EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA DAS TURMAS RECURSAIS 8/2020
Estadual
Judiciário
15/09/2020
16/09/2020
DJERJ, ADM, n. 11, p. 14.
Ementário de Jurisprudência das Turmas Recursais do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA TURMAS RECURSAIS Nº 8/2020
COMISSÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Presidente: Desembargador MARCO ANTONIO IBRAHIM
Organização: Serviço de Publicações Jurisprudenciais da Divisão de Organização de Acervos de Conhecimento - dicac@tjrj.jus.br
Rua Dom Manoel, 29, 2º andar, sala 215, Praça XV
Ementa número 1
DETRAN
FISCALIZAÇÃO ELETRÔNICA
ÁREA DE RISCO
ROL TAXATIVO
UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO TURMA DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA DAS TURMAS RECURSAIS DA FAZENDA PÚBLICA Uniformização de Jurisprudência nos autos do Processo nº 147241-43.2018.8.19.0001 Requerente: Marize Cordeiro Paiva Requeridos: Município do Rio de Janeiro e DETRAN-RJ Trata-se de pedido de uniformização de jurisprudência, nos termos do artigo 42 e seguintes da Resolução 14/2012 do Conselho da Magistratura, com as alterações da Resolução CM 05/2013. Alega a parte autora ter sido autuada por diversas vezes entre os anos de 2015 e 2018, por transitar em velocidade superior à máxima permitida em até 20%. Sustenta que na localidade onde as infrações ocorreram a velocidade permitida é de 60km/h, aduzindo que há uma placa no local informando que a fiscalização eletrônica é das 6 às 22h. Ressalta que todos os horários em que foi autuada foram de madrugada. Requereu, assim: (I) a anulação das multas elencadas na inicial; (II) o cancelamento dos pontos lançados no prontuário da autora; (III) o arquivamento do processo administrativo E-12/062/060204/2018; (IV) a devolução dos valores pagos referentes às multas; (V) indenização por dano moral. A sentença de fls. 135/137 julgou procedentes os pedidos para condenar o DETRAN a cancelar o processo administrativo de cassação do direito de dirigir nº E-12/062/060204/2018 e condenar os réus a cancelarem as infrações relacionadas às fls. 09 e restituir à parte autora a quantia de R$ 2.915,64 a título de dano material, com juros e correção monetária incidentes em conformidade com o Enunciado 36 do Aviso Conjunto TJ/COJES nº 15/2017. Recurso inominado interposto pelo Município do Rio de Janeiro às fls. 152/160 alegando que não ignora os perigos aos quais os cidadãos cariocas estão expostos diariamente, razão pela qual a Lei Municipal nº 4892/08 dispõe que o sistema eletrônico de aferição não poderá estar ligado após às 22h. Ressalta que a referida lei restringe tal disposição às áreas consideradas de risco. Aduz que o Decreto 30.404/2009 regulamentou a referida lei, e prevê a exclusão da lavratura de autuações por avanço de sinal nos locais relacionados no anexo I e por excesso de velocidade nos locais relacionados no anexo II, no horário compreendido entre às 22h e 6h. Salienta que o referido Decreto traz um rol taxativo das áreas de risco, aduzindo que o local onde as infrações foram cometidas não estão no rol taxativo considerado de área de risco. Assevera que a alegação de que o local das infrações é perigoso não torna legítima as infrações. Alega que não é possível que o Poder Judiciário intervenha alargando o rol do referido Decreto. Sustenta que os atos administrativos têm presunção de legalidade e legitimidade. Recurso Inominado interposto pelo DETRAN às fls. 169/177, alegando sua ilegitimidade para alterar as multas aplicadas, posto que foram aplicadas pelo Município do Rio de Janeiro. Aduz que o procedimento de cassação aplicada observou todas as normas do CTB, estando vestido da mais inequívoca legalidade. Pugna pelo afastamento da condenação por dano material. Contrarrazões às fls. 191/225. Acórdão da I Turma Recursal da Fazenda Pública em fl. 230/238, datado de 10.04.2019, da lavra do eminente Juiz Relator Dr. João Felipe Nunes Ferreira Mourão, pelo qual foi dado provimento aos recursos inominados interpostos pelo réu com o fim de reformar a sentença de primeiro grau para a improcedência, nos seguintes termos: "Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço do recurso. Sustenta a autora ter sido autuada diversas vezes entre os anos de 2015 e 2018 por transitar em velocidade superior à máxima permitida na Estada do Galeão, aduzindo que no local existe uma placa informando que o horário da fiscalização eletrônica é das 6h às 22h. Alega que foi autuada de madrugada. Desta forma, requer a anulação dos autos de infração, bem como do procedimento administrativo de cassação do direito de dirigir e a devolução dos valores pagos referentes às multas. A questão em debate foi disciplinada pela Lei Municipal 4.892/08, que prevê o seguinte: Art. 1º O Poder Executivo Municipal não poderá utilizar sistemas eletrônicos de aferição de velocidade, que estejam instalados em áreas de risco para segurança dos motoristas, após as 22h00min (vinte e duas) horas. Art. 2º O Poder Executivo promoverá a regulamentação desta Lei, estabelecendo todas as normas complementares para o seu cumprimento. Com efeito, o Decreto 30.404/09, regulamentou a referida lei municipal estabelecendo que: Art. 1º Não serão emitidas multas relativas a avanço de semáforo vermelho nos locais relacionados no Anexo I deste Decreto, no período compreendido entre 22:00 e 06:00 horas. Parágrafo único. No período citado no caput deste artigo, os semáforos serão mantidos no piscante amarelo como forma de alertar os motoristas sobre o local de risco. Art. 2º Não serão emitidas multas relativas a excesso de velocidade nos locais relacionados no Anexo II deste Decreto, no período compreendido entre 22:00 e 06:00 horas. Parágrafo único. As lombadas eletrônicas instaladas nos locais citados no caput deste artigo permanecerão apenas com o sinalizador piscante amarelo, para que os condutores não abusem dos limites de velocidade, devendo a sinalização informar o horário de funcionamento da fiscalização. In casu, as infrações foram aplicadas em decorrência do excesso de velocidade, conforme documento de fls. 40/55, hipótese, portanto, que se amolda ao art. 2º do Decreto 30.404/09, cujo Anexo II cuidou de relacionar em quais locais não haveria autuação da infração em razão do reconhecido risco à segurança. Conforme se infere dos referidos documentos, todas as infrações foram cometidas na Estrada do Galeão, local que não se encontra descrito no rol do Decreto regulamentador, conforme se verifica abaixo: ANEXO II 1. RUA DOM ROSALVO COSTA REGO, EM FRENTE AO Nº 146 2. RUA DOM ROSALVO COSTA REGO, PRÓXIMO A RUA MIN. WALDEMAR FALCÃO 3. ESTRADA DOS BANDEIRANTES, PRÓXIMO AO Nº 8.100 4. AV. PASTEUR, EM FRENTE AO Nº 350 5. RUA MARY PESSOA, EM FRENTE AO Nº 70 6. AV. AREIA BRANCA, EM FRENTE AO Nº 1.628 7. AV. AREIA BRANCA, EM FRENTE AO Nº 178 8. ESTRADA DO DENDÊ, EM FRENTE AO Nº 1.056 9. ESTRADA DOS BANDEIRANTES, PRÓXIMO AO Nº 14.789 10. ESTRADA SANTA MARIA, EM FRENTE AO Nº 1380 11. RUA OLINDA ELIS, EM FRENTE AO Nº 111 12. ESTRADA RIO - SÃO PAULO, PRÓXIMO AO Nº 1278 13. RUA ASSIS CARNEIRO, EM FRENTE AO Nº 375 14. ESTRADA TEN. CEL. MUNIZ DE ARAGÃO, EM FRENTE AO Nº 898 15. RUA SANTO AMARO, EM FRENTE AO Nº 158 16. ESTRADA DO RIO GRANDE, PRÓXIMO AO Nº 1096 17. AV. CESARIO DE MELLO, PRÓXIMO AO Nº 13604 18. ESTRADA DO MAGARÇA, PRÓXIMO AO Nº 1781 19. RUA CAMPO GRANDE, PRÓXIMO AO Nº 1520 20. AV. CESÁRIO DE MELLO, PRÓXIMO AO Nº 4408 (LADO CEMITÉRIO) 21. ESTRADA BENVINDO DE NOVAES, PROXIMO AO Nº 2555 22. ESTRADA DO BARRO VERMELHO, PROXIMO AO Nº 1468 23. ESTRADA DO CAMPINHO, PROX AO Nº 1409 Saliente-se que o referido rol é taxativo, não cabendo ao Poder Judiciário ampliar sua aplicação. Neste sentido, a jurisprudência deste Tribunal: TURMA EXTRAORDINÁRIA RECURSAL FAZENDÁRIA Nº do Processo: 0083733-26.2018.8.19.0001 Recorrente/Autor: JOSÉ CARLOS MOREIRA Recorridos/Réus: MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO e DETRAN VOTO O recurso preenche os requisitos de admissibilidade. No mérito, o recorrente tem razão em parte. Explica-se. Em primeiro, é preciso destacar, em que pese os horários nos quais o autor foi autuado por excesso de velocidade e por avanço do sinal vermelho, as localidades em questão não estão inseridas no Decreto regulamentador da Lei Municipal nº. 4892/2008. O rol, pois, é taxativo, sem possibilidade de ampliação de sua abrangência pelo Poder Judiciário. Neste sentido, o aresto: PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO TURMA RECURSAL EXTRAORDINÁRIA DE FAZENDA PÚBLICA PROCESSO N°: 0331966-07.2017.8.19.0001 RECORRENTE: MUNICIPIO DO RIO DE JANEIRO RECORRIDO: ROBSON ANTÔNIO DOS SANTOS EMENTA: INFRAÇÃO DE TRÂNSITO - MULTA POR EXCESSO DE VELOCIDADE VERIFICADO EM HORÁRIO NOTURNO - ALEGAÇÃO DO LOCAL SER ÁREA DE RISCO - PEDIDO DE ANULAÇÃO DO AUTO DE INFRAÇÃO - SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA - INCONFORMISMO DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO- LEI MUNICIPAL 4.892/08 REGULAMENTADA PELO DECRETO 30.404/09 - RELAÇÃO DOS LOCAIS EM QUE NÃO HÁ EMISSÃO DE MULTA POR EXCESSO DE VELOCIDADE NO PERÍODO EM QUESTÃO - ROL TAXATIVO - PROVIMENTO DO RECURSO - REFORMADA DA SENTENÇA PARA JULGAR IMPROCEDENTES OS PEDIDOS. RELATÓRIO Trata-se de ação pelo rito especial da Lei 12.153/09, proposta em face do DETRAN/RJ e do Município do Rio de Janeiro, pela qual buscou obter o cancelamento de infração de trânsito decorrente de excesso de velocidade, por se tratar de local de extrema periculosidade. Contestação do Município, fls. 37/45, que, em síntese, alegou ser taxativo o rol de áreas de risco que integra a Lei Municipal n° 4.892/08, que dispõe acerca da fiscalização de trânsito em área consideradas de risco na cidade do Rio de Janeiro, e que o local mencionado pelo autor não se encontra previsto pela referida relação. O Ministério Público manifestou seu desinteresse pelo feito, fl. 47. Pela sentença de fl. 65, o pedido foi julgado procedente quanto à pretensão dirigida ao Município do Rio de Janeiro, declarada a insubsistência do Auto de Infração nº D8/01219130 e condenado o réu ao cancelamento da pontuação inserida no prontuário do autor, bem como julgado extinto o feito em relação ao DETRAN/RJ por reconhecimento de sua ilegitimidade passiva. Recurso Inominado do MRJ, fls. 82/88, pela reforma da sentença com base nos argumentos de sua peça de defesa. Sem contrarrazões, fl. 99. VOTO Cuida-se de recurso interposto contra sentença pela qual fora acolhido o pedido autoral de anulação de multa de trânsito por excesso de velocidade. Ao contrário do que entendeu o Juízo a quo, os fundamentos do pedido de anulação do auto de infração não têm como serem acolhidos no caso concreto. A matéria foi disciplinada pela Lei municipal 4.892/08, que assim dispôs: Art. 1º O Poder Executivo Municipal não poderá utilizar sistemas eletrônicos de aferição de velocidade, que estejam instalados em áreas de risco para segurança dos motoristas, após as 22h00min (vinte e duas) horas. Art. 2º O Poder Executivo promoverá a regulamentação desta Lei, estabelecendo todas as normas complementares para o seu cumprimento. Regulamentada pelo Decreto nº 30.404/09, ficou estabelecido que: Art. 1º Não serão emitidas multas relativas a avanço de semáforo vermelho nos locais relacionados no Anexo I deste Decreto, no período compreendido entre 22:00 e 06:00 horas. Parágrafo único. No período citado no caput deste artigo, os semáforos serão mantidos no piscante amarelo como forma de alertar os motoristas sobre o local de risco. Art. 2º Não serão emitidas multas relativas a excesso de velocidade nos locais relacionados no Anexo II deste Decreto, no período compreendido entre 22:00 e 06:00 horas. Parágrafo único. As lombadas eletrônicas instaladas nos locais citados no caput deste artigo permanecerão apenas com o sinalizador piscante amarelo, para que os condutores não abusem dos limites de velocidade, devendo a sinalização informar o horário de funcionamento da fiscalização. Na hipótese dos autos, a multa aplicada ao autor decorreu de excesso de velocidade, conforme fl. 12, hipótese constante do artigo 2º do decreto regulamentador, cujo Anexo II cuidou de relacionar em quais locais não haveria emissão de multas. No referido Anexo não consta o local da infração cometida pelo autor. O rol é taxativo, não cabendo ao Judiciário ampliar a sua aplicação. Observa-se, portanto, que o réu agiu dentro dos parâmetros legais, o que afasta a nulidade pleiteada. Por fim, assinale-se que a Lei Estadual 7.580/2017, referida pelo autor à fl. 04, não determinou o desligamento dos radares em áreas de risco, como afirmado, mas, em verdade, proibiu a instalação de novos dispositivos de controle de velocidade em áreas de risco e determinou a retirada gradual destes equipamentos, em conjunto com os municípios, estando ainda pendente de regulamentação. Assim, VOTO PELO CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO RECURSO para reformar a sentença e julgar improcedentes os pedidos. Sem custas pela isenção legal e sem honorários em razão do provimento do recurso. Juiz(a) RAQUEL DE OLIVEIRA - Julgamento: 30/11/2018 - TURMA RECURSAL FAZENDARIA EXTRAORDINARIA Entretanto, no que toca às notificações relativas às infrações registradas sob os números B62718271 (D3/01135582), B62720048 (D3/01137112) e B62709048 (D8/01038991), verifica-se que o Município do Rio de Janeiro - órgão autuador - se limitou a apresentar telas sistêmicas sem qualquer indicação do endereço para o qual teriam sido enviadas as notificações de autuação e de penalidade. As telas apresentadas, no caso em comento, não são hábeis a demonstrar a regularidade das notificações, razão pela qual cabe a anulação dos respectivos procedimentos, bem como das penalidades, nos termos da Súmula 312 do STJ. E se é assim, cabe ao Município a devolução dos valores das multas administrativas decorrentes das infrações supracitadas, alcançando a quantia total de R$631,57 (R$132,50 + R$298,75 + R$200,32) conforme indicado nas telas acostadas pela municipalidade. No que se refere ao procedimento administrativo de suspensão do direito de dirigir nº E-12/062/019010/2018, deflagrado em 02/2018, muito embora a autarquia estadual de trânsito tenha apresentado a prova do envio da notificação de autuação para o endereço cadastrado no Renach - Rua Orica nº. 462, casa, Brás de Pina, Rio de Janeiro - (fls. 73 e 75), tendo o autor, inclusive, apresentado defesa prévia, é de rigor a anulação do referido procedimento, diante da irregularidade referente às notificações das infrações autuadas pelo Município do Rio de Janeiro. Neste passo, as infrações remanescentes não alcançam 20 pontos, sendo, portanto, insuficientes para a deflagração do processo de suspensão. Os fatos narrados não ocasionaram violação dos direitos da personalidade, limitando-se à análise da regularidade formal. À conta do exposto, voto pelo conhecimento do recurso e, no mérito para: a. DAR PROVIMENTO AO RECURSO PARA julgar procedente o primeiro pedido, na forma do artigo 487, I, do CPC, para anular os autos de infração nºs B62718271 (D3/01135582), B62720048 (D3/01137112) e B62709048 (D8/01038991), condenando o Município do Rio de Janeiro a efetivar o cancelamento, bem como a penalidade deles decorrentes; b. DAR PROVIMENTO AO RECURSO PARA julgar procedente o segundo pedido, na forma do artigo 487, I, do CPC, para anular o processo de suspensão do direito de dirigir nº E-12/062/019010/2018, condenando o Detran a efetivar o cancelamento, bem como da penalidade dele decorrente; c. DAR PROVIMENTO AO RECURSO PARA Julgar procedente o terceiro pedido, na forma do artigo 487, I, do CPC, para condenar o Município do Rio de Janeiro a devolver ao autor a quantia de R$ 631,57 com correção a partir do desembolso pelo IPCA-E e juros a partir da citação, na forma do artigo 1º-F da Lei n. 9.494/97, com a redação dada pela Lei n. 11.960/2009; d. NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO NO QUE TOCA AO DANO MORAL, MANTENDO, POIS, A SENTENÇA. Sem custas e honorários advocatícios, tendo em vista o provimento do recurso, nos termos do artigo 55 da Lei nº 9099/95. É o voto. Rio de Janeiro, 13 de dezembro de 2018. Alexandre Correa Leite Juiz Relator PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO TURMA RECURSAL EXTRAORDINÁRIA DE FAZENDA PÚBLICA PROCESSO N°: 0078939-59.2018.8.19.0001 RECORRENTES: MUNICIPIO DO RIO DE JANEIRO E DETRAN/RJ RECORRIDO: ALEX GOMES DE OLIVEIRA EMENTA: TRÂNSITO - INFRAÇÕES PRATICADAS EM HORÁRIO NOTURNO - ALEGAÇÃO DE ÁREA DE RISCO - PEDIDO DE ANULAÇÃO DAS MULTAS APLICADAS PELO MRJ E DA PONTUAÇÃO NEGATIVA ANOTADA PELO DETRAN - SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA - INCONFORMISMO DOS RÉUS - LEI MUNICIPAL 4.892/08 REGULAMENTADA PELO DECRETO 30.404/09 - RELAÇÃO DOS LOCAIS EM QUE NÃO HÁ EMISSÃO DE MULTA POR AVANÇO DE SINAL VERMELHO OU POR EXCESSO DE VELOCIDADE NO HORÁRIO NOTURNO - ROL TAXATIVO - AUSÊNCIA DE IRREGULARIDADE - PROVIMENTO DO RECURSO PARA JULGAR IMPROCEDENTES OS PEDIDOS. RELATÓRIO Trata-se de ação pelo rito especial da Lei 12.153/09, proposta em face do Município do Rio de Janeiro e do DETRAN/RJ, em que o autor buscou obter a declaração de nulidade de autos de infrações que resultaram na instauração de dois processos administrativos por acúmulo de pontuação. Dentre os motivos, alega que o excesso de velocidade se deu em razão da periculosidade do local em horários noturnos, bem como ausência de notificações. Deferimento parcial da tutela antecipada, fl. 53, para determinar a suspensão da penalidade de suspensão do direito de dirigir, mantendo-se esta decisão até o término da lide. Contestação do Município, fls. 78/91, em que apontou não ser competente para retirar ou atribuir pontos à CHN. No mais, informou que a Lei Municipal n° 4.892/08, que dispõe acerca da fiscalização de trânsito em área consideradas de risco na cidade do Rio de Janeiro, apresenta um rol taxativo e que esta não abarca a localização em que o autor foi autuado. Contestação do DETRAN/RJ, fls. 101/103, pela qual sustentou ser parte ilegítima para cancelar multas que foram aplicadas por outros entes. No mais, enfatizou que não houve qualquer violação ao devido processo legal no caso em tela. O Ministério Público manifestou seu desinteresse pelo feito, fl. 129. Pela sentença de fl. 139/140, o pedido foi julgado procedente para declarar a nulidade dos autos de infrações nº D3/01146141, D8/01063655, D2/00474693, D8/01106052, D2/00479356, D2/00479358, D8/01108557, D3/01177400 e D2/00480063 e dos processos administrativos E12/062/098767/2017 e E-12/062/098799/2017. Recurso Inominado do MRJ, fls. 152/159, pela reforma da sentença com base nos argumentos apresentados em contestação. Contrarrazões, fls. 173/178. Recurso Inominado do DETRAN/RJ, fls. 181/185, igualmente para renovar os fundamentos constantes da peça de bloqueio. Contrarrazões, fls. 191/196. VOTO Cuida-se de pedido de anulação de multas de trânsito sob a alegação de que as infrações impugnadas teriam sido cometidas no horário de 22:00h a 06:00h, período em que eventuais faltas não seriam passíveis de registro por força da Lei 4.892/08 e da relação de áreas de risco anexa ao decreto regulamentador. Inicialmente, cabe ser destacado que o autor não alegou a nulidade das multas por ausência de notificação válida, mas, apenas, pelo local e horário de seu cometimento, para efeito da Lei municipal 4.892/08. Note-se que assiste razão ao MRJ, pois a questão da não emissão de multas no horário de 22:00h até 06:00h foi disciplinada pela Lei municipal 4.892/08 e regulamentada pelo Decreto nº 30.404/09, que assim dispôs: Art. 1º Não serão emitidas multas relativas a avanço de semáforo vermelho nos locais relacionados no Anexo I deste Decreto, no período compreendido entre 22:00 e 06:00 horas. Parágrafo único. No período citado no caput deste artigo, os semáforos serão mantidos no piscante amarelo como forma de alertar os motoristas sobre o local de risco. Art. 2º Não serão emitidas multas relativas a excesso de velocidade nos locais relacionados no Anexo II deste Decreto, no período compreendido entre 22:00 e 06:00 horas. Parágrafo único. As lombadas eletrônicas instaladas nos locais citados no caput deste artigo permanecerão apenas com o sinalizador piscante amarelo, para que os condutores não abusem dos limites de velocidade, devendo a sinalização informar o horário de funcionamento da fiscalização. Na hipótese dos autos, as multas de fls. 36/37 e fls. 41/46 decorreram de excesso de velocidade e teriam sido supostamente cometidas em áreas de risco, conforme previsto pelo artigo 2º do decreto regulamentador. Ocorre que seu Anexo II cuidou de relacionar de forma taxativa quais locais em que não haveria emissão de multas e, dentre estes, não constou o local da infração cometida pelo autor. Em relação à multa de fl. 38, por avanço de sinal vermelho, não há porque ser invocado o artigo 1º do regulamento na medida em que a infração se deu fora do horário de 22:00h a 06:00h, além de o local de seu cometimento não ter constado como área de risco do Anexo II do mesmo decreto. Neste contexto, verifica-se que o MRJ agiu dentro dos parâmetros legais, o que afasta a nulidade pleiteada. Quanto ao recurso do DETRAN/RJ, é preciso assinalar que este órgão não detém ingerência sobre os autos de infração lavrados pelo MRJ, cabendo-lhe apenas registrar as infrações nos respectivos prontuários e aplicar as penalidades decorrentes dos seus efeitos. No caso em tela, não houve imputação da prática de qualquer ilegalidade à autarquia de trânsito pela parte autora, permanecendo hígidos os procedimentos administrativos instaurados a partir das multas lavradas pelo MRJ, sobre as quais, conforme já explanado, não pairam quaisquer vícios. Assim, VOTO PELO CONHECIMENTO E PROVIMENTO DE AMBOS OS RECURSOS para reformar a sentença e julgar improcedente os pedidos. Sem custas pela isenção legal. Sem honorários, ante o provimento dos recursos. Portanto, a autora não logrou êxito em afastar a presunção de legalidade dos atos administrativos, razão pela qual os pedidos devem ser julgados improcedentes. À conta de tais fundamentos, VOTO PELO CONHECIMENTO E PROVIMENTO DOS RECURSOS, para julgar improcedentes os pedidos. Sem condenação em custas e honorários, ante o provimento dos recursos. Transitado em julgado, baixe-se à origem". Após a interposição e apreciação dos aclaratórios de fls. 239/294 e 299/303, a parte autora ingressou com o pedido de Uniformização de Jurisprudência de fls. 308/331 alegando, em síntese, que: (I) na localidade onde as Multas foram efetuadas pela Requerente, existe uma placa bem grande e legível que informa que ali no local tem um radar de avanço de velocidade, com a seguinte informação para os motoristas que ali transitam: "FISCALIZAÇÃO ELETRONICA DE VELOCIDADE, das 6 às 22 h"; (II) Apesar de ter uma placa bem grande ao lado do Radar, instalada pela Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, informando que, entre as 6 às 22 h, a velocidade máxima do local permitida é de 60km por hora, sendo depois desse horário, liberada para os motoristas passarem a mais de 60km por hora, a Requerente recebeu todas as multas elencadas na inicial; (III) a sentença de 1º grau acolheu sua tese e seus pedidos, porém após a interposição dos recursos inominados pelos réus, houve reforma da sentença para julgar improcedentes os pedidos; (IV) há diversos julgados das Turmas Recursais da Fazenda Pública em sentido contrário ao acórdão exarado nestes autos que julgaram procedentes pedidos idênticos aos formulados pelo ora Requerente (RI 0154544-45.2017.8.19.0001, RI 0426473-96.2013.8.19.0001 e RI 0101508-88.2017.8.19.0001); (V) a legalidade e legitimidade dos atos administrativos, apesar de terem certa presunção de legalidade e legitimidade, ocorreu um equívoco intencional por parte do Poder Público Municipal, quando instalou uma placa bem grande ao lado dos semáforos autorizando o avanço de velocidade, desconstituindo assim, a presunção que milita em favor da Edilidade Municipal, com a realização da prova do fato constitutivo de seu direito, com a referida Placa. Ao final de seu arrazoado, o Requerente formulou pedido nos seguintes termos: "... demonstrado o cabimento do presente pedido de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais, a Recorrente requer a essa Egrégia Turma de Uniformização o seu conhecimento e integral provimento, para que seja reformado a Súmula e o Voto de Julgamento recorrido, eis que diverge do entendimento das decisão da própria 1ª Turma recursal, bem como da Turma Recursal Fazendária Extraordinária sobre o tema, nos termos acima explicitados, para que seja anulado o Processo Administrativo nº E-12/062/060204/2018, em tramite junto ao Departamento de Trânsito do Estado do Rio de Janeiro - Detran/RJ, seja definitivamente cancelado e arquivado, sem qualquer prejuízo ou ônus para a Autora, uma vez que ela não cometeu as multas aqui discutidas, bem como para que sejam os Recorridos, condenados a título de repetição de indébito, que restituam o valor de R$2.915,64 (dois mil, novecentos e quinze reais e sessenta e quatro centavos) a Autora, devidamente atualizado e corrigido a partir de cada pagamento, conforme comprovantes em anexo, e seja determinado a anulação de todas as multas que foram elencadas no item número 2(dois) da presente". O Município do Rio de Janeiro impugnou o pedido de Uniformização de Jurisprudência mediante a petição de fls. 335/344. O Detran-RJ impugnou o pedido de Uniformização de Jurisprudência mediante a petição de fls. 345/351. Sobreveio a decisão de fls. 353/354 da lavra do Exmo. Desembargador Mauro Martins, Presidente da COJES, que reconheceu a existência de dissídio jurisprudencial em relação à questão em exame, e admitiu o incidente, determinando o julgamento do processo representativo da controvérsia, a teor do disposto no artigo 42 do Regimento Interno, nos seguintes termos: "... No caso dos autos, restou evidenciada a divergência entre julgados contemporâneos da Turma Recursal Fazendária em hipótese idêntica. De fato, a divergência entre os julgados da Turma Recursal Fazendária em simultâneo exercício quanto à interpretação de direito material - taxatividade do rol previsto no Decreto Municipal 30.404/2009 para efeitos de anulação de multa de trânsito por infrações cometidas em áreas de risco - foi regularmente demonstrada pelo impetrante, o que autoriza o processamento deste incidente na forma do artigo 42 do Regimento Interno da Turma Recursal. Dessa forma, acolho o incidente de uniformização do id. 308 e determino a suspensão dos processos que versem sobre o tema no âmbito das Turmas Recursais Fazendárias do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Distribuam-se este procedimento a novo relator para julgamento do incidente e procedam-se às comunicações de estilo". Em fl. 359 o Ministério Público reiterou manifestação anterior no sentido de que não possui interesse em intervir no feito. É O RELATÓRIO. PASSO AO VOTO. Inicialmente, deve ser destacado que o artigo 18 da Lei 12.153/2009 estabelece, quanto ao incidente de Uniformização de Jurisprudência nas Turmas Recursais Fazendárias, que "Caberá pedido de uniformização de interpretação de lei quando houver divergência entre decisões proferidas por Turmas Recursais sobre questões de direito material". Tal esclarecimento se faz necessário, eis que não se pode reapreciar em sede de Uniformização de Jurisprudência questões probatórias suscitadas pelo Requerente no curso da demanda, notadamente acerca da existência ou não de placa no local informando, supostamente, que no horário compreendido entre 22:00h e 06:00h estaria permitido o avanço da velocidade máxima prevista para o local de 60km/h. Desta forma, a decisão a ser aqui proferida deverá se limitar à divergência jurisprudencial quanto à interpretação de direito material relativa à taxatividade dos róis previstos no Decreto Municipal 30.404/2009. Aqui nesse aspecto deve ser destacado, outrossim, que o Decreto Municipal 30.404/2009 apresenta duas hipóteses distintas em que a Municipalidade deverá deixar de exercer seu poder fiscalizatório quanto ao trânsito, no período compreendido entre 22:00h e 06:00h, quais sejam, avanço de semáforo vermelho nos locais relacionados no Anexo I do aludido Decreto (onde os semáforos permanecerão em amarelo piscante) e excesso de velocidade nos locais relacionados no Anexo II do mesmo decreto legislativo. Note-se que embora o Recurso Inominado interposto nos autos do processo originador do Incidente de Uniformização de Jurisprudência tenha por objeto apenas o Anexo II do Decreto 30.404/2009, certo é que a decisão de fls. 353/354, da lavra do eminente Presidente da Cojes, Des. Mauro Martins, determina que seja apreciada a questão da taxatividade do rol previsto no Decreto Municipal 30.404/2009, o que engloba ambas as hipóteses ali previstas. Postos tais limites objetivos da matéria em debate, passo a análise do mérito. Como muito bem ressaltado pelo acórdão de fls. 230/238, o rol apresentado pelo Anexo II do art. 2º, do Decreto 30.404/2009 é taxativo, não cabendo ao Poder Judiciário ampliar sua aplicação, devendo ser expandido tal entendimento à hipótese do artigo 1º do aludido Decreto e seu respectivo rol do Anexo I. Isso porque admitir-se deixar ao critério do Poder Judiciário a aferição, caso a caso, dos locais onde não haveria autuação da infração em razão do reconhecido risco à segurança é usurpar a competência exclusiva dos Municípios, substituindo, o Poder Judiciário, a tarefa que é exigida e imposto ao Poder Executivo Municipal. Com efeito, o artigo 24 do Código de Trânsito Brasileiro estabelece que compete aos órgãos e entidades executivos de trânsito dos Municípios, no âmbito de sua circunscrição, planejar, projetar, regulamentar e operar o trânsito de veículos, de pedestres e de animais, e promover o desenvolvimento da circulação e da segurança de ciclistas, além de implantar, manter e operar o sistema de sinalização, os dispositivos e os equipamentos de controle viário. E no âmbito do Município do Rio de Janeiro a Lei Municipal nº 4.892/2008 preceitua, em seu artigo 1º, que o Poder Executivo Municipal não poderá utilizar sistemas eletrônicos de aferição de velocidade que estejam instalados em áreas de risco para segurança dos motoristas, após às 22h. Também prevê, a referida lei em seu artigo 2º preceitua que o Poder Executivo promoverá a sua regulamentação, estabelecendo normas complementares para o seu cumprimento. Como já salientando alhures, a referida lei foi regulamentada através do Decreto nº 30.404/2009, que especificou os locais, em seu Anexo II, nos quais não serão emitidas multas relativas a excesso de velocidade, no período compreendido entre 22:00 e 06:00 horas, dentre os quais não se encontra aquele onde a parte Requerente foi multada. Ampliando as hipóteses em que o Poder Público deixará de exercer seus poder fiscalizatório entre as 22:00h e 06:00, como já apontado acima, o Decreto 30/404/2009 também trouxe o Anexo I, regulamentando seu artigo 1º, que estabelece que "Não serão emitidas multas relativas a avanço de semáforo vermelho nos locais relacionados no Anexo I deste Decreto, no período compreendido entre 22:00 e 06:00 horas". Tal escolha decorre de uma opção política do Poder Executivo a quem cabe realizar a ponderação dos interesses em conflito, ou seja, optar em fazer prevalecer a segurança viária e daqueles que utilizam a via pública em detrimento da segurança dos motoristas que optam em trafegar na mesma via pública em horário considerado perigoso. Sobre a sobre a competência dos Municípios, o ministro Gilmar Mendes (in Curso de Direito Constitucional/Gilmar Ferreira Mendes, Paulo Gustavo Gonet Branco. - 13. ed. rev. e atual. - São Paulo: Saraiva Educação, 2018, p. 1357) diz que: "Aos Municípios reconhece-se o poder de auto-organização, o que significa reconhecer-lhes poder constituinte, expresso nas suas leis orgânicas, limitadas tanto por princípios da Constituição Federal como da Constituição estadual, nos termos do art. 29 da CF. As competências implícitas decorrem da cláusula do art. 30, I, da CF, que atribui aos Municípios "legislar sobre assuntos de interesse local", significando interesse predominantemente municipal, já que não há fato local que não repercuta, de alguma forma, igualmente, sobre as demais esferas da Federação. Consideram-se de interesse local as atividades, e a respectiva regulação legislativa, pertinentes a transportes coletivos municipais, coleta de lixo, ordenação do solo urbano, fiscalização das condições de higiene de bares e restaurantes, entre outras. Aos Municípios é dado legislar para suplementar a legislação estadual e federal, desde que isso seja necessário ao interesse local, no desempenho da competência disposta no art. 30, II, da Constituição". Em brilhante decisão proferida nos autos do pedido de Suspensão de Execução nº 0036361-16.2020.8.19.0000 ajuizado pelo Estado do Rio de Janeiro e Município do Rio de Janeiro em face da decisão da 7ª Vara da Fazenda Pública que havia concedido tutela de urgência para impedir que o Governador do Estado e o Prefeito do Município do Rio de Janeiro estabelecessem, medidas de flexibilização do isolamento social, o eminente Presidente do Tribunal de Justiça, Des. Claudio de Mello Tavares, ao tratar da atuação do Poder Judiciário, trouxe à baila a questão contemporânea do ativismo judicial. O eminente Presidente asseverou naquele decisum, mencionado artigo da lavra do Ministro Luiz Fux, que "impõe-se aos juízes atenção para as consequências das suas decisões, recomendando-se prudência redobrada em cenários nos quais os impactos da intervenção judicial são complexos, incalculáveis ou imprevisíveis. Antes de decidirem, devem os juízes ouvir os técnicos, porque uma postura judicial diversa gera decisões passionais que desorganizam o sistema de saúde, gerando decisões trágicas e caridade injusta". (FUX, Luiz. Justiça infectada? A hora da prudência. Publicado no Jornal O GLOBO. Disponível em: https://oglobo.globo.com/opiniao/artigo-justica-infectada-hora-daprudencia-24337119. Acesso 08 de junho de 2020). Prosseguiu o Presidente desta Corte Fluminense destacando que "... o respeito às diretrizes técnicas buscam justamente garantir o princípio da separação de poderes, um dos pilares de sustentação da República...". Aqui reside, repita-se, o nó górdio da questão trazida à lume: cabe ao Poder Judiciário declarar quais locais não apresentam a segurança aos condutores de veículos automotores a justificar a não observância dos limites de velocidade ou a sinalização semafórica instituídos para aquelas localidades? E mais: Cabe ao Poder Judiciário ampliar o rol apresentado pelo Anexos I e II do art. 2º, do Decreto 30.404/2009 sem qualquer fundamento técnico a embasar tal posicionamento? A meu ver a resposta é evidentemente negativa. Somente o Poder Executivo Municipal detem conhecimento técnico a possibilitar a edição de Decreto legislativo prevendo quais locais devem ser considerados como inseguros a justificar o desligamento dos radares de velocidade e sinais de trânsito (que devem permanecer em amarelo piscante) em determinado período da noite. Entendimento contrário seria ferir de morte o princípio da Separação dos Poderes insculpido na Carta Magna. Ainda mencionando a decisão proferida pelo Des. Claudio de Mello Tavares nos autos do pedido de
Suspensão de Execução nº 0036361-16.2020.8.19.0000 e que se amolda perfeitamente à questão sob exame, "Em um Estado Democrático de Direito, a atuação do Poder Judiciário deve respeitar os limites impostos pela Constituição e pelas demais leis do país. Não pode se dar, exclusivamente, pela vontade do julgador, por melhor que seja sua intenção. Julgar não é um ato de vontade, mas de conhecimento. A sociedade precisa de tranquilidade e segurança jurídica. Cumpre ao Poder Judiciário, com serenidade e responsabilidade, se desincumbir desse mister. De fato, e não raro, sob a argumentação de [suposta] proteção aos direitos fundamentais, muitas vezes se escondem objetivos pragmáticos e ideológicos de controle sobre os demais Poderes republicanos, o que afronta diretamente a Constituição". Desta forma, conclui-se que na execução do conjunto de medidas adotadas para o combate à violência urbana que acomete a cidade do Rio de Janeiro, não cabe ao Poder Judiciário decidir, sem respaldo técnico, qual escolha deve ser tomada pelo Executivo Municipal quanto à indicação de quais locais devem ser considerados como inseguros a justificar o desligamento dos radares de velocidade e sinais semafóricos em determinado período da noite. Pelo exposto, VOTO pelo reconhecimento da taxatividade de ambos os róis previstos no Decreto Municipal 30.404/2009 (Anexos I e II) para efeitos de anulação de multa de trânsito por infrações cometidas em áreas de risco, mantendo-se hígido, assim, o acórdão de fls. 230/238 destes autos. Rio de Janeiro, 28 de julho de 2020. ALBERTO REPUBLICANO DE MACEDO JR. JUIZ DE DIREITO RELATOR
RECURSO INOMINADO 0147241-43.2018.8.19.0001
TURMA DE UNIFORMIZAÇÃO FAZENDÁRIA
Juiz(a) ALBERTO REPUBLICANO DE MACEDO JUNIOR - Julg: 31/07/2020
Ementa número 2
PANDEMIA DE COVID-19
HOSPITAL PARTICULAR
TRANSFERÊNCIA DO PACIENTE
SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE - S.U.S.
INVIABILIDADE DO MANDADO DE SEGURANÇA
Mandado de Segurança nº 0000751-50.2020.8.19.9000 IMPETRANTE: HOSPITAL MEMORIAL FUAD CHIDID LTDA IMPETRADO: I JUIZADO ESPECIAL FAZENDÁRIO MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA DECISÃO QUE DEFERIU TUTELA DE URGENCIA NO SENTIDO DE QUE O HOSPITAL IMPETRANTE MANTENHA A INTERNAÇÃO DA PARTE AUTORA ATÉ QUE SEJA PROVIDENCIADA TRANSFERÊNCIA DA MESMA PARA ALGUM HOSPITAL DA REDE PÚBLICA COM SUPORTE PARA ATENDÊ-LA. DESCABIMENTO DA VIA ELEITA. NA FORMA DO DISPOSTO NO ART. 101 DO C/C ART. 1.015, INCISO V, AMBOS DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL E DA VEDAÇÃO DO ART. 5°, II DA LEI 12.016/2009. INDEFERIMENTO DA INICIAL. VOTO Trata-se de Mandado de Segurança contra decisão do Juízo de Plantão que deferiu a antecipação de tutela no sentido de que o Hospital impetrante mantenha a internação da parte autora , com suspeita de COVID-19, às expensas dos entes públicos, até que seja providenciada transferência da mesma para algum hospital da rede pública com suporte para atendê-la, no bojo do processo originário nº 0122758-75.2020.8.19.0001. Aduz o impetrante que é um hospital particular, que não possui convênio com o SUS entendendo, portanto, que deve ser incluída na decisão liminar o seqüestro de verbas públicas para o custeio da internação da autora em suas dependências, até que seja efetivada a transferência da mesma para algum hospital público. É flagrante o não cabimento de Mandado de Segurança visando reforma da decisão, como pretende o Impetrante, visto que o meio próprio de impugnação é pela via do Agravo de Instrumento, na forma do disposto no art. 101 do c/c art. 1.015, inciso V, ambos do Código de Processo Civil e da vedação do art. 5°, II da Lei 12.016/2009. A hipótese, portanto, é de indeferimento liminar da petição inicial. Assim, impõe-se a extinção do feito, tendo em vista não ser esta a via adequada para demonstração do inconformismo do impetrante. Pelo exposto, voto no sentido de não conhecer do presente mandado de segurança ante a inadequação da via eleita, nos termos do art. 485, VI do Código de Processo Civil. Sem custas. Sem honorários advocatícios. Rio de Janeiro, 15 de julho de 2020. ANA PAULA CABO CHINI JUÍZA RELATORA
MANDADO DE SEGURANÇA - CPC 0000751-50.2020.8.19.9000
CAPITAL 1 TURMA RECURSAL DOS JUI ESP FAZENDA PUB.
Juiz(a) ANA PAULA CABO CHINI - Julg: 18/07/2020
Ementa número 3
PERTURBAÇÃO DO SOSSEGO ALHEIO
LOCAL DE TRABALHO
BEM JURÍDICO TUTELADO
PAZ SOCIAL
MULTA
ESTADO DO RIO DE JANEIRO PODER JUDICIÁRIO I TURMA RECURSAL CRIMINAL PROCESSO Nº 4910-65.2015.8.19.0026 APELANTE: ROSELAINE SOUZA DE OLIVEIRA APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO CONTRAVENÇÃO DE PERTURBAÇÃO DO SOSSEGO - CONDENAÇÃO - RÉ REVEL - TIPICIDADE - OFENSA AO BEM JURÍDICO PAZ PÚBLICA CARACTERIZADA - PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA - AFASTAMENTO - PROVA SUFICIENTE PARA A CONDENAÇÃO - CONHECIMENTO DO RECURSO E PROVIMENTO PARCIAL PARA DIMINUIR A PENA BASE AO PATAMAR MÍNIMO E SUBSTITUÍ-LA PELA PENA DE MULTA, EIS QUE PRESENTES OS REQUISITOS LEGAIS, MANTENDO-SE, NO MAIS A R. SENTENÇA ATACADA. RELATÓRIO Trata-se de ação penal em que a acusada ROSELAINE SOUZA DE OLIVEIRA está condenada à pena de 01 (um) mês de prisão simples, substituída pela pena de prestação de serviços comunitários por igual período, tendo em vista a infração do art. 65 da LCP. A acusada recorreu tempestivamente com razões a fls. 70/75. O recurso deve ser conhecido. Quanto às teses de defesa, o recurso vem argumentando que o fato careceria de tipicidade: quer formal, eis que tudo não teria passado de mera discussão entre as partes materiais; quer material, eis que seria aplicável o Princípio da Insignificância. Por fim, ataca a prova, dizendo ser insuficiente, e pede a absolvição. Subsidiariamente, pleiteia a modificação da pena, diminuindo-a ao mínimo legal. A Defensoria Pública junto a este Colegiado, a fls. 89/90, ratificou as teses defensiva já sustentadas e ainda impugnou a aplicação da pena base acima do mínimo legal e o afastamento da pena de multa. O Ministério Público prestigiou a sentença, tanto na resposta recursal de fls. 85/88, quanto no parecer junto a este Conselho (fls. 91/93). VOTO O recurso defensivo é tempestivo e possui sua regularidade formal. Assim, RECEBO-O. A r. decisão atacada, data venia, não merece a reforma pretendida na tese principal (absolvição por quaisquer dos fundamentos sustentados), eis que se encontra devidamente bem fundamentada. Deve, no entanto, sofrer pequena reforma quanto à resposta penal, conforme segue delineado neste voto. Com a devida vênia da douta Defesa, não há como se acolher a tese da falta de provas, eis que, como bem fundamentado na r. sentença atacada, "O Sr. Leonardo Ferreira Cunha disse em sede policial, e ratificou em juízo, que sua ex-companheira Roselaine, com quem conviveu por cerca de um ano e oito meses, após a separação do casal, esteve em seu local de trabalho por mais de uma vez, gritando seu nome, afim de lhe causar transtorno, com a intenção de prejudica-lo profissionalmente. A meu sentir, se de um lado não ficou bem configurada a real motivação por parte da ré de comparecer no local de trabalho de seu ex-companheiro, por algumas vezes, até porque, de fato, depende financeiramente do mesmo para cuidar dos filhos do casal, conforme revelou, lado outro, temos que a ré não negou, quando de seu depoimento em sede policial, que, esteve por pelo menos duas vezes no local de trabalho do seu ex-companheiro se valendo de palavras impróprias (em tom alto) para chamar atenção do mesmo. Neste ponto, ainda que não fosse a efetiva intenção da ré, certo é que com seus "gritos", além de chamar a atenção de seu ex-companheiro, certamente perturbou não apenas o seu ex-companheiro, mas o próprio ambiente de trabalho, alcançando, inclusive, os colegas de trabalho do ex-companheiro, sem falar, na efetiva possibilidade de que o ex-companheiro fosse advertido pelo patrão ou até mesmo perdesse o emprego, conforme acabou acontecendo, por duas vezes, segundo desse Leonardo". (fls. 60/61) Deve-se portanto, prestigiar o Princípio da Identidade Física do Magistrado que colheu a prova. No caso em tela, como não foi possível trazer aos autos outras testemunhas do fato, certo é que a palavra do ofendido assume especial valor probatório, eis que coerente em ambas as fases, tudo acrescido da parcial confissão da ré em sede policial. De outro lado, registre-se, por ser oportuno, que não se tratou mera discussão entre as partes materiais, mais sim de mais de uma efetiva perturbação do sossego do ofendido. Como bem disse a ré e confirmou a vítima, a primeira esteve em seu local de trabalho, por mais de uma vez, aos gritos, e, evidentemente para tirar-lhe a tranquilidade, ainda que não tivesse a intensão clara e cristalina de lhe prejudicar no trabalho. Diz o tipo contravencional em questão: "Molestar alguém ou perturbar-lhe a tranquilidade, por acinte ou por motivo reprovável". Ora, trata-se de tipo de conteúdo variável, sendo que a adequação típica, no caso em tela, encontra amálgama no segundo núcleo ("perturbar-lhe"), bem como no termo "acinte" ou qualquer "outro motivo reprovável", cabendo aqui a chamada interpretação analógica, que tem lugar quando a lei diz menos do que queria dizer, mas permite o preenchimento de suas lacunas expressamente. Com efeito, no "Dicionário de Sinônimos Online" - https://www.sinonimos.com.br/acinte, existem trinta e nove sinônimos de "acinte" para quatro sentidos da palavra em tela, seguindo em negrito aqueles que encontram correspondência do no caso em tela, Vejamos: "Ação que visa ofender ou aborrecer alguém: 1 ofensa, insulto, afronta, desaforo, agravo, ultraje, deboche, provocação, agressão, maldade, malícia, incitação, desfeita, judiaria. Obstinação em fazer algo: 2 obstinação, teima, teimosia, pirraça, afinco, turra, cisma, intenção, propósito. De forma intencional: 3 intencionalmente, intencionadamente, de propósito, propositadamente, deliberadamente, premeditadamente, propositalmente, pensadamente, refletidamente, adrede. Com maldade: 4 maldosamente, ofensivamente, maliciosamente, perversamente, acintosamente, acintemente." Assim sendo, é incontroverso que, pelo mesmo, em três dos quatro sentidos da elementar "acinte", o fato encontra adequação típica no modelo contravencional em testilha, emergindo o dolo da própria conduta. Também peço todas as vênias à combativa defesa apara dizer que não tenho como acolher a aplicação do Princípio da Insignificância no caso ora em análise. Como bem salientado pelo MP, a fls. 86, "(...) o bem tutelado é a paz social, sendo certo que a conduta praticada pela apelante, além de perturbar seu companheiro, perturbou a coletividade, colocando em risco a saúde física e mental dos ouvintes, realçando a importância da intervenção penal diante da nocividade ao meio social." Com efeito, a doutrina firmou o entendimento no sentido de que o Princípio da Insignificância é na palavra do Excelso Supremo Tribunal Federal, expressão do caráter subsidiário do Direito Penal, e requisita, para sua aplicação, a presença de certas circunstâncias objetivas, como: a) a mínima ofensividade da conduta do agente; b) a nenhuma periculosidade social da ação; c) o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada. Ora, nenhum dos requisitos acima está presente. Quanto ao primeiro, é evidente que o próprio legislador já se preocupou e punir tal conduta como "crime anão", e tanto é que a tipificou como contravenção; quanto ao segundo, também se faz ausente, eis que apesar de não se tratar de conduta praticada mediante violência ou grave ameaça à pessoa, não se pode admitir que alguém que aja reiteradamente para tirar o sossego do outrem, seja por que motivo for, e o faça sem nenhuma periculosidade social, principalmente se considerarmos as potenciais e graves consequências destes atos, até mesmo contra o próprio autor dos mesmos, que pode vir a ser alvo de reação violenta por parte da vítima de sua conduta anterior; no concernente ao eventual reduzido grau de reprovabilidade do comportamento, é evidente que tal somente poderia ter sido admitido se estivéssemos diante de fato isolado e sem maiores consequências, o que não é o caso dos autos, e, por fim, não há falar em inexpressividade da lesão causada, exatamente porque atinge um bem jurídico coletivo. Correto, portanto, o juízo de reprovação. Todavia, a sentença merece pequeno decote no tocante à pena. Com efeito, a pena base foi fixada acima de seu mínimo, com base, tão somente, nos "maus antecedentes" da ré. Ocorre que a FAC de fls. 45/46 indica que a ré só possui uma anotação, que diz respeito a um RO de lesões corporais, que foi arquivado, o qual, por isso, não ser considerado como mau antecedente. Sendo assim, como a ré é primária e sem antecedentes, e a vedação da "Reformatio in Pejus" impede o reconhecimento nesta Instância Recursal de outra circunstância judicial a fim de justificar a elevação da pena base, reduzo-a ao seu mínimo legal, ou seja, 15 (quinze dias de prisão simples), que substituo pela multa, no total de dez dias multa, no valor mínimo legal, na forma do art. 60, § 2º, do CP. Por força do exposto, voto no sentido de conhecer do recurso defensivo e dar-lhe parcial provimento para diminuir a pena base para quinze dias de prisão simples e substituí-la pela pena de multa, nos montante e valor acima consignados, mantendo-se, no mais, a r. sentença atacada por seus próprios fundamentos. Rio de Janeiro, 31 de janeiro de 2020 ANDRÉ RICARDO DE FRANCISCIS RAMOS Juiz de Direito Relator
APELAÇÃO CRIMINAL 0004910-65.2015.8.19.0026
CAPITAL 1a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CRIMINAIS
Juiz(a) ANDRE RICARDO DE FRANCISCIS RAMOS - Julg: 04/02/2020
Ementa número 4
CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA
VERBAS TRABALHISTAS
VÍNCULO ADMINISTRATIVO
EXCLUSAO DO F.G.T.S.
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO SEGUNDA TURMA RECURSAL DE FAZENDA PÚBLICA PROCESSO N°: 0001232-35.2018.8.19.0059 RECORRENTE: CIRLENE DOS SANTOS ANDRADE RECORRIDO: MUNICÍPIO DE SILVA JARDIM EMENTA: CONTRATO TEMPORÁRIO. PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO. REVELIA DA PARTE RÉ/RECORRIDA. VERBAS DEVIDAS: AVISO PRÉVIO; SALDO DE SALÁRIO; FÉRIAS VENCIDAS (e) PROPORCIONAIS; TERÇO CONSTITUCIONAL DE FÉRIAS; e 13º INTEGRAL E PROPORCIONAL. INDEVIDOS OS RECOLHIMENTOS DO FGTS E MULTA DOS 40% (QUARENTA POR CENTO). VALIDADE DO CONTRATO ADMINISTRATIVO DE EMPREGO TEMPORÁRIO. CONHECIMENTO E PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO INOMINADO. RELATÓRIO: Trata-se de ação pelo rito especial da Lei 12.153/09, proposta em face do Município de Silva Jardim, através da qual a parte autora afirma a parte autora que fora contratada pelo Réu no período de 17/04/2015 à 01/12/2016, mediante contrato temporário, para prestar serviço na função de Serviços Gerais, junto a Secretaria Municipal de Educação. Alega que seu vínculo com o Município seria nulo, posto que sua admissão teria se dado em ofensa aos ditames constitucionais e, portanto, faz jus a todas as verbas rescisórias presentes em uma relação jurídica "celetista". A inicial veio acompanhada com os documentos de fls. 22/42. O Ministério Público às fls. 76 manifestou desinteresse no feito. Às fls. 79, foi decretada a revelia do Réu. Sentença de fls. 92/95 julgou improcedentes os pedidos da parte autorais. Recurso Inominado da parte autora às fls. 103 e seguintes, no qual requer, em síntese, a reforma da r. sentença. Alega que os documentos juntados comprovam o direito autoral a ter a sua rescisão totalmente paga como requerida na exordial, bem como requer que o FGTS seja indenizável acrescido de multa de 20%, o que deve ser direito de todo trabalhador, ainda porque protegidos pela constituição. E ainda conforme previsão do art. 37, II e § 2, pois restou esclarecido que a reclamante prestava serviços diretamente para ao réu de forma irregular, portanto requerendo que o referido contrato seja declarado nulo de pleno direito, assim como a inconstitucionalidade da Lei infraconstitucional invocada pelo Município, declarando nulo o referido contrato. Contrarrazões do Município de Silva Jardim às fls. 132 e seguintes. Após a distribuição do recurso, os autos vieram conclusos. RELATEI DE FORMA BREVE. PASSO AO VOTO. Presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos do recurso posto em julgamento. Inicialmente, ainda que reconhecida a repercussão geral sobre a extensão de direitos dos servidores públicos efetivos a contratados temporários no RE 1.066.677/MG (tema 551 do STF), imperioso destacar que não foi determinada a suspensão dos processos em curso, nos termos do art. 1.035, § 5º, do novo CPC e que a decisão final ainda não transitou em julgado. Merece provimento o recurso no que diz respeito à condenação ao pagamento das verbas correspondentes aos direitos sociais previsto no artigo 7º da Constituição da República, considerando que o Supremo Tribunal Federal vem reconhecendo a sua extensão aos servidores contratados temporariamente, verbis: "AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITOS SOCIAIS. DÉCIMO TERCEIRO PROPORCIONAL. FÉRIAS PROPORCIONAIS. EXTENSÃO AOS CONTRATOS TEMPORÁRIOS. PRECEDENTES. AGRAVO DESPROVIDO. 1. São extensíveis aos servidores contratados temporariamente (art. 37, IX, CF) os direitos sociais previstos no art. 7º da Constituição da República. Precedentes. 2. Agravo regimental a que se nega provimento." (RE 775801 AgR, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, Primeira Turma, julgado em 18/11/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-257 DIVULG 01-12-2016 PUBLIC 02-12-2016). Os servidores contratados a título temporário, através do artigo 37, inciso IX da CRFB/88, traz exceção à regra do concurso público para atender necessidade de excepcional interesse da Administração. Esses servidores são contratados para exercer funções em caráter temporário, sem estarem vinculados a cargos ou empregos públicos, mediante regime jurídico especial a ser disciplinado em lei de cada unidade da federação. Nestas circunstâncias, aplica-se o disposto no art. 39, § 3º da Constituição Federal, estendendo ao servidor temporário os direitos estabelecidos no art. 7º da CRFB para o servidor de cargo efetivo. Por força dos mencionados dispositivos legais, a autora tem direito, no que lhe era aplicável, aos seguintes benefícios: a) salário mínimo; b) garantia de salário nunca inferior ao mínimo; c) 13º salário; d) remuneração do trabalho noturno, superior ao diurno; e) salário família; f) duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais; g) repouso semanal remunerado; h) remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em cinquenta por cento à do normal; i) gozo de férias anuais remuneradas com pelo menos, um terço a mais do que o salário mínimo; j) proteção do mercado de trabalho da mulher; k) redução dos riscos do trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança; l) proibição de diferença de salários de exercício de funções e de critérios de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil: Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão conselho de política de administração e remuneração de pessoal, integrado por servidores designados pelos respectivos Poderes. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) (Vide ADIN nº 2.135-4) § 3º Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998). Em razão da confissão, em virtude do estado de revelia do réu/recorrido, não há controvérsia quanto à prestação dos serviços pela autora quanto ao período apontados na inicial relativamente ao contrato (17/04/2015 a 01/12/2016), assim como que não houve o pagamento de férias vencidas, 13º's salários, bem como salários retidos, aviso prévio, férias proporcionais e 13º salário proporcional. Malgrado eventual legislação municipal eventualmente não contemplar o respectivo pagamento de adicional de férias, 13º salário integral e/ou proporcional e recolhimentos previdenciários, é certo que a Constituição da República, em seu artigo 39, § 3º c/c artigo 7º, XVII, estendeu aos servidores públicos, em sentido amplo, o direito ao recebimento respectivo destas verbas trabalhistas. Assim, por ter sido assegurado tal direito à autora pela Constituição e por não ter a parte recorrida comprovado o regular adimplemento das verbas acima mencionadas, cujo ônus processual lhe impunha pelo artigo 373, II do Código de Processo Civil, forçoso reconhecer o direito da autora No mesmo sentido vem decidindo este E. Tribunal de Justiça, destacando-se os seguintes julgados: "APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. MUNICIPIO DE RIO BONITO. CONTRATO TEMPORARIO PARA O CARGO DE AGENTE COMUNITÁRIO. INDENIZAÇÃO POR FÉRIAS VENCIDAS E NÃO USUFRUÍDAS, TERÇO CONSTITUCIONAL. Sentença de procedência parcial do pleito autoral para condenar o Município a pagar a autora férias acrescidas de abono de 1/3 pelo o período reclamado. Recurso exclusivo da parte ré. Contratação de servidor temporário que possui natureza administrativa. Férias e décimo terceiros assegurados aos servidores pelo artigo 39, § 3º, da CRFB. Entendimento do STF no sentido de ser extensível ao contratado temporariamente os direitos garantidos aos demais servidores. Precedentes desta Corte. Sentença mantida. DESPROVIMENTO DO RECURSO." (0005118-57.2013.8.19.0046 - APELAÇÃO CÍVEL - REL. SÔNIA DE FÁTIMA DIAS - Julgamento: 31/10/2018 - VIGÉSIMA TERCEIRA CÂMARA CÍVEL). "APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO ADMINISTRATIVO. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. AÇÃO DE COBRANÇA COM VISTA À OBTENÇÃO DE VERBAS DECORRENTES DA RESCISÃO DE CONTRATO TEMPORÁRIO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO FIRMADO ENTRE ESTE O MUNICÍPIO DE RIO BONITO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA, DETERMINANDO AO RÉU O PAGAMENTO DAS FÉRIAS PROPORCIONAIS, ACRESCIDAS DO TERÇO CONSTITUCIONAL, REJEITANDO, CONTUDO, O PLEITO DE PAGAMENTO DE FGTS. CONTRATO TEMPORÁRIO QUE OSTENTA NATUREZA JURÍDICO-ADMINISTRATIVA. PAGAMENTO DAS FÉRIAS PROPORCIONAIS QUE SE AFIGURA DEVIDO EM RAZÃO DE SE TRATAR DE DIREITO CONSTITUCIONALMENTE ASSEGURADO AO TRABALHADOR, MESMO SE TRATANDO DE SERVIDOR CONTRATADO POR TEMPO DETERMINADO. INCABÍVEL O PAGAMENTO DO FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA FIXADOS DE FORMA CORRETA. NEGATIVA DE PROVIMENTO AOS RECURSOS." (0004564-25.2013.8.19.0046 - APELAÇÃO CÍVEL - REL. DES. MARIO GUIMARÃES NETO - Julgamento: 23/10/2018 - DÉCIMA SEGUNDA CÂMARA CÍVEL). Quanto ao FGTS e ao pedido de declaração de nulidade do contrato não se sustenta, eis que não se verifica um mínimo de evidência, diante dos documentos dos autos que tenha havido prorrogação fraudulenta do contrato temporário, sem que se tenha observado qualquer solução de continuidade. Desta forma, não há como se reconhecer a nulidade do vínculo de emprego administrativo de forma a se reconhecer o direito ao recebimento do FGTS. Neste sentido, cita jurisprudência do E. STJ: "REsp 1766071 / CE RECURSO ESPECIAL 2018/0209271-5. Relator(a) Ministro HERMAN BENJAMIN (1132). Órgão Julgador: T2 - SEGUNDA TURMA. Data do Julgamento: 04/10/2018. Data da Publicação/Fonte: DJe 16/11/2018. Ementa. PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. CONTRATO TEMPORÁRIO. RELAÇÃO JURÍDICO-ADMINISTRATIVA. FGTS INDEVIDO. 1. Trata-se de questão referente ao cabimento do depósito do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS relativo ao período em que o recorrido prestou serviços sob o regime de contratação temporária, insculpido no art. 37, IX, da Constituição Federal. 2. Esclareça-se que o caso não trata de servidor público que teve sua investidura em cargo ou emprego público anulado, mas sim de trabalhador contratado a título precário cujo contrato de trabalho foi prorrogado, o que não é suficiente para transmudar a natureza do vínculo administrativo em trabalhista. 3. A jurisprudência do STJ está consolidada no sentido de que o trabalhador temporário mantém relação jurídico-administrativa com o ente contratante, e, dessa forma, a ele não se aplica a regra do art. 19-A da Lei 8.036/1990, relativa às verbas do FGTS. Nesse sentido: AgRg no AREsp 483.585/PE, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 5.5.2014; AgRg no AREsp 348.966/MS, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 25.2.2014; REsp 1.399.207/MG, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 24.10.2013; AgRg no AREsp 66.285/MG, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 21.2.2013. 4. Recurso Especial não provido." Pelo exposto, voto pelo CONHECIMENTO DO RECURSO e pelo seu PROVIMENTO PARCIAL para condenar o réu/recorrido ao pagamento do valor de R$ 5.773,26 (cinco mil, setecentos e setenta e três reais e vinte e seis centavos) relativo às seguintes verbas: férias vencidas e proporcionais, ambas acrescidas do terço constitucional; saldo de 17 (dezessete) dias de salário do mês de dezembro de 2016, 13º salários e 13º salários proporcionais; aviso prévio - acrescidos de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês de forma simples a partir da citação e correção monetária na forma do enunciado 36 do Aviso Conjunto COJES nº 36 nº 15/2017 a partir desta decisão. Sem custas e/ou honorários de advogado ante ao provimento parcial do recurso. Rio de Janeiro, 20 de agosto de 2020. DANIELA BANDEIRA DE FREITAS Juíza Relatora
RECURSO INOMINADO 0001232-35.2018.8.19.0059
Segunda Turma Recursal Fazendária
Juiz(a) DANIELA BANDEIRA DE FREITAS - Julg: 31/08/2020
Ementa número 5
PLANO DE SAÚDE
IMPORTAÇÃO DE PRODUTO DERIVADO DE CANNABIS
USO INDIVIDUAL
PERMITIDO
Estado do Rio de Janeiro Poder Judiciário 4ª Turma Recursal Cível Recurso Inominado Processo n°: 0034078-48.2019.8.19.0002 Recorrente: Central Nacional Unimed - Cooperativa Central Recorrido: Eliane Nemer Saud Volpato Freire Relator: Juiz Fábio Costa Soares PLANO DE SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO IMPORTADO SEM REGISTRO NA ANVISA. TESE REPETITIVA 990 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. INAPLICABILIDADE AO CASO CONCRETO. DISTINÇÃO. IMPORTAÇÃO DE PRODUTO DERIVADO DE CANNABIS PARA USO PRÓPRIO PARA TRATAMENTO DE SAÚDE REGULAMENTADA E AUTORIZADA EXPRESSAMENTE PELA ANVISA (RDC 335, DE 24 DE JANEIRO DE 2020). NORMA DA ANVISA DISPONDO SOBRE PROCEDIMENTOS PARA A CONCESSÃO DA AUTORIZAÇÃO SANITÁRIA PARA A FABRICAÇÃO E A IMPORTAÇÃO E ESTABELECENDO REQUISITOS PARA A COMERCIALIZAÇÃO, PRESCRIÇÃO, A DISPENSAÇÃO, O MONITORAMENTO E A FISCALIZAÇÃO DE PRODUTOS DE CANNABIS PARA FINS MEDICINAIS (RDC 327, DE 09 DE DEZEMBRO DE 2019). AUTORIZAÇÃO DA ANVISA PARA O REGISTRO E A PRODUÇÃO DE MEDICAMENTO À BASE DE CANABIDIOL CONCEDIDO A EMPRESA ESPECÍFICA (RESOLUÇÃO RE Nº 1.186, DE 20 DE ABRIL DE 2020). AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO ARTIGO 10, INCISOS I, V, VI e IX DA LEI NO 9.656/98. RECUSA DA OPERADORA QUE VIOLA O DISPOSTO NOS ARTIGOS 39, V E 51, IV DO CDC. OBRIGATORIEDADE DO FORNECIMENTO. SENTENÇA DETERMINANDO O FORNECIMENTO E ARBITRANDO DANO MORAL PELA RECUSA. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RECURSO NÃO PROVIDO. VOTO Trata-se de recurso inominado interposto contra sentença que condenou a parte recorrente na obrigação de fornecer à parte recorrida, portadora de esclerose lateral amiotrófica - ELA, o medicamento HEMPFLEX 6000 - 4ML - CANABIDIOL e compensação por danos morais no valor de R$5.000,00. A recorrente sustenta que, por se tratar de medicamento a ser importado, sem registro na ANVISA e ter natureza experimental, inexiste obrigatoriedade do seu fornecimento, na forma da tese 990 fixada pelo egrégio Superior Tribunal de Justiça no julgamento de recurso especial repetitivo. Entretanto, o recurso não merece provimento. 1.A TESE 990 FIXADA PELO EGRÉGIO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E SEUS FUNDAMENTOS (HOLDING, OU RATIO DECIDENDI). O Superior Tribunal de Justiça, em julgamento de recurso especial pela sistemática dos recursos repetitivos, firmou a tese repetitiva 990: "as operadoras de plano de saúde não estão obrigadas a fornecer medicamento não registrado pela ANVISA". A tese foi firmada no julgamento do REsp 1.712.163/SP (Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 08/11/2018, DJe 26/11/2018) e do REsp 1.726.563/SP, transcrevendo-se a ementa deste segundo julgado: "RECURSO ESPECIAL. RITO DOS RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS. PLANO DE SAÚDE. CONTROVÉRSIA ACERCA DA OBRIGATORIEDADE DE FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO NÃO REGISTRADO PELA ANVISA. 1. Para efeitos do art. 1.040 do NCPC: 1.1. As operadoras de plano de saúde não estão obrigadas a fornecer medicamento não registrado pela ANVISA. 2. Aplicação ao caso concreto: 2.1. Não há ofensa ao art. 535 do CPC/73 quando o Tribunal de origem enfrenta todas as questões postas, não havendo no acórdão recorrido omissão, contradição ou obscuridade. 2.2. É legítima a recusa da operadora de plano de saúde em custear medicamento importado, não nacionalizado, sem o devido registro pela ANVISA, em atenção ao disposto no art. 10, V, da Lei nº 9.656/98, sob pena de afronta aos arts. 66 da Lei nº 6.360/76 e 10, V, da Lei nº 6.437/76. Incidência da Recomendação nº 31/2010 do CNJ e dos Enunciados nº 6 e 26, ambos da I Jornada de Direito da Saúde, respectivamente, A determinação judicial de fornecimento de fármacos deve evitar os medicamentos ainda não registrados na Anvisa, ou em fase experimental, ressalvadas as exceções expressamente previstas em lei; e, É lícita a exclusão de cobertura de produto, tecnologia e medicamento importado não nacionalizado, bem como tratamento clínico ou cirúrgico experimental. 2.3. Porém, após o registro pela ANVISA, a operadora de plano de saúde não pode recusar o custeio do tratamento com o fármaco indicado pelo médico responsável pelo beneficiário. 3. Recurso especial parcialmente provido. Acórdão sujeito ao regime do art. 1.040 do NCPC. (REsp 1726563/SP, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 08/11/2018, REPDJe 03/12/2018, DJe 26/11/2018)". No voto do e. Min. Relator do REsp 1.726.563/SP, destaca-se o seguinte fundamento: "Conforme a fundamentação acima destacada, a operadora de plano de saúde está, em princípio, obrigada ao fornecimento de tratamento médico a que se comprometeu por contrato, razão pela qual deve fornecer os medicamentos prescritos pelo médico assistente, necessários à recuperação da saúde do beneficiário. (...) essa obrigação não se impõe na hipótese em que o medicamento recomendado seja de importação e comercialização vetada pelos órgãos governamentais, porque o Judiciário não pode impor que a operadora do plano de saúde realize ato tipificado como infração de natureza sanitária, prevista no art. 66 da Lei nº 6.360/76, e criminal também, prevista na norma do art. 273 do CP" (página 36 do voto do e. Min. Rel. no REsp1726563/SP). A impossibilidade de obrigar o plano de saúde a praticar ato que tipifique infração sanitária (artigo 66 da lei 6.360/76 e artigo 10, V, da Lei nº 6.437/76) e infração penal (artigo 273, parágrafo 1º- B do Código Penal), assim como a inexistência de cobertura para medicamentos importados não nacionalizados e tratamentos experimentais constituem fundamentos (holding, ou ratio decidendi) da tese 990, que definiu a impossibilidade de obrigação do plano de saúde fornecer medicamento não registrado na ANVISA. Estes fundamentos foram destacados em Acórdãos posteriores daquela e. Corte Superior sobre o tema, assim ementados: RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE E PROCESSUAL CIVIL. PREQUESTIONAMENTO. IMPRESCINDIBILIDADE. INOVAÇÃO, EM SEDE DE AGRAVO INTERNO. INVIABILIDADE. IMPOSIÇÃO DE FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO SEM REGISTRO NA ANVISA. ILEGALIDADE. 1. "É legítima a recusa da operadora de plano de saúde em custear medicamento importado, não nacionalizado, sem o devido registro pela ANVISA, em atenção ao disposto no art. 10, V, da Lei nº 9.656/98, sob pena de afronta aos arts. 66 da Lei nº 6.360/76 e 10, V, da Lei nº 6.437/76" (REsp 1726563/SP, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 08/11/2018, REPDJe 03/12/2018, DJe 26/11/2018). 2. Com efeito, o art. 10, I, V, IX, da Lei n. 9.656/1998 testilhando com as súmulas locais invocadas, expressamente exclui da relação contratual a cobertura de tratamento clínico ou cirúrgico experimental, fornecimento de medicamentos importados não nacionalizados e tratamentos não reconhecidos pelas autoridades competentes (no caso, a Anvisa). 3. Agravo interno não provido. (AgInt no REsp 1693941/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 03/09/2019, DJe 10/09/2019). "AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. MEDICAMENTO IMPORTADO SEM REGISTRO NA ANVISA. AUSÊNCIA DE OBRIGATORIEDADE DE FORNECIMENTO. ENTENDIMENTO FIRMADO SOB O RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. O atual entendimento desta Corte Superior, consolidado sob a sistemática dos recursos repetitivos, orienta no sentido da inexistência de dever legal da empresa de plano de saúde em proceder ao fornecimento de medicamento importado sem registro na Anvisa, sob pena de tal prática ser tipificada como infração de natureza sanitária, conforme o art. 66 da Lei 6.360/76 (REsp 1.712.163/SP e REsp 1.726.563/SP, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, SEGUNDA SEÇÃO, julgados em 08/11/2018, DJe de 26/11/2018). 2. Agravo interno não provido." (AgInt nos EDcl no AREsp 845.302/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 29/10/2019, DJe 19/11/2019). A partir do exame do REsp 1.726.563/SP e do REsp 1.712.163/SP, identificam-se os fundamentos da tese repetitiva 990, que desobriga as operadoras de planos de saúde a fornecer medicamento sem registro na ANVISA: a) a impossibilidade de obrigar o plano de saúde a praticar ato que tipifique infração sanitária (artigo 66 da lei 6.360/76 e artigo 10, V, da Lei nº 6.437/76) e infração penal (artigo 273, parágrafo 1º- B do Código Penal); b) a ausência de inclusão no plano-referência de assistência à saúde da obrigação de fornecer medicamentos importados não nacionalizados e tratamentos em fase experimental (artigo 10, incisos I, V, VI e IX da lei 9.656/98). 2-FUNDAMENTOS DA INAPLICABILIDADE DA TESE 990 FIXADA PELO EG. STJ NO JULGAMENTO DO RESP 1726563/SP E DO RESP 1712163/SP AO CASO CONCRETO 2.1-DISTINÇÃO Nada obstante as características peculiares do sistema de precedentes brasileiro, fortalecido com as normas do Código de Processo Civil de 2015, assim como a necessária distinção entre precedentes e técnicas de solução de litígios de massa, nada impede que o recurso especial repetitivo utilizado como paradigma para definição da tese a ser aplicada com efeito vinculativo, seja considerado um precedente. E, através do exame dos fundamentos (holding, ou ratio decidendi) utilizados para definição da tese, se descortine o âmbito da sua incidência, ou da sua inaplicabilidade a determinado caso concreto, considerando que "o significado de um precedente deve ser buscado nas razões pelas quais se decidiu de certa maneira, ou nas razões que levaram à fixação do dispositivo" (MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes Obrigatórios. 5ª. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p.162). O objetivo dos precedentes, ou dos padrões decisórios, ainda que formados em procedimentos destinados à solução de litígios de massa e demandas repetitivas, é conferir o mesmo tratamento jurídico a situações de fato iguais, ou semelhantes e sujeitas à disciplina da mesma norma jurídica, possibilitando a estabilidade, a integridade e a coerência da jurisprudência, dever imposto aos tribunais pelo artigo 926 do Código de Processo Civil. A função do recurso especial repetitivo julgado pelo Superior Tribunal de Justiça não é apenas resolver de maneira uniforme e com maior celeridade os múltiplos recursos sobre idêntica questão de direito, mas também orientar a interpretação e aplicação da lei para casos futuros, a partir dos seus fundamentos, conforme a sua competência constitucional. Assim, ao examinar a função e o fundamento do recurso repetitivo, Marinoni destaca: "Não há porque pensar que esse modelo sirva apenas para otimizar o trabalho da Corte e dar agilidade ao julgamento dos casos. O objetivo de garantir a coerência do direito e a igualdade está presente quando se tem em conta que o recurso repetitivo almeja evitar que os recursos especiais recebam decisões diferentes. (...) o recurso especial é instrumento que tem a função de abrir a oportunidade para a Corte Suprema outorgar sentido ao direito, ou seja, para formar precedentes" (MARINONI, Luiz Guilherme. O STJ enquanto corte de precedentes. Recompreensão do sistema processual da corte suprema. 3ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017, p.219). Neste contexto, sem prejuízo da sua função diante da litigância de massa representada pela multiplicidade de recursos sobre idêntica questão de direito (CPC, artigo 1036), inserindo-se o recurso especial repetitivo entre os instrumentos que possibilitam a formação de precedentes e cuja tese tem efeito vinculativo (Cf. CPC, artigos 927, III, 1039, 1040 e 1041), é necessário não apenas aplicar a tese às situações de fato idênticas, ou semelhantes, mas também não aplicá-la àquelas situações de fato que se distinguem daquelas consideradas pela Corte no momento da fixação da tese e elaboração do precedente, o que em verdade fortalece a tese reveladora de padrão decisório no precedente. E a negativa de aplicação da tese em decisão fundamentada (CPC, artigo 489, parágrafo 1º, VI) não infirma a autoridade do Tribunal Superior, mas fortalece o sistema de precedentes. Ao destacar a necessidade de tratar os casos semelhantes do mesmo modo, Câmara afirma: "Daí resulta a importância de, diante de um caso concreto ao qual podem ser aplicados os fundamentos determinantes de um padrão decisório anteriormente estabelecido, o juiz ou o tribunal verificar se as circunstâncias que levaram à formação daquele padrão decisório estão ou não presentes neste novo processo. Caso não esteja, torna-se imperioso estabelecer-se a distinção entre os casos e, a partir daí, negar a aplicação ao precedente (ou enunciado de súmula). A distinção entre casos, portanto, não é uma forma de se deixar de aplicar o padrão decisório, mas - ao contrário - uma forma de respeitá-lo, estabelecendo com precisão em que casos seus fundamentos determinantes devem incidir (CÂMARA, Alexandre Freitas. Levando os padrões decisórios a sério. Formação e aplicação de precedentes e enunciados de súmula. São Paulo: Atlas, 2018, pp.289/290). Portanto, a identificação da ratio decidendi, ou da holding do precedente, como suas razões de decidir, ou fundamentos determinantes, é de suma importância não apenas para a sua aplicação aos casos semelhantes, como para o seu afastamento dos casos diferentes, como é feito no sistema do common law: "O direito costumeiro trabalha, assim, com uma metodologia de estudo de precedentes a partir dos quais se extrai a razão de decidir que estará norteando os casos futuros, a partir de elementos que foram considerados essenciais para a tomada de decisão condutora. Por sua vez, se o futuro caso envolver outros elementos essenciais peculiares, a corte deverá efetuar todo um trabalho de argumentação, no sentido de demonstrar que o novo caso não se enquadra dentro das características do precedente "a" ou "b" e que, portanto, merecerá a construção e raciocínio diverso ("c"), distinto do aplicado anteriormente, técnica essa denominada de distinguishing (MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas: sistematização, análise, e interpretação do novo instituto processual. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p.79). Nesta linha, considerando as razões de decidir do REsp 1726563/SP e do REsp 1712163/SP, que geraram a tese repetitiva 990 e foram identificadas anteriormente, não é possível acolher a pretensão da recorrente na sua aplicação ao caso concreto. A ANVISA autoriza a importação de produto derivado de Cannabis, como o canabidiol, através da Resolução da Diretoria Colegiada - RDC 335, de 24 de janeiro de 2020, que ampliou a disciplina da matéria objeto de Resoluções anteriores (RDC 17/2015, RDC 128/2016 e RDC 306/2019), dispondo: Art. 3º Fica permitida a importação, por pessoa física, para uso próprio, mediante prescrição de profissional legalmente habilitado para tratamento de saúde, de Produto derivado de Cannabis. § 1º A importação de que trata o caput deste artigo também pode ser realizada pelo responsável legal do paciente ou por seu procurador legalmente constituído. § 2º A importação do produto poderá ainda ser intermediada por entidade hospitalar, unidade governamental ligada à área da saúde, operadora de plano de saúde para o atendimento exclusivo e direcionado ao paciente previamente cadastrado na Anvisa, de acordo com esta Resolução. O parágrafo 2º do artigo 3º da RDC 335/2020 da ANVISA expressamente autoriza a empresa que administra o plano de saúde a importar produto derivado de Cannabis, para atendimento exclusivo e direcionado ao paciente previamente cadastrado na ANVISA, de acordo com a referida Resolução. É certo que a norma não obriga a importação pela empresa, mas reveste a sua conduta de licitude em caso de importação segundo as suas normas. Ademais, a ANVISA editou a RDC 327, de 09 de dezembro de 2019 (dispõe sobre os procedimentos para a concessão da Autorização Sanitária para a fabricação e a importação, bem como estabelece requisitos para a comercialização, prescrição, a dispensação, o monitoramento e a fiscalização de produtos de Cannabis para fins medicinais, e dá outras providências) e autorizou o registro e a produção de medicamento à base de canabidiol, por meio da Resolução RE nº 1.186, de 20 de abril de 2020, publicada no Diário Oficial da União em 22 de abril de 2020. Portanto, trata-se de situação de fato diversa daquela que gerou a tese 990 a partir do REsp 1726563/SP e do REsp 1712163/SP, haja vista que foi apontado como fundamento da tese a impossibilidade de obrigar o plano de saúde a praticar ato ilícito, que tipifique infração sanitária (artigo 66 da lei 6.360/76 e artigo 10, V, da Lei nº 6.437/76) e infração penal (artigo 273, parágrafo 1º- B do Código Penal). Assim a operadora do plano de saúde não incorrerá em infração administrativa, ou penal, fornecendo o medicamento com observância das normas da RDC 335/2020 da ANVISA, configurando situação de fato diversa daquela que fundamentou a tese repetitiva 990. Tratando-se de produto derivado da Cannabis para uso individual para tratamento de saúde, a importação pelo plano de saúde é permitida pela ANVISA na RDC 335/2020 e impede a configuração do ilícito administrativo e penal. A tese repetitiva 990 não se destina a regular obrigação imposta à operadora do plano de saúde que não configure ato ilícito, mas a proibir que se imponha à empresa, por decisão judicial de instâncias inferiores, a prática de ato que configure ato ilícito. Finalmente, destaca-se a seguinte decisão monocrática, proferida pelo e. Min. Relator do STJ após a definição da tese repetitiva 990: "Em detida análise dos autos, observa-se que a matéria relativa à obrigação da operadora do plano de saúde a fornecer o produto à base de "canabidiol", diante da autorização expressa de sua importação pela ANVISA, merece um exame mais aprofundado pelo colegiado da Terceira Turma desta Corte Superior. Diante do exposto, reconsidera-se a decisão do Presidente desta Corte de fls. 785-786 (e-STJ), visto que houve impugnação a todos os fundamentos da decisão que inadmitiu o recurso especial. Pelas razões ora expendidas e, por entender que a matéria merece melhor exame, dou provimento ao agravo para determinar a sua reautuação como recurso especial, nos termos do art. 34, inciso XVI, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça. Após, voltem-me conclusos os autos. Publique-se. Intimem-se. Brasília, 18 de fevereiro de 2020." AgInt no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.598.409 - RJ (2019/0300916-0). RELATOR: MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA. Portanto, a referida decisão demonstra que o caso concreto pode contemplar a distinção apontada e, s.m.j., afastar a incidência da tese 990, por se tratar de medicamento com importação expressamente autorizada pela ANVISA para uso individual para tratamento de saúde. 2.2-AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO ARTIGO 10, INCISO V DA LEI 9.656/98. A lei 9.656/98 não incluiu no plano-referência o fornecimento de medicamentos importados não nacionalizados (artigo 10, inciso V). No julgamento do EAREsp 988.070/SP, o Eg. Superior Tribunal de Justiça decidiu: "EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PLANO DE SAÚDE. MEDICAMENTO IMPORTADO. ANVISA. AUSÊNCIA DE REGISTRO. OBRIGATORIEDADE DE CUSTEIO. AFASTAMENTO. INFRAÇÃO SANITÁRIA. NORMAS PROIBITIVAS DO SETOR. CDC. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA. LICENÇA POSTERIOR. DOENÇA COBERTA. TRATAMENTO IMPRESCINDÍVEL À RECUPERAÇÃO DO PACIENTE. ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA DEVIDA. 1. A questão controvertida na presente via recursal consiste em definir se o plano de saúde deve arcar com os custos de medicamento importado sem registro na ANVISA, essencial para o êxito de tratamento oncológico (no caso, o Revlimid, para tratar mieloma múltiplo). 2. Estão excluídos das exigências mínimas de cobertura assistencial a ser oferecida pelas operadoras de plano de saúde os procedimentos clínicos experimentais e o fornecimento de medicamentos importados não nacionalizados (art. 10, I e V, da Lei nº 9.656/1998). Incidência da Recomendação nº 31/2010 do CNJ e dos Enunciados nºs 6 e 26 da I Jornada de Direito da Saúde. 3. Nos termos de normativos da ANS, medicamento importado não nacionalizado é aquele produzido fora do território nacional e sem registro vigente na ANVISA. Por seu turno, o tratamento que emprega fármaco não registrado/não regularizado no país pode ser considerado de índole experimental. 4. A exclusão da assistência farmacêutica para o medicamento importado sem registro na ANVISA também encontra fundamento nas normas de controle sanitário. De fato, a importação de medicamentos e outras drogas, para fins industriais ou comerciais, sem a prévia e expressa manifestação favorável do Ministério da Saúde constitui tanto infração de natureza sanitária (arts. 10, 12 e 66 da Lei nº 6.360/1976 e 10, IV, da Lei nº 6.437/1977) quanto infração penal (art. 273, § 1º-B, I, do Código Penal), não podendo a operadora de plano de saúde ser obrigada a custeá-los em afronta à lei. Precedentes. 5. As normas do CDC aplicam-se apenas subsidiariamente nos planos de saúde, conforme previsão do art. 35-G da Lei nº 9.656/1998. De qualquer maneira, em casos de incompatibilidade de normas, pelos critérios da especialidade e da cronologia, há evidente prevalência da lei especial nova. 6. Após o ato registral, a operadora de plano de saúde não pode recusar o tratamento com o fármaco indicado pelo médico assistente. Com efeito, a exclusão da cobertura do produto farmacológico nacionalizado e indicado pelo médico assistente, de uso ambulatorial ou hospitalar e sem substituto eficaz, para o tratamento da enfermidade significa negar a própria essência do tratamento, desvirtuando a finalidade do contrato de assistência à saúde (arts. 35-F da Lei nº 9.656/1998 e 7º, parágrafo único, e 17 da RN nº 387/2015 da ANS). Precedentes. 7. Embargos de divergência rejeitados." (EAREsp 988.070/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 08/11/2018, DJe 14/11/2018). A ausência de fornecimento de medicamento importado não nacionalizado, sem registro na ANVISA, na forma do inciso V do artigo 10 da lei 9.656/98, tem a finalidade de proteger o usuário do plano dos efeitos de medicamentos não testados e que poderiam ser prejudiciais à saúde do usuário, sem estar comprovada a sua eficácia através de testes apresentados para fins de registro do medicamento perante o órgão regulador nacional. Entretanto, a partir do registro na ANVISA, o medicamento importado e sem similar nacional passa a ser de fornecimento obrigatório pela operadora do plano de saúde, quando prescrito pelo médico assistente para o tratamento de enfermidade coberta pelo plano, sob pena de configurar negativa de cobertura contratada pelo usuário, independentemente da sua previsão específica no contrato. Neste contexto, o conteúdo da norma enunciada no inciso V do artigo 10 da lei 9.656/98, que impede que o plano de saúde seja obrigado a fornecer medicamento importado não nacionalizado, não consiste na ausência do registro, mas no fato de que a ausência de registro na ANVISA indica a impossibilidade de se administrar ao usuário medicamento sem eficácia positiva comprovada e com risco de efeitos colaterais. Mas, quando a ANVISA autoriza expressamente a importação do medicamento derivado de Cannabis (RDC 335/2020), como o canabidiol, além de autorizar a fabricação e registro de medicamento com a mesma natureza (Resolução RE nº 1.186, de 20 de abril de 2020), com relação a este medicamento não está mais identificada a norma jurídica que foi enunciada no inciso V do artigo 10 da lei 9.656/98 para preservação da saúde do usuário do plano e paciente. Trata-se de situação de fato relevante, mormente porque não se pode desconsiderar que o medicamento também tenha passado por testes, feito o registro no país de origem e que o procedimento de registro do medicamento na ANVISA requer tempo até a sua conclusão. Assim, em época marcada pela difusão ampla do conhecimento científico, não é possível supor que a ANVISA tenha autorizado expressamente a importação de medicamentos derivados da Cannabis para uso próprio e conforme prescrição médica, sem qualquer consideração sobre a eficácia do medicamento, a partir do seu registro no país de origem. 2.3. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO ARTIGO 10, INCISOS I, VI e IX DA LEI 9.656/98. A lei 9.656/98 dispõe: Art. 10. É instituído o plano-referência de assistência à saúde, com cobertura assistencial médico-ambulatorial e hospitalar, compreendendo partos e tratamentos, realizados exclusivamente no Brasil, com padrão de enfermaria, centro de terapia intensiva, ou similar, quando necessária a internação hospitalar, das doenças listadas na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, da Organização Mundial de Saúde, respeitadas as exigências mínimas estabelecidas no art. 12 desta Lei, exceto: I-tratamento clínico ou cirúrgico experimental; VI-fornecimento de medicamentos para tratamento domiciliar, ressalvado o disposto nas alíneas 'c' do inciso I e 'g' do inciso II do art. 12; IX-tratamentos ilícitos ou antiéticos, assim definidos sob o aspecto médico, ou não reconhecidos pelas autoridades competentes; Entretanto, a exclusão de cobertura pelo plano-referência do tratamento experimental, do fornecimento de medicamentos para uso domiciliar e de tratamentos não reconhecidos pelas autoridades competentes (lei 9.656/98, artigo 10, I, VI e IX) não impede o fornecimento de medicamento e tratamento, quando a aquisição e administração do medicamento são compatíveis com as normas legais de controle sanitário e de obtenção e uso do medicamento e quando o medicamento e o tratamento são necessários para viabilizar tratamento para doença coberta pelo plano de saúde, conforme prescrito pelo médico assistente, após frustradas as formas convencionais de tratamento. O eg. Superior Tribunal de Justiça decidiu: "RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. PLANOS DE SAÚDE. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. AFASTADA. NEGATIVA DE FORNECIMENTO DE MEDICAÇÃO SOB O FUNDAMENTO DE SE TRATAR DE TRATAMENTO EXPERIMENTAL. RESOLUÇÃO NORMATIVA DA ANS. USO FORA DA BULA (OFF LABEL). INGERÊNCIA DA OPERADORA NA ATIVIDADE MÉDICA. IMPOSSIBILIDADE. CONFIGURAÇÃO DO DANO MORAL. CONCRETO AGRAVAMENTO DA AFLIÇÃO PSICOLÓGICA DA BENEFICIÁRIA DO PLANO DE SAÚDE QUE SE ENCONTRAVA COM A SAÚDE DEBILITADA POR NEOPLASIA MALIGNA. MAJORAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS. 1. Ação ajuizada em 18/05/15. Recurso especial interposto em 10/02/17 e concluso ao gabinete em 16/11/17. 2. Ação de obrigação de fazer, ajuizada devido à negativa de fornecimento da medicação Temodal para tratar neoplasia maligna do encéfalo, na qual se requer seja compelida a operadora de plano de saúde a fornecer o tratamento conforme prescrição médica. 3. O propósito recursal consiste em definir se a operadora de plano de saúde está autorizada a negar tratamento prescrito por médico, sob o fundamento de que sua utilização em favor do paciente está fora das indicações descritas na bula/manual registrado na ANVISA (uso off-label). 4. Ausentes os vícios do art. 1.022, do CPC/15, rejeitam-se os embargos de declaração. 5. O recurso especial não é a via adequada para revisão dos fatos delineados de maneira soberana pelo Tribunal de origem. Incidência da Súmula 7/STJ. 6. A Lei 9.656/98 (Lei dos Planos de Saúde) estabelece que as operadoras de plano de saúde estão autorizadas a negar tratamento clínico ou cirúrgico experimental (art. 10, I). 7. A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) editou a Resolução Normativa 338/2013, vigente ao tempo da demanda, disciplinando que consiste em tratamento experimental aquele que não possui as indicações descritas na bula/manual registrado na ANVISA (uso off-label). 8. Quem decide se a situação concreta de enfermidade do paciente está adequada ao tratamento conforme as indicações da bula/manual da ANVISA daquele específico remédio é o profissional médico. Autorizar que a operadora negue a cobertura de tratamento sob a justificativa de que a doença do paciente não está contida nas indicações da bula representa inegável ingerência na ciência médica, em odioso e inaceitável prejuízo do paciente enfermo. 9. O caráter experimental a que faz referência o art. 10, I, da Lei 9.656 diz respeito ao tratamento clínico ou cirúrgico incompatível com as normas de controle sanitário ou, ainda, aquele não reconhecido como eficaz pela comunidade científica. 10. A ingerência da operadora, além de não ter fundamento na Lei 9.656/98, consiste em ação iníqua e abusiva na relação contratual, e coloca concretamente o consumidor em desvantagem exagerada (art. 51, IV, do CDC). 11. A recorrida detectou o ressurgimento de um problema oncológico que imaginava ter superado e recebeu recomendação médica de imediato tratamento quimioterápico, com utilização do Temodal, sob pena de comprometimento de sua saúde. Esta delicada situação em que se encontrava evidencia o agravamento de sua condição de dor, de abalo psicológico e com prejuízos à saúde já debilitada, sobretudo diante de seu histórico clínico. Configurado o dano moral passível de compensação. 12. Recurso especial conhecido e não provido, com majoração dos honorários advocatícios recursais." (REsp 1721705/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 28/08/2018, DJe 06/09/2018). No REsp 1279241/SP, o eg. Superior Tribunal de Justiça decidiu que a restrição à cobertura de tratamentos experimentais prevista no inciso I do artigo 10 da lei 9.656/98 incide quando houver tratamento convencional eficaz para o segurado, não impedindo, portanto, o custeio de tratamento não convencional prescrito pelo médico assistente como necessário ao tratamento da doença, quando insuficientes os tratamentos convencionais. "RECURSO ESPECIAL. SECURITÁRIO. PLANO DE SAÚDE. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 10, I, E 12 DA LEI 9.656/98. TRATAMENTO EXPERIMENTAL. EXCLUSÃO DE COBERTURA. DESCABIMENTO. INEXISTÊNCIA DE TRATAMENTO CONVENCIONAL. INDICAÇÃO MÉDICA. INSTITUIÇÃO DE SAÚDE RECONHECIDA. RECURSO PROVIDO. 1. A Lei 9.656/98 garante aos segurados e beneficiários de seguros e planos de saúde a fruição, no mínimo, de exames, medicamentos, anestésicos, gases medicinais, transfusões e sessões de quimioterapia e radioterapia, conforme prescrição médica. Com isso, as seguradoras e operadoras são obrigadas a cobrir os referidos meios, tratamentos e serviços necessários à busca da cura ou controle de doença apresentada pelo paciente e listada na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, da Organização Mundial de Saúde. 2. A interpretação conjunta dos arts. 10 e 12 da Lei 9.656/98 conduz à compreensão de que, na hipótese de existir tratamento convencional, com perspectiva de resposta satisfatória, não pode o paciente, às custas da seguradora ou operadora de plano de saúde, optar por tratamento experimental. Por outro lado, nas situações em que os tratamentos convencionais não forem suficientes ou eficientes, fato atestado pelos médicos que acompanham o caso, existindo, no País, tratamento experimental, em instituição de reputação científica reconhecida, com indicação para a doença, a seguradora ou operadora deve arcar com os custos do tratamento, na medida em que este passa a ser o único de real interesse para o contratante, configurando o tratamento mínimo garantido pelo art. 12 da Lei. 3. Assim, a restrição contida no art. 10, I, da Lei 9.656/98 somente deve ter aplicação quando houver tratamento convencional eficaz para o segurado. 4. Divergência de fundamentação na formação da maioria. 5. Recurso especial provido." (REsp 1279241/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Rel. p/ Acórdão Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 02/10/2014, DJe 07/11/2014). Portanto, os incisos I, VI e IX do artigo 10 da lei 9.656/98 não configuram óbice ao acolhimento da pretensão da parte reclamante em obrigar o plano de saúde a custear o medicamento canabidiol, necessário ao tratamento da doença conforme prescrição do médico assistente, após esgotadas formas convencionais de tratamento. 3.AFASTADA A APLICAÇÃO DA TESE REPETITIVA 990 AO CASO CONCRETO E A TESE DE VIOLAÇÃO AO ARTIGO 10, I, V, VI e IX da LEI 9.656/98. FUNDAMENTOS DA OBRIGATORIEDADE DE FORNECIMENTO DO MEDICAMENTO DERIVADO DA CANNABIS - CANABIDIOL O fornecimento do medicamento importado com autorização da ANVISA e na forma dos atos normativos expedidos pela agência reguladora, quando prescrito como necessário para o tratamento de doença coberta pelo plano de saúde e após esgotados os meios convencionais de tratamento, não configura violação à Tese Repetitiva 990 definida pelo eg. Superior Tribunal de Justiça e não significa violação às normas dos incisos I, V, VI e IX do artigo 10 da lei 9.656/98. A ausência de previsão expressa na lei 9.656/98 para o fornecimento de medicamentos, fora das situações previstas no artigo 12, I, c (cobertura de tratamentos antineoplásicos domiciliares de uso oral, incluindo medicamentos para o controle de efeitos adversos relacionados ao tratamento e adjuvantes) e no artigo 12, II, g (cobertura para tratamentos antineoplásicos ambulatoriais e domiciliares de uso oral, procedimentos radioterápicos para tratamento de câncer e hemoterapia, na qualidade de procedimentos cuja necessidade esteja relacionada à continuidade da assistência prestada em âmbito de internação hospitalar) não impede que seja avaliada se a obrigação decorre do sistema normativo de proteção e defesa do consumidor, aplicável subsidiariamente aos contratos celebrados com as operadoras de planos de saúde (artigo 35-G, da lei 9.656/98). Tratando-se de patologia coberta pelo contrato celebrado, a negativa de fornecimento de medicamento prescrito pelo médico assistente como necessário para o tratamento, quando frustrados os meios convencionais de tratamento e cujo fornecimento e administração não implique em infrações de normas sanitárias e penais, equivale à ausência de cobertura para a doença, esvaziando o conteúdo do contrato e configurando vantagem exagerada para o fornecedor de serviços, vedada pelas normas dos artigos 39, V e 51, IV da lei 8.078/90, que proíbem a obtenção de vantagem exagerada para o fornecedor. Como decidiu o eg. Superior Tribunal de Justiça: "PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. HARMONIA ENTRE O ACÓRDÃO RECORRIDO E A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA 568/STJ. 1. Ação de obrigação de fazer cumulada com reparação por danos morais, fundada na negativa de cobertura de medicamento. 2. Ausentes os vícios do art. 1022 do CPC, rejeitam-se os embargos de declaração. 3. É abusiva a recusa da operadora do plano de saúde de arcar com a cobertura do medicamento prescrito pelo médico para o tratamento do beneficiário, sendo ele off label, de uso domiciliar, ou ainda não previsto em rol da ANS, e, portanto, experimental, quando necessário ao tratamento de enfermidade objeto de cobertura pelo contrato. Precedentes. 4. Agravo interno no recurso especial não provido." (AgInt no REsp 1849149/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 30/03/2020, DJe 01/04/2020). "AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. MEDICAMENTO IMPORTADO. AVASTIN. REGISTRO. ANVISA. OBRIGATORIEDADE DE CUSTEIO. TRATAMENTO IMPRESCINDÍVEL À RECUPERAÇÃO DO PACIENTE. RECUSA INJUSTIFICADA DE COBERTURA. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. Ação ordinária que visa a cobertura de tratamento quimioterápico com medicamento (Avastin) registrado na ANVISA desde 16/5/2005. 3. A exclusão da cobertura do produto farmacológico nacionalizado e indicado pelo médico assistente, de uso ambulatorial ou hospitalar e sem substituto eficaz para o tratamento da enfermidade, significa negar a própria essência do tratamento, desvirtuando a finalidade do contrato de assistência à saúde (arts. 35-F da Lei nº 9.656/1998 e 7º, parágrafo único, e 17 da RN nº 387/2015 da ANS). 4. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de ser abusiva a negativa de cobertura pelo plano de saúde de procedimento, tratamento, medicamento ou material considerado essencial para preservar a saúde e a vida do paciente, mesmo porque a opção da técnica a ser utilizada cabe ao médico especialista. 5. Agravo interno não provido." (AgInt no AREsp 1555404/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/02/2020, DJe 20/02/2020) AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. USO FORA DA BULA (OFF-LABEL). DANO MORAL. RECUSA INJUSTIFICADA. CONFIGURAÇÃO. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. Nas hipóteses em que há recusa injustificada de cobertura por parte da operadora do plano de saúde para tratamento do segurado, como ocorrido no presente caso, a orientação desta Corte é assente quanto à caracterização de dano moral, não se tratando apenas de mero aborrecimento. 2. Razões recursais insuficientes para a revisão do julgado. 3. Agravo interno desprovido." (AgInt no AREsp 1443939/SC, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/06/2019, DJe 25/06/2019). Na fl. 18, o laudo elaborado pelo médico assistente indica: "Paciente padece de Esclerose Lateral Amiotrófica. Doença progressiva, degenerativa e inexorável, que cursa com a depleção dos neurônios motores superiores e inferiores. Atualmente necessita de canabidiol Hemp Flex 6000 - 4ml de 12 em 12 horas - 25 frascos. Todas as tentativas para atenuação da empasticidade em membros inferiores foram tentadas (baclofeno, lioresal, toxina botulínica tipo A) sem sucesso terapêutico. Em adição, o canabidiol pode ser utilizado como droga adjuvante dos quadros de ansiedade e insônia apresentados pela mesma. CID 10: G12.2" Assim, considerando a prescrição de tratamento para doença coberta pelo plano de saúde, para paciente portadora de esclerose lateral amiotrófica, com uso do medicamento canabidiol conforme laudo médico de fl.18, a recusa no seu fornecimento configura ato ilícito, por violação das normas dos artigos 39, V e 51, IV da lei 8.078/90. No âmbito do e. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, também existem recentes julgados fixando a obrigação da operadora do plano de saúde fornecer o medicamento contendo canabidiol sob determinadas circunstâncias. Neste sentido: 0035068-38.2016.8.19.0004 - APELAÇÃO, Des(a). CINTIA SANTAREM CARDINALI - Julgamento: 12/08/2020 - VIGÉSIMA QUARTA CÂMARA CÍVEL. 0001296-81.2019.8.19.0068 - APELAÇÃO, Des(a). RICARDO RODRIGUES CARDOZO - Julgamento: 30/06/2020 - DÉCIMA QUINTA CÂMARA CÍVEL. 0020511-76.2017.8.19.0209 - APELAÇÃO, Des(a). LUIZ FERNANDO DE ANDRADE PINTO - Julgamento: 24/06/2020 - VIGÉSIMA QUINTA CÂMARA CÍVEL. 0297460-05.2017.8.19.0001 - APELAÇÃO, Des(a). CRISTINA TEREZA GAULIA - Julgamento: 02/06/2020 - QUINTA CÂMARA CÍVEL. 0023682-25.2018.8.19.0203 - APELAÇÃO, Des(a). ANDRE GUSTAVO CORREA DE ANDRADE - Julgamento: 19/05/2020 - SÉTIMA CÂMARA CÍVEL. 0008810-96.2016.8.19.0066 - APELAÇÃO, Des(a). MARIA REGINA FONSECA NOVA ALVES - Julgamento: 18/02/2020 - DÉCIMA QUINTA CÂMARA CÍVEL. 0085056-66.2018.8.19.0001 - APELAÇÃO, Des(a). PEDRO SARAIVA DE ANDRADE LEMOS - Julgamento: 11/02/2020 - DÉCIMA CÂMARA CÍVEL. 4.CONCLUSÃO. O e. Superior Tribunal de Justiça, ao fixar a tese repetitiva 990 ("as operadoras de plano de saúde não estão obrigadas a fornecer medicamento não registrado pela ANVISA), considerou como fundamentos a impossibilidade de obrigar o plano de saúde a praticar ato que tipifique infração sanitária (artigo 66 da lei 6.360/76 e artigo 10, V, da Lei nº 6.437/76) e infração penal (artigo 273, parágrafo 1º- B do Código Penal) e a ausência de inclusão no plano-referência de assistência à saúde de obrigação de fornecer medicamentos importados não nacionalizados e tratamentos experimentais (artigo 10, inciso V da lei 9.656/98), em consonância com a Recomendação nº 31/2010 do CNJ e com os enunciados 6 e 26, da I Jornada de Direito da Saúde. As normas da ANVISA que autorizam a importação dos produtos derivados da Cannabis para uso próprio para tratamento de saúde, com possibilidade de atuação da operadora de plano de saúde (RDC 335, de 24 de janeiro de 2020), que dispõem sobre os procedimentos para a concessão da Autorização Sanitária para a fabricação e a importação e estabelece requisitos para a comercialização, prescrição, a dispensação, o monitoramento e a fiscalização de produtos de Cannabis para fins medicinais (RDC 327, de 09 de dezembro de 2019) e a autorização da ANVISA para o registro e a produção de medicamento à base de canabidiol (Resolução RE nº 1.186, de 20 de abril de 2020), impedem a configuração de natureza infracional do ato de fornecimento do medicamento importado com observância das normas da ANVISA, revelando hipótese de fato distinta daquela que deu origem à tese repetitiva 990, do eg. Superior Tribunal de Justiça. A exclusão do plano-referência do fornecimento de medicamentos não nacionalizados (artigo 10, V, da lei 9.656/98) trata de hipótese diversa do caso do medicamento com importação autorizada, controlada e disciplinada pela ANVISA, agência reguladora de natureza autárquica com meios de acesso à informação sobre a eficácia dos referidos medicamentos e ao registro no país de origem, para orientar a edição dos atos normativos sobre o tema e permitir, ou proibir a sua importação. A exclusão de cobertura pelo plano-referência do tratamento experimental, do fornecimento de medicamentos para uso domiciliar e de tratamentos não reconhecidos pelas autoridades competentes (lei 9.656/98, artigo 10, I, VI e IX) não impede o fornecimento de medicamento e tratamento neste caso concreto, haja vista que: a)a aquisição e administração do medicamento são feitas com base em ato normativo emitido pela ANVISA e prescrição do médico assistente, revelando conduta lícita da operadora de plano de saúde e compatível com as normas legais de controle sanitário e de obtenção e uso do medicamento; b) o medicamento é necessário para viabilizar tratamento para doença coberta pelo plano de saúde, conforme prescrição do médico assistente; c) o medicamento foi prescrito pelo médico assistente após esgotadas as possibilidades de tratamento convencional. A recusa em fornecer medicamento necessário ao tratamento da doença coberta pelo contrato com a operadora de plano de saúde, conforme prescrição médica e após esgotados outros meios de tratamento, configura vantagem exagerada para o fornecedor por esvaziar o conteúdo do contrato, violando as normas dos artigos 39, V e 51, IV da lei 8.078/90, aplicáveis subsidiariamente na forma do artigo 35-G da lei 9.656/98. Pelo exposto, VOTO pelo conhecimento e não provimento do recurso, mantendo a sentença recorrida pelos seus fundamentos e pelas razões acima expostas. FÁBIO COSTA SOARES Juiz Relator - 4ª Turma Recursal Cível PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
RECURSO INOMINADO 0034078-48.2019.8.19.0002
CAPITAL 4a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS
Juiz(a) FABIO COSTA SOARES - Julg: 21/08/2020
Ementa número 6
PLANO DE SAÚDE
INADIMPLÊNCIA DO DEVEDOR
CANCELAMENTO
FALTA DE NOTIFICAÇÃO PRÉVIA
VIOLAÇÃO DO DEVER DE INFORMAÇÃO
INOCORRÊNCIA DE DANO MORAL
2ª TURMA RECURSAL. RECURSO Nº 0029903-66.2019.8.19.0210. RECORRENTE: CABERJ INTEGRAL SAÚDE S.A. RECORRIDO: ROSIMAR DE SOUZA RIBEIRO. VOTO: Narra a autora que, em 15/01/2019, contratou plano de saúde da recorrente (segunda ré), administrado por AMORIM ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS (primeira ré), com vigência de doze meses, cujas mensalidades venceriam no dia 20 de cada mês. Afirma que, devido a problemas financeiros, pagou em atraso as mensalidades com vencimento em junho e julho de 2019, o que resultou na suspensão do plano. Relata que, ao entrar em contato com as rés para regularizar sua situação, foi informada que deveria pagar os boletos em aberto para que o plano fosse restabelecido. Ocorre que após realizar os pagamentos foi surpreendida com a informação de que o plano havia sido cancelado, restando impossível o seu reestabelecimento. Neste contexto, ajuizou a presente pleiteando o restabelecimento do plano contratado; o cancelamento da cobrança referente às faturas dos meses em que ficou sem cobertura; a declaração de inexistência de débitos remanescentes em relação às faturas dos meses de junho e julho de 2019; bem como o pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). A primeira ré, em contestação (fls. 83/100), sustenta ser mera administradora do plano e rechaça a incidência do artigo 13 da Lei 9.656/98 a contratos coletivos por adesão. Defende, ainda, a legitimidade da suspensão e sustenta ser a autora inadimplente contumaz. O segundo réu, ora recorrente, suscitou, em sua peça de defesa (133/148), a inocorrência de falha na prestação do serviço, tampouco de ato ilícito ou danos morais e materiais passíveis de indenização. Realizada audiência de conciliação, instrução e julgamento (fls. 191/194) não foi obtido acordo entre as partes. A sentença julgou parcialmente procedentes os pedidos para: a) determinar que as rés restabeleçam o plano de saúde da autora, na forma contratada; b) declarar indevidas as cobranças enviadas nos meses de agosto e setembro de 2019, eis que, em tal período, o plano encontrava-se cancelado; c) declarar a inexistência de débitos remanescentes em relação às mensalidades de junho e julho de 2019, devendo as rés se absterem de cobrar a diferença entre os valores indicados nos boletos e os constantes das autenticações mecânicas; d) condenar as rés a pagarem à autora o valor de R$ 6.000,00 (seis mil reais) a título de danos morais. Recurso inominado pela segunda ré às fls. 207/222, reafirmando sua ilegitimidade passiva, a ausência de responsabilidade na hipótese e inocorrência de danos morais. Contrarrazões às fls. 239/250. É o breve relatório. Passo ao voto. Cinge-se a controvérsia acerca da legalidade da suspensão de contrato de plano de saúde e dos desdobramentos daí decorrentes, verificando se, na hipótese, ocorreram danos de ordem moral ou material a serem indenizados. De início, verifica-se que estamos diante de contrato de plano de saúde, em que o instrumento pactuado pelas partes prevê, em sua cláusula 21.1, a possibilidade de rescisão unilateral da avença nas hipóteses de inadimplência por prazo superior a 60 dias, cumulados ou não. Do histórico de pagamento da autora, verifica-se que o mês vencido em 20/04/19 foi pago em 20/05/19, ou seja, com trinta dias de atraso; o vencido em 20/05/19 foi pago em 10/07/19, o que denota um atraso de cinquenta e um dias e os meses vencidos em 20/06/19 e 20/07/19 foram pagos somente em 13/08/19, resultando em atraso de cinquenta e quatro e vinte e quatro dias, respectivamente. Neste contexto, tendo ocorrido o cancelamento do plano em agosto de 2019, não se observaria, a princípio, qualquer irregularidade na conduta das rés. Contudo, como bem ressaltado na sentença, exige-se, ainda, para que se opere o cancelamento do plano, o atendimento de um requisito de ordem formal, qual seja, a notificação prévia do devedor inadimplente. O próprio artigo 17 da Resolução Normativa ANS 195/2009, dispõe que: "O plano de saúde coletivo pode ser rescindido ou suspenso imotivadamente (independentemente da existência de fraude ou inadimplência), após a vigência do período de doze meses e mediante prévia notificação do usuário com antecedência mínima de sessenta dias". Ademais, trata-se de direito fundamental à saúde, sendo certo que a resolução automática por inadimplência, sem previa notificação, feriria o dever de informação, a boa-fé objetiva e o próprio fim social do contrato. Há de se ressaltar, de igual forma, que os Tribunais têm aplicado, por analogia, aos contratos de plano de saúde coletivo, o artigo 13, parágrafo único, inciso II da Lei 9.656 /98, que prevê a notificação prévia, como requisito formal inafastável para cancelamento ou suspensão no plano. Confira-se: "Plano de saúde coletivo por adesão. Cancelamento. Ausência de notificação prévia. Sentença de improcedência. Insurgência do Ministério Público sob o argumento de que a resolução automática por inadimplência em contratos de plano de saúde fere a boa-fé objetiva e o dever de informação. Direito fundamental à saúde. Expressiva finalidade social do contrato. Dever de informação e de boa-fé objetiva que devem ser observados pelas operadoras de plano de saúde. A Resolução Normativa 195 da ANS não conflita com a lei ao determinar que as condições de cancelamento dos planos coletivos devem estar previstas nos contratos. Resolução automática por inadimplência, contudo, que contraria o dever de informação, a boa-fé objetiva e o fim social do contrato. Analogia ao art. 13, parágrafo único, inciso II da Lei 9.656 /98 que prevê a notificação prévia para cancelamento do plano de saúde individual por inadimplência. Restabelecimento do serviço que se impõe. Impossibilidade de devolução de valores pagos. Falha na prestação do serviço que enseja indenização por dano moral arbitrado em R$ 10.000,00, considerando que se trata de criança em tenra idade com comprovação de necessidade de tratamento neurológico e psicológico. Sucumbência mínima. PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO. (APELAÇÃO nº 00006115620168190011; TJRJ; 08/05/2019)". O mesmo entendimento já foi explicitado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial nº 1655130. Desta forma, como no caso dos autos as rés não demonstraram a prévia notificação da consumidora, ônus que lhes incumbia, conclui-se que a rescisão se deu de forma irregular, não merecendo reparo a sentença no que tange ao restabelecimento do plano, a condenação das rés a se absterem de cobrar pelos meses em que o plano permaneceu cancelado e a declaração de inexistência de débitos remanescentes em relação às mensalidades de junho e julho de 2019. Por outro lado, no que concerne ao dano moral, entendo que o caso em análise guarda peculiaridades que merecerem atenção. Vejamos. A documentação acostada aos autos demonstra que a autora possui uma conduta reiterada de inadimplência, visto que a contratação do plano ocorreu em janeiro de 2019 e, desde abril de mesmo ano, a autora efetuou o pagamento de todas as prestações com atrasos significantes. Como já citado, o boleto de abril foi pago com trinta dias de atraso, o de maio com cinquenta e um dia de atraso, o de junho com cinquenta e quatro e o de julho com vinte e quatro dias de atraso. Outrossim, observa-se que o plano foi reativado em 02/09/19 (fls. 140) e que, durante o período aproximado de um mês em que permaneceu suspenso, não demonstrou a autora ter qualquer prejuízo de ordem moral. A autora não colaciona aos autos nenhum documento relativo ao seu quadro de saúde, tampouco comprova negativa de atendimento médico. Sendo assim, entendo não haver dano moral a ser indenizado, assistindo razão à recorrente ao requerer a improcedência deste pedido. Neste sentido: Apelação cível. Relação de consumo. Plano de saúde coletivo. Autora, funcionária pública municipal aposentada pelo Município do Rio de Janeiro. Recadastramento anual realizado a destempo. Exclusão da beneficiária do plano de saúde coletivo. Ausência de notificação prévia. Negativa de autorização para exames médicos. Parte autora alega estar adimplente. Pleito de restabelecimento do plano e de indenização por danos morais. Tutela antecipada deferida. Restabelecimento do plano de saúde. Sentença de parcial procedência para confirmar a tutela antecipada e condenar a parte ré a pagar danos morais à parte autora, no importe de R$5.000,00 (cinco mil reais). Apelações recíprocas. 1. Inicialmente, vale dizer que a ré pede a improcedência dos pedidos, mas não impugna minimamente a obrigação de fazer, que foi devidamente cumprida no curso do processo. Portanto, deve ser mantida a tutela de urgência. Controvérsia que se restringe aos danos morais. 2. Art. 17, parágrafo único, da RN nº 195/2009 da ANS. Cabimento, desde haja prévia notificação do beneficiário, o que não restou demonstrado. 3. De outro lado, a parte autora não comprovou o adimplemento da mensalidade de julho de 2018, mês anterior ao cancelamento. Possibilidade de suspensão do plano prevista no item 24.3 do contrato. Responsabilidade exclusiva da estipulante de informar os beneficiários acerca da suspensão da cobertura decorrente da falta de pagamento. Previsão do item 19.11.2 do contrato. 4. Por fim, não há comprovação de que a recusa de autorização para exames médicos tenha redundado em agravamento do quadro clínico da autora. Inexistência de conduta ilícita da parte ré. Ausência de lesão a direito da personalidade da autora. 5. Sentença que se reforma para afastar a condenação por danos morais. Sucumbência recíproca. PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DA RÉ. PREJUDICADO O RECURSO AUTORAL. (0027801-23.2018.8.19.0205 - APELAÇÃO Des(a). MARCOS ANDRE CHUT - Julgamento: 09/06/2020 - VIGÉSIMA TERCEIRA CÂMARA CÍVEL). APELAÇÃO CÍVEL. OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZATÓRIA. RELAÇÃO DE CONSUMO. PLANO DE SAÚDE COLETIVO. FALHA NO ENVIO DE BOLETOS. COBRANÇA DE FATURAS JÁ PAGAS. SUSPENSÃO POR INADIMPLEMENTO. ARTIGO 13, II, DA LEI 9.656/98, APLICÁVEL AOS PLANOS INDIVIDUAIS. RES.195/2009 DA ANS. RECUSA DE ATENDIMENTO NÃO COMPROVADA. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. 1. Ação de obrigação de fazer cumulada com indenizatória. Alegação de falha no envio de faturas com atraso e recebimento de mensagens por SMS para cobrar contas já pagas. 2. Suspensão do plano em razão de inadimplência, nos meses de outubro, novembro e dezembro de 2014. 3. Autora que justifica o inadimplemento pela ausência de recebimento dos boletos. Situação que, no entanto, não exime o consumidor de efetuar o pagamento com o qual anuiu quando celebrou o contrato. 4. Prazo para notificação, previsto no artigo 13, II, da Lei 9.656/98, que se aplica aos planos individuais. Artigo 15, da Resolução Normativa 195/2009, que determina que as condições devem ser aquelas pactuadas. 5. Ausência de prova mínima da atuação da fornecedora em desacordo com o ajustado. 6. Recusa de atendimento ao primeiro autor, que tampouco restou demonstrada. 7. A apreciação da questão trazida sob a ratio protetiva das normas consumeristas não dispensa o autor de provar minimamente o direito alegado. Inteligência da Súmula n.º 330 desta Eg. Corte Estadual. 8. Mantida a sentença de procedência parcial, por meio da qual foi acolhido, tão somente, o pleito de cancelamento do plano, mantidos o débito e rechaçada a pretensão indenizatória. 9. Desprovimento do recurso. (0000644-98.2016.8.19.0026 APELAÇÃO Des(a). GILBERTO CLÓVIS FARIAS MATOS - Julgamento: 12/05/2020 - DÉCIMA QUINTA CÂMARA CÍVEL). A manutenção do dano moral, nesta hipótese, premiaria o comportamento inadimplente da autora, que, de forma reiterada, efetua em atraso o pagamento das mensalidades. Por fim, cumpre ressaltar que a determinação de restabelecimento do plano de saúde envolve somente as prestações vencidas até setembro de 2019, eis que desprovidas do requisito formal necessário, qual seja, a notificação da consumidora. Neste sentido, esta decisão não tem o condão de impedir a suspensão ou cancelamento do plano, em caso de inadimplemento de parcelas posteriores, se atendidos a todos os requisitos legais. Ante o exposto, VOTO no sentido de conhecer e dar parcial provimento ao recurso para afastar a condenação em danos morais, mantendo, no mais, a sentença tal como lançada. Sem ônus sucumbenciais. Rio de Janeiro, 23 de julho de 2020. JULIANA ANDRADE BARICHELLO. JUÍZA RELATORA.
RECURSO INOMINADO 0029903-66.2019.8.19.0210
CAPITAL 2a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS
Juiz(a) JULIANA ANDRADE BARICHELLO - Julg: 07/08/2020
Ementa número 7
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO
PENHORA ON LINE
MANDADO DE SEGURANÇA
DESCABIMENTO
2ª TURMA RECURSAL. PROCESSO N.º 0001034-73.2020.8.19.9000. IMPETRANTE: RN COMÉRCIO VAREJISTA. IMPETRADO: JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DA COMARCA DE CAMPOS DOS GOYTACAZES. VOTO: Trata-se de mandado de segurança contra decisão que indeferiu pedido de extinção da execução do processo nº 0022609-03.2018.8.19.0014. Alega a impetrante que teve seu pedido de recuperação extrajudicial homologado pela 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais da Comarca de São Paulo e que, ao postular a extinção da execução do processo que tramita no JEC da Comarca de Campos do Goytacazes, teve o pedido negado, conforme decisão de fls.437 do processo originário. Relata que o indeferimento do pedido por parte do juízo impetrado fundamentou-se na inexistência de impedimento para que as execuções de créditos oriundos da relação de consumo tivessem prosseguimento, desde que não houvesse a penhora de bens arrolados na ação de recuperação. A impetrante pugna, assim, pelo deferimento de liminar para extinção da execução do processo nº 0022609-03.2018.8.19.0014 e, subsidiariamente, a suspensão do feito. A inicial veio instruída com os documentos. É o breve relatório. Passo ao voto. A impetrante impugna, no presente mandamus, decisão que indeferiu a suspensão da execução e determinou a realização de penhora on line no feito originário. Observa-se dos autos que a decisão ora impugnada poderá ser discutida em sede de embargos à execução e, posteriormente, submetida à apreciação da Turma Recursal através de recurso inominado. Nos termos do art. 5º, II, da Lei nº 12.016/2009: "Não se concederá mandado de segurança quando se tratar de decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo". No mesmo sentido, o enunciado nº 267 da Súmula de Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que dispõe: "Não cabe mandado de segurança contra ato judicial passível de recurso ou correição". Desta forma, existindo meio de impugnação próprio para a decisão impugnada, incabível a utilização do mandado de segurança, que não pode ser utilizado como sucedâneo de recurso legalmente cabível. Forçoso reconhecer, destarte, a manifesta inadequação da via eleita, o que autoriza o indeferimento liminar da petição inicial, na forma do art. 10 da Lei nº 12.016/2009. Diante do exposto, VOTO pelo indeferimento da petição inicial do mandado de segurança. Destaque-se que, nos termos da Resolução CM nº 14/2012, independe de inclusão em pauta a análise do indeferimento da inicial (artigo 13, inciso VI). Custas pelo impetrante. Sem honorários advocatícios, na forma da Súmula nº 512, do STF e da Súmula 105, do STJ. Oficie-se à autoridade apontada como coatora para ciência. Intimem-se os interessados. Ciência ao Ministério Público. Desde já autorizo a Secretaria das Turmas Recursais a assinar o respectivo expediente. Rio de janeiro, na data da assinatura digital. PAULO LUCIANO DE SOUZA TEIXEIRA Juiz Relator
MANDADO DE SEGURANÇA - CPC 0001034-73.2020.8.19.9000
CAPITAL 2a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS
Juiz(a) PAULO LUCIANO DE SOUZA TEIXEIRA - Julg: 13/08/2020
Ementa número 8
EXECUÇÃO
ASTREINTES VENCIDA
REDUÇÃO
IMPOSSIBILIDADE
Acordam os Juízes que integram a Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis em conhecer do recurso e negar-lhe provimento para manter a sentença por seus próprios fundamentos, apenas ressaltando que a execução se deu pelo valor das astreintes já devidas, sendo certo que não se reduz multa vencida. Neste sentido: "Direito processual civil. Recurso que tem por objeto a redução de valor de astreinte já vencida. Impossibilidade. Expressa vedação legal (art. 537, § 1º, do CPC/2015) à redução de multa com eficácia retroativa, que atende a entendimento que em doutrina já era majoritário ao tempo do CPC/1973. Desprovimento do recurso" (TJRJ. 0039701-07.2016.8.19.0000 - AGRAVO DE INSTRUMENTO. Des(a). ALEXANDRE ANTÔNIO FRANCO FREITAS CÂMARA - Julgamento: 21/09/2016 - SEGUNDA CÂMARA CÍVEL). "AGRAVO DE INSTRUMENTO. IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. REJEIÇÃO. ASTREINTE VENCIDA. REDUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. DESPROVIMENTO DO RECURSO. 1. Decisão agravada que rejeitou a impugnação ao cumprimento de sentença, por entender ausente qualquer fundamento para a redução da multa aplicada pelo descumprimento de obrigação imposta na decisão concessiva da tutela de urgência. 2. Cumprimento que somente se deu quando passados mais de 100 (cem) dias da intimação. 3. Fixação de astreintes em R$ 100,00 (cem reais) por dia, que se mostrou razoável e proporcional, considerados, sobretudo, o porte da devedora e a inexistência de dificuldade para o atendimento determinado. . 4. Novo Diploma Processual, que excluiu a possibilidade de modificação das multas vencidas. Artigo 357, §1º, do CPC. 5. Importe mais elevado atingido unicamente por força do descaso da agravante no cumprimento do comando judicial. 6. Precedentes. 7. Recurso desprovido" (TJRJ. 0056938-83.2018.8.19.0000 - AGRAVO DE INSTRUMENTO. Des(a). GILBERTO CLÓVIS FARIAS MATOS - Julgamento: 29/01/2019 - DÉCIMA QUINTA CÂMARA CÍVEL). "Apelação Cível. Ação de obrigação de fazer cumulada com danos morais em fase de cumprimento de sentença. Decisão que rejeita a impugnação ofertada pelo réu por excesso de execução. Extinção da execução, na medida em que o crédito deverá, doravante, ser alvo de busca na massa recuperanda. Apelação do executado pretendendo a redução do valor fixado, eis que excessivo, além da conversão em perdas e danos. Inexistência de excesso de execução. Valor fixado pelo Juízo a quo adequado, vez que engloba a multa vencida, danos morais e o valor fixado em conversão da obrigação de fazer em perdas e danos. Multa vencida por descumprimento da obrigação de fazer que perdurou por 971 dias. Diminuição do valor da multa que retira o poder coercitivo da astreinte de impor ao devedor o cumprimento de sua obrigação. Impossibilidade de redução. Precedentes do STJ. Nova ordem processual vigente, em seu artigo 537, §1º, inovou no sentido de autorizar tão somente a modificação ou exclusão da multa cominatória vincenda. Conversão em perdas e danos já deferida nos autos. Recurso desprovido" (TJRJ. 0031828-34.2013.8.19.0202 - APELAÇÃO. Des(a). NATACHA NASCIMENTO GOMES TOSTES GONÇALVES DE OLIVEIRA - Julgamento: 27/09/2018 - VIGÉSIMA SEXTA CÂMARA CÍVEL). Todas as questões aduzidas no recurso foram apreciadas, sendo dispensada a transcrição das conclusões em homenagem aos princípios informativos previstos no artigo 2º da Lei 9099/95, e na forma do artigo 46, segunda parte, da mesma Lei, frisando-se, outrossim, que a motivação concisa atende à exigência do artigo 93 da Constituição Federal, e está em conformidade com o disposto no artigo 26 do Regimento Interno das Turmas Recursais (Resolução do Conselho da Magistratura do TJ/RJ nº 14/2012). Condenado o recorrente nas custas e honorários advocatícios de 20% do valor atualizado da Execução, valendo esta súmula como acórdão, conforme o disposto no art. 46 da Lei 9099/95.
RECURSO INOMINADO 0009341-04.2018.8.19.0038
CAPITAL 4a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS
Juiz(a) PAULO ROBERTO CAMPOS FRAGOSO - Julg: 03/09/2020
Ementa número 9
ROCK IN RIO
COMPRA PELA INTERNET
FURTO
CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA VOTO
Trata-se de recurso inominado interposto pelo réu em face de sentença que julgou procedentes os pedidos autorais. Reforma que se impõe. Compulsando os autos, verifico que a parte autora realizou a compra do ingresso para o evento Rock in Rio, via internet, em 11/04/2019 pelo valor de R$ 290,00 (f.21/22); Que recebeu o ingresso (pulseira) em sua residência no início do mês de junho de 2019, efetuou o cadastro junto ao site da ré (f.24); Que o evento ocorreria no dia 06/10/2019 (domingo); Que em 30/09/19 a autora informa que foi furtada, dentro do ônibus enquanto dormia. A autora não comprova que houvesse no Regulamento do evento a informação de que o ingresso seria pessoal e intransferível. Por outro lado, a ré traz a informação de que em seu site havia expressamente a previsão de que em caso de furto, não haveria reembolso ou reposição das pulseiras (f.114). Ora, ao que tudo indica, ao se descuidar da guarda do ingresso, a autora permitiu que terceiro adentrasse no evento em seu lugar, não sendo razoável exigir que a ré suporte o prejuízo de lhe fornecer novo ingresso, deixando de vendê-lo a outrem. Trata-se, portanto, de dano decorrente de culpa exclusiva da vítima, não havendo que se falara em falha na prestação do serviço. Frise-se que, muito embora o réu formule pedido contraposto para a devolução do valor do ingresso (R$290), diante do deferimento da tutela antecipada, não recorre desta parte da sentença, conformando-se, pois, com seu resultado neste ponto. Isso posto, voto em conhecer do recurso e dar-lhe provimento para, revogando a decisão que antecipou os efeitos da tutela, JULGAR IMPROCEDENTES OS PEDIDOS autorais, resolvendo o mérito com fulcro no artigo 487, inciso I do CPC.
RECURSO INOMINADO 0003815-02.2019.8.19.0077
CAPITAL 4a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS
Juiz(a) RENATA PALHEIRO MENDES DE ALMEIDA - Julg: 03/09/2020
Ementa número 10
POSSE DE DROGAS PARA CONSUMO PESSOAL
PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA OU DA BAGATELA
AFASTABILIDADE
BEM JURÍDICO TUTELADO
SAÚDE PÚBLICA
Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Conselho Recursal dos Juizados Especiais Primeira Turma Recursal Criminal Apelação nº 0002017-76.2018.8.19.0035 Apelante: ASAPH STEGLAVS MARADUBA ANDRADE Apelado: MINISTÉRIO PÚBLICO R E L A T Ó R I O Cuida-se de recurso, apresentado pela Defesa, que enfrenta sentença proferida pelo Juizado Especial Criminal da Comarca de Vassouras, que julgou procedente a pretensão punitiva para condenar o acusado nas penas do art. 28 da Lei 11.343/2006, cuja pena fixada foi de 03 (três) meses de prestação de serviços comunitários. Requer o recorrente a reforma da sentença, a fim de que o apelante seja absolvido, ante a atipicidade da conduta pela inconstitucionalidade da norma e princípio da insignificância. Denúncia a fl. 02-A/02-B. Termo Circunstanciado e demais documentos oriundos da Delegacia de Polícia, a fl. 02/13. Promoção do Ministério Público a fl. 14. FAC a fl. 15/19 e 27/30. Assentada da AIJ a fl. 36, na qual, após o recebimento da denúncia, foi realizada a oitiva de uma testemunha e colheita do interrogatório. Mídia a fl. 40.
Alegações finais a fl. 42/44 e 46/59. Sentença condenatória a fl. 60/61, cuja pena foi fixada em 03 (três) meses de prestação de serviços à comunidade. Recurso interposto pela Defesa a fl. 70/80, sustentando haver violação à princípios constitucionais. Requereu a absolvição do Apelante por entender atípica a conduta descrita no tipo penal, por inconstitucionalidade da norma e pelo princípio da insignificância. Contrarrazões do Ministério Público a fl. 81/87. Aditamento da Defensoria Pública em atuação junto a Turma Recursal, a fl. 88v. O Ministério Público, em sede Recursal, a fl. 89, ratificou as contrarrazões. Rio de Janeiro, 3 de setembro de 2020. TELMIRA DE BARROS MONDEGO JUÍZA RELATORA Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Conselho Recursal dos Juizados Especiais Primeira Turma Recursal Criminal Apelação nº 0002017-76.2018.8.19.0035 Apelante: ASAPH STEGLAVS MARADUBA ANDRADE Apelado: MINISTÉRIO PÚBLICO V O T O A Defesa manifestou irresignação em relação à r. sentença condenatória, alegando ser inconstitucional a norma prevista no artigo 28 da Lei no 11.343/2006 e, portanto, atípica a conduta de porte de entorpecente para uso próprio, além de pequena quantidade da substância que autorizaria a aplicação do princípio da insignificância. Inicialmente, defiro a Gratuidade de Justiça ao apelante. Estão presentes os requisitos de admissibilidade recursal, razão pela qual deve ser recebido. 1. Em relação à alegação de atipicidade da conduta, tem-se que o porte de drogas para uso pessoal não desnatura o crime previsto no art. 28 da Lei n. 11.343/06. Outrossim, é patente a lesividade e ofensa a bens jurídicos protegidos pelo direito penal in casu. Primeiro, porque o bem tutelado neste crime não é a saúde individual da pessoa que consome a droga, mas sim a proteção a saúde pública, buscando assim reprimir e desencorajar a circulação de substâncias entorpecentes que causam sério risco à sociedade. O perigo aqui é social e presumido. Segundo, a aplicação deste princípio consistiria em praticamente fazer letra morta do dispositivo legal neutralizando-o in genere. Isto porque, a noção de consumo pessoal alcança justamente aqueles que portam pequenas quantidades de drogas. Ao que porta grandes quantidades a lei reserva-lhe tratamento mais severo com maior probabilidade de enquadramento no art. 33, com base nos requisitos do § 2º do art. 28, todos da Lei de Drogas. Portanto, o legislador no art. 28 da lei especial dedicou a quem porta pequenas quantidades uma resposta penal suave e absolutamente proporcional à lesão social causada. Nesse sentido, precedentes do STF e STJ. Precedentes citados: STF, HC 82.324/SP, Rel. Min. Moreira Alves, publ. 22/11/02; STJ, REsp. 612.064/MG, Rel. Min. Félix Fischer, publ. 01/07/04; STJ, REsp. 612.357, Rel. Min. Paulo Gallotti, publ. 19/06/06. Não merece prosperar também o argumento apresentado pela Defesa, quanto à prevalência do direito constitucional à intimidade e à privacidade. É sabido que, não há direito fundamental absoluto, sendo certo que, a análise da preponderância de um direito fundamental sobre outro é feita à luz do caso concreto. Neste caso, deve prevalecer o direito à saúde pública. No que tange à aplicação do princípio da bagatela, impõe-se idêntico pensamento. A norma jurídica violada é recente, aprovada pela sociedade através do Congresso Nacional e devidamente apresentada à sanção presidencial. Logo, dois Poderes da República anuíram completamente com a norma jurídica moderna, sendo certo que o legislador não desejou quantificar a substância entorpecentes para considerar típica a conduta. Deste modo, a quantidade há de ser valorada pelo Julgador somente para aferir se a conduta deve ser enquadrada como tráfico ou uso. De qualquer sorte, a tipicidade deve ser reconhecida. Entende-se, portanto, pela constitucionalidade do art. 28 da Lei nº 11.343/2006, eis que, embora tendo como elemento subjetivo do injusto o consumo pessoal de drogas, tutela interesse coletivo - a saúde pública, não ofendendo os princípios da igualdade, intimidade e vida privada. 2. Não houve irresignação da Defesa do mérito, nem no tocante à penalidade aplicada. O conjunto probatório é induvidoso, estando a autoria e materialidade sobejamente comprovados através dos depoimentos prestados em Juízo, bem como pelo Laudo Exame em Entorpecentes. Quanto à pena aplicada, houve por bem o Magistrado em fixa-la na modalidade de prestação de serviço à comunidade pelo prazo de 03 (três) meses, que se revela proporcional e atende ao caráter pedagógico/repressivo. 3. Diante de todo o exposto, não há violação ao art. 5º, XXXIX, art. 1º, III, art. 5º caput e art. 5º, X, XLVI, LIV, LV, LVII, todos da Constituição Federal. 5. Portanto, VOTO no sentido de CONHECER e NEGAR PROVIMENTO ao recurso, mantendo-se a sentença integralmente. Rio de Janeiro, 3 de setembro de 2020. TELMIRA DE BARROS MONDEGO JUÍZA RELATORA 2
APELAÇÃO CRIMINAL 0002017-76.2018.8.19.0065
CAPITAL 1a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CRIMINAIS
Juiz(a) TELMIRA DE BARROS MONDEGO - Julg: 03/09/2020
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