinte transcrição:    "Olha aqui, ô Mario. Você quer me processar, seu babaca! Você me processe, tá? Você é um canalha! Você é um canalha! Você vai entrar na justiça contra minha filha e contra mim! Eu acho você um canalha! Não fique mandando mensagem para o meu advogado não, que nem um covardão. Seja homem! Se você tem problema comigo, fale comigo, tá? Você morreu pra mim, seu babaca!"    "E outra coisa: se ficar me mandado procurar trabalho... você nem sabe da minha vida e nem o Hildênio sabe da minha vida. Minha vida profissional tem muito mais sucesso que a de vocês dois juntos, seus podres! Sabe? Se ficar falando isso, quem vai te processar sou eu! Viu? Seu merda! Seu covarde!"               A R. Decisão vergastada rejeitou a queixa crime, entendendo que a hipótese seria de perdão judicial e, portanto, de extinção da punibilidade da querelada, sob o  fundamento de ter havido provocação reprovável do querelante, ao mencionar que deveria estar "correndo atrás de trabalho", no seguinte áudio enviado ao advogado da querelada, conforme fls. 42, nos seguintes termos:          "Alexandre,  gostaria  que  a  Lucelena  não  mandasse áudio para minha mulher falando mal de mim, mandando ela  tomar  cuidado  comigo,  inclusive  falando  que falei  absurdos  para  o  advogado  dela,  que  além  de advogado  é  namorado.  Não  vou  admitir.  Se  ela continuar  pode  ter  certeza  que  colocarei  ela  na justiça.  Vai  sair  caro  pra  ela.  Não  sou  contra Belinha não. Por Hildênio morar em SP e a advogada dele também ser de lá ele me pediu para acompanhar o processo aqui. É isso. Se ela está insatisfeita com  o  resultado  que  recorra.  Ela  deveria  como  te disse,  era  estar  correndo  atrás  de  trabalho  para parar de depender de pai, mãe ou ex marido. O recado está dado. Passar bem."         Contudo, o conteúdo deste áudio já havia sido objeto de ação proposta pela querelada por crimes contra honra e restou decidido nos autos do processo nº 0013566-13.2020.8.19.0001 que as mensagens enviadas pelo querelante não tiveram animus injuriandi ou diffamandi, eis que não houve qualquer depreciação à imagem ou ofensa à dignidade da querelada, sendo a queixa crime rejeitada, o recurso julgado intempestivo e os autos arquivados em definitivo em 10/08/21.                 Vale transcrever parte da decisão:                 "(...) a ação não contém elementos que se enquadrem nos crimes de difamação e injúria, eis que não se depreende daquelas palavras apontadas depreciação quanto à imagem da ofendida ou demonstração de ofensa a sua dignidade pessoal (...)".                "(...) Conforme mencionado pelo querelado, que enviou mensagem descrita na inicial, ele o fez na qualidade de advogado constituído pelo ex adverso da querelante na ação cível em curso entre as partes (no Juízo de Família), e sua conduta está acobertada pela imunidade profissional, prevista no Estatuto da OAB.                Assim, rejeito a queixa, com fundamento no art. 395, III do CPP".              Como sabido, preceitua o artigo 7º, § 2º, do Estatuto da Advocacia que o advogado tem imunidade profissional, não constituindo injúria, difamação ou desacato puníveis qualquer manifestação de sua parte, no exercício de sua atividade, em juízo ou fora dele, sem prejuízo das sanções disciplinares perante a Ordem dos Advogados do Brasil, pelos excessos que cometer.              A mensagem foi de advogado para advogado, tendo absoluta relação com a causa de direito de família.  Daí que não há ofensa quando, em litígio relativo a pensão, se diz que a parte contrária "deve estar  correndo  atrás  de  trabalho  para parar de depender de pai, mãe ou ex marido".              A hipótese, como muito bem decidido, era de imunidade profissional.              Partindo desta premissa,  como bem ressaltado pelo apelante, não pode um ato acobertado pela imunidade profissional ser considerado uma provocação reprovável para isentar a querelada de pena. Entendimento contrário, implicaria em "salvo conduto" para todo tipo de ofensa da parte ao advogado de seu ex adverso.           Pelo exposto, voto no sentido de conhecer e dar provimento ao recurso, para cassar a decisão apelada, no que tange à rejeição da queixa crime, e determinar que seja dado prosseguimento ao feito, quanto à imputação do artigo 140 do CP.         Rio de Janeiro, 24 de setembro de 2021.      CLÁUDIA GARCIA COUTO MARI  JUÍZA RELATORA                        PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO  CONSELHO RECURSAL DOS JUIZADOS CÍVEIS E CRIMINAIS  Primeira Turma Recursal Criminal.

APELAÇÃO CRIMINAL 0325721-09.2019.8.19.0001

CAPITAL 1a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CRIMINAIS

Juiz(a) CLAUDIA GARCIA COUTO MARI - Julg: 28/09/2021

 

Ementa número 3

NEGÓCIO JURÍDICO SUB JUDICE

BEM IMÓVEL URBANO

POSSE MANSA E PACÍFICA

AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO

EXERCÍCIO ARBITRÁRIO DAS PRÓPRIAS RAZÕES

NÃO CONFIGURAÇÃO DO CRIME

ESTADO DO RIO DE JANEIRO PODER JUDICIÁRIO CONSELHO RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS SEGUNDA TURMA RECURSAL CRIMINAL    Processo n° 0203981-50.2020.8.19.0001   Apelante: CAMILO COLA   Apelado: SIDNEI PIVA DE JESUS   Relatora: Juíza de Direito DANIELA BARBOSA ASSUMPÇÃO DE   SOUZA.   Recurso de apelação. Art. 345 do Código Penal. Recurso do querelante. Queixa crime. Requer reforma da decisão que rejeitou a inicial por ausência de justa causa.   1. Decisão que rejeitou a queixa crime deve ser mantida. Imóvel objeto de negócio jurídico sub judice. Querelante não comprovou posse mansa e pacífica, não havendo, assim, indícios de exercício arbitrário das próprias razões pelo querelado. Imóvel desocupado.   Negado Provimento ao Recurso.     ACÓRDÃO                  Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n° 0203981-50.2020.8.19.0001, em que é apelante CAMILO COLA e apelado SIDNEI PIVA DE JESUS, em sessão realizada no dia 17 de setembro de 2021, ACORDARAM, À UNAMIDADE, os Juízes de Direito da Segunda Turma Recursal Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, em NEGAR PROVIMENTO ao recurso de apelação, nos termos do voto da juíza Relatora.       RELATÓRIO                                 Juízo do IV JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL   COMARCA DA CAPITAL, determinou o arquivamento da queixa crime deixando de receber a peça inicial, por ausência de justa causa.                 Inconformado, o querelante interpôs recurso de apelação em que pretende a reforma da decisão impugnada, a fim de que seja recebida a queixa crime, dando se prosseguimento à ação penal, fls. 393/405.                 O querelado, se manifestou em contrarrazões, requerendo a mantença da decisão impugnada, fls. 435/445.                 O Ministério Público em atuação junto à instância a quo, opinou pelo conhecimento do recurso de apelação e, no mérito, que seja negado provimento, mantendo se a sentença que rejeitou a queixa crime em face da ausência de justa causa, fls. 453/454.                 O Ministério Público em atuação nesta Turma Recursal, ratificou a manifestação da i. representante do parquet, em atuação perante o Juizado Especial Criminal, fls. 464.                  VOTO    1. Juízo de admissibilidade do recurso                   Inicialmente, verifica se que estão presentes os pressupostos recursais objetivos e subjetivos do recurso, uma vez que o mencionado meio processual de impugnação tem previsão legal (art. 82, caput, da Lei n° 9.099 e art. 593, inciso I, do CPP); observou as formalidades legais (art. 578 do CPP); é tempestivo (art. 82, §1°, da Lei n° 9.099); o recorrente é parte legítima e também está presente o interesse recursal (art. 577 do CPP). Além disso, não há causas impeditivas ou extintivas do direito de recorrer.                 Posto isso, CONHECE SE do recurso e, como consequência, passa se à análise do seu mérito.   2. Mérito recursal                 Procedimento instaurado através de representação formulada pelo querelante, visando apuração da suposta prática do crime previsto no art. 345, do Código Penal.                 Assim, relata o querelante, em sua inicial acusatória conforme trechos a seguir destacados:   "(...) Após diversas tratativas, em 25.10.2016 as partes resolveram assinar instrumento nominado "Contrato de Compra e Venda de Participação e Outras Avenças" (PROVA D).   Naquele momento, ficou acertado entre as partes que esse instrumento poderia, ou não, se transformar em Contrato Definitivo de Compra Venda, após a resolução das diversas pendências até então existentes, naturais de negociação de tamanha complexidade.   (...)  A Sra. Ruth e a sua cunhada, Sra. lzabel Cristina Rodrigues de Melo, estavam no apartamento, quando foram abordadas pela Síndica e pelo advogado do Condomínio, que estavam acompanhados de duas pessoas a mando do QUERELADO para a troca das fechaduras do imóvel.   A Sra. Ruth não autorizou ninguém a entrar no imóvel, uma vez que tem pleno conhecimento de que o possuidor do imóvel é o QUERELANTE e que guarnecem no local objetos de valor e bens móveis que pertencem ao QUERELANTE.   Após a Sra. Ruth retornar com a sua cunhada do trabalho para casa, as duas pessoas a mando do QUERELADO, com ciência da Síndica e do advogado do Condomínio, foram até o imóvel e efetuaram a troca das fechaduras (...)". (index 3).                                  Rejeitada a queixa crime, entendeu a magistrada de piso, não estar comprovada a justa causa para o exercício da ação penal privada, decisão index 372. Vale citar alguns trechos:   " (...)    Preliminarmente, o querelado apontou falhas no procedimento da Delegacia, que deixou de lavrar   a portaria de instauração de Inquérito e de representação. No mérito, afirmou que o querelante foi possuidor do imóvel que passou a pertencer à Imobiliária Bianca e foi vendido ao querelado em 25/10/2016, de tal forma que o querelante vinha utilizando o imóvel de forma indevida, o que perdurou até o final de 2016.   O querelado ainda afirma que o Condomínio do Ed. Regine Feigl propôs ação de execução das cotas condominiais relativas ao imóvel em questão em face da Imobiliária Bianca Ltda., e o querelado, representando essa empresa, formulou acordo para quitar a dívida. Além disso, o querelante propôs ação de usucapião em face da mesma Imobiliária, porém teve o pedido liminar indeferido pelo Juízo da 35°. Vara Cível desta Comarca. Em seguida, o querelante desistiu da ação.   Segundo o querelado, o querelante não residia e nem era proprietário do imóvel, como constou da decisão do Juízo Cível, e a troca de fechaduras constituiu exercício regular de um direito do querelado. Também sustenta que a hipótese é de crime impossível. Ele requer a rejeição da queixa.   (...)  Segundo consta, desde 2016 até hoje as partes não conseguiram concluir a contento o negócio jurídico, e estão litigando nos autos da Recuperação Judicial do Grupo ltapemirim, que teve início na Vara de       Recuperação Judicial e Falência de Vitória, mas atualmente o processo tramita na 1°. Vara de Falências e Recuperação Judicial de SP. A questão também foi levada ao procedimento arbitra/ perante a Câmara de Comércio Brasil Canada.   Além disso, consta dos autos que o Condomínio do Ed. Regine Feigl propõs a execução de cotas condominiais do mesmo imóvel perante a 140. Vara Cível RJ, e o querelado, representante da Imobiliária Blanco Ltda., formulou acordo para quitar a dívida (fls. 240/243). Mais curioso é que o querelante chegou a ingressar com ação de usucapião em face da mesma imobiliária, porém após ter o pedido liminar indeferido pelo Juízo da 35°. Vara Cível desta Comarca, desistiu da ação (fls. 218).   Ora, o que temos aqui é um questão civil ainda mal resolvida, mas nem de longe podemos afirmar que o querelado incidiu na conduta prevista no tipo penal: "fazer justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o permite" (art. 345 do CP).   A pretensão das partes, no caso, é patrimonial, e já está sendo exaustivamente examinada em outros ramos do ordenamento jurídico.   (...)  Isto posto, rejeito a queixa formulada em face de Sidnei Piva de Jesus, por faltar justa causa para o exercício da ação penal (art. 395, III do CPP)". (grifei)                   Diante disso, o querelante, inconformado, interpôs o presente recurso de apelação pleiteando a reforma da decisão, com o consequente recebimento da queixa crime.                 Aduz o querelante, em sua inicial, que é possuidor, desde o ano de 1997, do imóvel localizado na Avenida Atlântica, n° 270, apartamento 1.301, Bairro Leme, cidade do Rio de Janeiro, que teria realizado uma negociação com o apelado, envolvendo este e demais bens da empresa em recuperação judicial, sendo que o negócio firmado estaria sub judicie.                 Afirma não residir no imóvel, mas alega que comprova sua posse, através do pagamento das contas de gás, energia elétrica, telefone e registro de empregada doméstica. Declara, que sua posse se comprova, também, porque "guarnecem no local objetos de valor e bens móveis que pertencem ao QUERELANTE" (grifei).                 Alega, ainda, que no dia 11/08/2020, o apelante foi surpreendido pela informação prestada por sua funcionária, Ruth Elena Almeida da Silva, de que o apelado havia ingressado sem autorização no imóvel descrito e efetuado a troca das fechaduras.                 O querelado, por sua vez, afirma que na época dos fatos, o querelante não era mais proprietário do imóvel, nem mais detinha sua posse, conforme, inclusive, decisão do Juízo Chiei, que negou liminar em ação de usucapião proposta pelo apelante, que, depois, decidiu da mesma.                 Assim, afirma o querelado, que a troca das fechaduras foi "exercício regular do direito, se deu, única e exclusivamente na sua propriedade" (fl. 219).                 Conclui-se que, o apelante pretende demonstrar que seria possuidor do imóvel, em relação ao qual teria sido ilegitimamente privado de sua posse, porque teria objetos de valor e bens móveis guarnecendo o local, manteria uma funcionária para limpeza do imóvel e pagaria as contas de luz e gás, conforme documentos anexados nos index 70, 108 e 140.                 Ocorre que, dos documentos juntados verifica se que o querelante só teria pago as referidas contas até MAIO de 2016, index 155, pouco antes da celebração do contrato de compra e venda de participações e outras avenças, firmado entre as partes em 25/10/2016.                 Quanto à manutenção de empregada doméstica para manutenção do imóvel em questão, no contrato de trabalho juntado pelo apelante, consta rescisão contratual datada de DEZEMBRO de 2016, fl. 159/160.                 Como se não bastasse, o querelante não informa sequer quais "objetos de valor e bens móveis" guarneceriam o imóvel e o que teria sido feito com eles após a troca das chaves, não há sequer uma relação dos bens que lhe teriam sido turbados.                 Neste sentido, o próprio apelante confirma que não residia no imóvel à época dos fatos, sendo que pretende comprovar a alegado posse, através do custeio das despesas básicas de luz e gás, cuidados de limpeza e manutenção do imóvel e manutenção de bens móveis e valores no interior da propriedade.                 Ora, na forma exaustivamente verificada, o apelante não comprovou quais bens e valores manteria no local, não comprovou pagamento de nenhuma despesa do imóvel à época dos fatos, sendo que as contas juntadas e o contrato de prestação de serviços da funcionária doméstica, findam todos no ano de 2016, enquanto os supostos fatos teriam ocorrido no ano de 2020.                 Como se não bastasse, o querelado, ora apelado, comprova que em 30 de JULHO de 2020, celebrou acordo com o condomínio, em processo de Execução em curso na 14° Vara Cível da Comarca da Capital, quitando a dívida condominial do imóvel no valor de RS150.756,10 (cento e cinquenta mil, setecentos e cinquenta e seis reais e dez centavos), a saber:   "A parte Executada pagará ao AUTOR o valor total de RS150.756,10 (cento e cinquenta mil, setecentos e cinquenta e seis reais e dez centavos),que correspondem ao valor das Cotas condominiais vencidas até esta data RS147.411,74 (cento quarenta e sete mil quatrocentos onze reais e setenta e quatro centavos) somado ao valor das Custas judiciais pagas pela parte Exequente   R53.344,36 (três mil trezentos quarenta e quatro reais e trinta e seis centavos).   Pagará, ainda, diretamente aos patronos da parte Exe quente, o valor de 20% sobre a dívida em execução, referente aos Honorários advocatícios sucumbenciais   R$ 29.482,34 (vinte e nove mil, quatrocentos e oitenta e dois reais e trinta e quatro centavos).   O valor total a ser pago é de R$180.238,40 (cento oitenta mil duzentos trinta e oito reais e quarenta e quatro centavos) referente a dívida condominial, honorários advocatícios e custas judiciais. 2.3 O valor devido ao Condomínio Exequente, RS150.755,10 (cento e cinquenta mil, setecentos e cinquenta e seis reais e dez centavos), será pago parceladamente, em 10 (dez) prestações mensais de RS15.075,61 (quinze mil e setenta e cinco reais e sessenta e hum centavos" (index 240).                 Portanto, não resultando sequer comprovada, sem sombra de dúvidas, a posse do imóvel pelo apelante, tendo o apelado, por sua vez, comprovado, inclusive, pagamento das despesas condominiais, não há justa causa para oferecimento da ação penal privada contra o apelado, pela suposta prática do delito de exercício arbitrário das próprias razões.                 Tanto assim, que o Ministério Público em atuação nas duas instâncias, manifestou se pela manutenção da decisão vergastada.                 Por essas razões, VOTO no sentido de CONHECER do recurso e, no mérito, NEGAR PROVIMENTO, mantendo a decisão recorrida.   Rio de Janeiro, 17 de setembro de 2021.  DANIELA BARBOSA ASSUMPÇÃO DE SOUZA  Juíza Relatora

APELAÇÃO CRIMINAL 0203981-50.2020.8.19.0001

CAPITAL 2a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CRIMINAIS

Juiz(a) DANIELA BARBOSA ASSUMPCAO DE SOUZA - Julg: 20/09/2021

 

 

Ementa número 4

PANDEMIA DE COVID-19

DIREITO DO PAI DE ASSISTIR AO PARTO DO FILHO

PROIBIÇÃO POR PARTE DO HOSPITAL

PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

DANO MORAL

Trata se de ação que visa a indenização por danos morais em que o AUTOR relata que foi privado de assistir ao nascimento da filha, ficando a segunda autora desacompanhada na hora do parto da filha em comum do casal.       Os autores afirmam que a primeira autora deu entrada no dia 17/04/2020, sendo o parto realizado no dia 17/04, às 9:44 da manhã e alta no dia seguinte. No momento em que chegou ao Hospital com sua esposa, permaneceu quando possível em todos os momentos ao seu lado e de sua filha que estava para nascer, porém quando chegou a hora mais esperada o mesmo fora impedido de acompanhar o momento do parto com a justificativa de que, ainda sendo pai da criança, por conta da pandemia do COVID-19 o mesmo deveria permanecer do lado de fora.        A primeira autora assevera que estava passando por problemas psicológicos e emocionais que a fizerem por ordem médica, conforme consta no laudo em anexo, se afastar de seu trabalhando, o que de fato demonstra uma vulnerabilidade maior da Autora neste momento, necessitando de cuidados e um amparo, enfatizando o acompanhamento e seu marido.       As alegações do RÉU são que: i) no período do ocorrido havia um momento de notória ascensão da Pandemia da COVID-19, ii) que cumpriu seu papel e que o evento fazia parte de uma política sanitária para contenção da propagação do vírus. iii) que o parto foi normal, o que a impediu a tomada de medidas preventivas. iv) que adiu em prol da criança e da parturiente.    No recurso ajuizado, o RÉU requer que esta Egrégia Turma reveja a decisão imposta pelo juízo sentenciante de indenização por dano moral no valor de R$20.000,00, sendo R$10.000,00 para cada autor.   É o relato do necessário. Passo ao voto.    Trata-se de um caso concreto complexo, e que envolve aspectos que ultrapassam o Ordenamento Jurídico. O momento do nascimento de um filho é um evento único e revestido de grandes emoções, e que ao longo de séculos de existência da humanidade transforma a vida daqueles que empreendem nesse projeto.   Primeiro, há que se colocar a condição do ser humano, suas expectativas, anseios, liberdades e escolhas. Durante o período, desde o nascimento até a morte, a vida de cada indivíduo contribui para a sociedade. Não se pode negar que o desenvolvimento comum tem forte impacto sobre as relações humanas, e que as normas e regras são estabelecidas em momento posterior a esse amadurecimento que chamamos de sociedade. Antes da organização vem a existência, e após a organização, os princípios. Esses princípios que são tão valorizados e concretos atualmente já foram a essência de um momento anterior a construção das normas, que para a sociedade ocidental foi nomeado primeiramente como Jusnaturalismo. O Direito Natural do Ser Humano que segundo Hobbes seria a liberdade que toda pessoa tem de utilizar o arbítrio para a conservação da sua natureza, isto é, fazer qualquer coisa que segundo o próprio juízo e razão considere meio idônea para lograr uma finalidade. Por meio desta chamada lei natural, acreditava se que o ser humano possuía a essência de uma moral que advinha do prévio conhecimento acerca do certo e do errado. Os tempos foram mudando, novos pensadores foram surgindo, e chegou se finalmente ao nosso complexo Ordenamento Jurídico.   Durante a consolidação das ideias advindas do momento positivista, acreditou se que as normas deveriam ser meramente cumpridas, como um reflexo dos anseios de uma sociedade que se reflete constantemente na elaboração de normas e regras, teoria que foi se desconstruindo ao longo da segunda metade do século 20, onde houve um reconhecimento do Princípio da Dignidade Humana como um dos mais fundamentais a serem preservados na sociedade. Esse princípio de inegável relevância figura expressamente em nossa Carta Constitucional no Art. 1º, inciso III, e deve ordenar a hermenêutica de todos os Operadores do Direito.       Quando ao conhecimento sobre como lidar com a Pandemia naquela ocasião, esta Turma Reconhece as dificuldades enfrentadas pela classe médica no combate à propagação do vírus e exalta a resiliência dos profissionais de saúde, entretanto, o julgamento adotado na ocasião foi equivocado e descabido, pois o conceito de assepsia, de preparação sala estéril e medidas de segurança não foram no sentido de para fora para dentro dos hospitais, e sim de dentro para fora, onde o comportamento do cidadão comum precisou assemelhar se a procedimentos corriqueiros para profissionais de saúde em seu ambiente de trabalho.       Por outro lado, como bem salientado pela juíza sentenciante, "Vale dizer, que não havia qualquer motivo para a proibição ante  ao disposto na Resolução n.º 36/2008 da ANVISA, que assegura à parturiente o direito à presença de um acompanhante de sua livre escolha, no momento do nascimento, mesmo nas clínicas privadas, devendo ser ressaltado que o plano de contingência da atenção primária à saúde para o coronavírus no Estado do Rio de Janeiro não veta a presença do acompanhante, consoante entendimento contido na Nota Técnica n.º 6/2020 COCAM/CGCIVI/DAPES/SAPS/MS do Ministério da Saúde."       Se, de um lado, temos que observar de forma minuciosa e concreta as determinações das autoridades sanitárias a fim de evitar maior contaminação pela COVID-19, de outro não podemos afastar ou simplesmente negar os direitos individuais dos quais os indivíduos são titulares.         A Lei 11.108/2005, chamada de "Lei do Acompanhante" inseriu o art. 19 J na Lei 8.080/90 para garantir o direito da gestante a ter um acompanhante, de sua livre escolha, nos procedimentos relativos ao parto. Colaciono:    Art. 19 J. Os serviços de saúde do Sistema Único de Saúde   SUS, da rede própria ou conveniada, ficam obrigados a permitir a presença, junto à parturiente, de 1 (um) acompanhante durante todo o período de trabalho de parto, parto e pós parto imediato. § 1º O acompanhante de que trata o caput deste artigo será indicado pela parturiente. § 2º As ações destinadas a viabilizar o pleno exercício dos direitos de que trata este artigo constarão do regulamento da lei, a ser elaborado pelo órgão competente do Poder Executivo.    A despeito de tal legislação ser aplicável ao Sistema Único de Saúde - SUS, nada impede que seja igualmente aplicável aos serviços particulares, na forma do art. 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Decreto Lei Nº 4.657/1942 com a redação dada pela Lei 12.376, de 2010):    Art. 4º:  Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.    Neste mesmo sentido é a Resolução nº 36, de 3 de junho de 2008 da ANVISA   Agência Nacional de Vigilância Sanitária, que dispõe sobre regulamento técnico para funcionamento dos serviços de atenção obstétrica e neonatal, confirma tal direito concedido às gestantes, em diversas oportunidades, sendo algumas delas:     3.4 Humanização da atenção e gestão da saúde: valorização da dimensão subjetiva e social, em todas as práticas de atenção e de gestão da saúde, fortalecendo o compromisso com os direitos do cidadão, destacando-se o respeito às questões de gênero, etnia, raça, orientação sexual e às populações específicas, garantindo o acesso dos usuários às informações sobre saúde, inclusive sobre os profissionais que cuidam de sua saúde, respeitando o direito a acompanhamento de pessoas de sua rede social (de livre escolha), e a valorização do trabalho e dos trabalhadores.  9. PROCESSOS OPERACIONAIS ASSISTENCIAIS   9.1 O Serviço deve permitir a presença de acompanhante de livre escolha da mulher no acolhimento, trabalho de parto, parto e pós parto imediato.    A própria Organização Mundial de Saúde   OMS, ao tratar sobre o direito das gestantes em tempos de pandemia, afirmou que o direito a um acompanhante deve ser garantido às parturientes:     Todas as mulheres grávidas, incluindo aquelas com infecção confirmada ou suspeita por COVID-19, têm direito a cuidados de alta qualidade antes, durante e após o parto. Isso inclui cuidados de saúde pré natal, recém nascido, pós natal, intraparto e saúde mental.   Uma experiência de parto segura e positiva inclui: Ser tratado com respeito e dignidade; Ter um acompanhante de escolha presente durante o parto; Comunicação clara pela equipe de maternidade; Estratégias apropriadas de alívio da dor: Mobilidade no trabalho, sempre que possível, e posição de nascimento de sua escolha.   Se houver suspeita ou confirmação de COVID-19, os profissionais de saúde devem tomar todas as precauções apropriadas para reduzir os riscos de infecção para si e para outras pessoas, incluindo a higiene das mãos e o uso apropriado de roupas de proteção, como luvas, bata e máscara médica.    (https://www.who.int/emergencies/diseases/novel coronavirus 2019/question and answers hub/q a detail/q a on covid 19 pregnancy and childbirth )               Por outro lado, como apontado acima, indeferir tal requerimento andaria na contramão da dignidade da pessoa humana da parturiente, um dos pilares fundamentais da República (art. 1º, III; CRFB/88).         Por fim, imperioso apontar que a Lei Federal nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, que "dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019" não afastou tal direito à parturiente.              Há que se reconhecer no processo o fato notório que ao logo dos anos, a taxa de fecundidade dos casais reduziu significativamente, e que dados atuais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) se reporta para anos posteriores a 2007 uma taxa inferior a dois filhos por casal, o que reforça intrinsecamente ao fato narrado uma perda irreparável para uma vida inteira. Também há que se acrescentar que no campo da individualidade, o genitor, apesar de acompanhar o processo de gestação da genitora, apenas conheceria sua filha pela primeira vez pessoalmente no momento do nascimento. E por último, lei 11.108/2005 garante direito a gestante de ter seu acompanhante, e a menos o Genitor apresentasse sintomas explícitos de estar com Covid-19 (o que não foi o caso de acordo página 12 do presente recurso), ou testasse positivo para o vírus SARS-Cov-2, ou pertencesse a algum tipo de grupo de risco, a mera suposição não poderia suprimir o direito individual do autor alegando o interesse da coletividade.        Também se acrescenta que naquele momento já havia a experiência da utilização de máscaras e o dispositivo de proteção facial   faceshield   bem como a utilização de álcool gel ou 70% para assepsia. Desta forma, ainda que se tratasse de parto normal, o hospital recorrente poderia ter adotado medidas para aferição de temperatura, teste rápido para covid-19, exame laboratorial, etc.        Assim, o dano moral, in casu, se dá in re ipsa, visto que frustrada a legítima expectativa do autor quanto o fato de extrema relevância em sua vida e que jamais poderá ser restituído, e uma alegação de mero cumprimento normativo não pode prosperar. O valor fixado pelo juízo sentenciante se encontra devidamente arbitrado em consonância com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, bem como a extensão do dano e circunstâncias do caso.               Isto posto, VOTO no sentido de conhecer do recurso e negar lhe provimento para manter a sentença pelos motivos apresentados.       Condenado o recorrente nas custas e honorários advocatícios de 20% (vinte porcento) do valor da causa, valendo esta súmula como acórdão, conforme o disposto no art. 46 da Lei 9099/95.        Rio de Janeiro, na data da sessão

RECURSO INOMINADO 0801115-19.2020.8.19.0066

CAPITAL 4a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS

Juiz(a) ERIC SCAPIM CUNHA BRANDÃO - Julg: 21/09/2021

 

 

Ementa número 5

AUTOPISTA

ACIDENTE COM ANIMAL

DANOS CAUSADOS A VEÍCULO

RESPONSABILIDADE OBJETIVA

NEXO DE CAUSALIDADE

DANO MATERIAL

INOCORRÊNCIA DE DANO MORAL

PROCESSO: 0013074-81.2021.8.19.0002   RECORRENTE/RÉU: AUTOPISTA RÉGIS BITTENCOURT S.A  AUTOR: ANGELA MARIA PERAZOLI  RECORRIDOS/AUTORES: ANGELA MARIA PERAZOLI  E OUTRO  Magistrado: Dr. Alexandre Chini Neto  VOTO  Adoto relatório o de sentença a seguir: "Narra o autor, em apertada síntese, que atropelou um cachorro enquanto transitava em seu veículo em via operada pela ré através de concessão pública que causou danos na parte dianteira de seu veículo. Relata ter solicitado reembolso da mão de obra e das peças necessárias ao reparo do veículo, mas não obteve sucesso. Pleiteia indenização por danos materiais e morais."  Em contestação genérica, o réu alega que "não restou comprovado nenhuma conduta comissiva da reclamada que desse causa ao acidente, pelo contrário, a mesma mantém e sempre manteve regular inspeção de tráfego dentro do prazo contratual previsto, inclusive no dia do ocorrido" (literalmente, fls. 113). Requer a improcedência dos pedidos  Sentença com dispositiva a seguir: "JULGO EXTINTO COM RESOLUÇÃO DE MÉRITO E PROCEDENTE EM PARTE O PEDIDO, nos termos do artigo 487, I do Código de Processo Civil, para condenar o réu ao pagamento: 1) de R$ 4.278,10 (quatro mil, duzentos e setenta e oito reais e dez centavos) aos autores a título de danos materiais acrescidos de juros legais de 1% ao mês a contar da citação e corrigido monetariamente a contar do evento danoso. 2) de R$ 3.000,00 (três mil reais) aos autores a título de dano moral a ser corrigido monetariamente a contar desta data e acrescido de juros legais de 1% ao mês a contar da data da citação."  Recurso do réu que repisa argumentos da contestação.  É o relatório, decido.    De fato, quanto ao reconhecimento do dano ocorrido e a obrigação de pagar o valor do conserto, decidiu com acerto o magistrado sentenciante, conforme fundamentação a seguir: "Deve-se admitir como verdadeiros os fatos narrados na inicial, não só em razão dos documentos acostados à inicial, que demonstram que o veículo do autor foi atingido por peça desconhecida enquanto transitava em via operada pela ré em regime de concessão pública, mas também porque a ré não se desincumbiu de desconstituir os fatos que ensejam a pretensão autoral. A responsabilidade civil da ré, como concessionária de serviço público, é objetiva, na forma do artigo 37, §6º da Constituição Federal, respondendo pelos danos causados devidamente demonstrados, como nestes autos, já que há nexo de causalidade comprovado através de reclamação administrativa, comprovante de pagamento do pedágio e registro de ocorrência dos fatos. Por sua vez, a parte ré não comprova os fatos alegados em sua contestação, bem como não foi capaz de comprovar que os fatos narrados pelo autor não ocorreram. A ré poderia ter apresentado gravação, pois, como se sabe, há diversas câmeras ao longo da via, mas não o fez, ônus que lhe incumbia a teor do artigo 373, II do Código de Processo Civil. Caracterizada, pois, a responsabilidade da ré, merecendo ser acolhido parcialmente o pedido de indenização por danos materiais, referente ao valor do menor orçamento apresentado pelo autor, totalizando R$ 4.278,10".    Por fim, não restou demonstrada a ofensa aos direitos da personalidade, não sendo o caso de ser imposta a condenação dos réus na composição de danos morais, visto que a questão é meramente patrimonial.  Isto posto, voto no sentido de conhecer do recurso e, no mérito dar lhe parcial provimento, para afastar a incidência de danos morais, mantida no mais a sentença. Sem ônus da sucumbência face ao êxito parcial.   Rio de janeiro,  29   de setembro   de 2021.    ERICA DE PAULA RODRIGUES DA CUNHA  JUÍZA RELATORA            

RECURSO INOMINADO 0013074-81.2021.8.19.0002

CAPITAL 1a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS

Juiz(a) ERICA DE PAULA RODRIGUES DA CUNHA - Julg: 30/09/2021

 

 

Ementa número 6

AGRAVO DE INSTRUMENTO

INADMISSÍVEL

ENUNCIADO DOS JUIZADOS ESPECIAIS

INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL

  Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro  GAB. DRA. KEYLA BLANK DE CNOP  Quarta Turma Recursal    AGRAVO DE INSTRUMENTO  nº 0001287-27.2021.8.19.9000  V O T O                 Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto por APARECIDA MARIA MADEIRA DA SILVA em face de decisão interlocutória proferida pelo Douto Juízo do II JEC de São João de Meriti nos autos do processo nº 0025611-84.2020.8.19.0054, indeferindo o benefício de gratuidade de justiça pleiteado pela ora agravante.               Não assiste à requerente no tocante ao cabimento do presente agravo de instrumento, que é manifestamente inadmissível por falta de previsão legal e por evidente incompatibilidade com o microssistema dos Juizados Especiais. Neste sentido, é o enunciado 15 do FONAJE, que passo a transcrever: "Enunciado 15   Nos Juizados Especiais não é cabível o recurso de agravo, exceto nas hipóteses dos artigos 544 e 557 do Código de Processo Civil". Na mesma linha de intelecção, também o verbete nº 11.5 da Consolidação dos Enunciados Jurídicos Cíveis, publicada através do Aviso TJ nº 23/2008: "11.5   AGRAVO DE INSTRUMENTO   INADMISSIBILIDADE   No sistema de Juizados Especiais Cíveis, é inadmissível a interposição de agravo contra decisão interlocutória, anterior, ou posterior à sentença."               Por tais fundamentos, considerando que não existe previsão legal de agravo de instrumento em sede de Juizados Especiais Cíveis, meu voto é no sentido de NÃO CONHECER O RECURSO, ante sua manifesta inadmissibilidade. Comunique se ao Juízo de origem, com cópia da presente.               Indefiro a gratuidade de justiça pleiteada, uma vez que a agravante não comprovou minimamente que preenche os requisitos para concessão do benefício. Condeno a recorrente ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da causa.               Certificada a preclusão das vias impugnativas e inexistência de custas pendentes de recolhimento, dê se baixa e arquivem se.               Rio de Janeiro, na data da assinatura eletrônica.                 KEYLA BLANK DE CNOP  Juíza de Direito     Relatora  PALÁCIO DA JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO   FÓRUM CENTRAL  Lâmina IV  LMCSS    

AGRAVO DE INSTRUMENTO 0001287-27.2021.8.19.9000

CAPITAL 4a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS

Juiz(a) KEYLA BLANK DE CNOP - Julg: 29/09/2021

 

 

Ementa número 7

PACOTE DE VIAGEM

PANDEMIA DE COVID-19

CANCELAMENTO

RESTITUIÇÃO SIMPLES

DANO MORAL

  PODER JUDICIÁRIO  TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO CONSELHO RECURSAL      RECURSO Nº: 0002907-63.2021.8.19.0209  Recorrentes (réu): DECOLAR. COM LTDA   Recorrido (autor): ISABELA MARIA DE MOURA ESTÊVÃO PADILHA E CARVALHO MACEDO  Origem: I Juizado Especial Cível   Regional da Barra da Tijuca  Relator: Juiz Mauro Nicolau Junior      Por unanimidade a 2ª Turma Recursal deliberou em conhecer do recurso e dar provimento parcial nos termos do voto do juiz relator.  I   Autora que adquire pacote de viagens junto a empreas DECOLAR.COM e por conta da pandemia restou cancelado.  II   A despeito das incessantes reclamações, inclusive junto ao Procon, a ré se mostrou impassivel não contribuindo para a solução do problema visto não ter retituido o valor pago pela autora.  III   Afirma a ré que o cancelamento se deu por culpa da autora que não pagou pelos serviços o que não corresponde a realidade até porque a corré restituiu o valor o que apenas poderia ocorrer se o pagamento efetivamente tivesse sido realizado, como foi.  IV   Sentença que condenou a ré ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 3.000,00 e a restituir o valor pago que se reforma em parte para dela excuir a condenação em danos materiais na medida em que a empresa corré já restituiu o valor desembolsado pela autora sendo, assim, vedada a repetição em duplicidade.  V   Sem ônus sucumbenciais.    ACÓRDÃO                                ISABELA MARIA DE MOURA ESTÊVÃO PADILHA E CARVALHO MACEDO ajuizou ação de indenização por danos materiais e morais contra DECOLAR. COM LTDA e SAFETYPAY BRASIL   SAFETYPAY BRASIL SERVIÇOS DE PAGAMENTOS LTDA                                                    Relata que contratou pacote de viagem para São Paulo com passagem, estadia e seguro junto à primeira ré. Ocorre que, com as restrições causadas pela pandemia, teve sua reserva cancelada pela plataforma sem o devido estorno.                                                    Ressalta que tentou por diversas vezes a via administrativa para solução do problema, em contatos com a primeira ré, reclamações no PROCON e audiências na autarquia, porém não obteve êxito.                                                     Afirma que a empresa se limita a culpar a segunda ré pelo erro e pleiteia, então, a devolução em dobro do valor bem como compensação pelo desgaste físico e emocional sofridos. Dessa forma, requer:    a) A citação das rés, na forma do art. 19, da Lei nº 9.099/95, para, sob pena de revelia, comparecerem à audiência pré designada, a fim de responderem à proposta de conciliação ou apresentar defesa, oferecendo provas.   b) Devolução do valor pago de R$ 946,00 (novecentos e quarenta e seis reais) em dobro, que totaliza o valor do dano material em R$ 1.892,00.  c) Condenação a pagamento de R$ 10.000,00 a título de danos morais sofridos.  d) Seja julgado procedente o pedido, qual seja, condenar as rés a pagarem à autora a importância mencionada, com a devida correção monetária e acrescida de juros a partir da citação.   e) Provar o alegado por todos os meios de provas admitidos em direito, em especial a documental, testemunhal e o depoimento pessoal do Requerido.   f) Dá se a causa o valor de R$ 11.892,00 (onze mil, oitocentos e noventa e dois reais).       Documentos juntados pela parte autora: CPF, comprovante de endereço e procuração a fls. 7/11; comprovante de pagamento a fls. 12; contato com PROCON a fls. 13/18.                                                      DECOLAR. COM LTDA apresenta contestação a fls. 33/40. Preliminarmente, argui pela necessidade de segredo de justiça pela produção de provas que envolvam dados pessoais. No mérito, alega que a autora foi inerte no contato para alteração do bilhete e que o cancelamento se deu por falta de pagamento.                                                     Aduz, ainda, que as condições de mudança haviam sido dispostas com antecedência e que a consumidora não cumpriu as condições previamente estabelecidas. No mais, pugna pela improcedência dos pedidos.                                                     SAFETYPAY BRASIL   SAFETYPAY BRASIL SERVICOS DE PAGAMENTOS LTDA apresenta contestação a fls. 59/99. Preliminarmente, alega ilegitimidade passiva por não haver relação jurídica entre a empresa e a autora. Alega que não vendeu o produto ou intermediou a compra, mas apenas serviu de instrumento de repasse do pagamento para a corré.                                                     Relata que a autora realizou dois erros na execução do pagamento, o que impediu sua conclusão e levou ao cancelamento da reserva. Aduz, ainda, que o dinheiro solicitado foi devidamente devolvido, inexistindo dano material, e que se trata de mero aborrecimento da autora. No mais, pugna pela improcedência dos pedidos.                            Documentos juntados pela parte ré: representação processual a fls. 44/56; comprovante de devolução a fls. 100; telas de pagamento e valor da compra a fls. 101/104.                                                                              Autora apresenta réplica a fls. 117/118. Afirma que as contestações são conflitantes e não se sustentam nos documentos apresentados. Alega que o pagamento foi realizado, que o pedido de estorno não foi atendido e que o valor não foi devolvido. No mais, pede a procedência dos pedidos.                                                    Projeto de sentença a fls. 120/121, homologado em decisão a fls. 123.                            * Parte autora que aduz, em síntese, que comprou passagem aérea com destino a São Paulo, mas que em razão da pandemia de COVID-19, o voo foi cancelado; que não conseguiu o reembolso ou remarcação da passagem junto à parte ré. Requer reparação material e moral.   * Acolho a preliminar de ilegitimidade passiva arguida pela segunda ré, visto que a mesma é meromeio de pagamento, não possuindo responsabilidade pela remarcação das passagens aéreas.   * A relação jurídica objeto da presente demanda se configura como relação de consumo, sujeitando se às regras do Código de Defesa do Consumidor. Isso porque, a ré realiza atividade habitual de fornecimento de serviços, enquadrando-se no conceito legal de fornecedor do art. 3º do CDC, ao passo que o autor é destinatário final desses serviços, sendo considerado consumidor pela teoria finalista, nos termos do art. 2º, do CDC.   * Diante da verossimilhança das alegações autorais e patente hipossuficiência técnica, foi aplicada a inversão do ônus da prova em favor do consumidor autor.   * Compulsando os autos, observo que a parte ré não comprova ter realizado a remarcação da passagem ou restituição dos valores pagos e nem mesmo informado que o faria em determinado prazo, não demonstrando qualquer excludente de sua responsabilidade, o que lhe incumbia.   * Assim, é importante destacar que a perda de 100% do valor pago afigura se abusiva, ainda mais se tratando o caso de alteração por motivo de força maior, qual seja, a pandemia de COVID-19, que demanda medidas de isolamento social.   * De acordo com o art. 51, do CDC, são nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boafé ou a equidade.   * Assim, as cláusulas que prevejam a retenção de 100% do valor da reserva mostram se abusivas, por ensejar um desequilíbrio ainda maior do que o causado pela resilição unilateral pelo consumidor.   * No caso em tela, tendo em vista a excepcionalidade da situação vivenciada no Brasil e no mundo em decorrência da pandemia do novo coronavírus, deve a ré restituir o valor integralmente pago pela parte autora, no montante de R$ 946,00 (novecentos e quarenta e seis reais), de forma simples, eis que não aplicável ao caso a restituição em dobro, conforme entendimento do STJ.   * No que tange o dano moral, este restou configurado, pois a parte autora teve que ajuizar a presente demanda para fazer valer seu direito. Não há que se falar na existência de mero dissabor e "indústria o dano moral", diante do comportamento desrespeitoso dispensado pelos prepostos da ré em total afronta aos direitos do consumidor autor.   * Com efeito, presentes os elementos a justificar a responsabilização civil, quais sejam, ação em sentido amplo, nexo causal e prejuízo. Assim, falhou o serviço prestado pelo réu, devendo a responsabilidade ser objetiva na forma do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor.   * Tenho por razoável e com suficiente poder compensatório uma indenização no valor equivalente a R$ 3.000,00 (três mil reais). O montante indenizatório está levando em consideração a situação colocada, não se olvidando do caráter punitivo pedagógico da condenação.   * Ante todo o exposto, JULGO PROCEDENTE EM PARTE O PEDIDO para CONDENAR a primeira ré, DECOLAR, a pagar à parte autora a quantia de R$ 946,00 (novecentos e quarenta e seis reais), por danos materiais, e a quantia de R$ 3.000,00 (três mil reais), a título de indenização por danos morais, ambos os valores com correção monetária nos termos da tabela da Corregedoria Geral de Justiça do TJRJ e juros de 1% (um por cento) ao mês a partir da data da citação.   * Quanto à segunda ré, SAFETYPAY, JULGO EXTINTO o processo, sem apreciação do mérito, com base no art. 485, VI, do Código de Processo Civil.   * Sem custas e nem honorários advocatícios (artigo 55, da Lei n.º 9.099/95)                              Recurso inominado por DECOLAR. COM LTDA a fls. 132/140. Preliminarmente, argui pela ilegitimidade passiva por se tratar de culpa exclusiva da consumidora ao não realizar o pagamento e aceitar os termos de alteração da reserva previamente estabelecidos.                                                     Alega, também, se tratar de mera intermediadora do serviço junto à companhia aérea, de modo que não possui ingerência sobre sua política de cancelamento e reembolso. Aduz, por fim, não estar comprovado o dano moral alegado pela recorrida, alegando mero aborrecimento. No mais, pede a reforma da sentença e improcedência dos pedidos.                                                    Contrarrazões 192/195. Afirma que a recorrente é fornecedora do pacote de viagens contratado, de forma que há vínculo jurídico entre as partes. Alega, ainda, que os danos morais fixados se justificam no transtorno causado por atitude indevida de cancelamento sem devolução. No mais, pede a manutenção da sentença e condenação a pagamento de honorários advocatícios.                                                    Prospera em parte a pretensão recursal visto que se funda nas mesmas alegações postas na defesa sem que, contudo, tenha trazido qualquer argumento ou fato que possa infirmar as razões do julgamento.                          A alegação da ré de que a autora não teria realizado o pagamento e por isso o pacote adquirido teria sido cancelado não se sustenta na medida em que restou comprovado (fls. 12) que o pagamento foi efetivamente realizado.                                                    Não fosse suficiente o documento de fls. 100 comprova que a corré procedeu a devolução do valor pago o que apenas seria possivel se realmente o pagamento tivesse sido feito, como de fato o foi.                                                    A responsabilidade das rés é objetiva e solidária na medida em que se organizam em redes a fim de prestar serviços e comercializar produtos. No entanto, tendo a sentença acatado a tese de ilegitimidade passiva da corré, sem recurso da autora, não resta possivel qualquer alteração nesse sentido.                                                    Ademais a recorrente responde pelas falhas em seus serviços o que restou configurado não apenas por não ter efetivado as reservas contratadas pela autora como, principalmente, não ter devolvido o valor pago e não atendido às intimações do Procon que foram solenemente ignoradas demonstrado total ausencia de solução administrativa do imbroglio criado por ela compelindo a autora ao ajuizamento da ação sendo o valor fixado na sentença compatível com o grau de desidia demonstrado pela ré.                                                    Prospera, assim, a pretensão indenizatória, tal como decidido na sentença da qual, no entanto, deverá ser excluida a condenação a devolução do valor pago pela autora que, como acima mencionado, já foi objetivo de restituição pela corré.                                                    Por esses motivos o VOTO é no sentido de ser conhecido o recurso e a ele ser dado provimento em parte para reformar a sentença e dela excluir a condenação em indenização por dano material no valor de R$ 946,00 mantendo a, no mais, tal como proferida.                                                    Sem ônus sucumbenciais nos termos do artigo 55 da lei 9.099/95.                                  Rio de Janeiro, 23 de setembro de 2021                             MAURO NICOLAU JUNIOR  Juiz Relator                    

RECURSO INOMINADO 0002907-63.2021.8.19.0209

CAPITAL 2a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS

Juiz(a) MAURO NICOLAU JUNIOR - Julg: 23/09/2021

 

 

Ementa número 8

ISENÇÃO DE I.P.V.A.

PESSOAS PORTADORAS DE DEFICIÊNCIA FÍSICA

FRAUDE NO PAGAMENTO DA  D.A.R.J.

IRRELEVÂNCIA

DIREITO DA  AUTORA  À ISENÇÃO

EXTRAÇÃO DE PEÇAS PARA APURAÇÃO

Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro  Primeira Turma Recursal da Fazenda Pública    Recurso Inominado Nº 0001947-52.2021.8.19.0001  Recorrente: ESTADO DO RIO DE JANEIRO  Recorrido: MARIA CRISTINA REZENDE MAIA    RECURSO INOMINADO. FAZENDA PÚBLICA.  ISENÇÃO DE PAGAMENTO DE IPVA PARA PESSOAS COM DEFICIÊNCIA FÍSICA CONFORME LEI Nº 2.887/97. INDEFERIMENTO DO PEDIDO ADMINISTRATIVAMENTE SOB O FUNDAMENTO DE FRAUDE NO PAGAMENTO DA DARJ. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. EVENTUAL FRAUDE NÃO ANULA O DIREITO DA AUTORA À ISENÇÃO AO TRIBUTO, NO ENTANTO, OS INDÍCIOS A ELA REFERENTES OBRIGAM A EXTRAÇÃO DE PEÇAS AO MINISTÉRIO PÚBLICO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.                  RELATÓRIO               Trata-se de recurso inominado interposto pelo Estado do Rio de Janeiro.                          Cuida se de ação declaratória de inexistência de relação jurídica tributária com pedido liminar em que pretende a parte autora a retirada de seu nome da dívida ativa, bem como suspender a exigibilidade do crédito tributário até o final do processo, sob pena de multa, fundamentando seu pedido em isenção de pagamento de IPVA por deficiência física.                           Decisão às fls. 31 indeferindo a tutela de urgência.                          Manifestação do Ministério Público às fls. 39 informando a não intervenção no feito.                           Sentença proferida às fls. 118/119 julgando procedentes o pedido nos seguintes termos:               "...JULGO PROCEDENTE a demanda para declarar a inexigibilidade dos tributos   IPVA, determinando ao réu que promova a retirada do nome da autora dos cadastros da dívida ativa estadual, no prazo de 10 (dez) dias, sob pena de multa a ser fixada em sede execução, naquilo que corresponda à dívida imputada à autora em virtude da propriedade do auto placa LTO1E00".               Recurso inominado interposto pelo ERJ às fls. 126/129. Alega que a recorrida não preencheu os requisitos para isenção. Sustenta que o pedido da autora de isenção do IPVA foi indeferido em primeira e segunda instâncias, sob a justificativa de não ter ocorrido o recolhimento de maneira regular, porquanto foi verificado grave indício de fraude do documento inerente à arrecadação. Relata que o auditor constatou que os códigos de barra do DARJ e do comprovante de pagamento, juntado ao processo de isenção não coincidem, ou seja, o boleto bancário não possui correlaçaõ com o comprovante de pagamento, indicando ter havido adulteração dos documentos. Pugna pela reforma da sentença a fim de que os pedidos sejam julgados improcedntes.                          Contrarrazões apresentadas às fls. 133/135. Alega que o pagamento da DARJ foi devidamente realizado e juntado aos autos às fls. 21/22, não havendo que se falar em falta de pagamento da guia de arrecadação. Aduz que a suposta fraude não guarda relação com o direito ao benefício legal, que ora requer. Ressalta que se eventualmente houve fraude, esta foi perpetrada pela empresa contratada para a adaptação do veículo para as necessidades especiais da ora recorrida e tais atos não podem lhe prejudicar, pessoa deficiente, que já convive diariamente com restrições e dificuldades no seu dia a dia. Pela manutenção da sentença.                          É o relatório. Passo ao voto.                            VOTO                          Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço do recurso.                          Cinge-se a controvérsia acerca do indeferimento administrativo ao benefício instituído pelo art. 5º, V, da Lei 2.887/97 pela suposta fraude no pagamento da DARJ.                          Não assiste razão ao recorrente.                          A parte autora acostou aos autos documento comprobatório da condição de portadora de deficiência ou mobilidade reduzida nos termos da lei 10.098/00 e para fins do benefício instituído pelo art. 5º, V, da Lei 2.887/97 (fls. 14).               Desta forma, a alegação de fraude não anula o direito da autora ao benefício pleiteado, tendo em vista ter sido comprovada a sua condição de deficiente física nos termos da lei 10.098/00 e para fins do benefício instituído pelo art. 5º, V, da Lei 2.887/97. Eventuais irregularidades ou atitudes típicas da prática em tese de crime devem ser apuradas por autoridades competentes garantindo às partes o contraditório e a ampla defesa.               Isto posto, voto pelo CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO do recurso interposto pelo ERJ.               Ente isento de custas.                          Condeno o recorrente ao pagamento de honorários advocatícios na razão de 10% sobre o valor da causa.                          DETERMINO A EXTRAÇÃO DE PEÇAS À 1ª PIP PARA APURAÇÃO DE EVENTUAL CRIME.               Com o trânsito em julgado, devolva se à origem.                 Rio de Janeiro, 15 de setembro de 2021.    MIRELA ERBISTI  Juíza Relatora

RECURSO INOMINADO 0001947-52.2021.8.19.0001

CAPITAL 1 TURMA RECURSAL DOS JUI ESP FAZENDA PUB.

Juiz(a) MIRELA ERBISTI - Julg: 16/09/2021

 

 

Ementa número 9

TRANSAÇÃO PENAL

NÃO HOMOLOGAÇÃO

POSSE DE DROGA PARA USO PESSOAL

INCONSTITUCIONALIDADE

CASSAÇÃO DA DECISÃO

PROSSEGUIMENTO DO FEITO

Apelação nº 0030869-92.2020.8.19.0210  Apelante: MINISTÉRIO PÚBLICO  Apelado: FERNANDO DAVID DE BARROS MONTEIRO GOMES  Relatora: Dra. Yedda Christina Ching San Filizzola Assunção                           R E L A T Ó R I O                  Cuida-se de recurso, apresentado pelo Ministério Público, que enfrenta decisão proferida pelo 10º Juizado Especial Criminal Regional da Leopoldina, Comarca da Capital   RJ, que deixou de homologar a transação penal proposta pelo Ministério Público, declarando a inconstitucionalidade do artigo 28 da Lei nº 11.343/2006, entendendo atípica a conduta apurada nos autos.                Requer o apelante seja reformada a r. sentença, para que seja designada audiência especial para oferta de transação penal ao suposto autor do fato.                 Decisão judicial às fls. 28/33 (indexação eletrônica), declarando a inconstitucionalidade do artigo 28 da Lei nº 11.343/2006, entendendo atípica a conduta apurada nos autos e, consequentemente, deixando de homologar a transação penal proposta pelo Ministério Público.                Recurso interposto pelo Ministério Público às fls. 41/50 (indexação eletrônica), pugnando pela reforma da decisão acima mencionada, para que seja designada audiência especial para oferta de transação penal ao autor do fato.                Contrarrazões de apelação oferecidas pela Defesa às fls. 82/90 (indexação eletrônica), no sentido de ser mantida integralmente a r. decisão impugnada.                Aditamento das contrarrazões recursais, pela Defensoria Pública em atuação junto a Turma Recursal, à fl. 99 (indexação eletrônica), reiterando os termos das contrarrazões de apelação ofertados pela Defesa.                                O Ministério Público, em sede de Turma Recursal, à fl. 100 (indexação eletrônica), pugnou pelo conhecimento e o provimento do apelo.                               V O T O                              Trata-se de Recurso de Apelação interposto pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro contra a decisão proferida pela Juíza titular do X Juizado Especial Criminal da Comarca da Capital, que declarou a inconstitucionalidade do artigo 28 da lei 11.343/06, determinando o arquivamento do feito, deixando de determinar a intimação do indiciado para conhecimento da oferta de transação penal.             Primeiramente é de se lamentar o desvirtuamento do rito especial previsto na Lei 9099, que pretendia a celeridade do processamento, bem como a participação do Ministério Público na ação penal de forma adversarial direta. Prevê a lei que o autor do fato será encaminhado imediatamente ao Juizado, e em seguida, na audiência preliminar serão apresentadas as propostas de composição civil ou, nas hipóteses previstas no artigo 76, de transação penal. A burocratização do rito sumaríssimo, com a não designação de audiências preliminares e apresentações de propostas de transações penais por escrito e após meses da data do fato, é uma triste realidade nos Juizados Especiais Criminais deste Tribunal de Justiça, uma realidade violadora dos princípios norteadores a oralidade e celeridade processual.             Com relação as razões recursais apresentadas, assiste razão ao apelante. Não houve descriminalização da conduta de portar ou transportar drogas para uso próprio.              PRINCIPALMENTE NO CASO CONCRETO, NO QUAL FOI APREENDIDA DROGA (cocaína), COM INSCRIÇÃO DE ORIGEM RELACIONADA A ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA (boca de paris pedra 4 CV).                          Trata se de crime de perigo abstrato cujo bem jurídico protegido é a saúde pública,   um bem hoje considerado absolutamente prioritário e de primeira grandeza, apto a sustentar restrições a direitos de primeira dimensão como liberdade e privacidade   de modo que não há necessidade de demonstração de um dano concreto para estabelecimento de condutas consideradas positivas e negativas, com consequente a aplicação da sanção penal a estas últimas. É de fácil compreensão na realidade atual que o direito a intimidade ou vida privada deve ceder a alguns direitos, como ao direito genérico a saúde, contudo, o direito a intimidade sequer é suficiente para envolver a presente situação, uma vez que o réu se encontrava em via pública e não há nos autos indicação de maior pretensão a ocultar o uso de substância entorpecente.              Quanto a afirmação de violação ao princípio da intervenção mínima do penal, temos uma compreensão diversa.  Já foi afirmado em julgados desta Turma Recursal que o bem jurídico tutelado é de interesse de toda a coletividade e, por tal razão, merecem especial proteção. Em verdade, se ainda se insiste em teorias que pretendem de classificação de bens jurídicos, podemos afirmar que não apenas a saúde da coletividade é tutelada, mas outros inúmeros bens igualmente relevantes: a capacidade de atendimento médico daquele grupo social, a tranquilidade e paz social. Recorrendo novamente a realidade da pandemia mundial de 2020/2021, percebemos que num grupo social não é possível falar em condutas pessoais de forma isolada   a sociedade evoluiu a compreensão de individualidade para assentir que uma pessoa não tem o direito a se expor a um risco, se este comportamento, eventualmente, de alguma forma, for capaz de expor outrem a risco. E o comportamento de adquirir substância entorpecente expõe toda a sociedade ao tráfico de drogas, que no Brasil é extremante violento; e mais, expõe outras pessoas que mantém contato com o usuário a comportamentos determinados por alteração psicomotora   por exemplo, usuário de drogas conduzindo veículos com capacidade alterada, ou ainda, um usuário de drogas agindo de forma mais violenta dentro da sua família. Ora, se há um risco, ainda que eventual para a integridade física ou psicológica de outras pessoas, tem o Estado não apenas o interesse, mas o dever de agir e proibir a conduta.  Como bem dito, a finalidade da lei é reduzir a circulação das drogas pela sociedade   pelo evidente e relevante perigo social de sua difusão   e não simplesmente punir o usuário em si.             Necessário destacar que, no caso concreto também a segurança da unidade prisional, dos detentos e dos funcionários são bens jurídicos potencialmente atingidos pela conduta imputada a indiciada.             É fato que o Supremo Tribunal Federal reconheceu repercussão geral da questão constitucional invocada no REX 635659/SP, onde se discute a constitucionalidade do art. 28 da Lei 11.343/2006, frente ao disposto no artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal. Entretanto, não tendo sido determinada a suspensão do processamento das ações penais em curso, até o julgamento final do recurso, nos termos do § 5º do art. 1.035 do CPC, embora seja objeto de questão de ordem ainda não apreciada pelo Pleno do STF, passados mais de 10 anos desde a data da autuação do referido recurso, ainda compete a essa Turma Recursal decidir tal questão no caso concreto.              Inviável a negativa de incidência de uma norma penal incriminadora em vigor, sob pena de se proferir um julgamento contra legem. Assim, não tendo a "posse de droga para uso próprio" sido descriminalizada pelo legislativo e nem tendo sido declarada a inconstitucionalidade desse tipo penal pelo Supremo Tribunal Federal, impõe-se a incidência da referida norma.                          Neste sentido é a Jurisprudência deste Tribunal de Justiça:  "APELAÇÃO CRIMINAL. Condenação do réu pela prática dos crimes de roubo e de porte de drogas para consumo pessoal, às penas de 04 (quatro) anos de reclusão, em regime aberto, e de 10 (dez) dias multa, no valor mínimo legal, em relação ao crime previsto no artigo 157, caput, do código penal, e de 03 (três) meses de prestação de serviços à comunidade, quanto ao crime previsto no artigo 28 da lei nº. 11.343/06. Recurso defensivo pugnando preliminarmente, pelo reconhecimento da nulidade do processo por violação ao artigo 226, do código de processo penal. No mérito, busca a absolvição de ambos os delitos, sustentando que as provas produzidas durante a instrução criminal são insuficientes para embasarem o decreto condenatório em relação ao crime de roubo; quanto ao crime de porte de droga para consumo pessoal, sustenta que a conduta é atípica ante a alegada inconstitucionalidade do artigo 28 da lei n° 11.343/2006; pugna, ainda, pela aplicação do princípio da insignificância, diante da ínfima quantidade de drogas encontrada com o apelante. Subsidiariamente, requer a redução da pena para patamar abaixo do mínimo legal, ante o reconhecimento da atenuante genérica da confissão em relação ao crime de roubo; bem como a aplicação da pena de advertência quanto ao crime de posse de drogas para consumo pessoal, ante a ausência de justificativa idônea para a aplicação da pena de prestação de serviços à comunidade. (...)Com tais informações, os agentes da lei lograram encontrar o acusado e resolveram abordá lo, oportunidade na qual encontraram, no bolso do mesmo, 1,3 g (um grama e três decigramas) de cocaína, distribuídas em três pequenos tubos plásticos de eppendorf. Indagado, o acusado disse ser usuário de drogas e que tinha comprado aquele material entorpecente dando em pagamento o tablet/celular que ele tinha roubado, momentos antes, da vítima. (...)Do mesmo modo, não merece prosperar a tese defensiva no sentido de que o artigo 28 da lei nº. 11.343/06 é inconstitucional, eis que prevalece a orientação no sentido de que a criminalização do porte de uso de drogas para consumo pessoal não é incompatível com a constituição federal. Ademais, o recurso extraordinário nº. 635.659/SP, com repercussão geral reconhecida, ainda não teve seu julgamento finalizado pelo egrégio Supremo Tribunal Federal. Além disso, o bem jurídico tutelado no delito em questão é a saúde pública, e não a saúde do usuário, tratando-se de crime de perigo abstrato, que independe de constatação de efetiva lesão. Também não há que se falar em aplicação do princípio da insignificância ao referido delito, uma vez que se trata de crime de perigo abstrato, em que o bem tutelado pela norma é a saúde pública. Irrelevante, portanto, para a tipificação da conduta, a quantidade de entorpecente apreendido em poder do apelante. O simples ato de portar substância ilícita presume o potencial ofensivo da conduta. Ademais, a reduzida quantidade de droga é inerente à natureza do delito previsto no artigo 28 da lei 11.343/06. Condenações que merecem ser mantidas. Noutro giro, não merece ser acolhido o inconformismo defensivo no que tange à dosagem da pena. (...)Por tais razões, a sentença recorrida merece ser mantida, por seus próprios e jurídicos fundamentos. Desprovimento do recurso. 0122762-49.2019.8.19.0001   Rel Des. Luiz Zveiter   Julg: 21/07/2020   Primeira Câmara Criminal               "APELAÇÃO CRIMINAL. PENAL. PROCESSO PENAL. CONSTITUCIONAL. CRIME DE POSSE DE ENTORPECENTES PARA USO PRÓPRIO. SENTENÇA DE ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. INCONFORMISMO MINISTERIAL QUE PRETENDE O RECONHECIMENTO DA TIPICIDADE DA CONDUTA E O PROSSEGUIMENTO DO FEITO. In casu, malgrado o fato de o delito em questão ter sofrido um abrandamento em seu preceito secundário, fato é que a Lei n. 11.343/06 o manteve como injusto penal, considerando, para tanto, a importância do bem jurídico tutelado na espécie, qual seja, à saúde pública. Ademais, em que pese ser indiscutível o fato de o usuário de droga prejudicar sua própria saúde (se autolesionar), não se pode olvidar que o que está em jogo é a coletividade como um todo, que é colocada em risco na medida em que fica desestabilizada. Nesta linha de intelecção, o entendimento de que a posse de entorpecente para consumo pessoal constitui uma autolesão ou que está abrangido por uma adequação social, e, em consequência, o art. 28 seria inconstitucional, não merece guarida, notadamente porque a Suprema Corte brasileira, ao julgar RE 635660 SP, espancou qualquer argumento contrário à validade da norma. Outrossim, ressalte se, o diploma da Lei de Drogas não tipifica, em seu art. 28, a conduta de fumar, usar ou, de qualquer modo, consumir substância entorpecente, mas a de trazer consigo, na medida em que, repisa se, o bem juridicamente tutelado pela norma contida no art. 28 da Lei n. 11.343/06 é a saúde pública, de interesse coletivo, e deve se sobrepor a qualquer interesse individual, e, deste modo, autorizar o apenamento do agente, sem que isto resulte em ferir direito seu. RECURSO MINISTERIAL A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO. 0087443-25.2016.8.19.0001   APELAÇÃO. Des(a). MARIA ANGÉLICA GUIMARÃES GUERRA GUEDES - Julg: 15/05/2018   SÉTIMA CÂMARA CRIMINAL.".                      Com relação aos prequestionamentos, conforme a jurisprudência do STJ, não há necessidade de manifestação expressa do julgador acerca dos dispositivos legais prequestionados. Basta a discussão implícita da matéria impugnada no recurso.                      "...A configuração do prequestionamento não exige que haja menção expressa dos dispositivos infraconstitucionais tidos como violados, entretanto, é imprescindível que no aresto recorrido a questão tenha sido discutida e decidida fundamentadamente, sob pena de não preenchimento do referido requisito indispensável ao conhecimento do recurso especial..." (AgRg no REsp 1434927 / RS 2013/0421435 2 Relator(a) Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES (1141) Órgão Julgador T2   SEGUNDA TURMA Data do Julgamento 05/02/2015 Data da Publicação/Fonte DJe 12/02/2015"                                       Assim, adotando os mesmos fundamentos dos julgados acima mencionados,  seguindo entendimento pacificado desta Turma Recursal, explicitado no enunciado 94 do Fonaje, voto pelo PROVIMENTO do recurso ministerial para cassar a decisão que declarou a inconstitucionalidade do artigo 28 da lei 11.343/06, determinando o retorno dos autos ao Juízo a quo para o regular prosseguimento.                                  Rio de Janeiro, 16 de agosto de 2021.      Yedda Christina Ching San Filizzola Assunção  Juiza Relatora                                0030869-92.2020.8.19.0210  II Turma Recursal Criminal   TJRJ

APELAÇÃO CRIMINAL 0030869-92.2020.8.19.0210

CAPITAL 2a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CRIMINAIS

Juiz(a) YEDDA CHRISTINA CHING SAN FILIZZOLA ASSUNCAO - Julg: 02/09/2021

 

 

Ementa número 10

TRATAMENTO DE OXIGENOTERAPIA DOMICILIAR

TUTELA  ANTECIPADA  DEFERIDA

COBERTURA PELO S.U.S.

DEVER SOLIDÁRIO DOS ENTES EM PRESTAR SAÚDE

Recurso Inominado nº  0031639-30.2020.8.19.0002  Recorrente: Município de  São  Gonçalo  Recorrido: MANOEL FREIRE DOS SANTOS, representado por sua Curadora, JOANA DA SILVA DOS SANTOS      RECURSO  INOMINADO.  MUNICÍPIO DE SÃO GONÇALO.  ANTECIPAÇÃO  DE TUTELA. TRATAMENTO  DE OXIGENOTERAPIA DOMILICILIAR. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. SAÚDE PÚBLICA. GARANTIA DE DIREITO FUNDAMENTAL. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO.      RELATÓRIO    Trata se  de Recurso  Inominado  interposto pelo Município de  São  Gonçalo contra sentença proferida no index 289 que homologou projeto de sentença (index 284).         A  parte  autora narra  ser  portadora  de  ENFISEMA  PULMONAR  EM  ESTÁGIO  AVANÇADO, BRONQUIECTASIA, COM HISTÓRIA DE COCCIDIOMICOSE e COVID-19, encontrando se no momento  internado na Enfermaria de Clínica médica Masculina por quadro descompensatório de dispneia, necessitando assim, do aparelho de CILINDRO DE  OXIGÊNIO  40  LITROS,  CONCENTRADOR  DE  OXIGÊNIO  DOMICILIAR COM CATETER NASAL E CONCENTRADOR PORTÁTIL DE OXIGÊNIO.      A  sentença  julgou  procedente  a  ação  nos  seguintes termos:        "Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido, nos termos do artigo 487, I do Código de Processo   Civil,   para,   CONFIRMANDO  A  TUTELA ANTECIPADA  CONCEDIDA,   condenar   os   réus, SOLIDARIAMENTE,   a   fornecerem   ao   autor   o   tratamento   com   oxigenoterapia   domiciliar,   seus equipamentos e o insumo cateter nasal, conforme solicitado na inicial."    Parecer do NAT no index 74.                            Recurso inominado interposto pelo Município de São Gonçalo (index 307) pugnando pela reforma da sentença ao argumento de ser desarrazoado pretender que o Município possua responsabilidade de fornecer todo e qualquer tratamento, bem como medicamento e custeio de tratamentos de doenças de alta complexidade, eis que importa em violar a legislação vigente, que atribui a competência de cada ente federativo para tal. Alega que o direito à saúde deve sofrer restrições no que tange ao ente público competente para a sua promoção quando necessário, não sendo adequado o seu reconhecimento absoluto e irrestrito perante o Estado, sob pena de ferir a própria efetividade do direito.  Sustenta que muito embora o direito à saúde seja um direito constitucional fundamental de todo cidadão brasileiro a universalidade do direito de acesso à saúde e à integralidade do atendimento na rede pública se concretiza dentro do sistema único de saúde através da descentralização dos serviços e ações de saúde entre os entes federativos dividindo se entre a União, os Estados e os Municípios. Assevera que  cabe  aos  municípios  o  atendimento  ambulatorial,  de emergência, e o chamado "tratamento básico da população", correspondente a 90% das enfermidades, enquanto o tratamento das doenças complexas ou excepcionais foi atribuído, conforme o caso, aos Estados ou a União. Acresce que a  Portaria  do  Ministério  da  Saúde  nº  1318/2002,  relaciona  os  medicamentos,  e  os tratamentos de alto custo e os excepcionais, destinados a pacientes crônicos ou que fazem seu uso  por  períodos  prolongados  e  estes  medicamentos  devem  ser  fornecidos  pela  União  e Estados.  Parecer do Ministério Público (index 326), remetendo se à sua promoção anterior (index 280), em que opinou pela procedência do pedido.      Contrarrazões apresentadas pelo Estado do Rio de Janeiro (index 342).          VOTO       Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço do recurso.    De acordo  com  o  relatório  emitido  pelo  NAT (index 74), "...o tratamento com oxigenoterapia domiciliar, seus equipamentos e o insumo cateter nasal estão indicados diante da condição clínica que acomete o autor...", informando que o tratamento indicado encontra se coberto pelo SUS (index 77).     Nessa esteira, impende  ressaltar  o comando do artigo  196,  CF     "A  saúde  é  direito  de todos  e  dever  do  Estado,  garantido  mediante  políticas  sociais  e econômicas que  visem à  redução  do  risco de doença e de  outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação."         Ademais,  os  entes  federados  têm  a  obrigação  de  projetar suas  despesas  com  a  seguridade  social  (saúde,  assistência  e previdência sociais) em suas leis orçamentárias anuais, nos termos do artigo 165, § 5º, inciso III, da Constituição da República.        Nessa toada,  a sentença combatida encontra se em conformidade com a  Jurisprudência  deste  Tribunal, conforme se infere do enunciado de   Súmula  nº 184: "A  obrigação  estatal  de  saúde compreende o fornecimento de serviços, tais como a realização de exames  e  cirurgias,  assim  indicados  por  médico.  Referência: processo  administrativo  nº.  0013667-68.2011.8.19.0000    julgamento  em  22/11/2010     Relator:  desembargadora  Leila Mariano. Votação unânime."    A propósito:    APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO À SAÚDE. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO / INSUMO. AUTOR PORTADOR DE DOENÇA PULMONAR GRAVE (PSAP 81 MMHG). NECESSIDADE DE OXIGENOTERAPIA DOMICILIAR CONTÍNUA. EQUIPAMENTOS ESTACIONÁRIOS E PORTÁTEIS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. SAÚDE PÚBLICA. PREVISÃO ORÇAMENTÁRIA. DESPESA QUE SE SOBREPÕE ÀS DEMAIS. GARANTIA DE DIREITO FUNDAMENTAL. NECESSIDADE ATESTADA EM RECEITUÁRIO SUBSCRITO POR MÉDICO QUE ACOMPANHA O PACIENTE. PRINCÍPIO DA RESERVA DO POSSÍVEL NÃO PODE SERVIR COMO JUSTIFICATIVA PARA O DESCUMPRIMENTO DE MANDAMENTO CONSTITUCIONAL, MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. DESPROVIMENTO AO RECURSO.     1. "(...) O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente. " (RE 855178 RG, Relator Min. Luiz Fux, Julgado Em 05/03/2015, Processo Eletrônico Repercussão Geral   Mérito   DJE 13 03 2015; Public. 16 03 2015);     2. "Deriva se dos mandamentos dos artigos 6º e 196 da Constituição Federal de 1988 e da Lei n. º 8080/90, a responsabilidade solidária da União, Estados e Municípios, garantindo o fundamental direito à saúde e consequente antecipação da respectiva tutela. " (Enunciado sumular n. º 65 TJRJ);     3. "A obrigação dos entes públicos de fornecer medicamentos não padronizados, desde que reconhecidos pela ANVISA e por recomendação médica, compreende se no dever de prestação unificada de saúde e não afronta o princípio da reserva do possível. " (Enunciado sumular nº. 180 TJRJ);    4. In casu, a parte autora portadora de hipertensão arterial pulmonar grave (PSAP 81 mmHg), necessitando, o tratamento de oxigenoterapia, disponibilizando tanque e mochila de oxigênio líquido e cateter nasal, 2, conforme laudos médicos acostados no index 18   fls. 21/22, que indicam a urgência e a forma prescrita;     5. Obrigação que se insere na esfera jurídica do Estado diante da solidariedade ínsita aos deveres de atendimento à saúde;    6.  Alegações do ora apelante acerca do princípio da reserva do possível não podem servir como justificativas para o descumprimento de mandamento constitucional, quando acarretar a supressão de direitos fundamentais, em atenção ao mínimo existencial e à dignidade da pessoa humana. Diante da prova inequívoca da necessidade do tratamento e da impossibilidade financeira do autor em o custear e considerando a possibilidade de dano irreparável à sua saúde;     7. Correta a douta sentença, ao condenar os réus a disponibilizarem à parte autora o tratamento médico prescrito informado na inicial;    8.  Recurso desprovido, nos termos do voto do Relator.  (0016374-22.2016.8.19.0036   APELAÇÃO. Des(a). LUIZ FERNANDO DE ANDRADE PINTO   Julgamento: 21/04/2021   VIGÉSIMA QUINTA CÂMARA CÍVEL)      Por  todo  o  exposto, VOTO  pelo  CONHECIMENTO   e DESPROVIMENTO do recurso interposto para manter a sentença   por seus próprios fundamentos.        Pelo exposto, VOTO no sentido de CONHECER E NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO INOMINADO interposto pelo Município de São Gonçalo.      Custa na forma da lei.  Condeno o recorrente ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em R$ 500,00 (quinhentos reais),  nos termos do art. 85, §§ 1º e 2º do CPC, em favor do CEJURDPGE RJ.      Transitado em julgado, encaminhe se o Processo Eletrônico ao Juízo de origem.      Rio de Janeiro, 15 de setembro de 2021.      WLADIMIR HUNGRIA  Juiz Relator  Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro  Primeira Turma Recursal da Fazenda Pública

RECURSO INOMINADO 0031639-30.2020.8.19.0002

CAPITAL 1 TURMA RECURSAL DOS JUI ESP FAZENDA PUB.

Juiz(a) WLADIMIR HUNGRIA - Julg: 15/09/2021

 

 

Este texto não substitui o publicado no Diário Oficial.